Exm.º Senhor Governador Civil do Distrito de Faro
Número:49/A/97
Processo:R-1741/96
Data:19.06.1997
Área: A1

Assunto:AMBIENTE – RUÍDO – DISCOTECA – PODER VINCULADO – MEDIDAS DE POLÍCIA – ENCERRAMENTO.

Sequência:Acatada

I-Exposição de Motivos

Dos Factos

1. Foi apresentada na Provedoria de Justiça uma queixa a respeito da exploração de estabelecimento de bebidas exercida pela sociedade denominada “N…, Ldª”, no Edifício…, na Rua…, em Armação de Pêra, da qual se diz resultar incomodidade para os moradores vizinhos, em especial, durante o período nocturno, devido ao ruído da música ambiente e à exibição de espectáculos com música ao vivo que se prolongam até às 04, 00 horas, diariamente.

2. Questionado o Governo Civil acerca da matéria reclamada, fui informado, a coberto do ofício n.º …, de ter sido requerida licença de abertura e licença de funcionamento em 9.8.1995.

3. Em 1996, o Exmo. Presidente da Câmara Municipal de Silves manifestou-se favorável ao pedido formulado no sentido de o estabelecimento encerrar pelas 04, 00 horas.

4. Esclareceu ainda o Governo Civil que o processo de licenciamento do estabelecimento se mantinha pendente, dependendo a sua conclusão da avaliação das condições de isolamento sonoro, a promover pela Direcção Regional do Ambiente e Recursos Naturais do Algarve.

5. Em 14.3.1997 elucidou aquela Direcção Regional terem sido efectuados ensaios acústicos no que tange ao funcionamento do estabelecimento de bar, mostrando-se inobservado o disposto no art. 6º, n.º 5 do Regulamento Geral sobre o Ruído, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 251/87, de 24 de Junho. Por outro lado, nos termos das conclusões do respectivo relatório, os valores obtidos “para o índice de isolamento sonoro a sons de condução aérea entre o recinto emissor (bar) e os recintos receptores (sala e quarto do apartamento 1 A), não garantem condições mínimas de funcionamento do estabelecimento, principalmente no quarto, por forma a ser respeitado o n.º 1, do art. 14º do Regulamento Geral sobre o Ruído”.

6. Com efeito, os valores apurados, fixados em 53 dB e 49 dB, não permitem dar por observada a prescrição constante do art. 6º, n.º 5, al. a) do citado Regulamento, que estabelece como limite mínimo dos índices de isolamento sonoro para os sons de condução aérea entre fogos e locais afectos à prestação de serviços ou à promoção de espectáculos e divertimentos públicos, o valor de 55 dB.

7. Pese embora a circunstância de ter comunicado a V.Exª, através do ofício n.º …, as conclusões do exame de medição acústica levado a cabo pelos serviços regionais competentes, pedindo, do mesmo passo, indicação sobre as medidas adoptadas para reintegração da legalidade, limitou-se esse Governo Civil, em 14.5.1997, a responder, uma vez mais, que a decisão do processo de licenciamento aguardava o relato daqueles ensaios técnicos, nada aditando ao teor da informação facultada a coberto de ofícios de 5.6.1996, 23.8.1996 e 24.10.1996.

Do Direito

8. De acordo com o disposto no art. 3º do Regulamento Geral sobre o Ruído, em conjugação com o seu art. 2º, als. b) e d), deve o Governo Civil promover, no âmbito do procedimento de licenciamento de estabelecimento similar de bar, fiscalização prévia a respeito da observância dos requisitos técnicos previstos no art. 20º do citado regulamento.

9. Obedecendo ao mesmo desiderato, o art. 20º n.º 1 do Decreto-Lei n.º 251/87 de 24 de Junho, na redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.º 292/89, de 2 de Setembro, fixa os condicionalismos aplicáveis ao exercício de actividades ruidosas, promovidas por entidades públicas ou privadas, cujo cumprimento impõe seja assegurado no âmbito do processo de licenciamento.

10. Daqui se retira, a “contrario sensu”, não poder ser autorizada a prática de tais actividades quando os edifícios e demais locais afectos ao seu exercício não preencham os requisitos fixados legalmente.

11. O indeferimento do pedido, nestas situações, corresponde ao exercício de um poder vinculado.

12. De resto, deve entender-se que mantém aplicação a prescrição estabelecida no art. 1º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 271/84 de 6 de Agosto, com a qual não se compaginará a autorização de abertura de estabelecimentos hoteleiros e similares cujas instalações não obedeçam aos pertinentes requisitos técnicos de funcionamento.

13. Com efeito, entre aquela disposição e a regra contida no art. 20, n.º 2 do Regulamento Geral sobre o Ruído estabelece-se uma relação de especialidade, pelo que não foi a vigência da primeira norma preterida pela da segunda, sendo plena a eficácia de ambas as disposições.

14. Não logra aplicação ao caso a possibilidade de manter em funcionamento este estabelecimento sujeitando-o simplesmente à restrição legal de funcionamento no período compreendido entre as 24H00 horas e as 08H00 horas, estabelecido no art. 3º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 271/84 de 6 de Agosto, e á realização de obras de insonorização concedida pelo n.º 1 do mesmo artigo, porquanto aquelas disposições se reportam, tão somente, a estabelecimentos licenciados à data da entrada em vigor do diploma em causa.

15. Ao Governo Civil do Distrito de Faro não resta outra alternativa que não a de proferir decisão de indeferimento do pedido de licenciamento apresentado.

16. Consequentemente, há-de ser determinado o imediato encerramento do estabelecimento, em nada dependendo o exercício de medida policial da aplicação de sanções administrativas, como sejam as que resultem da instauração de processo contra-ordenacional.

17. Encontrando-se por licenciar o estabelecimento não pode a sua actividade beneficiar de um regime mais permissivo que o conjunto de restrições que impendem sobre os estabelecimentos similares devidamente licenciados, designadamente, em matéria de horários de funcionamento e de isolamento acústico.

18. Seria injusto que fossem os vizinhos, titulares do direito a um ambiente sadio e equilibrado (art. 66º, n.º 1, da Constituição) a suportar as consequências do funcionamento que iniciou a sua actividade sem que para tanto se encontrasse habilitado o seu proprietário.
De acordo com a motivação exposta,RECOMENDO:

Que pratique acto de indeferimento do pedido de licença de abertura do estabelecimento similar de bar denominado “…” sito na Rua…, em Armação de Pêra, concelho de Silves, com fundamento no disposto no art. 20, n.º 1, do Regulamento Geral sobre o Ruído conjugado com a disposição do art. 1º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 271/84 de 6 de Agosto, por não dispor o estabelecimento de condições de isolamento que permitam acautelar a observância do diferencial de 10 dB, nos termos estabelecidos pelas citadas normas legais.
Mais recomendo que seja determinado o encerramento do estabelecimento por não ter merecido provimento o pedido de licenciamento, ao abrigo do art. 36º, n.º 1, al. b) do Decreto-Lei n.º 328/86, de 30 de Setembro e no art. 14º do Regulamento Policial do Distrito de Faro, homologado por despacho ministerial de 5/2/1993.

O PROVEDOR DE JUSTIÇA

José Menéres Pimentel