RECOMENDAÇÃO N.º 1/A/05
(Artigo 20º, nº 1, alínea a), da Lei nº 9/91, de 9 de Abril)


Entidade visada: Secretário de Estado Adjunto e da Administração Educativa
Procº: R–1063/02 (A4)
Data: 2005/02/03
Assunto: Promoção, mediante concurso, a categoria superior. Nomeação por urgente conveniência de serviço. Produção de efeitos. Posicionamento na escala salarial da nova categoria.
Área: A4


1. XXXXX, funcionária do grupo de pessoal administrativo do quadro de vinculação do distrito da Guarda, em exercício de funções na Escola Básica dos 2.º e 3.º Ciclos de S. Miguel, distrito da Guarda, dirigiu-me uma reclamação, baseada, em síntese, no facto de não se conformar com o posicionamento remuneratório que lhe foi fixado na sequência da promoção a ecónoma especialista — escalão 1, índice 260 —, alegando que, na categoria imediatamente anterior, estava já posicionada em escalão a que correspondia o mesmo índice.


2. Apurados os factos e apreciada a questão em sede instrutória do processo a que a referida reclamação deu origem, concluiu a Provedoria de Justiça pela inteira procedência desta, tendo, em consequência, convidado a Direcção-Geral dos Recursos Humanos da Educação a reformar a situação da Reclamante, nos termos dos ofícios n.º 1167 e n.º 17382, respectivamente, de 23 de Janeiro e de 6 de Novembro de 2003.


3. Muito embora aquela Direcção-Geral haja transmitido, a final, e a coberto do ofício n.º 5361, de 23 de Março de 2004, que tal possibilidade estava afastada, entendo que as razões alegadas, que se resumem à afirmação da inexistência de ilegalidade e à conveniência administrativa, impõem a minha intervenção junto de V. Exa.


4. Importa, assim, retomar os seguintes factos essenciais (1):








– a Reclamante, por aplicação dos n.ºs 2, alínea b), e 3 do artigo 2.º do Decreto Regulamentar n.º 30-A/98, de 31 de Dezembro, transitou para a categoria de ecónoma principal e foi posicionada no escalão 3, índice 235;


– em 1 de Janeiro de 1998, progrediu ao escalão seguinte, índice 245, e, em 1 de Janeiro de 2001, ao escalão 5, índice 260;


– em 19 de Janeiro de 2001, no Diário da República, II Série, n.º 16 – AP. N.º 7, é publicado o Despacho n.º 424/2001, de 1 de Agosto de 2000, nomeando a Reclamante, entre outros, na categoria de ecónoma especialista, escalão 1, índice 260, “(…) por urgente conveniência de serviço, com efeitos a partir de 1 de Agosto de 2000(…)”;


– só em 19 de Janeiro de 2001 a Reclamante aceita a nomeação, sendo então reposicionada, com efeitos a 1 de Agosto de 2000, no escalão 1, índice 260, da escala salarial da nova categoria, nos termos do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 353-A/89, de 16 de Outubro, em função, portanto, do posicionamento que detinha naquela data (escalão 4, índice 245) e não do que alcançara entretanto (escalão 5, índice 260).



5. Para determinar o posicionamento salarial devido em virtude da promoção a categoria superior, questão que constitui o objecto da reclamação, importa definir o momento a partir do qual o acto de nomeação se tornou eficaz, isto é, há que esclarecer se este acto é susceptível de produzir efeitos logo a partir da data da sua prolação, em 1 de Agosto de 2000, como sustenta a Direcção-Geral dos Recursos Humanos da Educação, ou se, diversamente, os seus efeitos se produzem a partir de 19 de Janeiro de 2001, data da respectiva publicação e aceitação.


Esse acto de nomeação foi, na verdade, proferido “por urgente conveniência de serviço” em 1 de Agosto de 2000 e, nos seus próprios termos, “com efeitos” a partir desta mesma data. Mas não se pode pretender que, no caso, a simples menção da urgente conveniência de serviço seja determinante.


O regime da urgente conveniência de serviço permitia que os actos relativos à situação e movimentação de pessoal, enquanto estiveram sujeitos ao visto prévio do Tribunal de Contas, fossem executados ou produzissem efeitos antes de serem visados e publicados no Diário da República (cfr. artigo 3.º, nºs. 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 146-C/80, de 22 de Maio).


A indicação de urgente conveniência de serviço conferia, portanto, executoriedade ao acto. De todo o modo, e como sustentou João Alfaia (2), porque a lei era omissa quanto à investidura consequente deste tipo de nomeação, para que os diplomas de provimento produzissem efeitos antes de obtido o visto, não podia ser dispensada a investidura. Em causa mais não estava do que permitir a executoriedade antes do visto do Tribunal de Contas e da publicação, pelo que a solução seria assim “a de conferir, logo que possível e antes do exercício de funções, a referida investidura através da posse.”


Ora, o que acontece é que a urgente conveniência de serviço não tinha já existência legal no momento em que o despacho de nomeação foi proferido, pois desde Janeiro de 1999 que todos os actos em matéria de pessoal da função pública deixaram de estar sujeitos a fiscalização prévia do Tribunal de Contas (cfr. artigo 114.º da Lei n.º 98/97, de 26 de Agosto).


Mas, ainda que admita que a mesma pudesse ter sido validamente invocada, na medida em que, para a nomeação, em qualquer das suas modalidades, se mantém a exigência da publicidade (cfr. artigo 34.º do Decreto-Lei n.º 427/89, de 7 de Dezembro), parece-me incontestável a sua irrelevância jurídica neste caso.


É que, muito embora haja sido reconhecida expressamente, essa urgente conveniência de serviço foi insusceptível de conferir executoriedade ao despacho. Que assim foi, demonstra-o o facto de se ter aguardado pela publicação para que se iniciasse a sua execução, pois, como se sabe, a Reclamante não foi, desde logo, chamada a aceitar a nomeação, nem passou a desempenhar funções diferenciadas em exigências, complexidade e responsabilidade (3) e a ser remunerada pela nova categoria, tendo antes progredido efectivamente ao escalão seguinte da categoria de que ainda permanecia titular.


E faço notar, aliás, que tanto bastaria para retirar todo e qualquer fundamento àquela menção, sendo certo que também não foram apresentados quaisquer factos ou aduzidas razões concretas que a justificassem.


Considerar, nestas circunstâncias, portanto, que a nomeação se verifica no momento da prática do despacho, equivale, no fundo, a atribuir-lhe efeitos retroactivos, em clara e inequívoca violação do disposto no n.º 2, alínea a), do artigo 128.º do Código do Procedimento Administrativo. É óbvio que ao atender-se à situação detida em momento anterior para efeitos de integração no escalão de promoção, desprezando a progressão entretanto operada, se penaliza a Reclamante naquilo que é essencial nesta evolução na carreira: o aumento da remuneração, garantido pelo impulso salarial relativamente à categoria precedente expressamente determinado na lei (cfr. artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 353-A/89, de 16 de Outubro).


Afastada a relevância da urgente conveniência de serviço, não pode senão atender-se à data de 19 de Janeiro de 2001, data da publicação e da aceitação, para a determinação da produção dos efeitos do acto.


De acordo com o já citado artigo 34.º do Decreto-Lei n.º 427/89, de 7 de Dezembro, a nomeação, em qualquer das suas modalidades, está sujeita a publicação no Diário da República, ainda que por extracto. Depois, o artigo 130.º do Código do Procedimento Administrativo determina que, enquanto não for publicado, o acto administrativo é ineficaz.


Por sua vez, e nos termos do artigo 12.º do mesmo Decreto-Lei n.º 427/89, a aceitação fixa, em regra, o início de funções para todos os efeitos legais, designadamente, o abono de remunerações e contagem de tempo de serviço.


Neste condicionalismo legal, impõe-se a conclusão de que o despacho que nomeia a Reclamante na nova categoria só se tornou eficaz com a publicação e com a imediata aceitação em 19 de Janeiro de 2001, não produzindo antes disso quaisquer efeitos. Até lá tudo permaneceu no estado originário, operando-se, portanto, a progressão na categoria anterior, à qual se deve atender para efeitos de determinação do escalão de promoção, nos termos do disposto no artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 353-A/89, de 16 de Outubro.


Finalmente, e porque é patente a ilegalidade deste despacho, entendo que não colhem as razões de organização administrativa invocadas para a sua manutenção. A eficiência administrativa não pode ser alheia à realização da legalidade e os órgãos administrativos prosseguem o interesse público no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos (cfr. artigo 266.º, n.º 1, da Constitutição da República Portuguesa, e artigo 4.º do Código do Procedimento Administrativo).


De resto, não pode haver dúvidas quanto à natureza do despacho de nomeação que, sendo embora um acto plural, integra tantos actos únicos quantos os respectivos destinatários, a cuja situação é imperioso atender.


6 Nestes termos, e ao abrigo do disposto no artigo 20.º, n.º 1, alínea a), da Lei n.º 9/91, de 9 de Abril, tenho por bem formular a V. Exa. Recomendação no sentido de:








ser corrigido o posicionamento salarial da Reclamante decorrente da promoção a ecónoma especialista, reconhecendo-se-lhe o direito ao escalão 2, índice 270, desde 19 de Janeiro de 2001, data em que foi publicado o despacho de nomeação e se verificou a respectiva aceitação.



Permito-me lembrar a V. Exa. que, nos termos do disposto nos nºs. 2 e 3 do artigo 38.º da Lei n.º 9/91, de 9 de Abril, deve ser comunicada a este órgão do Estado a posição que vier a ser assumida sobre a Recomendação ora formulada.


O Provedor de Justiça,

H. Nascimento Rodrigues


 


Notas de rodapé:


(1) Transmitidos através dos ofícios n.º 19902 e n.º 39389 da Direcção Regional de Educação do Centro, cujas cópias foram remetidas à Direcção-Geral dos Recursos Humanos da Educação, pelo ofício n.º 1167, de 23 de Janeiro de 2003, da Provedoria de Justiça.
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(2) JOÃO ALFAIA, in “Conceitos fundamentais do regime jurídico do funcionalismo público”, Vol. I, pág. 390.
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(3) Como é próprio, nas carreira verticais, do acesso à categoria superior e se infere dos artigos 4.º e 5.º, alínea a), do Decreto-Lei n.º 248/85, de 15 de Julho.
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