S.Exa.


O Secretário de Estado da Administração Pública


Av. Infante D. Henrique


1149-009 LISBOA



 


Assunto: Reclamação apresentada na Provedoria de Justiça. Carreira de apoio à investigação e fiscalização do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF).



 


 


Um grupo de funcionários do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), que se encontravam integrados na carreira especial de apoio à investigação e fiscalização, com a categoria de especialista-adjunto principal, requereu a intervenção do Provedor de Justiça, por discordar da transição para a categoria de assistente técnico, determinada na sequência da extinção da referida carreira de regime especial pelo Decreto-Lei n.º 121/2008, de 11 de Julho (arts. 4.º e 9.º e mapa III anexo).



Invocam os reclamantes que deveriam ter sido integrados na categoria de coordenador técnico da mesma carreira, sem o que vêem substancialmente reduzidas as possibilidades de progressão remuneratória, na medida em que a categoria em que foram colocados contém um desenvolvimento remuneratório inferior ao da sua categoria de origem.



Alegam, de resto, que alguns destes trabalhadores estão a ser remunerados pela posição remuneratória complementar mais elevada da categoria de assistente técnico, pelo que já não têm qualquer expectativa de evolução retributiva na mesma categoria, ao contrário do que sucedia na sua anterior carreira. Não questionam, pois, a opção legislativa de extinguir a carreira especial de apoio à investigação e fiscalização, mas tão só os termos em que se processou a transição para as carreiras gerais dos trabalhadores nela integrados.



 


A apreciação da pretensão enunciada suscitou questões de relevo que me cumpre submeter à apreciação de V.Exa.



Para tanto, importa que, depois de convocados os critérios legais de definição e transição de carreiras, se proceda à análise da referidas carreira e categoria de regime especial do SEF, a fim de, à luz daquele quadro orientador, se aferir da idoneidade da solução legal em vigor.



Para além do grau de complexidade funcional e da estrutura remuneratória, a caracterização das carreiras gerais passa necessariamente pela definição do respectivo conteúdo funcional, uma vez que, nos termos do art. 43.º, n.º 3, da Lei n.º 12-A/2008, “a cada carreira, ou a cada categoria em que se desdobre, corresponde um conteúdo funcional legalmente descrito“.



Neste plano, resulta do anexo à Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, que a categoria de coordenador técnico, para além de integrar funções de natureza técnica e administrativa(1), distingue-se da categoria inferior da mesma carreira pela complexidade das funções e grau de autonomia, assim como pelas tarefas de coordenação.



Por outro lado, no que respeita às regras de transição para a carreira de assistente técnico, importa ter em conta o disposto no art. 96.º, n.º 1, nos termos do qual devem transitar para a categoria de coordenador técnico daquela carreira “os actuais trabalhadores que:


a) Sejam titulares da categoria de chefe de secção;


b) Sejam titulares da categoria de coordenador das carreiras de técnico-profissional de regime geral;


c) Sejam titulares de categorias diferentes das referidas nas alíneas anteriores cujos grau de complexidade funcional e conteúdo funcional sejam idênticos aos daquela categoria“.



Por seu turno, o art. 97.º, n.º 1, determina a transição para a categoria de assistente técnico da mesma carreira “[d]os actuais trabalhadores que:


a) Se encontrem integrados nas carreiras de assistente administrativo de regime geral;


b) Se encontrem integrados nas carreiras de tesoureiro de regime geral;


c) Sem prejuízo do disposto no artigo anterior, se encontrem integrados nas carreiras de técnico profissional de regime geral;


d) Se encontrem integrados em carreiras ou sejam titulares de categorias diferentes das referidas nas alíneas anteriores cujos grau de complexidade funcional e conteúdo funcional sejam idênticos aos daquela categoria“.



De acordo com o n.º 3 de ambos os preceitos, as carreiras e categorias referidas nas alíneas d) dos respectivos ns. 1 seriam definidas por decreto-lei, a publicar no prazo de 180 dias, tarefa levada a cabo pelo já referido Decreto-Lei n.º 121/2008, que visou, como refere o respectivo preâmbulo, “concretizar a extinção das actuais carreiras de regime geral ou especial, de categorias específicas e de corpos especiais, cujos conteúdos funcionais e requisitos habilitacionais permitem o seu enquadramento nas carreiras gerais, mediante a transição dos trabalhadores nelas actualmente integrados para essas novas carreiras“.



Do regime exposto resulta que este diploma, ao proceder à extinção de carreiras e à integração dos respectivos trabalhadores nas carreiras e categorias gerais, teve que seguir os critérios enunciados na Lei n.º 12-A/2008, ou seja, a identidade de conteúdo e de grau de complexidade funcionais.



Assim, ajuizar da adequação da solução legal consagrada – e, desse modo, da questão suscitada junto deste órgão do Estado – impõe particular atenção na análise da carreira de apoio à investigação e fiscalização do SEF e, em especial, da categoria de especialista-adjunto principal, em ordem a aferir com qual das categorias da carreira de assistente técnico aquela apresenta maior afinidade ou semelhança, à luz dos aludidos critérios(2).



A título prévio, justifica-se, porém, recordar que, até à entrada em vigor da nova orgânica do SEF, consagrada no Decreto-Lei n.º 252/2000, de 16 de Outubro, este serviço apenas dispunha de uma carreira de regime especial – a carreira de investigação e fiscalização –, estando o demais pessoal integrado nas carreiras de regime geral (cfr. arts. 46.º e segs. do Decreto-Lei n.º 440/86, de 31 de Dezembro, e mapa anexo ao mesmo diploma).



Com a nova lei orgânica e com a aprovação do novo Estatuto do Pessoal pelo Decreto-Lei n.º 290-A/2001, de 17 de Novembro, passou a prever-se um corpo especial – integrado pelo pessoal dirigente, pela carreira de investigação e fiscalização e pela carreira de vigilância e segurança – e uma carreira de regime especial, a carreira de apoio à investigação e fiscalização, reservando-se as carreiras de regime geral para o pessoal de informática, auxiliar e operário (art. 57.º do Decreto-Lei n.º 252/2000 e art. 2.º do Estatuto do Pessoal).



A carreira especial de apoio à investigação e fiscalização compreendia as seguintes categorias:


especialista superior, para onde transitaram os técnicos superiores e os chefes de repartição,


especialista, que integrou o pessoal da carreira técnica,


especialista-adjunto principal, onde foi integrado o pessoal detentor da categoria de chefe de secção e


especialista-adjunto, para onde transitaram todos os demais funcionários dos grupos de pessoal administrativo e técnico-profissional(3).



Cada uma das categorias referidas compreendia mais do que um nível (os quais, por seu turno, se desdobravam em 4 escalões), pelo que, na transição referida, a diferenciação da categoria de origem reflectiu-se no nível em que foram integrados. No caso da categoria a que respeita a questão que nos ocupa, interessa reter que nela foram integrados apenas os anteriores funcionários com a categoria de chefe de secção, os quais, de acordo com o disposto no art. 3.º, n.º 4, alínea d), e n.º 5, do Decreto-Lei n.º 290-A/2001, foram colocados no nível 2, em escalão a que correspondia índice remuneratório igual ou imediatamente superior, no caso de falta de identidade entre os escalões.



No que respeita à categoria onde se encontravam integrados os reclamantes – a de especialista-adjunto principal – pode a mesma caracterizar-se, por referência aos factores supra erigidos como essenciais e tendo por base o regime jurídico constante do referido Estatuto do Pessoal do SEF(4), do seguinte modo:



a) conteúdo funcional: nos termos do art. 60.º, ao especialista-adjunto principal incumbia, genericamente:


– “Coordenar e orientar o pessoal que lhe esteja adstrito;


Elaborar informações tendo em vista preparar a tomada de decisões sobre medidas que se integram nas actividades de apoio à investigação e fiscalização;


Coadjuvar os especialistas superiores;


Executar outras tarefas que lhe sejam determinadas no âmbito das funções da carreira de apoio à investigação e fiscalização“;



b) desenvolvimento indiciário:

























NÍVEL


ESCALÕES


1


2


3


4


1


390


410


430


460


2


350


370


390


410



 


 


 


 


 


c) funções de chefia: o provimento dos cargos de chefia correspondentes a chefe de núcleo e a chefe de delegação de tipo 2 fazia-se, por regra, de entre especialistas-adjuntos principais, com comprovada experiência profissional (art. 18.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 290-A/2001).



A caracterização da categoria, nos termos expostos, permite-nos dar por assente, em primeiro lugar, que o respectivo conteúdo funcional apresenta maiores afinidades com a categoria de coordenador técnico do que com a de assistente técnico, desde logo por integrar funções de coordenação e de orientação de outro pessoal. Note-se que, ao contrário dos especialistas-adjuntos principais, os trabalhadores integrados na categoria imediatamente inferior (a de especialista-adjunto) executavam trabalhos de apoio “a partir de instruções concretas“, ou seja, com grau de autonomia e responsabilidade inferior(5).



É, por outro lado, de salientar que a categoria de especialista-adjunto principal absorveu os anteriores chefes de secção, os quais, caso se tivessem mantido integrados nas carreiras gerais, ao abrigo da faculdade prevista no art. 3.º, n.º 8, do Decreto-Lei n.º 290-A/2001, teriam transitado para a categoria de coordenador técnico por força do disposto no art. 96.º, n.º 1, alínea a), da Lei n.º 12-A/2008, supra citado.



O que significa que, quando foi criada aquela carreira de regime especial, foi considerado existir afinidade suficiente entre as categorias de chefe de secção e de especialista-adjunto principal para determinar a transição dos trabalhadores integrados na primeira para a segunda. Mal se compreende, portanto, que na transição agora determinada se ignore e retire qualquer efeito a tal equivalência.



Verifica-se, ainda, que o desenvolvimento indiciário da categoria em causa aproximava-se mais da estrutura remuneratória das categorias cujos trabalhadores, por força do disposto no art. 96.º, n.º 1, alíneas a) e b), da Lei n.º 12-A/2008, foram integrados na categoria de coordenador técnico. Assim sucede com a categoria de chefe de secção (que compreendia índices entre o 337 e o 460) e com a categoria de coordenador da carreira de técnico-profissional do regime geral (com desenvolvimento indiciário entre o 360 e 450).



Ao invés, não se verifica qualquer afinidade com a estrutura remuneratória de qualquer das demais categorias dos ex-grupos de pessoal administrativo ou técnico-profissional, e cujos trabalhadores foram integrados na categoria de assistente técnico, desde logo por em nenhum caso ser ultrapassado o índice 360.



Assim, a transição dos anteriores especialistas-adjuntos principais do SEF para nova categoria com estrutura remuneratória bastante inferior à da categoria de origem permite compreender as reduzidas possibilidades de evolução remuneratória na nova categoria, invocadas por aqueles trabalhadores.



Chegados a este ponto, afigura-se suficientemente demonstrada a necessidade de ser reponderada a opção tomada quanto à transição dos trabalhadores detentores da categoria de especialista-adjunto principal do SEF e, em especial, questionar-se se não teria sido mais adequada a sua integração na categoria de coordenador técnico da carreira de assistente técnico.



Em face do exposto, solicito a V.Exa. que, nos termos do disposto no art. 29º da Lei n.º 9/91, de 9 de Abril, se digne promover a apreciação da questão à luz das considerações desenvolvidas e a comunicação a este órgão do Estado da posição que vier a ser tomada sobre o assunto.



Com os melhores cumprimentos,



 


A Provedora-Adjunta de Justiça



 


 


Helena Vera-Cruz Pinto



 


_________


(1) Desde logo porque o conteúdo funcional da categoria de coordenador técnico integra o da categoria inferior, ou seja, a de assistente técnico (art. 42.º, n.º 5, da Lei n.º 12-A/2008).


(2) De todo modo, o grau de complexidade funcional não constitui, no caso, factor decisivo, na medida em que ambas as categorias da carreira de assistente técnico são de grau 2, ou seja, é exigível, em qualquer caso, a titularidade do 12.º ano de escolaridade ou de curso que lhe seja equiparado [cfr. art. 44.º, n.º 1, alínea a) e anexo da Lei n.º 12-A/2008].


Cfr. art. 2.º, n.º 2, do Estatuto do Pessoal e art. 3.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 290-A/2001.


Normas entretanto revogadas pelo Decreto-Lei n.º 121/2008 (cfr. Mapa VIII).


Cfr. art. 61.º do Decreto-Lei n.º 290-A/2001.