Fora apresentada queixa contra a Câmara Municipal de Pombal, reclamando o exercício dos poderes conferidos pelo art. 89º do Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação, para corrigir a insegurança de uma edificação.


Apurou-se ter sido ordenada a execução de obras de conservação, não apenas à proprietária do edifício mas também à arrendatária (queixosa). Apurou-se, também, que o objecto dessa ordem incluía aspectos alheios à degradação da edificação propriamente dita como, por exemplo, o alojamento de um determinado canídeo no local.


Ao invés, quando seria de prever a especificação dos trabalhos a executar, a C.M. de Pombal limitou-se a ordenar que fossem colmatadas as deficiências recenseadas.


Ouvida a Câmara Municipal, esta considerou exaurida a sua competência para agir, por entender que:


– não lhe cumpriria especificar os trabalhos a empreender pela senhoria e/ou pela inquilina, sob pena de invadir a resolução de um conflito privado;


– não poder executar coercivamente as obras em falta, sob pena de se substituir à inquilina na propositura de acção judicial que lhe assiste;


– não pretender prejudicar a inquilina com o seu desalojamento temporário, ao que se crê, indispensável.


Analisado o assunto, foram comunicadas, por S. Ex.a o Provedor de Justiça ao Senhor Presidente da Câmara Municipal, as seguintes conclusões:


– independentemente do facto de uma edificação estar, ou não, arrendada, a defesa da segurança e salubridade das edificações – e o exercício dos poderes conferidos pelos artigos 89.º e segs. do RJUE – constitui uma atribuição municipal, pois de há muito se entendeu que os riscos próprios da falta de conservação das edificações urbanas são demasiado intensos para que possam ser deixados ao critério dos mais directos interessados;


– o destinatário da intimação municipal é e só pode ser o proprietário (n.º4 do art. 89º), pois é ele que responde administrativamente, sendo irrelevante para o município saber se o imóvel se encontra devoluto ou tomado de arrendamento, dado de comodato ou usado por terceiros, sendo a relação jurídica que envolve o município é determinada propter rem;


– incumprida a intimação pelo proprietário, contanto que regularmente notificado ou por outro meio legítimo conhecedor da intimação, justifica-se a execução coerciva pelo município (artigo 91.º), precedendo posse administrativa e a expensas do infractor, havendo despejo, ou não, conforme as exigências da operação, mas segundo um critério de indispensabilidade, conferindo-se ao arrendatário o direito a ser alojado, nos termos do Decreto-Lei n.º 157/2006, de 8 de Agosto;


– sem prejuízo da discricionariedade na formulação dos critérios de actuação coerciva, estes não podem fugir a considerações de prudência e necessidade, mostrando-se determinante a intensidade do risco ou mesmo do perigo, ao ponto de o município poder ser chamado a responder civilmente por não se ter substituído ao proprietário a tempo de evitar graves danos patrimoniais e pessoais para terceiros;


– as obras susceptíveis de constituir objecto da intimação são, apenas, as benfeitorias urgentes e necessárias que permitam assegurar o mínimo das condições de dignidade da casa de morada, o mínimo de segurança e salubridade;


Em conformidade com estas conclusões, foi sugerida ao Senhor Presidente da Câmara Municipal a adopção de um entendimento menos restritivo dos poderes e deveres que assistem às câmaras municipais em matéria de polícia administrativa das edificações, propondo-se, designadamente:


– a emissão de nova intimação da proprietária com especificação dos trabalhos a executar;


– a simples notificação da inquilina para conhecimento;


– instauração de procedimento contra-ordenacional;


– a ponderação adequada da substituição coactiva, na hipótese de a proprietária reincidir no incumprimento, deixando agravar as condições de insalubridade e insegurança.


Em resposta, o Senhor Presidente da Câmara Municipal de Pombal informou ter procedido em conformidade com as sugestões formuladas, determinando a renovação da intimação, com discriminação dos trabalhos a executar, e a instauração de procedimento contra-ordenacional em caso de desobediência.


Perante estes resultados, que permitem identificar uma revisão positiva do anterior entendimento municipal, a intervenção do Provedor de Justiça foi concluída.