Presidente da Assembleia da República

Rec. n.º 9/B/99
Proc: R-2275/95
Data: 22.03.1999
Área: A2

Assunto:DIREITO DE PARTICIPAÇÃO POLÍTICA – DIREITO DE VOTO – VOTO POR CORRESPONDÊNCIA – VOTO ANTECIPADO – ALARGAMENTO DO REGIME.

Sequência: Acatada.

1. As diversas leis eleitorais e a Lei orgânica do regime do referendo consagram, com excepção da legislação relativa às eleições para a Assembleia Legislativa Regional da Madeira (Decreto-Lei n.º 318-E/76, de 30 de Abril), a possibilidade do voto antecipado, regulamentando igualmente o seu modo de exercício.
Assim, podem votar antecipadamente nas eleições para o Presidente da República, Assembleia da República, Autarquias Locais e Parlamento Europeu e nos referendos, os militares que no dia da realização da eleição estejam impedidos de se deslocar à assembleia de voto por imperativo inadiável de exercício das suas funções, os agentes de forças e serviços que exerçam funções de segurança interna, em situação idêntica, os trabalhadores marítimos e aeronáuticos, bem como os ferroviários e os rodoviários de longo curso que, por força da sua actividade profissional, se encontrem presumivelmente embarcados ou deslocados no dia da realização da eleição, os eleitores que, por motivo de doença, se encontrem internados ou presumivelmente internados em estabelecimento hospitalar e impossibilitados de se deslocar à assembleia de voto, e, ainda, os eleitores que se encontrem presos – cfr. arts.º 70º-A, n.º 1, alíneas a) a e) do Decreto-Lei n.º 319-A/76, de 3 de Maio, 79º-A, n.º 1, alíneas a) a e) da Lei n.º 14/79, de 16 de Maio, 66º-A, n.º 1, alíneas a) a e) do Decreto-Lei n.º 701-B/76, de 29 de Setembro, 1º da Lei n.º 14/87, de 29 de Abril, em conjugação com o art.º 79º-A da já mencionada Lei n.º 14/79, e 128º, n.º 1, alíneas a) a e) da Lei n.º 15-A/98, de 3 de Abril.
A legislação relativa às eleições para a Assembleia Legislativa Regional dos Açores (Decreto-Lei n.º 267/80, de 8 de Agosto), apenas reserva a faculdade do voto por correspondência aos “membros das forças armadas e das forças militarizadas que no dia da eleição estejam impedidos de se deslocar à assembleia ou secção de voto por imperativo do exercício das suas funções, bem como os que, por força da sua actividade profissional, na data fixada para a eleição se encontrem presumivelmente embarcados” (art.º 79º, n.º 3).

2. Através da apresentação de queixas a este Órgão do Estado, vieram alguns cidadãos solicitar a intervenção do Provedor de Justiça tendo em vista a alteração da legislação em apreço, por forma a permitir-se igualmente o voto antecipado aos funcionários e agentes da administração pública que se desloquem em serviço ao estrangeiro em período que compreenda o dia da realização das eleições ou dos referendos.
A pretensão afigura-se-me manifestamente pertinente. A situação de um cidadão que se encontra obrigado, pelo próprio Estado, a cumprir missão oficial fora do país em período que englobe a data da realização de qualquer eleição ou referendo, e que, em virtude desse facto, se encontre impedido de exercer, no sufrágio em causa, o seu direito de voto, consagrado na Constituição como um direito fundamental e considerado como um dever cívico, ofende, antes de mais, o direito subjectivo do cidadão em causa, e também os princípios enformadores da ordem jurídico-constitucional do Estado democrático.
Parece-me, de resto, que a extensão do voto antecipado ao caso descrito se enquadra perfeitamente na legislação em apreço e no espírito que presidiu à respectiva elaboração, tanto mais que o exercício do eventual direito de voto antecipado por pessoas naquelas circunstâncias poderia aproveitar integralmente do modo já previsto para a respectiva efectivação por militares, agentes de forças e serviços de segurança e trabalhadores dos transportes, regulamentado nos arts.º 70º-B do Decreto-Lei n.º 319-A/76, de 03 de Maio, 79º-B da Lei n.º 14/79, de 16 de Maio, 66º-B do Decreto-Lei n.º 701-B/76, de 29 de Setembro, 1º da Lei n.º 14/87, de 29 de Abril, em conjugação com o 79º-B da Lei n.º 14/79, e 129º da Lei n.º 15-A/98, de 3 de Abril.

3. A matéria em causa é da reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia da República (art.º 164º, alíneas a), b), j) e l) da Constituição da República Portuguesa), revestindo a forma de Lei orgânica, nos termos do art.º 166º, n.º 2 da Lei Fundamental, carecendo, assim, da aprovação definida no art.º 168, n.º 5.

4. Em ano de eleição dos deputados à Assembleia da República e ao Parlamento Europeu seria de todo oportuno levar a efeito a alteração legislativa em análise, iniciativa que permitirá, sem dúvida, assegurar aos cidadãos uma melhor garantia de efectivação do respectivo e principal direito de participação na vida pública, e permitir a prossecução de uma política progressivamente mais consentânea com os princípios e valores inerentes ao Estado democrático.
Julgo que a proximidade destes actos eleitorais não prejudica a rápida sequência do processo legislativo, já que a matéria não me parece susceptível de causar qualquer melindre político.

5. Face ao exposto, e ao abrigo do art.º 20º, n.º 1, alínea b) da Lei n.º 9/91, de 9 de Abril, alterada pela Lei n.º 30/96, de 14 de Agosto,RECOMENDO

a) A alteração dos arts.º 70º-A, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 319-A/76, de 3 de Maio, 79º-A, n.º 1 da Lei n.º 14/79, de 16 de Maio, 66º-A, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 701-B/76, de 29 de Setembro e 128º, n.º 1 da Lei n.º 15-A/98, de 3 de Abril, diplomas que regulam, respectivamente, as eleições para o Presidente da República, Assembleia da República e Autarquias Locais e a realização de referendos, por forma a neles se incluir a possibilidade do voto antecipado dos funcionários e agentes da administração pública que se desloquem em serviço ao estrangeiro em período que compreenda o dia da realização das eleições ou dos referendos;
b) A consequente alteração dos arts.º 70º-B, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 319-A/76, de 03 de Maio, 79º-B, n.º 1 da Lei n.º 14/79, de 16 de Maio, 66º-B, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 701-B/76, de 29 de Setembro, e 129º, n.º 1 da Lei n.º 15-A/98, de 03 de Abril, e respectivas epígrafes, com vista ao alargamento do modo de exercício do direito de voto neles previsto à alteração recomendada;
Tendo em vista, ainda, a uniformização da solução legislativa em apreço,
c) A alteração do art.º 79º, n.º 3 do Decreto-Lei n.º 267/80, de 08 de Agosto, diploma que regula as eleições para a Assembleia Legislativa Regional dos Açores, por forma a nele se incluir a mesma possibilidade do voto antecipado dos funcionários e agentes da administração pública que se desloquem em serviço ao estrangeiro em período que compreenda o dia da realização das eleições, nos termos acima referidos, e também a possibilidade do voto antecipado dos eleitores que, por motivo de doença, se encontrem internados ou presumivelmente internados em estabelecimento hospitalar e impossibilitados de se deslocar à assembleia de voto, e dos que se encontrem presos, nos moldes que a previsão da situação já reveste nos diplomas relativos às eleições do Presidente da República, Assembleia da República, Autarquias Locais, Parlamento Europeu e na Lei orgânica do referendo.
d) A alteração do Decreto-Lei n.º 318-E/76, de 30 de Abril, diploma que regula as eleições para a Assembleia Legislativa Regional da Madeira, com vista à inclusão dos preceitos normativos permissivos do voto antecipado em todas as situações acima apontadas, incluindo a que é objecto da presente recomendação.

Um grupo parlamentar respondeu garantindo a ponderação desta recomendação no quadro da revisão da Lei Eleitoral.

O PROVEDOR DE JUSTIÇA

José Menéres Pimentel