Processo: R-5727/08







Assunto: Saúde; Serviço Nacional de Saúde.


Objecto: Queixa apresentada contra a obrigatoriedade de realização de análises clínicas prescritas em centro de saúde no hospital da área de residência.


Decisão: Elucidação do queixoso quanto à licitude do actual regime de optimização dos recursos, promovendo a realização das análises prescritas nos centros de saúde no hospital com o qual se articulam.



Síntese:



1. Recebeu-se uma exposição referente à obrigatoriedade de realização das análises clínicas prescritas nos centro de saúde, no hospital com quem se articulam.



2. As directrizes da política de saúde nacional, previstas na Base II da Lei de Bases da Saúde (Lei n.º 48/90, de 24 de Agosto) estabelecem, designadamente, que “a gestão dos recursos disponíveis deve ser conduzida por forma a obter deles o maior proveito socialmente útil e a evitar o desperdício e a utilização indevida dos serviços” (alínea e)].



3. Por outro lado, o regime jurídico da gestão hospitalar, aprovado pela Lei n.º 27/2002, de 8 de Novembro, prevê, por sua vez, no âmbito dos princípios específicos da gestão dos hospitais, a necessidade de estes garantirem aos utentes a prestação de cuidados de saúde de qualidade com um controlo rigoroso dos recursos, bem como de desenvolverem uma gestão criteriosa e promoverem a articulação funcional da rede de prestação de cuidados de saúde.



4. Na verdade, esta última norma permitiria, como sucede em outras unidades hospitalares nacionais, que as análises prescritas nos Centros de Saúde da área de influência do Hospital também sejam realizadas nesse mesmo Hospital, claro está que até ao limite da capacidade instalada. Por maioria de razão, tal orientação também é aceitável quanto às análises prescritas internamente, seja na urgência, em internamento ou em consulta externa.



5. Reconheceu-se, por conseguinte, que a medida adoptada, no sentido de a realização das análises clínicas ser efectuada no próprio Hospital, não só respeita todos os princípios e normas enumeradas, como visa alcançar as suas pretensões, numa procura de aproveitamento adequado dos equipamentos e meios de que dispõe, de gestão optimizada dos seus recursos financeiros.



6. Com efeito, se existe capacidade técnica para responder às necessidades de diagnóstico verificadas no seu âmbito, o promover da realização das análises clínicas dos utentes que recorrem ao Hospital mais não é do que o aproveitamento dessa capacidade técnica instalada. Se essa medida possibilita a rentabilização dos recursos internos disponíveis, por permitir o controlo da despesa com entidades convencionadas e conseguir uma melhor relação de custo/benefício, assiste-se, por sua vez, a uma optimização na gestão financeira da instituição.



7. Ao contrário do que se alegava, não há uma dicotomia insuperável entre esta optimização e a missão da unidade hospitalar em causa, que é naturalmente a de prestar os melhores cuidados, em termos técnicos e humanos. A referida optimização significará certamente, num cenário orçamental conhecido mas em que a despesa com a Saúde não desceu, menos desperdício e mais recursos disponíveis para o melhoramento da capacidade de prestação de tais cuidados.



8. Existindo recursos capazes para um serviço adequado no próprio Hospital, seria má gestão não os utilizar (tendo os mesmos custos fixos) e adicionalmente custear o serviço prestado por terceiro.



9. Não foi igualmente possível encontrar nesta iniciativa a coarctação do direito do utente à liberdade de escolha. Na verdade, o que se verifica é que, no acto de se dirigirem ao Hospital, os utentes já estão, só por si, a exercer esse direito de livremente escolherem a entidade que pretendem que lhes preste os cuidados médicos necessários, ou seja, o Serviço Nacional de Saúde.



10. Anteriormente, o Hospital não disporia de meios que possibilitassem a realização das análises clínicas que solicitava. Agora, tendo essa capacidade, não faz sentido que uma entidade do Serviço Nacional de Saúde, podendo fazer certo exame, custeie a actividade, legítima embora, de terceiros, desaproveitando os recursos próprios e tendo que pagar a realização desse exame a terceiro.



11. Na verdade, o utente é livre de optar pela realização das análise numa entidade privada, à sua escolha, correndo todavia por sua conta os custos da mesma. Aqui, como noutras prestações sociais, não cabe ao Estado custear o direito de opção, antes lhe cabendo assegurar a concretização das mesmas. Isto mesmo se passa na educação, em que o Estado, como é natural, só oferece gratuitamente o ensino em estabelecimentos públicos, podendo os cidadãos optar livremente pelos estabelecimentos de ensino particular e cooperativo, pagando as respectivas propinas, caso assim julguem mais adequado.



12. Nada impede que o utente realize as suas análises no laboratório que bem entenda, correndo, naturalmente, os custos por sua conta. É importante não esquecer, neste passo, que o direito à liberdade de escolha no acesso à rede nacional de prestação de cuidados de saúde é reconhecido e deve ser exercido “com as limitações decorrentes dos recursos existentes e da organização dos serviços” (n.º 5 da Base V da Lei de Bases da Saúde).



13. Por fim, considerou-se que o exponente vivia numa zona muito bem servida de transportes públicos, que lhe permitiam aceder comodamente ao hospital em causa.