Presidente da Câmara Municipal de Sousel
Número:76/A/98
Processo: R-3242/97
Data:1998.12.04
Área:A1

Assunto:URBANISMO E OBRAS – OBRAS PARTICULARES – REQUERIMENTO PARA LICENCIAMENTO – SUSPENSÃO – CONDIÇÃO – PRINCÍPIO DA LEGALIDADE.

Sequência: Acatada

I-Dos Factos

1. Foi instruído processo na Provedoria de Justiça na sequência da reclamação do acto que decidiu pela aplicação ao munícipe J… de coima pela promoção de obras de alteração da fachada principal do edifício sito na Rua Bartolomeu, em Sousel.

2. Analisados os elementos facultados a este Órgão do Estado, entendi inexistirem fundamentos que justificassem a censura daquele acto, por se verificar que o promotor das obras iniciara a sua execução sem alvará de licença de construção, facto que consubstancia comportamento contra-ordenacional, passível de aplicação de coima, como se alcança da análise do disposto no art. 54º, n.º 1 al. a) e n.º 2 do Decreto-Lei n.º 445/91, de 20 de Novembro (que aprovou o regime do licenciamento municipal de obras particulares).

3. Verifiquei, não obstante, que a promoção daquelas obras de alteração da fachada principal do edifício havia sido precedida do correspondente requerimento para licenciamento, o que havia dado lugar à constituição do processo de obras n.º …, que correu termos nessa Câmara Municipal, no âmbito do qual havia sido proferida decisão intercalar de suspensão do seu prosseguimento.

4. Efectivamente, e no âmbito do processo de obras n.º…, entendeu V. Exa. dever condicionar-se a sua marcha à retirada da cobertura em chapas de zinco de um terraço a tardoz da habitação – obra efectuada já há cerca de oito anos.

5. Instado V. Exa. para o efeito, veio a justificar essa decisão intercalar pelo facto de aquela construção erguida a tardoz não estar licenciada, e se encontrar em desconformidade com o prescrito no art. 2º, n.º 4 do Regulamento de Construção, Fiscalização e Taxas de Obras Particulares, aprovado pela Câmara Municipal e pela Assembleia Municipal de Sousel, em 27 de Dezembro de 1995 (publicado no Diário da República, II Série, de 27 de Fevereiro de 1996).

II-Dos Fundamentos

6. Analisado o regime jurídico do licenciamento municipal de obras particulares (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 445/91, de 20 de Novembro, com as alterações que lhe foram introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 250/94, de 15 de Outubro) observa-se inexistir previsão que justifique a suspensão do processo de licenciamento, por motivo da natureza do ora em apreço.

7. Observa-se, ainda, que o incumprimento, por parte do requerente, da condição imposta (conformação de uma outra construção, não abrangida pelo processo de licenciamento em apreço, com as regras municipais em vigor), nem sequer poderia vir a fundamentar o indeferimento do pedido de licenciamento da obra que pretendia erguer a coberto do processo de obras n.º …, como se alcança da análise do elenco taxativo que consta do art. 63º do supra mencionado Decreto-Lei n.º 445/91, de 20 de Novembro.

8. Afigura-se-me, assim, que a condição imposta para o prosseguimento do processo de obra n.º …, se encontra ferida do vício de violação de lei.. Faço notar a V. Exa. que a ordem jurídica prevê os meios adequados à legalização de obras promovidas sem o necessário alvará de licença de construção, ou demolição, quando se conclua que a intervenção clandestina é insusceptível de vir a satisfazer os requisitos legais e regulamentares de urbanização, estética, segurança e salubridade (cfr. art. 167º do Regulamento Geral das Edificações Urbanas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 38 382, de 7 de Agosto de 1951 e art. 58º do supra mencionado regime aprovado pelo Decreto-Lei n.º 445/91, de 20 de Novembro).

10. E, tais meios, não se reconduzem à solução que se pretendeu adoptar no caso apreciado.

11. De facto, verificando-se que a construção erguida a tardoz não estava licenciada e que se encontrava em desconformidade com o prescrito no art. 2º, n.º 4, do Regulamento de Construção, Fiscalização e Taxas de Obras Particulares, deveria, em lugar de apor condição para o prosseguimento da marcha de um processo de licenciamento de uma outra obra dela independente, ter essa Câmara Municipal intimado o proprietário a apresentar projecto de legalização da construção clandestina que satisfizesse os requisitos legais e regulamentares de urbanização, segurança, estética e salubridade (art. 167º do Decreto-Lei n.º 38 382, de 7 de Agosto de 1951).

12. No âmbito desse processo de legalização, a remoção daquelas chapas afigurar-se-ia, então, como condição essencial a uma futura decisão favorável.

13. No entanto, tal facto não poderia, pelas razões atrás expressas, constituir condição para o deferimento do pedido de licenciamento de uma outra obra, daquela independente.

14. Devo recordar a V. Exa. que o princípio da subordinação da Administração à lei comporta a necessidade de esta conformar a sua actuação com os quadros legais existentes, ainda que outros possam parecer mais adequados à prossecução do interesse público.

15. E não posso deixar de fazer notar a V. Exa. que estão os órgãos da Administração Pública vinculados, cumulativamente, na sua actuação, aos princípios da legalidade, da prossecução do interesse público e da protecção dos direitos e interesses dos cidadãos (art. 266º da Constituição da República Portuguesa e arts. 3º e 4º do Código do Procedimento Administrativo).

16. E se o desconhecimento da lei não aproveita a ninguém (segundo a princípio geral enunciado no art. 6º do Código Civil), não poderá, por maioria de razão, desculpabilizar a actuação de uma entidade que, dada a sua natureza, se encontra especialmente vinculada ao seu cumprimento.

III-Conclusões

São estas motivações, Senhor Presidente da Câmara Municipal de Sousel, que me aconselham dever,RECOMENDAR

a V. Exa. (ao abrigo do disposto no art. 20º, n.º 1, al. a) da Lei n.º 9/91, de 9 de Abril) que siga o processo de obras n.º … os seus trâmites até final, conformando-se a sua marcha com o previsto no regime do licenciamento municipal de obras particulares, aprovado pelo do Decreto-Lei n.º 445/91, de 20 de Novembro, com as alterações que lhe foram introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 250/94, de 15 de Outubro.

O PROVEDOR DE JUSTIÇA

José Menéres Pimentel