Presidente da Câmara Municipal de Castelo Branco

Proc. R-2081/96
Rec. n.º 15/A/98
1998.03.16
Área: A1
Sequência: Não Acatada

I Exposição de Motivos

1. Foi organizado e instruído um processo para apreciação de queixa que me foi dirigida pela munícipe Srª Dª M…, a respeito das condições de licenciamento de estabelecimento de bar sito na Rua C…, blocos A e B, em Castelo Branco.
No essencial, em resultado da apreciação das informações prestadas pela Câmara Municipal de Castelo Branco no âmbito da instrução do processo, e da análise dos documentos juntos pela reclamante em suporte da sua pretensão, foram apurados os factos e circunstâncias que passo a elencar:
1.1. A reclamante apresentou junto da Câmara Municipal de Castelo Branco pedido de aprovação de projecto de abertura de salão de jogos com máquinas eléctricas de diversão na Rua C…, blocos A e B, em 14.2.1992.
Deliberou a Câmara Municipal emitir parecer desfavorável à viabilidade de intalação da actividade de divertimentos eléctricos e manuais, em 6.5.1992.
1.2. Indeferida a sua pretensão pelo Governo Civil de Castelo Branco, solicitou a reclamante, em 1.6.1992, informação sobre a viabilidade de abertura na Rua C…, blocos A e B, de estabelecimento similar de ” café com licença de jogos lícitos de perícia psico-motora, designadamente bilhares de várias espécies”.
A coberto de ofício de 19.11.1992, a Câmara Municipal notificou a requerente do deferimento da “instalação de jogos lícitos de perícia psico-motora, designadamente bilhares de várias espécies, na Rua C…, Blocos A e B, em Castelo Branco”.
1.3. Em 28.1.1993 foi solicitada a aprovação da localização de estabelecimento de bar nos ditos blocos.
Em 1.2.1993 solicitou a Câmara Municipal ao Delegado Concelhio de Saúde a realização de vistoria ao estabelecimento de bar, com a localização pretendida pela reclamante, para efeitos do disposto no art. 36º, n.º 1, al. c) do Decreto-Lei n.º 328/86, de 30 de Setembro, na redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.º 149/88, de 27 de Abril.
Efectuada vistoria prévia aos dois blocos, em dois de Fevereiro, com a participação do Comandante dos Bombeiros Voluntários e de funcionário da Câmara Municipal, foi imposta à ora reclamante, em conclusão da mesma, a realização de determinadas obras e adaptações, reportando-se o respectivo auto ao conjunto dos blocos.
Do mesmo modo, concluiu a vistoria promovida pela autoridade sanitária concelhia, em 9.2.1993, pela necessidade de execução de adaptações nos dois espaços.
Por ocasião de ambas as vistorias realizadas foi verificada a existência de uma casa de banho para senhoras e uma casa de banho para homens, localizadas, uma no bloco A e a outra no bloco B, em consonância com o previsto no projecto apresentado, sem que tal facto merecesse qualquer objecção ou correcção.
O projecto submetido a aprovação municipal previa, também, a exploração no estabelecimento de bar de 14 bilhares, os quais, à data da vistoria, a reclamante mantinha no bloco A.
1.4. Culminou o procedimento de licenciamento sanitário, após execução dos trabalhos determinados, na emissão do respectivo alvará de licença de exploração de estabelecimento de bar, sito na Rua C…, blocos A e B, em consonância com a localização apontada pela reclamante em 24 de Fevereiro de 1993.
1.5. Do mesmo modo, a aprovação do período de funcionamento pela Câmara Municipal foi concedida por referência a um único estabelecimento, a explorar nos dois blocos.
l.6. Quanto ao licenciamento policial do estabelecimento, procedeu o Governo Civil do Distrito de Castelo Branco à emissão de duas licenças de abertura, uma para Bar e outra para a exploração de jogos lícitos no interior do estabelecimento de bar (“no s/ estabelecimento”), reportando-se ambos os títulos concedidos a um único estabelecimento, com ocupação dos dois blocos supra identificados.
Consequentemente, aprovou o Governo Civil dois horários distintos, um para a exploração de bar e outro para a prática de jogos lícitos, reportando-se ambas as aprovações aos blocos A e B. Com efeito, tal como a licença de abertura, também a licença de funcionamento relativa aos bilhares, indica que a sua exploração é autorizada no estabelecimento de bar.
O exercício da actividade de difusão de música ambiente foi autorizado nos dois espaços pelo Governo Civil competente, e emitido como título o de alvará de licença de 31 de Dezembro de 1993.
1.7. A vistoria promovida pela Direcção Geral dos Espectáculos recaíu sobre o bloco A, no qual a reclamante dispôs os bilhares sobre cuja exploração competia àquela entidade pronunciar-se.

2. Ainda que os bilhares se situem num só dos blocos, constituiam os blocos A e B, de acordo com o projecto aprovado, e com a utilização que subsequentemente lhes foi conferida, uma unidade funcional.
A divisória de vidro colocada entre aquelas fracções permitia a comunicação entre a sala dos snookers e o balcão do serviço de bebidas.
O estabelecimento dispõe de um único contador eléctrico e de apenas duas portas, uma das quais constituía, inicialmente, saída de emergência, não permitindo, em circunstâncias normais, o acesso à via pública.
A entrada e saída dos clientes no estabelecimento processava-se pelo bloco B, ocupando a clientela as duas salas, servindo-se de bebidas no bloco A e praticando jogos no bloco B, ou tão só nele permanecendo.

3. Através de ofício de 21.6.1993, a Câmara Municipal notificou a proprietária do dito estabelecimento da decisão de aplicação de coima no valor de Esc. 50.000$00, e de sanção acessória de “interdição de qualquer actividade na sala contígua ao bar, enquanto a mesma não for aprovada por esta Câmara Municipal, nos termos da alínea c) do art. 402º do Regulamento dos Empreendimentos Turísticos” (v.d.ofício n.º 5701).
Foi também aplicada à reclamante pela Câmara Municipal uma outra sanção pecuniária, em procedimento contra-ordenacional, pela prática de infracção de uso de classificação diferente da atribuída ao estabelecimento em colisão com o art. 339º, n.º1, do Decreto Regulamentar n.º 8/89 de 21 de Março.
3.1. Sabendo que a Câmara Municipal vistoriara já o bloco A com vista à abertura do estabelecimento de bar e dispondo de autorização para exploração de jogos de perícia psico-motora, a munícipe veios a ser induzida a requerer um outro licenciamento para a sala de jogos manuais, uma vez que lhe foram instaurados sucessivos processos contra-ordenacionais e que lhe fora interdito o exercício de qualquer actividade no compartimento pertencente ao bloco A.
Determinou essa Câmara Municipal a realização de trabalhos adicionais, em acolhimento das conclusões de vistoria realizada em 28 de Setembro de 1993, entre os quais a “eliminação da porta interior de ligação ao estabelecimento contíguo” e a aposição, junto da porta do Bloco A, de “sinalização luminosa SAÍDA” (v.d. auto de vistoria).
As medições acústicas promovidas concluiram pelo cumprimento das disposições legais aplicáveis em matéria de ruído.
Emitiu a Câmara Municipal de Castelo Branco parecer favorável à abertura e funcionamento de sala de divertimentos manuais, na Rua C…, Bloco A, em Castelo Branco (v.d. deliberação de 1.10.1993)

4. Concedeu o Governo Civil de Castelo Branco licença de funcionamento no tocante ao estabelecimento de bebidas, para o ano de 1994, mantendo-se no respectivo alvará a alusão aos dois compartimentos do bar (v.d. alvará de licença de 19.1.1994).

5. A requerimento da proprietária, deliberou a Câmara Municipal, em reunião de 25.07.1994, aumentar a lotação do «Bar Subsolo, sito na Rua Cardeal Mota – Bloco A/B», para 100 lugares sentados e 60 lugares em pé, procedendo os serviços municipais, subsequentemente, em 14.10.1994, a um averbamento ao alvará de licença sanitária n.º 3094, o qual faz menção aos dois compartimentos.

6. Derrogado o Regulamento dos Períodos de Abertura e Funcionamento dos Estabelecimentos de Venda ao Público e de Prestação de Serviço do Concelho de Castelo Branco, através do Edital n.º 84/95, de 17 de Março e perante a nova redacção conferida ao artº. 2º, grupo 11, al. c), passou a reclamante, a promover a prática de jogos lícitos até às 2 horas da madrugada, limite do horário fixado para o estabelecimento de bar.
Em consequência, sofreu a aplicação de novas coimas por não observar o horário consignado no art. 2º do Regulamento dos Períodos de Abertura e Funcionamento dos Estabelecimentos de Venda ao Publico e de Serviços do Concelho de Castelo Branco, para o funcionamento de salões de jogos.

7. Em 13 de Maio de 1996 determinou V.Exa. a rectificação do alvará de licença sanitária n.º 3094, por forma a corrigir erro de escrita relativo à localização do estabelecimento de bar, em virtude de se ter verificado que “no alvará sanitário n.º 3094 foi indicado que o referido Bar se localizava na Rua C…, Bloco A/B, quando na verdade, o local vistoriado e o licenciamento do Bar foi, tão só, para o Bloco B do referido arruamento.”

II Apreciação

Tenho por improcedentes os esclarecimentos prestados pela Câmara Municipal de Castelo Branco, na sequência da actividade instrutória desenvolvida, e as motivações invocadas em suporte da não aprovação municipal das actividades praticadas no Bloco A.
A este respeito, entendo formular as seguintes observações:

1. Os documentos que integram o pertinente processo camarário sustentam a convicção de ter sido inicialmente autorizada a abertura de um estabelecimento de bar, com ocupação dos dois blocos.
Em especial, tenho em conta o âmbito das vistorias promovidas em 2.2.1992 e em 9.2.1992, e as correcções pontuais impostas à reclamante em ordem à observância das prescrições regulamentares aplicáveis ao exercício da actividade de exploração de estabelecimento de bar.

2. A circunstância de a Direcção Geral dos Espectáculos haver vistoriado apenas o bloco A, em 13.10.1993 não permite inferir pelo funcionamento de dois estabelecimentos autónomos.
Na verdade, a diligência em causa foi levada a cabo pela Comissão de Vistoria para verificação das condições técnicas e de segurança do recinto, onde se propunha a reclamante prosseguir a exploração de jogos lícitos, pelo que, sempre a inspecção se havia de cingir ao espaço físico da sala de jogos de divertimentos manuais. Não lhe cumpria conhecer dos demais aspectos.

3. A apresentação pela proprietária do relatório de caracterização acústica, em Setembro de 1993, destinou-se a instruir o procedimento desencadeado pelo pedido de aprovação de sala de divertimentos manuais.
A declaração prestada pelo técnico responsável pelos ensaios técnicos promovidos, segundo a qual, o bar constituía a única instalação já em funcionamento, teve lugar em data subsequente à aplicação de sanção acessória pela Câmara Municipal relativa ao exercício da actividade de divertimentos manuais, e nesse contexto há-de ser interpretada.

4. Fica por compreender a legitimidade da actuação da Câmara Municipal, no que tange às diligências desencadeadas tendo em vista a aprovação da instalação de sala de jogos no bloco A, a qual deferira por deliberação de 6.11.1992.
4.1. A vistoria prévia para aprovação da localização da sala de divertimentos manuais no bloco A foi promovida “a fim de verificar se o mesmo reúne as condições exigidas pelo Regulamento dos Empreendimentos Turísticos” (cfr. auto de vistoria de 28.9.1993).
Ora, no regime aplicável à aprovação de empreendimentos turísticos não se confere às câmaras municipais competência para se pronunciarem sobre a localização de salas de jogos ou aprovar a sua abertura.
Dispõs o legislador, através do regime contido no Decreto-Lei n.º 328/86, de 30 de Setembro, e no Decreto Regulamentar n.º 8/89, de 21 de Março, sobre a construção, a instalação e o funcionamento dos estabelecimentos hoteleiros e similares, dos meios complementares de alojamento turístico, dos conjuntos turísticos, dos empreendimentos de animação, culturais e desportivos de interesse para o turismo.
Não se mostram preenchidos os requisitos de que o art. 260º do dito Decreto Regulamentar fez depender a declaração de interesse turístico dos empreendimentos de animação, não se subsumindo, claramente, os recintos de exploração de jogos lícitos de perícia psico-motora, em qualquer outra das citadas categorias legais.
A exploração em causa dependia, à data em que foi iniciada, de licenciamento policial do Governo Civil nos termos previstos no art. 1º, al. m) do Regulamento Policial do Distrito de Castelo Branco, carecendo o recinto de ser licenciado pela Direcção Geral dos Espectáculos e do Direito de Autor, ex vi do disposto no art. 5º do Decreto-Lei n.º 42 660 de 20 de Novembro de 1959.
Emitidos os respectivos alvarás de licença, na sequência de parecer favorável pela Câmara Municipal, no âmbito dos processos de licenciamento, ao abrigo do disposto na Lei n.º 2/87, de 8 de Janeiro, foi iniciada a exploração de jogos lícitos de perícia psico-motora em observância dos condicionalismos legais aplicáveis.
4.2. Carecem, pois, de fundamento as decisões proferidas em processo de natureza contra-ordenacional, de aplicação de sanção pecuniária e de sanção acessória pelo exercício de actividade não aprovada pela Câmara Municipal.
Concluiu a decisão proferida nos autos do processo por contra-ordenação n.º 81/93 que a abertura de dependência contígua ao Bar sito no bloco B, integra “o delito de contra-ordenação previsto no n.º 1 do art. 339º do Decreto Regulamentar n.º 8/89, punido pelo n.º 28 do artº. 400º do mesmo Decreto Regulamentar”.
A interdição do exercício de qualquer actividade é decretada “enquanto a mesma não for aprovada por esta Câmara Municipal, nos termos da alínea c) do art. 402º do Regulamento dos Empreendimentos Turísticos”.
Não se dão por consumados os factos previstos no art. 400º, n.º 28, do citado Regulamento por não ter a reclamante utilizado classificação diferente da atribuída ao estabelecimento, não logrando, também aplicação, consequentemente, o disposto no art. 402º do decreto regulamentar.
A classificação a que se reporta o legislador tem por objecto os estabelecimentos que integram o âmbito de aplicação do regime dos empreendimentos turísticos, ao qual são alheias as salas de divertimentos manuais (v.d. art. 9º do Decreto-Lei n.º 328/86, de 30 de Setembro).
A prática em causa, sobre a qual foi formulado juízo de ilicitude, traduzia o cumprimento da obrigação de afixação, em sala ou compartimento afecto à exploração de jogos, da respectiva licença (cfr. art. 34º do Regulamento Policial do Distrito de Castelo Branco).
4.4. À Reclamante foi também aplicada, no âmbito do processo de contra-ordenação n.º 63/95, coima no montante de Esc. 15.000$00, em virtude de ter alterado “os elementos constantes no auto de vistoria e no alvará, visto que, aquando da vistoria foi obrigada a imobilizar uma porta que dava acesso ao Salão de Jogos anexo, do qual também é proprietária (retirou uma peça que imobilizava a porta e permitia que a mesma se encontrasse aberta, dando assim acesso do bar ao Salão de Jogos e vice-versa)”, por ter sido praticada a infracção prevista na “alínea e) do n.º1 e n.º2 do art. 327º do Decreto Regulamentar 8/89 de 21 de Março, punida pelo n.º 49º do art. 400º do mesmo Decreto Regulamentar”.
Padece a decisão proferida de vício de violação de lei porquanto, tal como as anteriores, não se alcançam quais as suas motivações de direito.
Dispõe o art. 327º do Decreto Regulamentar n.º 8/89, de 21 de Março sobre os motivos de caducidade dos alvarás de abertura, entre os quais se conta a alteração dos elementos constantes do alvará.
O artº 400º, n.º 49 do citado diploma prevê constituir contra-ordenação a “falta, em qualquer estabelecimento, de algum dos requisitos mínimos exigidos para as suas instalações pelo presente Regulamento, quer seja dos comuns a todos os empreendimentos do mesmo tipo, quer dos próprios da sua categoria, ou a sua inexactidão relativamente às especificações legais”.
Cumpre-me reiterar as considerações tecidas a respeito do âmbito de aplicação do Regime dos Empreendimentos Turísticos.
Nem vejo como possa ser estabelecida conexão, nos termos pretendidos pela Câmara Municipal, entre o regime previsto no citado art. 327º e o disposto no art. 400º, n.º 49.
À tipologia legal das contra-ordenações, compreendida no art. 400º do aludido regulamento, permanece, alheia em absoluto, a verificação das circunstâncias que o legislador erigiu em fundamento de caducidade do alvará.

5. Entendo não merecer ponderação nesta apreciação a alegada interdição de exploração de jogos lícitos de perícia psico-motora nos estabelecimentos de bar, consagrada pelo Regulamento Policial do Distrito de Castelo Branco.
O eventual vício de violação de lei, por inobservância de tal disposição, determinaria, num momento prévio, a anulabilidade do acto que concedeu a licença policial de exploração de jogos lícitos no estabelecimento de bar, todavia sempre se deveria ter tal acto por convalidado por decurso do prazo maior de impugnação contenciosa.
Por terem caducado, na sequência da publicação do Decreto-Lei n.º 316/95 de 28 de Novembro, as normas atinentes ao regime de licenciamento policial dos jogos de perícia psico-motora, entre as quais se conta, a que estabelecia tal proibição (art. 31º do dito regulamento), não é tal prática, no presente, desvalorada pela ordem jurídica.

6. As diversas entidades intervenientes no processo de licenciamento do estabelecimento de bar consideraram constituir os blocos A e B uma unidade funcional e com base nesses pressupostos se pronunciaram em sentido favorável à pretensão da reclamante ou fixaram condicionalismos ao funcionamento do estabelecimento de bar.
A verificação do cumprimento dos requisitos técnicos aplicáveis ao exercício daquela actividade foi efectuada em referência ao todo constituído pelos dois blocos, pelo que não podem as suas conclusões ser aceites como válidas para um espaço mais restrito, sem nova apreciação e tomada de posição pelas autoridades administrativas competentes.
As condições de exploração de um estabelecimento de bebidas divergem necessariamente em função do local de funcionamento.
O entendimento perfilhado pela Câmara Municipal de que não fora aprovada a localização do estabelecimento por referência ao bloco A, não se compadece com o sentido da autorização das demais autoridades intervenientes.
Em particular, cumpre-me fazer notar que, a ser aceite como válida a tese da existência e licenciamento de dois estabelecimentos autónomos, resultará necessariamente prejudicada a segurança no respectivo funcionamento por não dispor qualquer um dos estabelecimentos de saída de emergência.

7. Não tendo sido indeferida a localização do estabelecimento, tal como requerida, em fase inicial do procedimento, não se conhecem razões que possam legitimar a sua alteração por iniciativa da Câmara Municipal.
Os autos das vistorias de 2 e 9 de Fevereiro de 1993, promovidas para efeitos de abertura do estabelecimento de bar, nos termos previstos no art. 36º, n.º 1, al. c), do Decreto-Lei n.º 328/86, de 30 de Setembro, na redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.º 149/88, de 27 de Abril, indicam ter sido realizada minuciosa inspecção às instalações, sem que haja sido apontado inconveniente à localização.
Conquanto tenha sido imposta a adopção de pequenas adaptações, não se pronunciaram os peritos pela fixação de prazo nem pela necessidade de realização de nova vistoria para verificação do cumprimento das medidas preconizadas, nos termos previstos no artº 14º das Instruções aprovadas pela Portaria n.º 6065 de 30 de Março de 1929.
De todo o modo, assumindo a vistoria realizada em 22 de Abril de 1993 natureza complementar das anteriores, causa a maior estranheza a circunstância de a comissão haver cingido a sua apreciação ao bloco B, o que não permitiria, seguramente, apurar sobre a execução da totalidade dos trabalhos impostos, com incidência, como se demonstrou, sobre o conjunto das salas.

III Conclusões

O erro material na expressão da vontade do órgão administrativo pode ser rectificado pelo órgão competente para a revogação do acto quando manifesto (v.d. art. 148º do Código do Procedimento Administrativo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442/91, de 15 de Novembro).
Entende a doutrina, em interpretação ao citado preceito, que a rectificação do acto administrativo apenas pode ter lugar quando o erro for “ostensivo, manifesto e indiscutível” (cfr. BOTELHO, José Manuel da S. Santos, ESTEVES, Américo J.Pires, e PINHO, José Cândido, Código do Procedimento Administrativo, Anotado-Comentado, Jurisprudência, Coimbra 1992, p. 457).
É a evidência do lapso cometido que leva a ter o acto como válido, mantendo-se, consequentemente, os efeitos jurídicos do acto aclarado.
No mesmo sentido decidiu o Supremo Tribunal Administrativo: “é possível a rectificação dos actos administrativos, tendo o mesmo efeito retroactivo, desde que se trate de corrigir erros materiais cometidos na expressão da vontade real do autor do acto e que tais erros sejam facilmente detectáveis ou comprováveis através do próprio ou de elementos constantes do processo burocrático” (v.d. Ac. do S.T.A. de 16/4/1991 – Rec. n.º 27.786).
Os elementos constantes do processo administrativo de licenciamento sanitário não parecem indiciar o erro na declaração da vontade, com incidência sobre o conteúdo do acto.
As informações relativas à localização do estabelecimento antes levam a inferir pela correcta expressão da vontade da Administração.
A única nota de incoerência no procedimento traduz-se na indicação, no auto de vistoria de Abril de 1993, de que o local vistoriado corresponde ao bloco B.
Todavia, pelas razões expostas, nomeadamente por manifesta contradição com os autos de vistoria de 2 e de 9 de Fevereiro de 1993, essa circunstância não permite retirar a ilação pretendida por essa Câmara Municipal.
Na verdade, a formação da vontade da Câmara Municipal e a sua manifestação produziu-se em sentido concordante com o do pedido que desencadeou o procedimento e com o dos actos praticados na fase preparatória do procedimento, de função instrumental e pré-ordenada à produção do acto final.
De resto, a alteração da localização requerida implicaria o indeferimento parcial do pedido e a prolação de decisão em sentido contrário à intervenção dos serviços camarários e de terceiros peritos, suscitada oficialmente na instrução do processo. Impor-se-ia, pois, à administração, ao decidir em sentido adverso à pretensão formulada e em desconformidade com o conteúdo de actos instrutórios ou procedimentais, a observância do dever de fundamentação (v.d. art. 124º do C.P.A), bem como a promoção da audiência do interessado, em momento prévio à sua prática ( v.d. art. 100º do C.P.A.).
A inobservância destas normas procedimentais suporta, também, a minha convicção de que não decidiu a Câmara Municipal em desfavor da interessada.
A concessão de alvará de licença sanitária constitui um acto administrativo constitutivo de uma situação jurídica objectiva, tendo por finalidade directa e imediata a ponderação final do órgão com competência para praticar o acto que põe termo ao procedimento, não podendo o governador civil atribuir licença de abertura sem que previamente se mostre concedida a licença sanitária.
Ora, não teve quaisquer dúvidas o Governador Civil na concessão de licença policial, o que me leva , do mesmo modo, a refutar, se não a verificação de lapso, ao menos, o seu carácter manifesto.
Na hipótese de erro, sempre a ausência de fundamentação levaria a ter por inválida a concessão de licença sanitária de estabelecimento de bar por referência exclusiva ao bloco B.
Resta-me invocar a incidência do princípio da boa fé nas relações que a administração mantém com os administrados, destinado a proteger a confiança suscitada no particular pela actuação admnistrativa, a qual se mostrará lesada quando o particular possua um motivo sério para acreditar na validade do acto a que tenha ajustado a sua conduta e haja sido levado a tomar medidas em prejuízo dos seus interesses (BOTELHO, José Manuel da S. Santos, ESTEVES, Américo J.Pires, e PINHO, José Cândido, obs. cit., p. 66).

Aprovada a exploração de um único estabelecimento de bebidas no conjunto dos blocos, é aplicável à prática de jogos lícitos o horário de funcionamento do bar, nos termos previstos no artº 2º, grupo 11, al. c), do Regulamento dos Períodos de Abertura e Funcionamento dos Estabelecimentos de Venda ao Público e de Serviços do Concelho de Castelo Branco (v.d. na redacção a que se reporta o Edital n.º 84/95).
De acordo com a motivação exposta, entendo exercer a faculdade que me é conferida pelo art. 20º, n.º 1, al. a) da Lei n.º 9/91, de 9 de Abril e, como tal, RECOMENDO,
que a Câmara Municipal de Castelo Branco reveja a sua posição e reconheça a validade do acto de concessão de licença sanitária para exploração de estabelecimento de bar na Rua C…, blocos A e B, em Castelo Branco, e, em consequência, se abstenha de instaurar procedimento contra-ordenacional por exploração de jogos lícitos no bloco A entre as 24 horas e as 2 horas da madrugada, ou de, por qualquer meio, impedir a circulação dos clientes entre ambos os blocos ou impor restrições ou limitações à exploração praticada e aprovada.

O PROVEDOR DE JUSTIÇA
Menéres Pimentel