RECOMENDAÇÃO N.º 11/B/04
(Artigo 20º, nº 1, alínea b), da Lei nº 9/91, de 9 de Abril)




Entidade visada: Ministro de Estado, da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar
Procº: R-3669/02
Data: 2004/11/25
Assunto: Lei n.º 15/92, de 5 de Agosto – Decreto-Lei n.º 236/99, de 25 de Junho
Área: A6


 1. Tendo sido apresentada ao Provedor de Justiça uma exposição subscrita no interesse de um conjunto de oficiais, pertencentes à Armada, actualmente na situação de reforma, nesta se dava conta dos efeitos práticos associados à revogação, pelo Decreto-Lei n.º 236/99, de 25 de Junho, da Lei n.º 15/92, de 5 de Agosto.



2. De acordo com o então alegado, tendo aqueles militares passado à situação de reserva, por força do disposto no artigo 7, n.º 1, alínea c), da Lei n.º 15/92, de 5 de Agosto, com efeitos reportados a 31 de Dezembro de 1992, atenta a previsão do n.º 4 daquela disposição, apenas ao completarem 65 anos de idade, transitariam para a situação de reforma.


3. Ainda de acordo com o oportunamente exposto, não obstante os militares em causa terem vindo a transitar, ao nível das Forças Armadas, dos quadros da reserva para a reforma, em 2001, ano em que completaram, efectivamente, a idade fixada nos termos que antecedem, veio a Caixa Geral de Aposentações a fazer retroagir os efeitos da passagem para aquela situação a Junho de 1999, data da publicação do diploma que veio a aprovar o então novo Estatuto dos Militares das Forças Armadas.


4. Analisada a situação deste modo trazida ao meu conhecimento, complementada pelos esclarecimentos prestados, nesta matéria, por aquela entidade pública, constata-se que a decisão contestada nos termos que antecedem, ter-se-á fundado na expressa revogação do artigo 7.º da Lei n.º 15/92, de 5 de Agosto, entretanto levada a cabo pelo artigo 30.º do Estatuto dos Militares das Forças Armadas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 236/99, de 25 de Junho.


5. De facto, de acordo com o despacho então proferido, ter-se-á aplicado, por isso, ao caso concreto dos exponentes, a regra vertida no artigo 160.º, n.º 1, alínea b) deste último diploma, na redacção a este então dada, de acordo com a qual o militar passa à situação de reforma sempre que “complete, seguida ou interpoladamente, cinco anos na situação de reserva fora da efectividade de serviço”.


6. No tocante a esta matéria, veio a Lei n.º 15/92, de 5 de Agosto, a adoptar um conjunto de medidas destinadas a assegurar a racionalização dos efectivos militares, estabelecendo, para o efeito, ao abrigo do seu artigo 7.º, n.º 1 que “durante os anos de 1992 e 1993 passam à situação de reserva os militares que possuam tempo de serviço igual ou superior a 36 anos”, preenchendo cumulativamente um dos critérios fixados nas suas diversas alíneas.


7. Por sua vez, estabelecia o n.º 4 daquele preceito, que os militares abrangidos pela medida caracterizada nos termos que antecedem, “apenas transitam para a situação de reforma ao completarem 65 anos de idade e são equiparados, para efeito de remuneração, aos militares cuja transição para a reserva se efectivou nas situações previstas no n.º 2 do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 57/90, de 14 de Fevereiro., com a redacção dada pelo artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 98/92, de 28 de Maio”.


8. Determinando a Lei n.º 15/92, de 5 de Agosto, na prática, a interrupção do percurso militar dos seus destinatários, pretendeu o legislador, através do recurso ao expediente elencado nos moldes que antecedem, criar uma solução que, em termos finais, permitisse acautelar os legítimos interesses daqueles, assentes nas expectativas de carreira detidas à data da publicação daquele diploma, não obstante as mesmas se encontrarem, na prática, limitadas pelo tempo de serviço até então já prestado.


9. Neste mesmo sentido veio a pronunciar-se alguma jurisprudência, reconhecendo que o tratamento diferenciado introduzido pelo diploma de 1992, veio a ser atenuado por algumas compensações, tais como a aplicação de regime mais favorável no cálculo das pensões (Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo – R 33 253 – de 14 de Outubro de 1999, publicado no Boletim do Ministério da Justiça, 490, 302).


10. Posteriormente veio o Decreto-Lei n.º 236/99, de 25 de Junho, a aprovar o novo Estatuto dos Militares das Forças Armadas, estabelecendo no seu artigo 30.º a revogação, entre outras, da Lei n.º 15/92, de 5 de Agosto.


11. Tendo em vista, precisamente, a salvaguarda do conjunto de expectativas fundadas no diploma legal de 1992 e comprometidas pela opção legislativa adoptada em 1999, veio a estabelecer o artigo 5.º da Lei n.º 25/2000, de 23 de Agosto, em sede de alterações ao Decreto-Lei n.º 236/99, de 25 de Junho, apenas a repristinação dos n.ºs 6 e 7 do artigo 7.º da Lei n.º 15/92, de 5 de Agosto, “até que se esgotem os respectivos efeitos jurídicos”.


12. Mais tarde, pelas razões atrás enunciadas, com a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 197-A/2003, de 30 de Agosto, que procedeu à introdução de alterações ao diploma de 1999, e por força do disposto no seu artigo 7.º, veio a ser repristinado “o regime de passagem à reforma previsto no n.º 4 do artigo 7.º da Lei n.º 15/92,de 5 de Agosto, até que se esgotem os respectivos efeitos jurídicos”.


13. Resulta assim do percurso legislativo, traçado nos termos que antecedem, que os militares que, de acordo com os critérios fixados pela Lei n.º 15/92, de 5 de Agosto, passaram internamente à situação de reforma entre Junho de 1999 e Agosto de 2003, não vieram a beneficiar, em termos práticos, do regime previsto no seu artigo 7.º, n.º 4, numa situação de diferenciação de tratamento para com os restantes militares que, em função da idade, tenham vindo a abandonar os quadros da reserva, ao abrigo daquela disposição, em data anterior ou posterior àquele período.


14. Esta situação é destituída, a meu ver, de qualquer fundamento racional bastante que permita a sua sustentação.


15. Na verdade, tendo vindo o legislador a repristinar, aceitando assim o erro cometido com a revogação e procurando remediá-lo, o regime com base no qual vieram os mesmo a fundar as suas legítimas expectativas, acabou por vir a reconhecer a actualidade e a validade da sua aplicação.


16. Validade essa que, assumida apenas em 2003, não veio a ser reconhecida até então apenas por mera opção legislativa, o que, associado ao mero decurso do tempo, determinou, no caso concreto dos militares que vieram a completar, entre o ano de 1999 e até àquela data, os 65 anos de idade previstos no n.º 4 do artigo 7.º da Lei n.º 15/92, de 5 de Agosto, o afastamento do regime agora repristinado.


17. Considero assim, não existir qualquer razão para que aos militares em causa não venha a ser agora reconhecido, à luz do princípio de justiça material, que enforma a noção de Estado de Direito Democrático, o direito vertido no artigo 7.º, n.º 4 da Lei n.º 15/92, de 5 de Agosto, devendo os mesmos passar a beneficiar, para efeitos do cálculo das respectivas pensões, do tempo decorrido até à data em que completaram, de facto, a idade naquele estabelecida.


18. Lembro, por último, que se trata de um universo bem definido e delimitado, assim facilitando a formação da vontade legislativa que se impetra.


Assim, nos termos do artigo 20.º, n.º 1, alínea b), do Estatuto do Provedor de Justiça – Lei n.º 9/91, de 9 de Abril, recomendo a Vossa Excelência







a adopção, por parte do Governo, de medida legislativa tendente à resolução, no sentido do entendimento perfilhado nos termos que antecedem, da situação em que actualmente se encontram os militares que, inicialmente abrangidos pelo regime de passagem à situação de reforma vertido no artigo 7.º, n.º 4 da Lei n.º 15/92, de 5 de Agosto, vieram a completar os 65 anos de idade naquele previstos, entre a revogação desta norma e a sua repristinação.


Conforme disposto no artigo 38.º da Lei n.º 9/91, de 9 de Abril, agradeço a Vossa Excelência que queira comunicar-me, no prazo aí definido, o acatamento desta Recomendação ou, porventura, o seu não acatamento, neste caso justificando-o.


O Provedor de Justiça,
H. Nascimento Rodrigues