General Comandante da Policia de Segurança Pública

Rec. nº 74/A/94
Proc. R.1620/93
Data: 1994-03-25
Área: A5

ASSUNTO: SEGURANÇA INTERNA – GUARDA DA PSP – ACTIVIDADE PROVADA EXERCICIDA POR GUARDA EM ESTABELECIMENTO NOCTURNO – AVERIGUAÇÕES – INFRACÇÃO AO DISPOSTO NO ESTATUTO DA PSP – PROCEDIMENTO DICIPLINAR

Sequência:

Informo V. Exª que, após análise da reclamação apresentada por C…, residente na Rua … , Lisboa, conclui ser a mesma improcedente em relação ao Guarda J…, mas haver boas razões para ser instaurado um processo de averiguações em relação ao Guarda B…, pelas razões enunciadas de seguida.

1. C…, com os demais sinais dos autos, veio apresentar reclamação, juntando para o efeito cópia da participação-crime enviada ao Director da Policia Judiciária de Lisboa.

2. Como se infere da participação apresentada o reclamante visava com o seu procedimento junto da Polícia Judiciária obter a identidade dos civis que no dia … de 1993, cerca das 04h00, o haviam agredido na “boite” … sita na Rua …, nesta cidade da Lisboa e, por outro lado, conseguir a censura disciplinar do Guarda J… por no local não ter identificado os seguranças e, ainda, por não ter recebido a queixa.

3. Solicitada a realização de averiguações ao Comando Geral da Polícia de Segurança Pública viria o Senhor Instrutor a concluir não se terem provado as acusações imputadas ao Guarda J…, conclusão essa que viria a merecer concordância dos Senhores Comandantes da 1ª Divisão e Comandante Distrital.

4. Compulsado o processo disciplinar, não vislumbramos a existência de quaisquer indícios de prova com base nos quais se possa censurar a actuação do Guarda J… .

5. Na verdade, o Guarda J… não identificou os seguranças da discoteca pela simples razão de que o ofendido C… não conseguiu identificar de entre os mesmos qual o seu agressor.

6. Por outro lado, o mesmo Guarda … não se recusou a receber a queixa, tendo, de contrário, informado o reclamante que poderia exercer o direito da queixa em qualquer Esquadra, dispondo do lapso de tempo de seis meses para tal efeito.

7. É, assim, inquestionável que o processo disciplinar instaurado contra o Guarda J… não poderia ter outro destino que não fosse o arquivamento.

8. Mas improcedendo, como improcede, a reclamação contra o Guarda …, a verdade é que o processo nos fornece, no plano indiciário, elementos de prova suficientes para justificar a realização de criteriosas averiguações à actividade do Guarda B…, a prestar serviço no Comando Geral da Polícia de Segurança Pública.

9. Como decorre dos autos, sobre o Guarda B… correm rumores de que trabalhava no referido estabelecimento.

Embora dos autos não se possa inferir que o mesmo trabalhava no local, a verdade é que a sua actuação é bastante comprometedora, não sendo de algum modo consentânea com os seus deveres de agente da autoridade.

10. Na verdade, quando o Guarda J… entrou na discoteca desde logo se apercebeu que o ofendido C… havia sido agredido, dado o tipo e a localização das lesões que apresentava.

Pois bem: nesse momento a intervenção do Guarda B…, que trajava à civil, foi a de se identificar como guarda da P.S.P. e a de negar que ali alguém tivesse sido agredido e que o ofendido deveria ter caído.

11. Ao ser ouvido o Guarda B… negou a versão dada pelo Guarda J… e confirmada pelas testemunhas Guarda J…, P…, J… e ofendido C…, versão essa que é aquela que aparece vertida em 10.

12. Tendo a ocorrência tido lugar às 04H00 da madrugada, e considerando a explicação dada pelo Guarda B… para justificar a presença no local, é por demais evidente que só razões especiais de ligação do Guarda à discoteca podem estar na base de tão insólita actuação.

13. Tendo o Guarda B… conhecimento da agressão, o dever de zelo impunha-lhe que tomasse conta da ocorrência e, por outro lado, estava-lhe interdito que tomasse, como tomou, atitudes que dificultassem o apuramento das responsabilidades do ou dos agressores.

14. Ao negar a existência da agressão e ao pretender atribuir as lesões a queda do ofendido, o Guarda B… pretendeu encobrir a prática do crime de ofensas corporais na pessoa do ofendido, assim protegendo o ou os agressores e a gerência do respectivo estabelecimento, sendo certo que o mesmo guarda confessa ter uma certa ligação ao referido estabelecimento.

15. Há, assim, sinais evidentes de o Guarda B… em concreto ter violado o dever de zelo a que se referem as alíneas a) e c) do nº 2 do artº 9º e do Regulamento Disciplinar da P.S.P. aprovado pela Lei nº 7/90, de 20 de Fevereiro.

16. Para além do caso concreto que merece procedimento disciplinar, importa, ainda, averiguar com mais profundidade a actividade do mesmo Guarda no referido estabelecimento.

17. Nestes termos tenho por bem RECOMENDAR a V. Exª

a instauração de um processo de averiguações em ordem a apurar a actividade privada do Guarda B…enquanto ligada à discoteca “…”, devendo, de qualquer modo, ser-lhe instaurado processo disciplinar, atendendo aos indicios existentes da prática de infracção disciplinar.

18. Agradeço que V. Exª me informe da sequencia dada à presente Recomendação.

19. Aproveito a oportunidade para devolver a V. Exª o processo disciplinar respeitante ao guarda J… .

O PROVEDOR DE JUSTIÇA

José Menéres Pimentel