ANOTAÇÃO


Entidade visada: Ministério da Agricultura
Proc.º: R-1590/04



Assunto
: Cálculo da remuneração horária descontada aos trabalhadores pelos períodos de ausência por motivo de greve.



Objecto: Aplicação uniforme pela Administração do cálculo do desconto.


Decisão: Foi transmitida ao Secretário de Estado da Administração Pública a posição deste órgão de Estado segundo a qual se deverá aplicar a fórmula contida no art.º 6º do DL nº 353-A/89, de 16 de Outubro, em detrimento da aplicação do disposto no art.º 4º do Decreto-Lei nº 42.046, de 23 de Dezembro de 1958. Em resposta, foi o Provedor de Justiça informado de que em 2007, na sequência da “Lei da Reforma dos Regimes de Vinculação, de carreiras e de Remuneração na Função Pública” será ponderada a matéria em causa tendo-se em consideração a posição assumida.



Síntese
:



Uma organização sindical apresentou neste órgão de Estado queixa relativa à forma de proceder quanto aos dias de desconto da remuneração motivada pelo exercício do direito à greve, afirmando que “… na generalidade dos serviços e organismos da Administração Pública a remuneração descontada por um dia de greve é calculada como 1/30 (a trigésima parte) do respectivo vencimento mensal, no Ministério da Agricultura calcula-se o valor da remuneração horária que depois é multiplicado pelo número de horas de trabalho do dia de greve, o que constitui uma fórmula com consequências muito gravosas pois implica o desconto por uma quantia superior”.


A esta queixa juntaram-se outras de funcionários de serviços do Ministério da Agricultura.


Não deixou de causar alguma surpresa a afirmação de que a generalidade dos serviços desconta por cada dia de greve, 1/30 do vencimento mensal, quando, desde há muito, se mantém a regra, claramente expressa nos n.ºs 1 e 2 do artigo 6º do Decreto-Lei nº 353-A/89, de 16 de Outubro, de que “para todos os efeitos legais, o valor da hora normal de trabalho é calculado através da fórmula RbX12/52XN, sendo Rb a remuneração mensal e N o número de horas correspondentes à normal duração semanal de trabalho” e que “a fórmula referida no número anterior serve de base ao cálculo da remuneração correspondente a qualquer fracção de tempo de trabalho”.


Num dos documentos enviados ao processo, de uma direcção de serviços do MADRP, consta, efectivamente, que o desconto do vencimento resultante de dias de greve “sempre foi efectuado com base mensualizada, através do cálculo de 1/30 avos do vencimento ilíquido, situação prevista na aplicação informática, concebida e gerida pela Secretaria-Geral do M.A.D.R.P.”


Nas queixas, refere-se o Despacho Conjunto da PCM e dos Ministérios da Administração Interna e das Finanças, de 19/03/76, mas invoca-se o artigo 4º do Decreto-Lei nº 42046, de 23 de Dezembro de 1958 (!), citado num parecer da Procuradoria-Geral da República, de 29/03/89.



Este órgão de Estado veiculou a sua posição para a DGAP e posteriormente para o Secretário de Estado da Administração Pública, entendendo em síntese, que do nº 1 do artigo 19º do Decreto-Lei nº 100/99, de 31 de Março, se retira que a ausência por exercício do direito à greve “implica a perda do vencimento correspondente ao período de trabalho” .


A remuneração de qualquer período de ausência deverá ser aferida tendo em conta o disposto na norma citada do Decreto-Lei nº 353-A/89.


Desconhecendo-se a dimensão que terá assumido a posição denunciada pelo sindicato queixoso, admite-se que, eventualmente tenha apoio teórico no Parecer do Conselho Consultivo da P.G.R. POO0221989, mas haverá que ter em conta, além do mais, que este parecer foi emitido antes da publicação do Decreto-Lei nº 353-A/89.


Mesmo assim, entendeu-se que, salvo melhor opinião, seria de considerar que o Decreto-Lei nº 42.046, de 23 de Dezembro de 1958, cujo artigo 4º estabelecia que para efeitos da determinação do ” … vencimento diário considerar-se-á o mesmo correspondente a 1/30 do vencimento mensal”, se teria este de se considerar revogado por outros diplomas que vieram posteriormente a reajustar as condições de remuneração dos funcionários públicos (1).


O regime constante do DL nº 42.048 ao estabelecer uma fórmula de cálculo da remuneração diária de trabalho, partindo do pressuposto de que o vencimento diário seria correspondente a 1/30 do vencimento mensal, assentava numa realidade diversa daquela em se fundamentou a fórmula de cálculo da remuneração diária constante do DL nº 353-A/89. Efectivamente, naquele caso, partia-se do pressuposto de que, face à mensualização da remuneração, o cálculo da remuneração diária de trabalho seria correspondente a 1/30, daquela remuneração, o que não correspondia à realidade.


A referência à expressão “qualquer outra fracção de tempo”, no âmbito da evolução legislativa verificada, parece inculcar a intenção clara do legislador no sentido de afastar dúvidas quanto ao alcance da medida. Com efeito, se bem que não tivesse sido publicado, à data da vigência dos diplomas em causa, diploma relativo a duração de trabalho na função pública, no entanto, com a publicação da Resolução do Conselho de Ministros nº 142/79, de 11/05, a duração de trabalho na função pública passou, na prática, a limitar-se a cinco dias semanais, sendo que, pelo menos, a partir desta altura, o cálculo da remuneração horária era feito em função dos dias de efectiva prestação de trabalho.


Assim, afigura-se que, legalmente, não devem existir dúvidas de que a remuneração correspondente a qualquer fracção de tempo de trabalho deve ser a determinada pela fórmula constante do artigo 6º do Decreto-Lei nº 353-A/89, a não ser que se entendesse, o que não parece credível, que um dia não é uma fracção de tempo de trabalho em que a medida padrão é a remuneração mensal.


 


 


Nota de rodapé:


(1) A evolução legislativa nesta matéria, na ausência de revogação expressa do regime constante do DL nº 42.046 parece apontar no sentido defendido por este órgão de Estado. Com efeito, já o Decreto-Lei nº 294/75, de 16 de Junho, em que se apoiou o Despacho Conjunto da Presidência do Conselho de Ministros e Ministérios da Administração Interna e das Finanças de 19 de Março de 1976, estabelecia, no nº 3 do artigo 1º, a fórmula da remuneração horária. Posteriormente, em sede de diplomas de vencimentos da função pública, nomeadamente no DL nº 204-A/79, previa-se no o art.º 5º o seguinte: “Para todos os efeitos legais o valor da hora de trabalho é calculado na base da fórmula vx12/52xn, sendo v a remuneração mensal e n o número de horas correspondentes ao horário semanal. A fórmula referida no número anterior servirá de base de cálculo da remuneração correspondente a qualquer outra fracção de tempo de trabalho” Já o art.º 7º do DL nº 106/78, relativo às remunerações do funcionalismo público de 1978, estabelecia, no art.º 7º idêntica fórmula. No âmbito da actualização das remunerações para o ano de 1977, por força do DL nº 923/76, o disposto no art.º 3º, nº2 limitava a fórmula em causa ao nº 1 do disposto no art.º 5º do atrás referido DL nº 204-A/79. Os diplomas que se lhe seguiram consagraram disposições semelhantes, até que o artigo 28º do Decreto-lei nº 110-A/81, de 14 de Maio, veio a ser revogado pelo artigo 36º do Decreto-Lei nº 187/88, de 27 de Maio, que manteve, no artigo 31º, a fórmula de cálculo da remuneração horária mas não estabeleceu a menção à sua utilização “… para qualquer fracção de tempo” que, porém, veio a ser retomada no Decreto-Lei nº 353-A/89. Aquele diploma, sobre duração e horário de trabalho, ao manter a fórmula de cálculo da remuneração horária sem a menção da sua aplicação a qualquer fracção de tempo, resultou, certamente, do facto de, de acordo com o seu articulado (art.º 5º), a semana de trabalho ter passado a decorrer, em regra, de segunda a sexta-feira, não se considerando, a partir daí, o sábado e o domingo como dias susceptíveis de serem contados para determinação do valor hora do trabalho, o que já se vinha verificando.



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