Ministro da Saúde

Rec. nº 62/A/94
Proc. nº R.2937/91
Data: 1994-03-17
Área: A4

ASSUNTO: FUNÇÃO PÚBLICA – POSSE – TOMADA DE POSSE EM DATA POSTERIOR – RETROACÇÃO DE EFEITOS DA POSSE – NÃO EXISTÊNCIA DE CULPA DO FUNCIONÁRIO

Sequência: Não Acatada

1. A enfermeira do Centro Hospitalar de Coimbra, … solicitou intervenção ao Provedor de Justiça, por ter sido indeferido o pedido que fez para retroacção de efeitos da sua posse na actual categoria à data da posse dos outros candidatos aprovados no mesmo concurso.

2. Do indeferimento do pedido pelo Senhor Presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar de Coimbra, a queixosa interpôs recurso que foi também indeferido pela Senhora Directora Geral do Departamento de Recursos Humanos, em 92.06.08, com o fundamento de ter sido largamente excedido o prazo de interposição de recurso hierárquico.

3. Considerou-se também, no parecer em que a decisão se fundamentou, não ter a interessada provado caber aos serviços a responsabilidade pelo atraso verificado no envio do seu processo de nomeação ao Tribunal de Contas.

4. Entendendo que a Administração podia revogar o acto praticado, substituindo-o por outro favorável à interessada, recomendei ao Senhor Director Geral dos Recursos Humanos que revogasse o despacho, permitindo a retroacção de efeitos à data da tomada de posse, por me parecer justo e haver disposição legal que o permitia.(cópia junta)

5. Face à resposta enviada que, não aceitando a recomendação, não rebatia directamente os seus fundamentos, reiterei-a, rebatendo a argumentação expendida.

6. Não tendo logrado obter acatamento do recomendado, dirijo-me agora a Vossa Excelência, usando a faculdade conferida pelo nº 4 do artigo 38º da Lei nº 9/91, de 9 de Abril.

7. São estes os factos:

a) a enfermeira …, do Centro Hospitalar de Coimbra, foi aprovada no concurso para ascender à categoria de enfermeira especialista,juntamente com várias colegas que tomaram posse em 89.10.10;

b) não tomou posse na mesma data, mas em 89.11.07, por lhe ter sido exigida a apresentação de um certificado de um curso de especialização, o que retardou o envio do processo para visto ao Tribunal de Contas;

c) afirma, e tal não foi desmentido,que já apresentara antes a referida certidão mas os Serviços não a encontraram ou acharam que já tinha perdido validade;

d) o visto acabou por ser concedido antes de ser enviada nova certidão;

e) como, do facto de a data de posse ser posterior à das outras candidatas, podem resultar prejuízos na sua carreira profissional, resultantes da menor antiguidade na categoria, solicitou, com base em disposições legais então vigentes,que os efeitos da sua posse retroagissem à das outras enfermeiras;

f) a Administração do Hospital não deferiu o seu pedido, pelo que recorreu hierarquicamente mas, como se viu, o recurso foi indeferido por ter sido interposto fora de prazo, referindo ainda o parecer em que se fundamentou que se a interposição fosse tempestiva não tinha ficado apurado a quem cabia a responsabilidade do atraso;

g) além de se ter entendido que não provara não ter culpa do atraso verificado, nem que do mesmo fossem culpados os serviços.

8.Considerando que:

8.1. Ao regime geral estabelecido no artigo 3º do Decreto-Lei nº 146/80, de 22 de Abril, quanto aos efeitos dos actos sujeitos a visto do Tribunal de Contas (a partir da publicação no Diário da República) se sobrepunha então o estabelecido no artigo 1º do Decreto-Lei nº 137/88, de 27 de Abril, diploma posterior e de natureza especial que teve precisamente em vista corrigir certos resultados injustos que decorriam da aplicação daquele dispositivo aos elementos aprovados em um mesmo concurso mas que tomassem posse em datas diversas, por motivos não imputáveis aos interessados;

8.2. Aquela disposição, entretanto revogada pelo Decreto-Lei nº 427/89, de 7 de Dezembro, dizia: «Sempre que, por motivo não imputável ao funcionário este tome posse em momento posterior ao de outros que lhe seguem na lista classificativa final do concurso, os efeitos da mesma serão retroagidos à data da tomada de posse destes, para efeitos de antiguidade»;

8.3. Como se vê, a lei apenas exigia que o motivo não fosse imputável ao funcionário, não referindo, ao contrário do que se entendeu, ter de ser provada a culpa da Administração;

8.4. Porém, como foram os serviços que exigiram a entrega da certidão, retardando o envio do processo para o Tribunal de Contas que acabou por conceder o visto, sem a remessa da mesma, mostrando que afinal não era necessária, é difícil não imputar a culpa à Administração e evidente não haver qualquer culpa da queixosa;

8.5. Não entendo, contrariamente ao argumentado pelo Departamento de Recursos Humanos, que o indeferimento do recurso hierárquico torne inviável a revogação do acto que indeferiu o pedido de retroacção dos efeitos da nomeação, por ter decorrido mais de um ano e não ter sido interposto recurso contencioso;

8.6. Sanado um acto administrativo, mesmo que tivesse sido inválido, passa a ser-lhe aplicável o regime dos actos válidos, ou seja o prescrito no artigo 140º do Código do Procedimento Administrativo, que estabelece que os actos válidos são livremente revogáveis na parte em que sejam desfavoráveis aos interesses do destinatário. (Veja-se o parecer neste sentido expresso no comentário ao Código do Professor Freitas do Amaral e outros);

8.7. A curta distância das datas de posse e o pedido de efeitos apenas em matéria de antiguidade na categoria que tem grande importância para a interessada não representa para a Administração nada de gravoso;

9. Nestes termos, ao abrigo do disposto no nº 1 e no nº 4 do artigo 38º da Lei nº 9/91, de 9 de Abril, considero de formular a seguinte

RECOMENDAÇÃO

A data de posse da enfermeira do Centro Hospitalar de Coimbra, … no lugar correspondente à categoria de enfermeira especialista seja reportada a 89/10/10, para efeitos de antiguidade,conforme então dispunha o artigo 1º do Decreto-Lei nº 137/88, de 22 de Abril.

O Provedor de Justiça

José Menéres Pimentel