Presidente do Instituto de Desenvolvimento e Inspecção das Condições de Trabalho

Processo: R.658/91
Rec. nº 13/A/95
Data:2-02-1995
Área: A 4

Assunto: FUNÇÃO PÚBLICA – EXERCÍCIO DE FUNÇÕES – REGIME DE SUBSTITUIÇÃO – RETRIBUIÇÃO – NÃO EXIGÊNCIA DO FORMALISMO LEGAL.

Sequência:

1.O Inspector Adjunto Principal … da então Inspecção-Geral do Trabalho, em serviço na Subdelegação de Tomar, apresentou reclamação pondo em causa, por um lado, o resultado do concurso para Inspectores de 2ª classe, aberto por aviso publicado no D.R., II Série, nº 111, de 15-05-1990, e, por outro lado, a situação que decorria do facto de há cerca de nove anos exercer as funções de chefia da Subdelegação de Tomar sem que lhe tivesse sido paga uma remuneração correspondente às funções exercidas.

2. Relativamente à questão do concurso este Órgão do Estado decidiu não intervir por estar pendente recurso contencioso, no qual o reclamante viria a decair.

3. Quanto à questão do exercício de funções de chefia foi ouvido o Inspector-Geral do Trabalho que, em síntese, e para alicerçar a correcção da posição sustentada, veio aduzir os seguintes argumentos:
a) As figuras de “ausência ou impedimento” delimitadas no Dec-Lei nº 327/83, de 8 de Julho
(Estatuto da IGT) e Dec-Lei nº 323/89, de 26 de Setembro (Estatuto do Pessoal Dirigente) são
distintas, uma vez que no 1º caso a substituição decorre “ope legis” e no 2º caso decorre do formalismo inerente ã substituição, por despacho da entidade competente;
b) No caso do Estatuto da I.G.T. o substituto actua a título precário, não assumindo a
qualidade de titular do cargo, devendo limitar se a actos inerentes a assuntos de gestão
corrente;
c) O substituto não pode intervir nos processos de contra-ordenações laborais, designadamente decidindo sobre eles;
d) No caso de vacatura ou de ausência prolongada do titular do cargo, competirá ao Inspector-
Delegado “coordenar a actuação da subdelegação compreendida no seu ãmbito”, de harmonia com o disposto na alínea c) do nº 2 do artº 20º do Estatuto da IGT.
e) Durante o período em que esteve vago o cargo de Inspector-Subdelegado de Tomar o seu exercício veio a ser assegurado pelo Inspector-Delegado de Santarém.

4. Não pondo em causa a Inspecção-Geral do Trabalho que o reclamante exerceu durante largo período as funções de Chefe da Subdelegação de Tomar, por ser o Inspector de categoria mais elevada que nela prestava serviço, e nos termos do artº 21º, nº 1 do Estatuto aprovado
pelo Dec-Lei nº 327/83, de 8 de Julho, importa, agora, extrair as conclusões jurídicas de tal situação.

Vejamos:
5. A competência do Inspector-Subdelegado vem prevista no artº 219, nº 2 do último diploma citado, cabendo-lhe:
a) Representar a I.G.T. na sua área de jurisdição;
b) Dirigir os respectivos serviços;
c) Exercer na sua área as demais funções cometidas ao Inspector Regional.

6. O Inspector Subdelegado é equiparado nos termos do artº 59º do mesmo diploma a Chefe de Divisão.

7. Resultando do Estatuto da IGT a indicação do legal substituto do titular do cargo ausente ou impedido, e tratando-se de um cargo equivalente ao elenco dos cargos do pessoal dirigente, é inequívoco que o formalismo a observar quanto à substituição não pode deixar de ser o previsto para o pessoal dirigente, já que o Estatuto da I.G.T. é omisso quanto ao regime a observar relativamente à substituição.

8. E a aplicação do regime geral impõe-se, se não directamente, pelo menos por via de analogia, ja que as razões que justificam a regulamentação na lei geral são as mesmas que procedem no caso da I.G.T., sendo certo que no Estatuto desta não existem normas que regulem a situação jurídica de forma especial.

9. Ora, ao tempo do inicio de funções de Chefia pelo reclamante estava em vigor o artº 11º do Dec-Lei 191-F/79, de 26 de Junho, onde a substituição se verificava sempre que houvesse vacatura do lugar, ausência ou impedimento do titular por período previsivelmente superior
a 30 dias, sendo tal substituição feita por despacho do Director-Geral ou equiparado para o caso de cargo situado abaixo de subdirector geral, e tendo o substituto direito aos vencimentos e demais remunerações atribuídas ao substituido.

10. Este regime foi ligeiramente alterado pelo Dec-Lei 323/89, de 26 de Setembro, designadamente:
a) Alteração para mais de 60 dias do período de previsibilidade e persistência das
condicionantes da substituição;
b) A substituição é sempre determinada por despacho do membro do Governo;
c) G exercício de funções em substituição abrange os poderes delegados e subdelegados no
substituído, salvo despacho expresso em contrário.

11. Analisando os argumentos sustentados pela Inspecção-Geral do Trabalho no que respeita à figura da substituição aplicável aos cargos de chefia, enquanto regulada no Estatuto do Pessoal Dirigente, desde logo se conclui que o Estatuto da IGT apenas se limita a indicar o
substituto legal do inspector subdelegado.

12. Não havendo outro regime de substituição que não o de pessoal dirigente, evidente se torna que o Inspector-Geral do Trabalho deveria, enquanto vigorou o Dec-Lei 191-F/79, de 26 de Junho, ter proferido Despacho de substituição, enquanto que no domínio do Dec-Lei 323/89, de
26 de Setembro, deveria ter proposto ao Ministro do Emprego e da Segurança Social a substituição do cargo de Inspector Subdelegado.

13. Todavia, o não cumprimento dos formalismos de substituição não pode justificar o não pagamento da contrapartida exigida por funções de maior qualidade e superior responsabilidade.
De contrário, o Estado locupleta-se à custa do trabalho e do esforço do seu servidor, circunstãncia essa que não pode deixar de ser repelida pelo Estado de Direito que enforma o nosso sistema constitucional (cfr. artº 59º, nº 1, alínea a) da C.R.P.).

14. Não pode aceitar-se que a substituição “ope legis” prevista no Estatuto da IGT opere uma “capitis diminutio” do substituto, já que o substituto investido “ope legis”, ou por nomeação, não pode deixar de estar investido nos mesmos poderes do substituido, isto pela simples razão de que não existe norma legal que preveja a limitação dos poderes.

15. No que respeita à competência do Inspector Delegado quanto à função de “coordenação das subdelegações”, também não colhe a argumentação da Inspecção Geral do Trabalho, pelas razões seguintes:
a) Coordenar não é chefiar ou dirigir um serviço, mas antes tentar supervisionar as subdelegações quanto a uniformidade de procedimentos;
b) Tal coordenação existirá sempre, quer haja Inspector Subdelegado em exercício ou no caso
de vacatura;
c) A levar ao absurdo tal argumento jamais haveria substituição nos cargos de chefia de uma
direcção-geral, uma vez que o Director Geral coordena sempre todos os serviços da direcção-
geral;
d) Na tradição do regime de substituição a trajectória é sempre de baixo para cima e não
ao contrário, como resultaria da argumentação sustentada;

16. Não é exacto que o substituto do inspector subdelegado não pode intervir nos processos de contra-ordenações laborais.

17. É que o processamento das contra-ordenações compete à Inspecção-Geral do Trabalho através das suas Delegações e Subdelegações, competindo a aplicação das coimas ao Inspector Geral, que poderá delegá-la nos Inspectores Delegados ou Inspector Subdelegado (cfr. artº 46º do Dec-Lei 491/85, de 26 de Novembro).

18. Daí que se deva concluir que a competência para aplicação de coimas na Subdelegação de Tomar poderia ou não ter sido cometida ao Inspector Subdelegado ou ao Inspector
Delegado de Santarém, de acordo com o despacho da delegação de competências do Inspector Geral, sendo certo que a intervenção em tais processos pelo reclamante em nada foi
afectada pelo facto de estar a desempenhar de facto as funções de Inspector Subdelegado.

19. Face ao exposto, tenho por bem Recomendar a V. Exª que, a título de indemnização por locupletamento à custa alheia, deva ser paga ao reclamante a diferença entre o valor das remunerações por si auferidas e aquelas que auferiria o titular do cargo de Inspector da Subdelegação de Tomar, enquanto durou a vacatura do lugar ou o impedimento do seu titular.

20. Agradeço que me seja comunicado o teor do despacho que recair sobre a Recomendação ora formulada.

O PROVEDOR DE JUSTIÇA

José Menéres Pimentel