Inspector-Geral de Jogos

Rec. n.º 28/A/92
Proc. :R-53/91
Data:27-04-1992
Área: A 1

ASSUNTO: LAZERES – JOGOS DE FORTUNA OU AZAR – CASINO – ACESSO RESERVADO.

Sequência:

1.O senhor A e outros dirigiram-me uma exposição relacionada com a proibição de acesso, pelo período de um ano, de 60 pessoas às salas de jogos do Casino do Estoril, confirmada por despacho do Inspector-Geral de Jogos de 21/12/90 nos termos dos art.ºs 29.°, 36.º e 38.º n.° 3 do Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de Dezembro.

2. Analisado o assunto, concluí o seguinte:

2.1. Não pode considerar-se contrário à lei fundamental o acesso restrito aos casinos, já que estes não são lugares públicos, com entrada livre para qualquer pessoa, antes constituem lugares reservados, em que o ingresso, é limitado às pessoas que garantam o exercício regular e tranquilo da actividade que é objecto da concessão;

2.2. A entrada num casino não integra a esfera pessoal, a capacidade civil de um cidadão.

2.3. Mas a aplicação de sanções ou de medidas equivalentes deve ser procedida de audiência dos visados – para salvaguarda dos respectivos direitos de defesa – e seguida da notificação por forma adequada.

3. Com efeito, a jurisprudência constitucional tem entendido que:

3.1 Situações como a versada no processo configuram a natureza de ilícito disciplinar atípico ou relação especial de terceiros com a Administração, donde resulta a sujeição ao poder do Estado de pessoas que, por não serem funcionários nem agentes da Administração, não estão integrados numa relação de sujeição hierárquica. Tais situações ocorrem sempre que, para salvaguarda de determinados interesses colectivos, se submete o exercício de determinadas actividades a uma vigilância especial, dotando a Administração de poderes disciplinares sobre os eventuais infractores, colocando-os numa especial subordinação face à mesma Administração (cfr. Parecer da Comissão Constitucional n.° 7/88 in Pareceres, 4.º volume, pp. 329, Acórdão do Tribunal Constitucional n.° 282/86 in DR – l.ª Série de 11/11/86 e Acórdão do Tribunal Constitucional n.° 160/81 in DR – 2.ª Série de 4/9/91).

3.2. Ao silêncio da lei deve entender-se o direito de defesa como um princípio geral de direito administrativo que os órgãos ou agentes da Administração terão de observar, mesmo que o legislador, ao regular certo tipo de situações, seja omisso acerca dele (cfr. Parecer da Comissão Constitucional n.° 29/82 in Pareceres, 219 volume, pp. 33, Parecer da Comissão Constitucional n.° 30/80 in Pareceres, 14.° volume, pp. 10 e Acórdão da Comissão Constitucional n.° 164/79 in BMJ 291/318.

3.3. 0 direito de defesa dos administrados não é exigível em todos os casos de acto administrativo desfavorável ao destinatário (cfr. Acórdão n.° 142/85 do Tribunal Constitucional, in DR – 2.ª Série de 7/9/85, pp. 8369), mas deve ser garantido sempre que, como no caso versado no processo, se está perante um efeito de carácter punitivo ou equiparável a uma sanção nos seus pressupostos, nas suas consequências e no tipo de juízo implicado, situação em que deve conceder-se ao interessado a defesa da imputação de um comportamento ilícito (cfr. Ac. n.° 142/82, cit, e Pareceres da Comissão Constitucional 29/82, 21.º volume pp. 25 e 26/82).

3.4. 0 direito de defesa deve ser logo garantido na fase processual administrativa, sendo independente da fase contenciosa (cfr. Pareceres da Comissão Constitucional n.ºs 26/82 e 29/82, citados e também do Acórdão do STA – 1.ª Secção de 30/5/75 in A.D. n.° XIV pp. 1510).

3.5. No silêncio da lei, o regime processual aplicável ao ilícito disciplinar atípico é o do estatuto disciplinar dos funcionários públicos, com as devidas adaptações (cfr. acórdão n.° 282/86 do Tribunal Constitucional, cit).

4. Por outro lado, os reclamantes não foram notificados do acto administrativo de confirmação da proibição de acesso ao Casino do Estoril durante determinado período, como exige o art.° 268.° n.° 2 da CRP, pois não pode considerar-se notificação “na forma prevista na lei” a simples comunicação aos reclamantes de tal medida pelo porteiro em serviço, quando pretendiam entrar no Casino. Esta comunicação é já no acto de execução da medida.

Em face do anteriormente exposto, ao abrigo da competência que me é conferida pelo art.° 20.° n.° 1 alínea a) da Lei n.º 9/91, de 9 de Abril, formulo um reparo à actuação do Inspector-Geral de Jogos na situação versada no processo e emito a seguinte RECOMENDAÇÃO

Que para o futuro, em processos administrativos do mesmo tipo, seja conferido aos particulares o direito de defesa antes da aplicação das medidas previstas nos art.ºs 29.° e 38.° do Decreto-Lei n.º 422/89, devendo os mesmos ser notificados por forma adequada.

0 PROVEDOR DE JUSTIÇA

JOSÉ MENÉRES PIMENTEL