Presidente da Direcção do INATEL

RECOMENDAÇÃO N.º 63/A/00
Proc. R-4292/99
Data: 11.09.2000
Área: A6
Sequência: Acatada

Assunto: Consumo. INATEL. Impossibilidade de alojamento. Dever de Informação. Indemnização

Como é do conhecimento de V. Ex.ª, o Senhor D. solicitou a intervenção do Provedor de Justiça relativamente ao facto de ter visto frustrado o gozo de férias no centro do INATEL das Caldas de Manteigas, na Serra da Estrela, para onde possuía reserva de alojamento entre os dias 8 e 22 de Agosto de 1999, devido à inoperacionalidade das respectivas instalações termais.

O vosso supra identificado sócio procedeu à confirmação da reserva, através do pagamento da quantia exigida para esse efeito, de harmonia com a cláusula contida no ponto 3.1, das condições gerais de utilização dos centros de férias do INATEL para o ano de 1999.

Todavia, em 6 de Agosto de 1999, isto é, dois dias antes do seu ingresso naquele centro de férias, o reclamante foi informado telefonicamente por esse Instituto de que “por uma questão de obras, não lhe poderiam assegurar o turno”, facto que lhe impossibilitou o acesso aos tratamentos termais ali prestados, que frequenta por indicação clínica, e lhe causou compreensíveis transtornos e dificuldades em encontrar uma solução alternativa.

Posteriormente, o INATEL procedeu à devolução da quantia de 32.800$00, correspondente à quantia paga para confirmação da reserva. Não obstante esta devolução, entende o reclamante que o INATEL lhe deveria entregar o sinal em dobro, bem como compensá-lo pelos danos morais e patrimoniais causados pelo sucedido, não se conformando com a alegação de que era imprevisível para o Instituto, “em face dos trabalhos realizados e dos bons resultados do programa analítico, a impossibilidade de colocar o balneário termal em funcionamento”.
Instado a pronunciar-se sobre esta queixa, veio o INATEL explicitar que, em Abril de 1999, o Instituto Geológico e Mineiro fez depender o início da época termal nas Caldas de Manteigas da apresentação de projecto do balneário termal contendo as alterações nele efectuadas, da elaboração de memória descritiva das obras projectadas para o depósito de água mineral e da comprovação da qualidade da água nas captações e nos diversos pontos de utilização.

De harmonia com aquela imposição, em 29 de Julho, o Director do centro de férias de Manteigas requereu ao Instituto Geológico e Mineiro autorização para reabrir o estabelecimento termal, instruindo o pedido com um relatório sobre as alterações ocorridas e com parecer laboratorial sobre a adequabilidade do revestimento do depósito abastecedor do balneário. O mesmo pedido refere ainda que tinham já sido efectuadas “algumas análises” (presume-se sobre a qualidade da água termal), também remetidas em anexo.

Em face destes documentos, o director do centro referiu ainda considerar estarem reunidas as condições “para após a conclusão do programa exigido pela DGS, se possa, com as respectivas autorizações, dar início à época termal de 1999”.

Todavia, em 3 de Agosto, o Instituto Geológico e Mineiro fez depender a autorização de abertura da época termal de parecer da Direcção-Geral de Saúde acerca dos documentos apresentados que o habilitasse a decidir sobre o pedido de abertura da época termal. Na mesma data, aquele Instituto informou o INATEL da impossibilidade de abertura da época termal até à emissão do parecer solicitado à DGS. Em face desta situação, em 6 de Agosto, como já foi mencionado, o INATEL informou o reclamante do sucedido, via telefónica.

E bem andou o Instituto Geológico e Mineiro em não autorizar a abertura da época termal nas Caldas de Manteigas, atendendo a que, em Setembro, a DGS concluiu “não estarem reunidas as condições mínimas necessárias para o início do funcionamento destes estabelecimento termal, uma vez que os resultados analíticos apresentados não permitem assegurar que esteja ultrapassada a situação de contaminação que se verificou”, e que “o programa analítico estipulado por esta direcção geral está em quase total incumprimento”, reportando-se o resultado das análises apresentados “apenas a uma colheita de amostras de água em dois pontos da sua utilização”, concluindo que a água mineral se revelava “bacteriologicamente imprópria”. Culminando este processo, em 8 de Outubro, o Instituto Geológico e Mineiro negou a autorização de abertura da época termal de 1999 nas Caldas de Manteigas.

Em termos de qualificação jurídica, verifica-se que o reclamante celebrou com o Instituto a que V. Ex.ª preside um contrato misto de hospedagem hoteleira e de prestação de serviços termais, por força do qual este se obrigou, mediante um preço, a facultar-lhe alojamento e tratamento termal.

Em momento posterior àquele, ocorreu uma situação de impossibilidade de cumprimento definitiva e parcial da prestação a que o devedor estava vinculado, que não afectou o cumprimento da prestação de hospedagem estipulada pois o encerramento do estabelecimento termal não abrangeu as estruturas hoteleiras do centro. Todavia, o interesse do reclamante incidia maioritariamente sobre o tratamento termal, motivo pelo qual a mera realização da prestação de hospedagem não detinha, por si só, relevância significativa para a manutenção do contrato.

Do que acima ficou exposto resulta que a não abertura do balneário das termas de Manteigas se ficou a dever a uma decisão estranha ao INATEL, fundada em razões de saúde pública subjacentes à exigência de padrões de qualidade das águas e das estruturas termais. Ou seja, a impossibilidade de prestação dos tratamentos termais teve como causa directa um facto exterior ao Instituto que, sendo estranho à sua vontade, não releva directamente para efeitos de imputação da sua responsabilidade pelo sucedido.

Porém, tal facto não isenta o INATEL de responsabilidade pela forma como conduziu o processo de autorização de abertura termal que esteve na origem do incumprimento em apreço, designadamente face às obrigações de informação que advinham do seu relacionamento com os titulares de reservas. Tal como resulta da factualidade supra descrita, era razoável prever que, em face das condições fixadas pelo Instituto Geológico e Mineiro para a entrada em funcionamento do estabelecimento termal, um pedido de autorização de abertura do estabelecimento termal expedido em 29 de Julho pudesse não obter provimento em 6 de Agosto, de forma a permitir honrar o compromisso contratual a que o INATEL estava obrigado perante este sócio em particular, desconhecendo a ocorrência de situações similares. Esse Instituto, aliás, deveria ter consciência de que o parecer da Direcção Geral de Saúde é um pressuposto necessário e vinculativo em processos desta natureza.

Apesar da manifesta impossibilidade de desfecho atempado do processo em causa, o INATEL negligenciou a adopção, em tempo útil, de soluções alternativas, quanto mais não fosse informando atempadamente os seus associados da probabilidade deste desfecho, no intuito de salvaguardar os compromissos perante eles assumidos e permitir-lhes, eventualmente a desistência da reserva e a busca de alternativa.

O direito à informação é uma das principais posições jurídicas activas que o ordenamento reconhece aos consumidores (cfr. art.º 3.º, d), e 8.º da Lei 24/96, de 31 de Julho, aplicáveis à Administração Pública, ex vi art.º 2.º, n.º 2). A informação é, aliás, no âmbito contratual, um dos deveres acessórios que automaticamente a boa fé liga ao cumprimento do negócio jurídico (cfr. A. Meneses Cordeiro, Direito das Obrigações, pg. 149). Bem poderia o INATEL ter invocado a situação referida como causa de força maior geradora de impossibilidade de cumprimento do contrato se tivesse ocorrido no período de tempo imediatamente anterior ao início da prestação. Ao ter deixado correr alguns meses sem dar o mínimo conhecimento aos associados titulares de reserva, o INATEL omitiu negligentemente uma obrigação a que estava sujeito, gerando uma obrigação de indemnizar os danos causados por essa omissão e tornando de alguma forma inalegável a força maior enquanto tal. É manifesto que um dos elementos integrantes da causa de exclusão de responsabilidade por ocorrência de facto de força maior é a ausência de controlo, neste caso do INATEL, sobre a mesma. Ora, o INATEL estava ciente da probabilidade do facto e em nada contribuiu para minorar a lesão causada nos interessados.

Assim, não deve o INATEL eximir-se à reparação dos danos causados ao reclamante por falta de cumprimento da prestação de tratamentos termais em resultado da já mencionada conduta omissiva, à luz dos princípios da responsabilidade civil e nos termos do regime consagrado pelo art.º 562 e seguintes do Código Civil.
A este propósito realço que, caso a prestação se torne parcialmente impossível, o art.º 802º, n.º 1, do Código Civil, permite ao credor a resolução do negócio garantindo-lhe o direito à indemnização a que porventura haja lugar.
No que à reparação de danos diz respeito, e sem prejuízo do que acima referi, é razoável presumir a boa-fé desse Instituto na condução do problema, numa tentativa imponderada de conseguir “in extremis” proporcionar os serviços termais aos sócios em causa.

Atenta esta circunstância, entendo, como uma solução razoável e equitativa, RECOMENDAR
a V. Ex.ª que o INATEL repare os incómodos causados ao reclamante por toda esta situação através do pagamento de uma quantia equivalente ao montante que lhe foi exigido para a reserva da hospedagem no centro de férias de Manteigas.
Naturalmente que o mesmo procedimento deverá ser seguido para com os outros associados que estejam em identidade de circunstâncias, se os houver.

Agradeço a V. Ex.ª que me queira transmitir a posição que assume face a esta recomendação, nos termos do art.º 38.º da Lei nº 9/91.
Com os melhores cumprimentos,

O PROVEDOR DE JUSTIÇA,
H. Nascimento Rodrigues