Ministro das Finanças

RECOMENDAÇÃO Nº 3/B/98
Proc. R-4910/97
1998.06.18
Área:A3
Sequência: Sem resposta

1. No âmbito da instrução de um processo aberto neste órgão do Estado, apurou-se que os funcionários do Centro de Medicina de Reabilitação da Região Centro – Rovisco Pais(adiante designado como CMRRC-Rovisco Pais), se encontram numa situação de desprotecção na assistência à saúde, uma vez que a ADSE se recusa a considerá-los seus beneficiários de plenos direitos, não liquidando as comparticipações das despesas que para o efeito lhe vão sendo apresentadas.

2. Esta situação verifica-se desde a entrada em vigor do D.L. n.º 203/96, de 23/10, o qual veio extinguir o Hospital Rovisco Pais (art. 3º) e criar o referido CMRRC-Rovisco Pais. Este último manteve, no entanto, o mesmo estatuto jurídico de “pessoa colectiva de direito público dotada de autonomia administrativa e financeira” (art. 1º, n.º 1), sendo-lhe supletivamente aplicáveis as disposições legais relativas aos estabelecimentos hospitalares do Serviço Nacional de Saúde (art. 1º, n.º 2), nomeadamente no que concerne às comparticipações nos encargos com a assistência na saúde dos seus funcionários (art. 2º, n.º 3, do D.L. n.º 19/88, de 21/1, o qual estabelece, para os hospitais, a dispensa do pagamento de tais encargos e que são exigíveis à generalidade dos outros organismos autónomos).

3. A ADSE, em defesa da sua posição, invoca que só está obrigada ao cumprimento do disposto no D.L. n.º 118/83, de 25/2 (diploma que rege o esquema de benefícios cuja comparticipação é assegurada por aquele subsistema) e que o seus arts. 4º e 64º determinam que a ADSE só poderá assumir o pagamento das prestações devidas por um organismo autónomo (caso do CMRRC-Rovisco Pais) mediante a celebração de um acordo prévio com a entidade em causa, sem dispensa de liquidação de encargos (condicionalismo este que o CMRCC-Rovisco Pais não aceita). Mais alega a ADSE que o disposto no n.º 3, do art. 2º do D.L. n.º 19/88, de 21/01, não é susceptível de ser aplicado, uma vez que os diplomas legais aí referidos se encontram há muito revogados (permito-me juntar fotocópia dos ofícios emanados pela ADSE nos quais transparece a posição assumida por aquela entidade sobre o assunto).

4. Ora, verifica-se efectivamente que o D.L. n.º 203/96, de 23/10, não regulou especialmente a matéria relativa à comparticipação nos encargos com a assistência na saúde dos funcionários CMRRC-Rovisco Pais, pelo que na falta de disposição expressa nesse sentido, é aplicável o regime jurídico dos hospitais (D.L n.º 19/88, de 21/1), o qual, no seu art. 2º, n.º 3 dispõe : “A autonomia financeira a que se refere o n.º 1 do presente artigo não prejudica o direito dos funcionários hospitalares de serem beneficiários da Assistência na Doença aos Servidores Civis do Estado, prevista no Decreto Lei n.º 45002, de 27 de Abril de 1963 e Decreto Lei n.º 45688, de 27 de Abril de 1964, com dispensa das indemnizações por despesas previstas na parte final do art. 4º do último diploma citado” .

5. É certo que nos termos do disposto no art. 4º do D.L. n.º 118/83, de 25/2 (novo regulamento da ADSE), “o pessoal dos organismos dotados de autonomia administrativa e financeira (…) só poderá adquirir a qualidade de beneficiário titular se, cumulativamente:
a) os respectivos organismos tiverem celebrado um prévio acordo com a ADSE onde serão fixadas as condições respeitantes à atribuição dos benefícios assegurados pela ADSE;
b) não beneficiarem como titulares de qualquer outro regime de natureza igual ou semelhante ao da ADSE;
c) os respectivos organismos assegurarem pelas verbas inscritas nos seus orçamentos privativos os encargos resultantes da aplicação do previsto na al. a);
d) concorrerem a favor da ADSE a título de comparticipação nas despesas da Administração com um quantitativo anual por beneficiário inscrito, quer titular quer familiar fixado por despacho do Ministro de Estado e das Finanças e do Plano”.

6. Contudo, se é certo que este regime do art. 4º do D.L. n.º 118/83, de 25/2 é aplicado à generalidade dos organismos autónomos, não menos certo é que sofre uma excepção no caso dos hospitais ou estabelecimentos similares, de acordo com legislação que especialmente regula esta matéria (art. 2º, n.º 3, do D.L. n.º 19/88 e art. 1º, n.º 2, do D.L. n.º 203/96) e à qual a ADSE também está vinculada.

7. E tanto assim é que a ADSE tem reconhecido à generalidade dos estabelecimentos hospitalares do país o direito de isenção de encargos, não lhes exigindo a celebração de qualquer acordo. Aliás, de facto reconhece aos funcionários dos hospitais a qualidade de beneficiários de plenos direitos, liquidando-lhes as respectivas comparticipações nas despesas de saúde.

8. Como V.Exa. compreenderá, não cabe aqui pronunciar-me sobre o mérito da norma constante do referido art. 2º, n.º 3, do D.L. n.º 19/88, de 21/1 e, consequentemente, sobre o regime de excepção que dessa norma resulta para os hospitais e estabelecimentos similares (como o CMRRC-Rovisco Pais). Assim, perante o quadro legal existente, é com natural perplexidade que encaro a posição assumida pela ADSE perante o CMRRC-Rovisco Pais.
8.1. Em primeiro lugar, não pode ignorar-se que o CMRRC-Rovisco Pais se rege, na parte não prevista no D.L. n.º 203/96, “… pelas disposições legais aplicáveis aos estabelecimentos hospitalares do Serviço Nacional de Saúde” (art. 1º n.º 2), pelo que não existindo qualquer norma legal que regule especialmente a situação dos encargos com a saúde dos funcionários daquela instituição, aplica-se automaticamente o disposto no referido art. 2º, n.º 3, do D.L. n.º 19/88. Acresce, aliás, que a situação do pessoal daquele estabelecimento público de saúde se encontra claramente definida no próprio art. 4º do D.L. n.º 203/96, o qual transitou, “na mesma situação”, do Hospital de Rovisco Pais para o CMRRC-Rovisco Pais. Ora, se antes da criação do CMRRC-Rovisco Pais, a ADSE suportava os encargos com a saúde dos respectivos funcionários e se a ADSE continua a assegurar tais encargos com os funcionários dos diferentes estabelecimentos hospitalares do país, não se compreende – nem com justiça se pode aceitar – que a ADSE se recuse a fazê-lo, agora, no caso do CMRRC-Rovisco Pais. Afinal, esta última entidade goza da mesma autonomia administrativa e financeira que os restantes estabelecimentos hospitalares do país (cfr. art. 1º, n.º 1 do D.L. n.º 203/96 e art. 2º, n.º 1, do D.L. n.º 19/88). Não se compreende nem se aceita a existência desta dualidade de critérios por parte da ADSE.

8.2. Em segundo lugar, não procede o argumento invocado pela ADSE no sentido de que o art. 2, n.º 3, do D.L. n.º 19/88 não é aplicável , uma vez que o mesmo remete para legislação revogada. É certo que à data da publicação do D.L. n.º 19/88 (ou seja, em 21.01.1988) o D.L.n.º 45002, de 27.04.63 e o DL n.º 45688, de 27.04.64, a que se alude naquele diploma, já se encontravam revogados. Contudo, só por mero lapso se pode compreender o facto de o legislador ter referido diplomas legais que à data se encontravam revogados, uma vez que parece inequívoca a intenção e o espírito do legislador, no sentido da não aplicação aos hospitais do dever de indemnização à ADSE pelos encargos com a saúde dos seus funcionários. A não ser assim, qual o sentido útil do n.º 3 do art. 2º do D.L. n.º 19/88?
Como já tive oportunidade de referir, a norma em causa foi literalmente transposta do D.L. n.º 129/77, de 2.04 (com a redacção dada pelo D.L. n.º 476/77, de 14/11), quando ainda estavam em vigor os referidos D.L.n.º 45002, de 27.04.63 e DL n.º 45688, de 27.04.64. Estes vieram a ser revogados e substituídos, respectivamente, pelo D.L. n.º 476/80, de 15/10 e pelo D.L. n.º 118/83, de 25/2 que, sobre esta matéria específica, nada de novo acrescentaram ao estipulado nos diplomas legais revogados.
Assim, conclui-se facilmente pela existência de lapso grosseiro na redacção do referido art. 2º, n.º 3, do D.L. n.º 19/88: o texto da lei não encontra clara correspondência no espírito do legislador, sendo certo que este, porém, pretendeu manter o mesmo regime (até então vigente) de isenção de encargos para os hospitais e instituições similares. Assim, tendo em atenção o disposto no art. 9º do Código Civil, bastará o simples recurso a uma interpretação correctiva da referida norma para se alcançar o escopo real e final da mesma . Na interpretação das leis tem de partir-se do pressuposto que o legislador não cria normas inúteis e sem sentido. Ora, a posição da ADSE sobre o assunto fica necessariamente confrontada com este problema e irremediavelmente prejudicada pela tábua rasa que faz da aplicação do art. 9º do Código Civil. Para além da incongruência em que a sua própria actuação se traduz, uma vez que perante uma mesma norma jurídica utiliza uma dualidade de critérios na sua aplicação: aos hospitais propriamente ditos não exige a celebração de qualquer acordo nem os encargos previstos no art. 4º do D.L. n.º 118/83, reconhecendo os respectivos funcionários como beneficiários de plenos direitos; ao CMRRC-Rovisco Pais, com o mesmo estututo jurídico dos hospitais e a quem é aplicável o mesmo regime (cfr. art. 1º, n.º 2, do D.L. n.º 203/96, de 23/10), já a ADSE não reconhece tal direito.

9. Como V.Exa. por certo compreenderá, a situação de desprotecção na saúde que entretanto se verifica com os funcionários do CMRRC-Rovisco Pais revela-se, assim, preocupante, urgindo, por isso, que a legalidade e a justiça sejam repostas. Assim sendo, ao abrigo do disposto no art. 20º, n.º 1 al. b) da Lei n.º 9/91, de 9/4, e considerando a urgência que a resolução da situação de desprotecção social impõe, RECOMENDO

a) que seja estabelecida uma interpretação correctiva do art. 2º, n.º 3 do D.L. n.º 19/88, no sentido atrás exposto, por forma a assegurar que essa norma seja efectivamente aplicada pela ADSE;
b) que, em conformidade como o disposto no art. 1º, n.º 2 do D.L. n.º 203/96, de 23/10 – e em face da interpretação correctiva recomendada na al. a) – sejam transmitidas aos serviços da ADSE as necessárias instruções por forma a que os funcionários do Centro de Medicina de Reabilitação da Região Centro – Rovisco Pais tenham, por parte da ADSE, idêntico tratamento àquele que é assegurado aos funcionários dos restantes estabelecimentos hospitalares do país;
c) que sejam transmitidas aos serviços da ADSE as necessárias instruções por forma a que sejam pagas todas as legais comparticipações das despesas de saúde que os funcionários do Centro de Medicina de Reabilitação da Região Centro – Rovisco Pais entretanto apresentaram e foram recusadas pela ADSE, bem como as comparticipações relativas a despesas futuras.

O PROVEDOR DE JUSTIÇA
Menéres Pimentel

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Senhor Ministro das Finanças
Número: 3/B/98
Processo: 4910/97

Em 18 de Junho de 1998 dirigi a Vossa Excelência a Recomendação n.º 3/B /98 sobre o assunto supra referenciado.

Através do ofício com a referência n.º … (procº … / Ent. … /98), datado de … de 1998, proveniente do gabinete de Sua Excelência o Secretário de Estado do Orçamento, fui informado do não acatamento da referida recomendação, através de um despacho daquele membro do Governo sustentado por um parecer emitido, para o efeito, pela Direcção-Geral de Protecção Social aos Funcionários e Agentes da Administração Pública.

Contudo, face à gravidade da situação criada aos funcionários do CMRRC- … e à incongruência dos fundamentos sustentados no parecer que enformou o despacho do Senhor Secretário de Estado do Orçamento, venho, por este meio, formular a reiteração da minha Recomendação, o que faço nos termos e com os fundamentos seguintes:

1. O parecer que sustenta o despacho de concordância do Senhor Secretário de Estado do Orçamento assenta, em síntese, nos seguintes pressupostos:

1.1. A interpretação correctiva não é admitida pelo nosso sistema jurídico ou, pelo menos, a admitir-se, a mesma não é susceptível, por si só, de resolver o caso concreto do CMRRC- … .

1.2. O D.L. n.º 118/83, de 25/2 revogou o D.L. n.º 45688, de 27/04/64, apresentando uma formulação para o problema diferente da que constava do diploma legal revogado.

1.3. O D.L. n.º 118/83, de 25/2, que regulamenta o funcionamento e o esquema de benefícios da ADSE, já estava em vigor à data da publicação do D.L. n.º 19/88, de 21/1, relativo ao estatuto dos hospitais do Serviço Nacional de Saúde.

1.4. Em nenhuma circunstância deixou de ser assegurada a assistência na saúde aos funcionários do CMRRC-… através dos hospitais públicos e dos médicos convencionados.

2. Considerando que são os legítimos interesses dos funcionários do CMRRC-… que estão em causa, começo por me debruçar sobre o último dos argumentos avançados pela ADSE. Como referi, entende esta instituição que àqueles funcionários está garantida a protecção na saúde através dos hospitais públicos e dos médicos convencionados.

Contudo, resulta à evidência que os mesmos estão excluídos do exercício do direito à assistência em regime livre (a ADSE admite-o implicitamente, o que, aliás, é corroborado pelas informações recolhidas no âmbito da instrução do processo existente neste órgão do Estado, segundo as quais a ADSE estaria a devolver aos funcionários em causa todos os recibos de despesa de saúde, recusando-se, consequentemente, a comparticipá-los).
Esta restrição imposta pela ADSE é discriminatória e, por isso, abusiva. Efectivamente, ao contrário dos outros funcionários e agentes da Administração Pública, os funcionários do CMRRC- … , descontando mensalmente para a ADSE o mesmo que a generalidade dos outros trabalhadores da função pública, vêem-se impedidos de recorrer ao regime livre da assistência na saúde.

Mas tal restrição é ainda discriminatória face aos funcionários dos hospitais públicos, com o mesmo estatuto que os funcionários do CMRCC-… (art. 1º, n.º 2, do D.L. n.º 203/96, de 23/10), a quem é reconhecido, na prática, a cobertura total por parte da ADSE, o que esta não deixa de reconhecer no seu parecer: “(…) a ADSE sempre tem contestado a aplicabilidade da norma constante do n.º 3 do artigo 2º do Decreto-Lei n.º 19/88, 21 de Janeiro no que toca aos hospitais do Serviço Nacional de Saúde, mau grado a situação de facto existente (…) “.

Afinal, de acordo com os critérios da ADSE, uma mesma norma jurídica (art. 2º, n.º 3, do D.L. n.º 19/88, de 21/1) é susceptível de criar aos seus destinatários dois tratamentos diferenciados.
Conclui-se, assim, que os princípios da legalidade, da igualdade e da justiça, são irrelevantes e perfeitamente contornáveis para a ADSE, tendo em atenção os seus interesses (que não o próprio interesse público) e não os interesses dos beneficiários que para ela descontam.

3. A minha Recomendação apontava de facto para que fosse adoptada a interpretação correctiva do art. 2º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 19/88, de 21/1, aplicável ao CMRRC-… por força do disposto no art. 1º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 203/96, de 23/10. Ao contrário do que refere a ADSE, a interpretação correctiva não está excluída do nosso sistema jurídico (art. 9º do Código Civil).

A doutrina dominante assim se pronuncia, o que a ADSE não deixa, aliás, de reconhecer no seu parecer. Para além da doutrina citada na minha Recomendação, bastará também acompanhar o pensamento de BAPTISTA MACHADO (1): “A letra (o enunciado linguístico) é, assim, o ponto de partida. Mas não só, pois exerce também a função de um limite, nos termos do art. 9º, 2; não pode ser considerado como compreendido entre os sentidos possíveis da lei aquele pensamento legislativo (espírito, sentido) �que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso�.

Pode ter de proceder-se a uma interpretação extensiva ou restritiva, ou até porventura a uma interpretação correctiva, se a fórmula verbal foi sumamente infeliz, a ponto de ter falhado completamente o alvo. Mas, ainda neste último caso, será necessário que do texto “falhado” se colha pelo menos indirectamente uma alusão àquele sentido que o intérprete venha a acolher como resultado da interpretação”.

4. É certo que à data da publicação do D.L. n.º 19/88 (ou seja, em 21.01.1988) o D.L.n.º 45002, de 27.04.63 e o DL n.º 45688, de 27.04.64, a que se alude naquele diploma, já se encontravam revogados.

Contudo, conforme tive oportunidade de referir na Recomendação, só por mero lapso se pode compreender o facto de o legislador ter referido diplomas legais que à data se encontravam revogados, uma vez que parece inequívoca a intenção e o espírito do legislador, no sentido da não aplicação aos hospitais do dever de indemnização à ADSE pelos encargos com a saúde dos seus funcionários.

A não ser assim, qual o sentido útil do n.º 3 do art. 2º do D.L. n.º 19/88? Não parece oferecer quaisquer dúvidas que a ratio legis da norma jurídica em causa é a de permitir que, não obstante o facto de serem entidades públicas dotadas de autonomia administrativa e financeira,os hospitais e estabelecimentos similares (como o CMRRC-…) estariam dispensados do pagamento das indemnizações à ADSE relativas às despesas de saúde dos respectivos funcionários.

Ou seja, o legislador, através de uma formulação imperfeita quis pura e simplesmente manter o quadro de excepção para aquele tipo de entidades (2). O n.º 3 do art. 2º do D.L. n.º 19/88 mais não é do que uma norma excepcional face ao regime geral consagrado no D.L. n.º 118/83 (concretamente no seu art. 4º), sobrepondo-se, como e enquanto norma excepcional, à norma geral insíta no referido art. 4º do D.L. n.º 118/83. A ADSE deve-lhe, por isso, total obediência. E se é certo que a ADSE admite, na prática, a aplicabilidade de tal norma aos hospitais públicos, já outro tanto não se verifica, infundadamente, com o CMRRC- … que detém o mesmo estatuto que os hospitais públicos (art. 1º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 203/96, de 23/10).

Face ao exposto, também é destituído de qualquer relevância o argumento expendido pela ADSE referido em síntese no ponto 1.3. deste ofício, ou seja, face à natureza excepcional da norma em causa (art. 2º, n.º 3, do D.L. n.º 19/88), carece de total relevância que o D.L. n.º 118/83 (que regulamenta os benefícios da ADSE) já estivesse em vigor à data da publicação do aludido D.L. n.º 19/88. Aliás, ao contrário da conclusão que a ADSE procura retirar, o facto de a norma em crise ser não só posterior mas também excepcional, permite que se entenda, por maioria de razão, que ela se sobrepõe às normas gerais constantes do D.L. n.º 118/83.

5. Como tive oportunidade de referir na minha Recomendação, não está em causa pronunciar-me sobre a bondade ou o mérito da norma de excepção contida no aludido n.º 3 do art. 2º do D.L. n.º 19/88. Ela existe no nosso ordenamento jurídico e como tal a sua observância é incontornável.

Na resposta à minha Recomendação, o parecer da ADSE refere que a norma em causa está a ser objecto de reapreciação por parte das respectivas Tutelas, mas tal não tem a virtualidade de afastar a sua aplicabilidade enquanto a mesma estiver em vigor.

6. Face a todo o exposto, e como Vossa Excelência por certo compreenderá, a fundamentação apresentada para o não acatamento da minha Recomendação não é razoável e, em última instância, ignora a clara violação dos princípios da legalidade, da justiça e da igualdade por parte da ADSE. Justifica-se, assim, que

REITERE

a Vossa Excelência a Recomendação n.º 3/B/98, por forma a que seja resolvido o grave problema vivido pelos funcionários do CMRRC-… que merecem assistência idêntica à que é assegurada aos funcionários dos restantes hospitais públicos.

Com o pedido de que, com a máxima brevidade possível, me seja comunicada a posição que vier a ser assumida relativamente à presente reiteração da Recomendação n.º 3/B/98 (art. 38º, n.ºs 2 e 3, da Lei n.º 9/91, de 9/4).

O PROVEDOR DE JUSTIÇA

JOSÉ MENÉRES PIMENTEL

Recomendação sem resposta
(pedido de parecer ao Conselho Consultivo da PGR)

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(1) “Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador”, Almedina; 1983, p. 188 e seguintes.

(2) Demonstra-se, por isso, como totalmente irrelevante, o argumento expendido pela ADSE referido em síntese no ponto 1.2. deste ofício. A formulação para o problema dos organismos autónomos constante do D.L. nº 45688, de 27.04.64,não é substancialmente diversa daquela que veio a ser acolhida pelo D.L. nº 118/83, de 25.02, que o revogou. De qualquer modo, mesmo que o fosse tal não teria a virtualidade de se sobrepor ao disposto no art.2º, nº 3, do D.L. nº 19/88, dada a natureza da norma jurídica em causa: excepcional e posterior. Afinal, bem ou mal – não me cabe aqui apreciar -, o legislador quis excluir aquelas entidades da regra geral da comparticipação nos encargos com as despesas de saúde.