RECOMENDAÇÃO N.º 5/B/2003
(Artigo 20º, nº 1, alínea b), da Lei nº 9/91, de 9 de Abril)


Entidade visada: Ministro da Segurança Social e do Trabalho


Nossa Ref.ª – Proc.º: R-734/02 (A6)
Data: 2003/04/29


Assunto: Decreto-Lei n.º 322/90, de 18 de Outubro. Protecção por morte dos beneficiários abrangidos pelo regime geral de segurança social. Pensão de sobrevivência. Divorciados ou separados judicialmente de pessoas e bens.


1. Os art.ºs 7.º, n.º 1, alínea a), e 8.º do Decreto-Lei n.º 322/90, de 18 de Outubro, reconhece como titulares de uma pensão de sobrevivência, no âmbito da protecção na eventualidade morte dos beneficiários do regime geral de segurança social, a par do cônjuge sobrevivo e da pessoa que se encontrar na situação prevista no art.º 2020.º do Código Civil (ou seja, que no momento da morte de pessoa não casada ou separada judicialmente de pessoas e bens vivesse com ela há mais de dois anos em condições análogas às dos cônjuges), e nos termos preceituados no Decreto Regulamentar n.º 1/94, de 18 de Janeiro, o(s) ex-cônjuge(s) do beneficiário falecido.


Acrescenta o art.º 11º do mesmo Decreto-Lei n.º 322/90, que “o cônjuge separado judicialmente de pessoas e bens e o divorciado só têm direito às prestações se, à data da morte do beneficiário, dele recebessem pensão de alimentos decretada ou homologada pelo tribunal ou se esta não lhes tivesse sido atribuída por falta de capacidade económica do falecido judicialmente reconhecida”.


Por sua vez, e já quanto à forma pela qual se processa a distribuição da pensão no caso de concorrerem ao seu recebimento designadamente o cônjuge sobrevivo ou a pessoa que vivia com o falecido em união de facto e o ex-cônjuge, adianta o art.º 28.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 322/90, que o montante obtido pela aplicação da percentagem estabelecida, no caso aqui em discussão, no art.º 25.º, é repartida por igual entre os titulares do direito à pensão aí incluídos, isto é, entre o cônjuge ou a pessoa que vivia com o falecido em união de facto e o(s) ex-cônjuge(s) do beneficiário falecido. Ou seja, a pessoa divorciada ou separada judicialmente do falecido aparece, à partida, em situação de inteira paridade com a do cônjuge sobrevivo ou da pessoa que com o falecido vivia em união de facto nas condições exigidas na legislação, acima explicitadas.


2. Não se revelará difícil equacionar situações em que a aplicação concreta e conjugada das normas referidas potenciará casos de injustiça.


Imagine-se, por exemplo, situações em que o beneficiário viveu a maior parte da sua vida com o cônjuge sobrevivo, tendo estado muito pouco tempo casado com a pessoa de quem se divorciou. Ou a circunstância, que se perspectiva de forma mais gravosa, de a pensão de alimentos, paga em vida pelo beneficiário à pessoa de quem se divorciou ou separou judicialmente, ser substancialmente inferior à pensão que esta vem agora, por via da morte daquele, a receber. Situações deste tipo têm sido objecto de reclamação ao Provedor de Justiça.


Em muitas circunstâncias poderá a solução legal aqui em análise levar a um enriquecimento ilegítimo – e provavelmente, até, inesperado para o próprio destinatário – por parte desta pessoa que vem a auferir de uma pensão de sobrevivência por morte do ex-cônjuge, com concomitante e nítido prejuízo da pessoa com quem o contribuinte era casado ou vivia em união de facto à data do seu falecimento.


3. Assim sendo, tendo em vista obviar ao que fica dito, parece-me de todo justificável a introdução de alguns ajustamentos na legislação em análise.


Antes de mais, será de assumir o princípio de que é, em regra, ao cônjuge (por facilidade, assumindo-se sempre aqui englobado aquele que vivia em união de facto, nos termos legalmente estabelecidos) sobrevivo que se deve dirigir primacialmente o benefício da pensão de sobrevivência, prestação que tem carácter ressarcitório da perda de rendimento causada pelo óbito do beneficiário.


Independentemente de quaisquer considerações – designadamente quanto à duração dessa ligação – o que importa é que, no momento do óbito e, assim, previsivelmente para além dele caso o decesso não tivesse ocorrido, era aquela a pessoa com a qual o de cujus vivia, em situação conjugal ou equiparada.


A eventual existência de ex-cônjuges ou cônjuges separados judicialmente, sempre se manifestando nestas situações jurídicas a inexistência da comunhão a que acima me reportei, deve apenas implicar o pagamento de pensão de sobrevivência em quantitativo que corresponda à perda efectivamente sofrida, ao fim e ao cabo, correspondendo à pensão de alimentos que, por decisão judicial, vinha sendo liquidada.


Será, assim, de excluir uma orientação como a que se encontra actualmente em vigor, decorrente do disposto no art.º 28.º, n.º 1, quando conjugada com a do art.º 25.º do Decreto-Lei n.º 322/90, da divisão automática e simples, per capita, do montante total a pagar nos termos legais, numa solução que de salomónica apenas goza a aparência.


Parece-me adequado que o montante da pensão de sobrevivência a atribuir à pessoa divorciada ou separada judicialmente de pessoas e bens do beneficiário falecido, que recebesse, à data da morte deste, uma pensão de alimentos fixada ou homologada judicialmente, tenha como limite precisamente a quantia percebida a este título, naquela data, naturalmente permitindo-se, v. g. para obviar ao caso de a mesma não ter sido entretanto actualizada, que a pessoa daquela beneficiária possa requerer essa actualização, face à situação vigente na data da morte do seu ex-cônjuge.


De qualquer forma, o montante final a atribuir, a título de pensão de sobrevivência, ao ex-cônjuge do beneficiário falecido, no âmbito do quadro aqui proposto, nunca poderá ser superior à quantia atribuída, também a título de pensão de sobrevivência, ao cônjuge sobrevivo, ou à pessoa com quem o mesmo vivia, à data da morte, em união de facto, assim admitindo o actual critério da divisão per capita como limite máximo.


4. Naturalmente que esta intervenção legislativa terá que ser sintonizada com idêntica alteração no regime legal das pensões de sobrevivência pagas no âmbito da Função Pública. Desta forma, dirigi nesta data idêntica recomendação a Sua Excelência a Ministra de Estado e das Finanças.


Face a tudo o que fica exposto, permito-me recomendar a Vossa Excelência, ao abrigo do disposto no art.º 20.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 9/91, de 09 de Abril, que, 








seja promovida alteração legislativa que modifique o regime ora previsto no art.º 28.º, n.º 1, quando conjugado com o do art.º 25.º do Decreto-Lei n.º 322/90, de 18 de Outubro, estabelecendo os seguintes termos:



a) a previsão de que o montante da pensão de sobrevivência a atribuir a pessoa divorciada do beneficiário falecido ou deste separado judicialmente de pessoas e bens, nas condições já referidas, tenha como medida precisamente a quantia recebida, à data da morte do seu ex-cônjuge, a título de pensão de alimentos, eventualmente permitindo-se a sua actualização face às condições verificadas no momento do óbito;


b) a previsão de que o montante da pensão de sobrevivência a atribuir à pessoa divorciada do beneficiário falecido ou deste separado judicialmente de pessoas e bens, nas condições referidas, não ultrapasse igualmente, em quaisquer circunstâncias, o montante da pensão atribuído ao cônjuge sobrevivo ou à pessoa que com o falecido vivia em união de facto no momento do óbito.


5. Na expectativa de que o que acima fica recomendado mereça o atendimento de Vossa Excelência, agradeço a oportuna comunicação sobre a posição que o Governo tomará a propósito do teor da presente Recomendação.



O Provedor de Justiça,
H. Nascimento Rodrigues