Presidente da Câmara Municipal da Maia
Número: 36/A/98
Processo: 3343/96
Data: 25.05.1998
Área: A1

Assunto: URBANISMO E OBRAS – OBRAS PARTICULARES – RESTAURANTE – AMPLIAÇÃO – INEXISTÊNCIA DE LICENCIAMENTO – INTERESSE URBANÍSTICO DE ESTÉTICA – LEGITIMIDADE – CÂMARA MUNICIPAL – DEVER DE DECISÃO – IRRENUNCIABILIDADE DE COMPETÊNCIA

Sequência: Acatada

I – Exposição de Motivos

1. Foi solicitada a minha intervenção tendo em vista a reintegração dos interesses urbanísticos de estética e de salubridade afectados pela realização de obras de ampliação no prédio sito na Rua A … , onde se encontra instalado o Restaurante M…, sem licença municipal de construção.

2. A instrução do processo permitiu concluir que havia a Câmara Municipal da Maia promovido a regularização da situação, porquanto vieram as obras a ser legalizadas (art. 167º do Regulamento Geral das Edificações Urbanas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 38.382, de 7 de Agosto de 1951), encontrando-se sanada a ilegalidade formal de que padeciam.

3. Não obstante, prosseguiu a instrução, por questionar o queixoso a alteração do revestimento do muro confinante com a sua propriedade, em condições que entende esteticamente prejudiciais. Sem que pretenda apreciar os factos a partir de juízos de ordem estética, cumpre apreciar da legalidade da situação.

4. Quanto a este aspecto, informou V. Exa. (ofício n.º … , de … .97), que no projecto de obras submetido a apreciação camarária para efeitos de legalização (art. 167º do citado Regulamento Geral das Edificações Urbanas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 38.382, de 7 de Agosto de 1951), não se previa que o muro confinante com o prédio contíguo fosse revestido a tela de alumínio.

5. Em face de tal informação, foi a Câmara Municipal da Maia questionada quanto às medidas a adoptar para garantir o respeito do projecto aprovado, designadamente, se pretendia V. Exa. ordenar a retirada do revestimento do muro (art. 58º do Decreto-Lei n.º 445/91, de 20 de Novembro, com a redacção conferida pelo Decreto-Lei n.º 250/94, de 15 de Outubro).

6. Em esclarecimentos ulteriores, prestados através do ofício n.º … de … .1998, refere V. Exa. que nada constando do projecto quanto ao revestimento do muro confinante com o prédio contíguo, nem sendo obrigatório que o projecto contemple tal aspecto, é entendimento dessa Câmara Municipal “que não há qualquer ilegalidade por parte do particular, devendo apenas caso coloque tela de alumínio – por razões estéticas – pintar esse revestimento”.

7. Cumpre-me referir, quanto a esta questão, que se encontram sujeitas a licenciamento municipal todas as obras, ainda que de simples conservação, restauro, reparação ou limpeza, que impliquem modificação da natureza e da cor dos materiais de revestimentos exteriores (art. 3º, n.º 1, alínea a), do regime aprovado pelo Decreto-Lei n.º 445/91, de 20 de Novembro, com a redacção conferida pelo Decreto-Lei n.º 250/94, de 15 de Outubro).

8. Assim, os trabalhos de revestimento do muro, porquanto implicaram alteração nos materiais de revestimento exterior do imóvel, traduzem-se em obras formalmente ilegais, uma vez que não foram habilitadas por licença municipal a tanto destinada e excedem, de forma manifesta, o projecto de obras submetido à apreciação camarária para efeitos de legalização.

9. À Câmara Municipal da Maia, no momento da apresentação do pedido de legalização das obras de ampliação efectuadas no Restaurante M…, apenas foi requerido que procedesse ao licenciamento ex post das alterações que constavam do projecto submetido à apreciação municipal.

10. Não foi requerida a legalização de quaisquer outras alterações no imóvel existente, como era dever do requerente se as quisesse executar. Assim, sobre esta alteração não se pronunciou a Câmara Municipal da Maia, e não o poderia sequer ter feito, por tal não lhe ter sido requerido.

11. Neste sentido pronunciou-se em caso semelhante, e de forma clara, o Supremo Tribunal Administrativo em Acordão de 9 de Abril de 1991, ao considerar que tendo sido requerida licença para a realização de obras de ampliação de um vão de porta e tendo sido deliberado deferir o requerido, “tal deliberação não autoriza o requerente a substituir os materiais existentes nos aros e nas portas, por tal substituição não ter sido solicitada e autorizada”.

12. Do exposto resulta que o proprietário do Restaurante M… realizou obras que não vieram a ser legalizadas por essa Câmara Municipal, mantendo-se, por isso, formalmente ilegais os trabalhos de alteração do revestimento do muro confinante com o prédio do queixoso.

13. Nos termos do disposto no art. 54º, n.º 1, alínea a), do regime jurídico relativo ao licenciamento municipal de obras particulares, compete à câmara municipal sancionar a conduta do infractor, mediante a instauração de adequado procedimento contra-ordenacional, e, no que respeita à tutela da legalidade urbanística infringida, ponderar sobre a viabilidade de legalização das obras (art. 167º do Regulamento Geral das Edificações Urbanas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 38.382, de 7 de Agosto de 1951).

14. À Câmara Municipal da Maia compete proceder à sanação da ilegalidade formal de que os trabalhos padecem, habilitando a respectiva subsistência com título jurídico adequado. Para este efeito, no entanto, é necessário que as obras satisfaçam os condicionamentos urbanísticos e construtivos que constituem o parâmetro aferido da respectiva legalidade material.

15. Assim, uma vez que são passíveis de legalização, não apenas as obras que satisfaçam os requisitos estabelecidos pelas normas técnicas e urbanísticas aplicáveis, mas também aquelas que sejam susceptíveis de vir a satisfazer os referidos requisitos, poderá ser ordenada a adaptação material da obra por forma ser evitada a respectiva demolição.

16. Nos termos do § 1º, do art. 167º do Regulamento Geral das Edificações Urbanas, poderá a Câmara Municipal ordenar a realização de trabalhos de alteração, designadamente, a pintura do revestimento de alumínio.

17. Afigurando-se inviável a legalização, já que as obras em questão não podem satisfazer os requisitos legais e regulamentares de urbanização e estética, mais não resta a V. Exa. segundo creio, que ordenar, nos termos do disposto no art. 58º, n.º 1, do regime aprovado pelo citado Decreto-Lei n.º 445/91, de 20 de Novembro, a reconstituição da situação existente, através da retirada do revestimento colocado no muro.

18. Apenas o procedimento acima descrito garantirá a satisfação do interesse público urbanístico que dita a sujeição dos trabalhos de construção civil com implicações de índole estética a licenciamento municipal, bem como os interesses legalmente protegidos de terceiros afectados com as decisões e omissões dos poderes públicos nesta matéria, porquanto a relação administrativa em causa, possui natureza poligonal. Na verdade, as disposições legais referidas têm ainda por fim proteger os direitos e legítimos interesses dos vizinhos. Apenas garantindo o estrito cumprimento da lei se poderá, no futuro, aos mesmos vizinhos impor idêntico rigor.

II – Conclusões

Em face do exposto e no exercício da atribuição constitucional que me é confiada para prevenção e reparação das injustiças e ilegalidades (art. 23º, n.º 1, da CRP),

RECOMENDO

1. Que pondere a Câmara Municipal da Maia sobre a viabilidade de legalização dos trabalhos de alteração do revestimento do muro, porquanto constituem obras sujeitas a licenciamento municipal não se encontrando a sua subsistência habilitada por título jurídico a tanto destinado (art. 167º do Regulamento Geral das Edificações Urbanas, art. 3º, n.º 1, alínea a), do regime aprovado pelo Decreto-Lei n.º 445/91, de 20 de Novembro);

2. Não se mostrando as obras susceptíveis de satisfazer os requisitos estabelecidos pelas normas técnicas e urbanísticas aplicáveis, ordene a Câmara Municipal da Maia, com fundamento no disposto no § 1º, do art. 167º, do Regime Geral das Edificações Urbanas, a adaptação material da obra, designadamente a pintura do revestimento de alumínio;

3. Não se mostrando o dono da obra disposto a promover, nos termos expostos, a respectiva legalização, ordene V. Exa., no exercício dos poderes que lhe são confiados pelo art. 58º, n.º 1, do regime jurídico relativo ao licenciamento municipal de obras particulares, para reconstituição da situação material afectada pela realização ilegal de obras de construção civil, a retirada do revestimento de alumínio.

O PROVEDOR DE JUSTIÇA

JOSÉ MENÉRES PIMENTEL