Presidente do Conselho Directivo do Centro Nacional de Pensões
Número:44/A/98
Processo:R-4639/97
Data:18.06.1998
Área :A3

Assunto:SEGURANÇA SOCIAL – PENSÃO UNIFICADA – REQUISITO NEGATIVO – ATRIBUIÇÃO DE PRESTAÇÕOES POR SISTEMA DE SEGURANÇA SOCIAL ESTRANGEIRO

Sequência: Acatada ( por alteração legislativa ).

1. O Senhor …, dirigiu-me uma reclamação onde alega, essencialmente, o seguinte:
1.1. Em 1992 requereu a atribuição da pensão unificada à Caixa Geral de Aposentações, tendo-lhe sido atribuída a pensão provisória no valor de 203.179$00.
1.2. Esse Centro Nacional de Pensões informou-o, em …, que não tinha direito à atribuição da pensão unificada por estar abrangido por um regime de segurança social de um país em relação ao qual Portugal se encontrava vinculado por força de um instrumento internacional.
1.3. Em …de 1993 a Caixa Geral de Aposentações notificou-o do valor definitivo da pensão, 167.296$00, fundamentando a redução verificada na impossibilidade de aplicação do regime da pensão unificada, dado o facto de ter pertencido a um regime especial e nos termos do art.º 14º do Decreto-Lei n.º 143/88, de 22 de Abril.

2. Com efeito, o reclamante trabalhara perto de dois anos e meio nos Estados Unidos da América.

3. Nesta circunstâncias, o reclamante solicitou às autoridades norte-americanas informação quanto à possibilidade de a inscrição no sistema de segurança de segurança social referente àquele período lhe proporcionar a atribuição de protecção face às eventualidades velhice e invalidez.

4. Os serviços de segurança social norte americanos vieram a informar, em … de 1994, que o reclamante não tem, por força daquela inscrição, direito a qualquer prestação atribuível no âmbito da protecção das eventualidades velhice e invalidez.

5. O reclamante ao ser notificado do indeferimento da pensão unificada por esse Centro Nacional de Pensões, foi, também, informado de que teria direito a uma pensão de acordo com a convenção internacional, caso viesse a requerê-la.

6. Tendo requerido a pensão de invalidez, a mesma foi-lhe atribuída, com efeitos a …de 1995, sem que, todavia, incluísse qualquer componente relativa ao trabalho prestado no estrangeiro.

7. O que levou o exponente a reclamar, em … de 1995, através de carta dirigida ao Centro Coordenador de Prestações Diferidas da Região Autónoma dos Açores.

8. Na falta de resposta à sua reclamação, o exponente insistiu em … de 1997, tendo recebido a resposta daquele Centro, em … de 1997, que lhe transmitia uma informação oriunda dos Estados Unidos, datada de … de 1996, de acordo com a qual não tinha direito aos benefícios sociais atribuíveis por aquele sistema.

9. O reclamante, face a esta resposta, solicitou ao referido Centro Coordenador de Prestações Diferidas a reabertura do processo de atribuição da pensão unificada, o que foi feito, tendo sido remetido um fax, para o efeito, à Caixa Geral de Aposentações.

10. A Caixa Geral de Aposentações não deu provimento ao pedido porque esse Centro Nacional de Pensões informara que o mesmo fora arquivado dado que o exponente trabalhara nos Estados Unidos da América e estivera abrangido pela Segurança Social daquele país.

11. É, pois, esta decisão que está em causa e com a qual não posso deixar de discordar pelas razões que passo a expor.

12. O Decreto-Lei n.º 143/88, de 22 de Abril, excluía da respectiva aplicação os beneficiários que, no decurso da sua actividade profissional, estivessem abrangidos também por legislação de segurança social de países em relação aos quais Portugal se encontrasse vinculado por força de instrumento normativo internacional.

13. A decisão quanto à aplicabilidade do regime da pensão unificada ao exponente, como já se disse no ofício n.º …, desta Provedoria de Justiça, depende, essencialmente, da interpretação a conferir ao requisito negativo de se encontrar abrangido por legislação de segurança social estrangeira.

14. Em que termos haverá, pois, que considerar-se, para aquele efeito, um indivíduo deve considerar-se “abrangido” por um sistema de segurança social?

15. Num critério mais lato, poderá considerar-se essa circunstância como tratando-se da inscrição num sistema de segurança social e, logo, da possibilidade desse sistema de lhe proporcionar um qualquer tipo de protecção.
Num critério mais restrito, somente a possibilidade de a legislação desse sistema proporcionar protecção face a uma determinada eventualidade considerada em concreto.
Qual, então, desses entendimentos é o que melhor corresponde ao espírito da lei?

16. A pensão unificada apareceu como uma medida integrada num processo de harmonização decorrente da necessidade de dar cumprimento ao art.º 63º da Constituição da República Portuguesa no que respeita à existência de um sistema unificado de segurança social e ao art.º 70º da Lei de Bases da Segurança Social – Lei n.º 28/84, de 14 de Agosto- que preconiza a criação de um sistema unitário de segurança social.

17. Porém, no próprio preâmbulo do Decreto-Lei n.º 143/88, de 22 de Abril, que veio instituir o regime jurídico da pensão unificada, reconhece-se que o processo de harmonização haveria que ser gradual, não sendo “…facilmente atingível em todas as prestações, face às divergências mais profundas entretanto criadas pelos regimes e ao respeito das legítimas expectativas dos trabalhadores, que a Segurança Social defende e pratica, mas não impede, em muitos aspectos, a progressiva adopção de medidas de aproximação dos dois sistemas.”.

18. É, pois, nesse contexto que, mais à frente no preâmbulo, se refere “…a possibilidade de atribuição de uma pensão unificada sempre que, no exercício da sua actividade, o trabalhador esteja abrangido pelo sistema de segurança social e pelo sistema de protecção própria dos trabalhadores da função pública.”.

19. Resulta, pois, destas considerações do legislador, expressas no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 143/88, que a pensão unificada constitui uma medida que se insere num processo de harmonização progressiva de dois regimes de protecção social, o qual se desenvolverá gradualmente quanto às diversas prestações correspondentes.

20. Mas, por outro lado, resulta, também, dessas considerações que, embora o regime da pensão unificada se integre num processo mais lato de harmonização, constitui-se, em si próprio, como uma medida de alcance mais restrito porquanto é uma medida direccionada especificamente à protecção conferida pelos dois sistemas nas eventualidades velhice e invalidez.

21. Tratando-se de uma medida de harmonização com alcance restrito, não faz sentido nela considerar outras prestações que não sejam aquelas que, no momento, foram objecto daquele processo de harmonização de regimes.

22. Com efeito, o regime da pensão unificada tem por objectivo, como veio a ser inequivocamente expresso pelo legislador no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 159/92, de 31 de Julho, “…a totalização dos períodos contributivos cumpridos ao abrigo do regime geral da função pública, numa perspectiva de articulação entre os dois sistemas de protecção social”.

23. Ora, sendo inquestionável o alcance restrito da medida que correspondeu à consagração da possibilidade da atribuição da pensão unificada, não pode deixar de perguntar-se que sentido teria, para esse efeito específico, conferir relevância a inscrições em sistemas de segurança social estrangeiros que (em função do decurso de períodos de residência, de inscrição, de tempo de trabalho, contribuições ou outras condições normalmente designadas como prazos de garantia) não garantem aos beneficiários protecção face às eventualidades velhice e invalidez?

24. Na verdade, compreende-se que o legislador tenha pretendido acautelar o processo de harmonização relativo às duas prestações em causa face à eventual verificação de efeitos perversos decorrentes do direito à atribuição de prestações semelhantes no âmbito de um terceiro sistema, nomeadamente, estrangeiro.
No entanto, já não se compreende que se pretenda excluir do regime da pensão unificada beneficiários que, apesar de terem estado abrangidos por legislação de segurança social estrangeira, dessa inscrição não resulta o direito às prestações em causa, isto é, o direito à atribuição de uma pensão de velhice ou de invalidez.

25. A vontade do legislador foi, pois, a de delimitar o tipo de situações abrangidas por legislação de segurança social estrangeira, no sentido restrito referido no n.º 15 supra.

26. E, tanto assim foi que a exclusão constante no art.º 14º foi prevista sob a epígrafe “Pensões de país estrangeiro”.

27. Deve-se, pois, entender que a exclusão do regime da pensão unificada está prevista apenas para os casos em que se verifica a intervenção de um terceiro regime (estrangeiro) no domínio da atribuição de prestações tendentes a assegurar a protecção da eventualidade em causa.

28. Acresce que, uma vez que foi demonstrada a ineficácia da inscrição no sistema de segurança social norte americano no que respeita à protecção nas eventualidades velhice e invalidez, considero profundamente injusto que se pretenda excluir o reclamante do regime da pensão unificada.

29. Faço notar, finalmente, que ao contrário do referido no ofício n.º …, desse Centro Nacional de Pensões, a reclamação ora em causa não é extemporânea.

30. Com efeito, presente que seja o referido nos ns. 3 a 9 supra, facilmente se verifica que o reclamante nunca se conformou com a decisão de indeferimento da atribuição da pensão unificada tendo manifestado junto da administração pública essa sua posição.

31. Refira-se, a propósito, que o Centro Nacional de Pensões a que V. Exa. preside apenas em 18 de Abril de 1997 informou o reclamante que não tinha direito aos benefícios sociais atribuíveis pelo sistema de segurança social norte-americano.

Em face do exposto,RECOMENDO:

a V.Exa. a revogação do acto de indeferimento da atribuição da pensão unificada, com a comunicação à Caixa Geral de Aposentações do encargo a suportar pelo Centro Nacional de Pensões.

O PROVEDOR DE JUSTIÇA

José Menéres Pimentel