Director-Geral dos Regimes de Segurança Social

Rec. n.º 123/A/92
Proc.:R-3629/91
Data:20-11-92
Área: A 3

Assunto: SEGURANÇA SOCIAL – PENSIONISTA DE INVALIDEZ OU DE VELHICE – EXERCÍCIO DE ACTIVIDADE PROFISSIONAL – SUBSÍDIO DE DOENÇA – PERDA DE DIREITO – VER TAMBÉM REC. N.º 101/A/1993 E REC. N.º 240/A/1993.

Sequência:

I –

Diversas reclamações têm dado entrada na Provedoria de Justiça, tendo por objecto e interpretação que essa Direcção-Geral tem vindo a fazer do Decreto-Lei n.º 132/88, de 20/4, na parte em que ele nega o subsídio de doença aos pensionistas que exerçam actividade profissional.

II –

Atribui esse Departamento ao termo “pensionistas” constante da alínea a) do n.º 2 do art.º 7.º daquele diploma um sentido lato, de modo a abranger, quer os titulares de pensões concedidas pelo Centro Nacional de Pensões (prestações de substituição de salário por trabalho no sector privado), quer os beneficiários de pensões atribuídas pela Caixa Geral de Aposentações (prestações de substituição de vencimentos por actividade na função pública).

Estabelece o n.º 2 do art.º 7.º do D.L. n.º 132/88 que “Não é reconhecido o direito ao subsídio de doença, em razão da concorrência da cobertura de riscos aos beneficiários que:

a) Sejam pensionistas de invalidez ou de velhice que exerçam actividade profissional.”

Face a este preceito e em articulação com o art.º 25.º do mesmo diploma, segundo o qual “O subsídio de doença não é acumulável com outras prestações compensatórias da perda de remuneração de trabalho, sem prejuízo do disposto no artigo seguinte”(*).

Considera essa Direcção-Geral que um pensionista da Caixa Geral de Aposentações que exerça actividade profissional no sector privado não tem direito, no caso de doença, ao respectivo subsídio (vd. of. de 91.01.18 remetido ao Conselho Directivo do Centro Regional de Segurança Social do Porto).

IV –

Não posso subscrever o referido entendimento pelas razões que passo a alinhar.

a) Um argumento de ordem literal pode desde logo ser apontado.

Os titulares de pensões calculadas em função de remunerações por trabalho na função pública são designados por aposentados e as suas pensões qualificadas de pensões de aposentação, reservando a lei a expressão “pensão de invalidez” para as pensões concedidas aos militares que, não sendo subscritores da Caixa Geral de Aposentações, se incapacitam no exercício do serviço militar obrigatório (vd. cap. IV da Parte I e cap. II da Parte II do Estatuto da Aposentação).

b) Reconheço que a interpretação que essa Direcção-Geral perfilha, em termos de incluir na expressão “pensionistas de invalidez e velhice” os pensionistas da Caixa Geral de Aposentações está de acordo com o princípio da unidade do sistema de segurança social, consagrado no art.º 63.º, n.º 2 da C.R.P. e no art.º 5.º da Lei n.º 28/84, de 14/8 (Lei da segurança social).

Há, todavia, que ter em atenção que a harmonização dos dois sistemas de segurança social e a sua articulação em obediência àquele princípio tem vindo a ser gradualmente implementada, mediante diplomas legais adequados.

Isto com vista, nomeadamente, a evitar possíveis situações de ruptura, dadas as acentuadas heterogeneidades entre as estruturas de segurança social dos dois sistemas e às diversificadas situações de especialidade socioprofissional sedimentadas no âmbito de cada um desses sectores.

A este respeito, afigura-se-me elucidativo o seguinte passo do preâmbulo do Decreto-Lei n.º 143/88, de 22/4, que instituiu a pensão unificada:

“A harmonização não é facilmente atingível em todas as prestações, face às divergências mais profundas entretanto criadas pelos regimes e ao respeito das legítimas expectativas dos trabalhadores, que a Segurança Social defende e pratica, mas não impede, em muitos aspectos, a progressiva adopção de medidas de aproximação dos dois sistemas”.

Reputa-se, igualmente, significativo o período que segue
“Assim, na perspectiva de que uma pensão unificada poderia trazer nalguns casos perda de direitos dos interessados, manteve-se o respeito por melhores expectativas, garantindo o valor total das duas pensões quando superior ao da pensão unificada.”

Ainda mais sintomática de uma orientação contrária à que está a ser focada se me apresenta esta parte do preâmbulo, que se segue imediatamente à que acaba de ser transcrita

“Nesta linha e tendo em vista razões práticas de ordem administrativa, apenas se previu este cálculo no caso de as actividades terem sido exercidas sucessivamente, uma vez que, em regra, a prática simultânea das actividades apontaria para a concessão das duas pensões?

V –

Neste contexto, parece-me lícito concluir que a interpretação extensiva que essa Direcção-Geral sustenta para a alínea a) do n.º 2 do art.º 7.º do D.L. n.º 132/88, de molde a negar subsídio de doença aos pensionistas da Caixa Geral de Aposentações que, por motivo dessa eventualidade, se viram compelidos a suspender a sua actividade profissional no sector privado, não está de harmonia com a letra desse preceito nem com a preocupação que o legislador tem vindo a revelar, de respeito pelas melhores expectativas dos beneficiários e de possibilitar o recebimento de duas pensões nos casos em que ocorra o exercício de actividades simultâneas nos dois sectores, o público e o privado, ou mesmo de actividades sucessivas desde que os interessados fiquem prejudicados com o sistema da pensão unificada (art.º 4.º do D.L n.º 143/88 e art.º 8.º do D.L. n.º 159/92).

VI –

Ainda que o D.L. n.º 132/88, diploma em causa, não verse sobra a acumulação de pensões, mas sim sobre a acumulação de pensão de aposentação com subsídio de doença, o que é verdade é que a interpretação que essa Direcção-Geral faz da alínea a) do n.º 2 do seu art.º 7.º não respeita as expectativas que os aposentados tinham, de receberem o subsídio de doença sempre que preenchessem os requisitos legais constantes do regime geral de segurança social.

Essa expectativa advinha-lhe pois do regime vigente à data em que começaram a acumular a situação de aposentado com a de activo no sector privado, anterior à entrada em vigor do D.L. n.º 132/88.

VII –

Acresce que os beneficiários que reclamam da interpretação em causa contribuíram para o regime geral de segurança social nos termos de qualquer trabalhador, pelo
que, sendo o subsidio de doença uma prestação que substitui o salário perdido nessa eventualidade, têm os mesmos direito a esse beneficio.

E não se argumente com o Despacho n.º 126/SESS/91, publicado no D.R. n.º 278, II Série, de 91.12.03, que veio reduzir a taxa de contribuição dos trabalhadores que simultaneamente são pensionistas de invalidez e velhice, porquanto, não só os casos concretos que pendem nesta Provedoria são anteriores à entrada em vigor desse despacho,
como também não tem este normativo força suficiente para impor ao D.L n.º 132/88 um sentido que ele não comporta.

VIII –

Por outro lado, há que atentar em que o citado n.º 2 do art.º 7.º do D.L. n.º 132/88 tem por finalidade evitar a concorrência da cobertura de riscos, concorrência esta que, na hipótese em análise, se não verifica.

Com efeito, o que nesta está em jogo e a existência de dois riscos diversos (a incapacidade definitiva para o exercício da actividade que os interessados exerciam na função pública e a doença que os impediu temporariamente de trabalhar no sector privado), dando cada um origem à perda de uma remuneração distinta daquela que é afectada pelo outro, o que, por conseguinte, justifica duas prestações de substituição: a pensão de aposentação e o subsídio de doença.

Neste contexto, considero de formular a seguinte RECOMENDAÇÃO:

Que, tendo em conta a argumentação atrás expendida, essa Direcção-Geral transmita aos centros regionais de segurança social que os pensionistas da Caixa
Geral de Aposentações (aposentados) que exerçam a actividade no sector privado não se incluem no âmbito de aplicação da alínea a) do n.º 2 do art.º 7.º do D.L. n.º 132/88.

O PROVEDOR DE JUSTIÇA

JOSÉ MENÉRES PIMENTEL

(*) No artigo seguinte regula-se a acumulação do subsídio de doença no caso de acidentes de trabalho e doenças profissionais.