Ex.mo Senhor
Presidente do Conselho de
Administração Executivo da
EDP – Energias de Portugal, S.A.
Praça Marquês de Pombal, 12
1250-162 LISBOA
 
 
 
V.ª Ref.ª
V.ª Comunicação
Nossa Ref.ª
Proc. R-3673/11 (A2)
 
 
 
RECOMENDAÇÃO N.º 15/A/2013
 
(artigo 20.º, n.º 1, alínea a), da Lei n.º 9/91, de 9 de abril, na redação da Lei n.º 17/2013,
de 18 de fevereiro)
 
 
Assunto:
Contribuição para o audiovisual.
 
 
 
Nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 20.º, n.º 1, alínea a), da Lei n.º 9/91, de 9 de abril, e em face das motivações seguidamente apresentadas, recomendo a V. Ex.ª que:
 
I)                   Em observância do que resulta da sistemática da própria lei, a EDP – Energias de Portugal, S.A., faça operar a incidência, a priori, da contribuição para o audiovisual sobre todos os fornecimentos de energia[1] e, somente a posteriori, proceda à verificação do pressuposto da isenção anual, com o natural e consequente processamento das restituições que, para esse mesmo ano, dela resultem;
 
II)                Sejam atendidos os pedidos de devolução das contribuições pagas por consumidores que, no termo de cada ano civil, não tenham registado um consumo anual igual ou superior a 400 kWh.
 
Convido-o a atender às motivações que se apresentam, no termo da instrução de um processo que contou, como não poderia deixar de ser, com os prestimosos contributos da EDP Soluções Comerciais, S. A. e da Rádio e Televisão de Portugal, S. A. (RTP). Entendo, assim, contribuir para uma mais correta e razoável aplicação do direito vigente.
 
 
 
§ 1.º- O PROBLEMA
 
1.      A  aplicação da isenção de contribuição para o audiovisual a que têm direito os consumidores cujo consumo anual fique abaixo dos 400 kWh tem vindo a ser objeto de queixas recorrentes ao Provedor de Justiça, formuladas por clientes dos comercializadores de energia elétrica do Grupo EDP, EDP Serviço Universal, S.A. e EDP Comercial – Comercialização de Energia, S.A..
 
2.      Como é sabido, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 169‑A/2005, de 3 de outubro, o n.º 2 do artigo 3.º da Lei n.º 30/2003, de 22 de agosto (aprova o modelo de financiamento do serviço público de radiodifusão e de televisão), dispõe que a contribuição para o audiovisual incide sobre o fornecimento de energia elétrica, sendo devida mensalmente pelos respetivos consumidores.
 
3.      Ainda de acordo com o mesmo diploma, é a contribuição para o audiovisual liquidada, mensalmente, por substituição tributária, através das empresas comercializadoras de eletricidade, incluindo as de último recurso, ou através das empresas distribuidoras de eletricidade, quando estas a distribuam diretamente ao consumidor, sendo cobrada juntamente com o preço relativo ao seu fornecimento ou comercialização.
 
4.      De qualquer modo, segundo o n.º 1 do seu artigo 4.º, estão isentos do pagamento da contribuição para o audiovisual os consumidores cujo consumo anual de energia elétrica seja inferior a 400kWh.
 
5.      Ora, é precisamente o procedimento adotado pelos comercializadores do Grupo EDP para aplicação desta isenção, relativamente a instalações sem um consumo anual de energia elétrica igual ou superior a 400 kWh, que constitui o objeto das queixas que me são dirigidas.
 
 
 
§ 2.º – O PROCEDIMENTO DA EDP
 
6.      Oportunamente interpelado sobre o assunto, o DAE – Departamento de Atendimento Especial, da EDP Soluções Comerciais, S.A., no âmbito da boa cooperação que sempre tem prestado a este órgão do Estado, esclareceu o seguinte:
 
a.       O processo de prestação de contas e os procedimentos associados à liquidação da contribuição para o audiovisual, relativamente aos clientes dos comercializadores de energia elétrica do grupo EDP, são os estabelecidos nos protocolos que regulam as relações entre aqueles e a RTP;
 
b.      Relativamente aos contratos em vigor, resulta dos procedimentos previstos que, antes da primeira fatura de cada ano civil, o sistema analisa os consumos faturados no ano anterior «n-1», no total dos doze meses ou por extrapolação do respetivo período disponível, e determina a sujeição à faturação de contribuição para o audiovisual para o total do ano «n»;
 
c.       Esta classificação é válida para todo o ano civil, sendo mantida até à primeira fatura do ano seguinte «n+1», repetindo-se a avaliação em todos os anos futuros, enquanto o contrato se mantiver válido;
 
d.      Tratando-se de novos contratos, para determinação das instalações isentas, estabelece o sistema implementado que, antes da primeira fatura (mais propriamente entre a ordem de cálculo e o cálculo), seja feita uma simulação em função de consumos eventualmente já registados para o próprio contrato, ou, na ausência de leitura, em função do consumo standard e módulo de estimativa aplicado ao contrato;
 
e.       O consumo standard é então considerado para extrapolar o consumo estimado desde a data de início do contrato até final desse ano e, assim, determinar se deve ser faturada contribuição para o audiovisual à instalação ou se esta deve ser considerada isenta;
 
f.       As contribuições para o audiovisual liquidadas e cobradas com base naquela presunção relativamente a instalações que, no final do primeiro ano civil, não tenham ultrapassado o limite de isenção, não são, por regra, restituídas aos sujeitos passivos.
 
 
 
§ 3.º – A POSIÇÃO DA RÁDIO E TELEVISÃO DE PORTUGAL, S.A.
 
7.      Seguidamente ouvida, transmitiu a RTP que, não obstante a receita da contribuição para o audiovisual se destinar ao financiamento dos serviços públicos de radiodifusão e de televisão, dos quais é concessionária, grosso modo, é completamente alheia a todo o processo de liquidação e cobrança daquele tributo, não lhe cabendo quaisquer responsabilidades na prestação de informação aos utilizadores, no cálculo do débito e na arrecadação de valores, da exclusiva responsabilidade das entidades liquidatárias da contribuição para o audiovisual, as quais, por força dos contratos de fornecimento de energia, têm uma relação continuada com os consumidores finais.
 
8.      Não mantendo, assim, qualquer ligação com os sujeitos passivos, não cabe à RTP proceder a restituições de qualquer natureza, da exclusiva responsabilidade das entidades liquidatárias.
 
9.      Não obstante, atenta a circunstância de terem, em permanência, um saldo considerável a favor da RTP – mensalmente são efetuados acertos parciais de valores de períodos anteriores -, parece-lhe legítimo e razoável que quaisquer devoluções de verbas da contribuição para o audiovisual efetuadas pelas empresas comercializadoras sejam deduzidas nas contas que estas lhe venham a prestar.
 
10. Ainda segundo a RTP, atendendo à clareza do texto legal, devem os consumidores ser reembolsados do valor que, uma vez pago, se conclua ser indevido.
 
 
 
§ 4.º – APRECIAÇÃO E CONCLUSÕES
 
 
A.     A contribuição para o audiovisual – correspetivo do serviço público de radiodifusão e de televisão -, foi introduzida no nosso ordenamento jurídico pela Lei n.º 30/2003, de 22 de agosto.
 
B.    Nos termos do n.º 2 do seu artigo 3.º, a contribuição para o audiovisual incide sobre o fornecimento de energia elétrica, sendo devida mensalmente pelos respetivos consumidores.
 
C.    De acordo com o n.º 1 do artigo 4.º da mesma lei, estão isentos os consumidores cujo consumo anual fique abaixo de 400 kWh.
 
D.    Celebrado o contrato de fornecimento de energia elétrica, procedem os comercializadores do Grupo EDP à liquidação e cobrança da contribuição para o audiovisual, ou não, consoante a estimativa ou simulação prévias à emissão da primeira fatura apontem para que, no período remanescente desse ano civil, o consumo na instalação seja, ou não, superior àquele limite legal.
 
E.    Relativamente aos consumidores que, tendo sido sujeitos à faturação da contribuição com base nessa estimativa, apresentem, no final daquele ano, um consumo anual inferior a 400 kWh, determina o procedimento da EDP a sua isenção a partir do dia 1 de janeiro do ano civil seguinte, classificação que se mantém até ser atingido aquele limite anual, sem que se deixe de lhes exigir os valores liquidados até ao dia 31 de dezembro.
 
F.     Quanto aos consumidores que, com base naquela projeção, tenham inicialmente beneficiado de isenção, passa a contribuição a ser-lhes faturada apenas a partir do momento em que atingem um consumo anual superior ao limite legal, aplicando-se-lhes a contribuição até ao final do ano civil subsequente.
 
G.    Significa isto que, de acordo com a prática em vigor, consumidores há que, não tendo um consumo anual igual ou superior a 400 kWh, ficam irreversivelmente obrigados ao pagamento da contribuição ao longo de todo o ano civil, enquanto outros conservam o benefício transato da isenção até ao momento em que ultrapassam aquele consumo, o que, no limite, poderá significar uma isenção nos primeiros onze meses do ano civil.
 
H.   Trata-se, portanto, de um procedimento iníquo, pois além de não garantir a indispensável igualdade de tratamento entre os sujeitos passivos da contribuição, subverte os critérios legais de isenção, com prejuízo financeiro, ora dos próprios sujeitos passivos – não reembolsados quando o devam ser –, ora do sujeito ativo, RTP, que deixa de perceber receita que lhe é legalmente reconhecida.
 
I.       Por outras palavras, o sistema adotado pelas empresas do Grupo EDP introduz distorções ao regime legal aplicável, seja por se basear em presunções que são iníquas sem os devidos acertos de restituição ou de cobrança, seja por fazer corresponder os efeitos da isenção a um ano civil distinto daquele para o qual foi legalmente prevista.
 
J.       Na verdade, sendo a verificação do pressuposto de isenção somente aferível no termo do ano civil a que se refere, por o legislador a basear em consumo anual do sujeito passivo, será esse o momento a atender para o seu reconhecimento.
 
 
Dignar-se-á V. Ex.ª, em cumprimento do disposto no artigo 38.º, n.º 2, da Lei n.º 9/91, de 9 de abril, transmitir-me, dentro de sessenta dias, a posição que o Conselho de Administração Executivo da EDP – Energias de Portugal, S.A., vier a assumir.
 
 
O PROVEDOR DE JUSTIÇA
 
 
 
(José de Faria Costa)
 


[1] Aqui não cabendo as situações previstas no n.º 2 do artigo 4.º da Lei n.º 30/2003, de 22 de agosto, na redação que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 107/2010, de 13 de outubro.