Presidente da Câmara Municipal de Loulé

Rec. nº 37/A/93
Proc.:R-3206/87
Data:5-04-1993
Área: A 5

ASSUNTO:TRÂNSITO – ESTACIONAMENTO – MUNICÍPIO – TAXA INDEVIDA.

Sequência:

1. Um reclamante … apresentou reclamação contra a Câmara Municipal de Loulé pelo facto de ter sido obrigado a pagar a importância de 2.500$00 para que o seu veículo estacionado junto ao passeio do lado norte da Praça da República de Loulé fosse desbloqueado pelo pessoal ao serviço da Câmara Municipal.

Alega o reclamante que a importância cobrada a título de “taxa de recuperação é ilegal e que o local onde tinha estacionado o seu veículo não está devidamente sinalizado como estacionamento autorizado mediante pagamento de certa taxa”.

Mais alega que não lhe foi levantado qualquer auto de transgressão por forma a que pudesse exercer em juízo o seu direito de defesa.

2. Pelos documentos juntos pelo reclamante vê-se que em 6 de Maio de 1987 o reclamante pagou 2.500$00 a título de taxa de recuperação da viatura CT-81-09, mais juntando um ofício (de 2.7.87) onde a Câmara Municipal, além do mais, considera que a taxa de 2.500$00 é justa e razoável tanto mais que à situação verificada corresponde uma infracção a que cabe ,a multa de 1.000$00 a 5.000$00.

3. Depois de ouvida, a Câmara Municipal de Loulé limitou-se a remeter a este Serviço o “Regulamento das Zonas de Estacionamento de Duração Limitada” e, bem assim, a deliberação da Assembleia Municipal de 12.12.988 que aprovou as taxas de utilização dos parques de estacionamento de duração limitada.

4. Vejamos se assiste razão ao reclamante.

4.1. É inequívoco que as Câmaras Municipais podem estabelecer, no interior das localidades, zonas de estacionamento de duração limitada, gratuitas ou não, sinalizadas através de sinais regulamentares (art.º 25º,nº 5,do Código da Estrada), criando regulamentos de utilização das zonas referidas, onde se prevejam as regras de utilização, e aprovando as respectivas taxas (art. 12º, nº 3, do Regulamento do Código da Estrada e art. 25º, nº 6, do Código da Estrada).

4.2. Também é inquestionável que as Câmaras podem cobrar taxas por estacionamento em parques ou outros locais a esse fim destinados (art.º 11º, alínea g), da Lei nº 1/87, de 6 de Janeiro), taxas essas que se destinam a compensar a prestação de serviço pelo município (art.º 4º, alínea h),do último diploma legal citado).

Compete à Assembleia Municipal estabelecer as taxas municipais (cfr. art.º 39º, nº 2, alínea e), do Dec-Lei 100/84, de 29 de Março).

Conclui-se, assim, que a criação de taxas e, bem assim, a sua cobrança relativamente a locais de estacionamento têm ampla cobertura legal.

4.3. Também se não nos oferece dúvidas que o local em causa estava devidamente sinalizado como zona de estacionamento de duração limitada, uma vez que à entrada da zona estava colocado o sinal B21 aprovado pela Portaria nº 122/78, de 1 de Março, sinal esse constituído por um painel quadrangular de fundo branco, tendo inscrito o sinal de estacionamento proibido com indicação dos dias e horas em que a limitação vigora.

4.4. A operação do bloqueamento feita pelo pessoal da Câmara também é regular, porque autorizada pelo art.º 14º, nº 10, do Código da Estrada, na redacção dada pelo Decreto Regulamentar nº 32/85, de 9 de Maio.

4.5. Também não oferece dúvidas que a situação de estacionamento em local de estacionamento de duração limitada, sem pagar a respectiva taxa de utilização, constitui uma infracção punida com multa (cfr. art.º 14º, nº 7, do Código da Estrada).

5. É óbvio, no entanto, que as multas previstas no art.º 14º, nº 7, do Código da Estrada revertem a favor dos Cofres do Estado (cfr. art.º 70º, nº 3, do Código da Estrada) e não das Câmaras Municipais, sem embargo de, no caso dos autos, conjuntamente com o valor da multa, a entidade fiscalizadora poder cobrar o montante da taxa devida pela utilização à Câmara Municipal respectiva (cfr. parte final do art.º 14º, nº 7, do Código da Estrada).

6. Mas não é disso que se trata no presente caso.
6.1. As Câmaras só podem arrecadar as multas fixadas por lei, regulamento ou postura que caibam ao município (artigo 4º, alínea j), da Lei nº 1/87, de 6 de Janeiro).

6.2. Por outro lado, a violação dos regulamentos de natureza genérica e execução permanente das autarquias constitui contra-ordenação sancionada com coima (cfr. art.º 21º da Lei nº 1/87, de 6 de Janeiro).

7. Não podia, assim, a Câmara Municipal de Loulé criar uma nova multa para sancionar a infracção à regra do estacionamento em local cuja utilização está sujeita a taxa, uma vez que tal infracção já tinha sancionamento previsto na lei (artigo 14º, nº 7, do Código da Estrada), sendo certo que a sanção (multa) reverte a favor dos Cofres do Estado. O que a Cãmara podia – e fez – era fixar as taxas pela utilização dos locais de estacionamento.

8. Todavia, pela própria natureza das taxas, estas só existem como contraprestação de um serviço prestado. Onde não há serviço prestado, não há seguramente taxa. Ora, a verdade é que a denominada “taxa de recuperação da viatura” não resulta minimamente de qualquer serviço prestado pela Câmara Municipal.

Antes, e tão só, visa-se com tal taxa sancionar o comportamento do infractor que não pagou a taxa pela utilização.
É que, nesse caso, não existe qualquer actividade de que o particular beneficie.

9. Utilizando o particular a zona de estacionamento sem pagar a taxa, incorre em multa prevista no art. 14º, nº 7, do Código da Estrada e deve pagar a taxa correspondente à utilização da zona, devendo, nesse caso, os vigilantes proceder à denúncia da infracção às autoridades policiais com competência para fiscalização do trânsito (cfr. art.º 14Q, nº 11, do Código da Estrada).

10. Do exposto é de concluir que, por não corresponder à prestação de qualquer serviço e por não ter apoio em norma de direito superior, é ilegal a existência da denominada “taxa de recuperação da viatura” e a respectiva cobrança.

Repare-se que não repugna que seja criada uma taxa pela utilização do parque em que, por falta de pagamento prévio, a taxa a cobrar seja uma taxa agravada.

11. Não pode é a Câmara de Loulé criar uma taxa autónoma, que visa sancionar um comportamento, quando tal sancionamento (multa) já esta previamente definido por
lei.

Nestes termos, considero procedente a reclamação apresentada, e, em consequência, tenho por bem RECOMENDAR :

que o REGULAMENTO e a TAXA sejam alteradas de acordo com as considerações atrás expostas e que ao reclamante seja restituída a importância de 2.500$00 correspondente à taxa indevidamente cobrada.

0 PROVEDOR DE JUSTIÇA

JOSÉ MENÉRES PIMENTEL