Secretário de Estado da Segurança Social e Relações Laborais
Número: 15/B/98
Processo: 3101/94
Data: 29.12.1998
Àrea: A3

Assunto: SEGURANÇA SOCIAL – SUBSÍDIO DE DESEMPREGO – PRAZO – ALTERAÇÃO DAS CIRCUNSTÂNCIAS – INTERPRETAÇÃO LITERAL

Sequência: Acatada

1. Os trabalhadores que após o termo de concessão do subsídio de desemprego se mantenham na situação de desemprego, têm direito – no âmbito do quadro legal vigente (1) -, ao percebimento do subsídio social de desemprego, desde que os rendimentos mensais per capita do respectivo agregado familiar não sejam superiores a 80% do valor da remuneração mínima estabelecida por lei para o sector em que desenvolviam a actividade [art. 6º, n.º 2, al. b), art. 9º, n.º 2, art. 14º e art. 15º do referido diploma legal].

2. A atribuição do subsídio social de desemprego não depende de requerimento mas exige a apresentação dos meios de prova específicos das condições que justificam a sua atribuição (art. 40º do D.L. n.º 79-A/89, de 13/3 e art. 9º da Portaria n.º 994/89, de 16/11), ou seja, prova da manutenção da situação de desemprego involuntário e da situação de carência económica do agregado familiar em montante inferior à condição de recursos legalmente estabelecida.

3. Tais meios de prova deverão ser apresentados no prazo de 90 dias a contar da data do termo do subsídio de desemprego (art. 37º, n.º 2, do D.L. n.º 79-A/89 e art. 9º da Portaria n.º 994/89, de 16/11).

4. O início do pagamento do subsídio social de desemprego reporta-se ao dia imediato ao termo do período de concessão do subsídio de desemprego (art. 23º, n.º 2).

5. Os serviços processadores das prestações de desemprego (centros regionais de segurança social) têm feito uma interpretação muito restritiva do diploma legal em causa, nomeadamente quanto à articulação do disposto no art. 9º da Portaria com o disposto no art. 23º, n.º 2, do referido decreto-lei.

6. Efectivamente, tais serviços têm entendido que, pelo facto de o pagamento do subsídio social de desemprego se reportar ao dia imediato à cessação do subsídio de desemprego, a avaliação das condições de atribuição se reportam necessariamente a essa mesma data.

7. Contudo, a simples interpretação literal das referidas normas jurídicas colide com a natureza das prestações sociais em causa (cfr. art. 7º do D.L. n.º 79-A/89) e, sobretudo, com o propósito do legislador em acudir a situações de carência económica e de desprotecção social subsquentes à cessação do subsídio de desemprego.

8. Encontram-se nessa situação os desempregados cujo rendimento do agregado familiar exceda temporariamente a condição de recursos à data da cessação do subsídio de desemprego, mas que venha a ficar aquém dela no decurso do referido prazo de 90 dias.

9. Assim, o agregado familiar do trabalhador desempregado pode eventualmente apresentar, no dia da cessação do subsídio de desemprego, rendimentos mensais per capita superiores à condição de recursos e, logo no dia seguinte (ou em momento posterior, mas dentro do prazo de 90 dias), passar a registar rendimentos em montante inferior que lhe confeririam o direito ao percebimento da aludida prestação social, mas que pela aplicação literal das referidas normas legais o deixam irremediavelmente arredado daquela específica protecção social.

10. Permito-me evidenciar o caso concreto constante da reclamação que me foi presente:

10.1. O agregado familiar do Senhor J… (beneficiário n.º … ), composto por três pessoas (o casal e uma filha menor), em que o reclamante e a mulher se encontravam desempregados e ambos a receber o subsídio de desemprego.

10.2. Ao atingir o termo da concessão do seu subsídio de desemprego (… .93), o reclamante viu o rendimento do seu agregado familiar reduzido a um único rendimento, ou seja, o subsídio de desemprego do cônjuge.

10.3. Rendimento esse que, por acaso, ultrapassava ligeiramente o limite previsto como condição de recursos pelo art. 15º do D.L. n.º 79-A/89, de 13/3.

10.4. Entretanto, o reclamante requereu a atribuição do subsídio social de desemprego junto do respectivo Centro Regional de Segurança Social, o que veio a ser indeferido com fundamento no facto de o agregado familiar registar, à data do termo do subsídio de desemprego, um rendimento superior ao limite legal estabelecido (arts. 15º e 23, n.º 2 do referido diploma legal).

10.5. Isto apesar de, entretanto, dentro do referido prazo legal dos 90 dias, se ter registado uma profunda alteração das circunstâncias relativamente à situação económica do agregado familiar, uma vez que a mulher atingiu igualmente o termo do seu subsídio de desemprego (24.10.93) e, em consequência disso, passou a receber o respectivo subsídio social de desemprego, prestação esta de montante inferior ao que até então recebia. Nessa conformidade, o rendimento mensal do agregado familiar passou a ficar aquém do limite legalmente estabelecido como condição de recursos.

10.6. Permito-me insistir, todos estes factos se passaram quando ainda estava a decorrer o prazo de 90 dias para a apresentação das provas relativas à verificação ou não da condição de recursos. Afinal, entre a data da cessação do subsídio de desemprego do reclamante (21.08.93) e a data em que se veio a verificar o preenchimento da condição de recursos (24.10.93), susceptível de o enquadrar de pleno direito no acesso ao subsídio social de desemprego, medearam apenas cerca de 60 dias. O reclamante dispunha ainda de aproximadamente 30 dias para, dentro do prazo legal, apresentar as provas relativas à alteração do rendimento do agregado familiar, o que fez e não foi tido em consideração.

10.7. Mas, sobretudo, poderá afirmar-se mesmo que, na própria data em que o reclamante apresentou a prova inicial dos rendimentos do agregado familiar, ao respectivo CRSS não seria difícil verificar, desde logo, que o único rendimento disponível daquele agregado familiar se reconduzia ao subsídio de desemprego do outro cônjuge e que o mesmo se esgotaria volvidos dois meses, ou seja, ainda dentro do prazo legal para apresentação da prova dos rendimentos, determinante, afinal, da atribuição do subsídio social de desemprego ao reclamante e ao respectivo cônjuge.

10.8. Não obstante isso, o referido CRSS manteve-se intransigente, negando a atribuição da mencionada prestação social ao reclamante.

11. Para melhor ilustrar a injustiça da situação criada ao reclamante, permito-me evidenciar uma situação análoga com desfecho contrário e que resulta literalmente da lei, o que inequivocamente demonstra o espírito e a intenção do legislador que, perante uma prestação social da mesma natureza, não quis, por certo, criar situações de desigualdade de tratamento. Refiro-me concretamente à situação de um beneficiário que, perante uma situação de desemprego, não reúna as condições para aceder ao subsídio de desemprego, enquadrando-se, por isso, no regime do subsídio social de desemprego [art. 6º, n.º 2, al. a) e art. 12º, n.º 2, ambos do D.L. n.º 79-A/89]. Tal beneficiário terá igualmente que preencher a condição de recursos prevista no art. 15º e dispõe do prazo legal de 90 dias para requerer a atribuição de tal prestação social (art. 37º, n.º 2).

Poderá imaginar-se, por mera hipótese, que até ao 80º dia subsequente à situação de desemprego os rendimentos do agregado familiar de tal beneficiário excedem a condição de recursos prevista no referido art. 15º e que, posteriormente, mas dentro do prazo dos 90 dias, se verifica uma alteração da situação económica do agregado familiar, no sentido de o respectivo rendimento passar a ficar aquém da condição de recursos. Nestas circunstâncias, o beneficiário terá a possibilidade de requerer ainda a atribuição do subsídio social de desemprego até ao 90º dia e, desse modo, acederá a tal prestação social.

12. Por outro lado, não posso deixar de considerar socialmente chocante que não se garanta o direito à protecção de agregados familiares cujo único rendimento é o subsídio social de desemprego de um dos cônjuges, sobretudo, quando disso se faz prova em tempo oportuno.

13. Mas, para além das razões de ordem social, o certo é que, no caso concreto do reclamante, os requisitos substantivos do direito à prestação – desemprego involuntário e situação de carência do agregado familiar – encontravam-se objectivamente reunidos dentro do prazo legal para a prestação da prova, muito embora quanto à situação de carência esta não coincidisse com a data a que a lei fazia reportar o início do pagamento do subsídio social de desemprego subsequencial.

14. Parece-me razoável e de toda a justiça que, quando a alteração relativa à condição de recursos ocorre no decurso do prazo para requerer a prestação e/ou fazer prova da situação de carência, faça todo o sentido que se permita a atribuição do subsídio em causa a partir da data em que, para além dos demais requisitos, esteja também preenchida a condição relativa aos rendimentos do agregado familiar.

Afinal, a atribuição do subsído social de desemprego subsequente ao subsídio de desemprego não depende de requerimento (art. 40º, n.º 1, do D.L. n.º 79-A/89 e art. 9º, n.º 1, da Portaria n.º 994/89), sendo tal prestação social, por isso, processada e paga automaticamente pelos serviços de segurança social logo após a cessação do subsídio de desemprego.

Aos beneficiários apenas é exigido que no prazo de 90 dias (art. 9º da Portaria n.º 994/89, de 16/11) façam prova da condição de recursos para que lhe seja reconhecido o direito ao subsídio social de desemprego. Ora, ao fixar tal prazo o legislador pretendeu que o mesmo funcionasse em benefício do interessado e não contra ele. Parece-me fazer todo o sentido que esse prazo funcione como um período de espera (e, consequentemente, de prova) que permita acolher as situações de carência que se verifiquem na sua vigência.

15. Reconheço, porém, que a lei em vigor não é suficientemente clara que permita concluir de modo inequívoco no sentido que acabo de referir. De qualquer modo, o espírito do D.L. n.º 79-A/89, de 13/3 e a própria natureza da prestação não deixam de reflectir este entendimento. Bastará, para o efeito, atentar no exemplo evidenciado no ponto 11 desta recomendação.

16. A decisão tomada pelo Serviço Sub-Regional de Lisboa do CRSS de Lisboa e Vale do Tejo relativamente ao caso concreto, prejudicou injustamente o reclamante não só no que concerne às prestações de subsídio social que o mesmo deixou de receber como, consequentemente, no que diz respeito ao registo de remunerações por equivalência à entrada de contribuições que se verificaria caso lhe tivesse sido abonado o referido subsídio social. Faz-se notar que o não registo de remunerações por equivalências durante esse período terá alegadamente prejudicado o interessado no tempo considerado para o cálculo da pensão de invalidez que, entretanto, lhe veio a ser atribuída.

17. Face a todo o exposto,

RECOMENDO

17.1. Que seja estabelecida uma orientação interpretativa relativamente à aplicação das normas constantes dos artigos 14º, 15º, 23º n.º 2 e 40º do D.L. n.º 79-A/89, de 13/3, e do artigo 9º da Portaria n.º 994/89, de 16/11, no sentido atrás exposto, por forma a assegurar que na vigência do prazo para prestação da prova da condição de recursos seja atendível qualquer alteração das circunstâncias relativa à situação económica do agregado familiar.

17.2. Que, em conformidade com essa orientação interpretativa seja reapreciado o processo do Senhor J… (beneficiário com o n.º … ), por forma:

– a ser-lhe reconhecido, processado e pago o subsídio social de desemprego que lhe seria devido;

– a assegurar-lhe o consequente registo de remunerações por equivalência à entrada de contribuições durante o período de concessão do subsídio social de desemprego e posterior recálculo da pensão de reforma.

17.3. Que, no âmbito do processo de revisão (em curso) do regime jurídico das prestações de desemprego, seja acolhida expressamente esta orientação interpretativa por forma a evitar futuras situações de desigualdade de tratamento, injustiça e de desprotecção social.

O PROVEDOR DE JUSTIÇA

JOSÉ MENÉRES PIMENTEL