RECOMENDAÇÃO N.º 10/A/2003
(Artigo 20º, nº 1, alínea a), da Lei nº 9/91, de 9 de Abril)


Entidade visada: Presidente da Câmara Municipal de Guimarães
Procº: R-3747/02
Data: 2003/08/01
Área: A4
Assunto: Funcionários que ingressaram na carreira de técnico-adjunto de biblioteca e documentação, na sequência da aprovação no concurso aberto pelo aviso publicado no Diário da República – III Série, n.º 151, de 3 de Julho de 1997. Aplicação do Decreto-Lei n.º 404-A/98, de 18 de Dezembro, com as adaptações do Decreto-Lei n.º 412-A/98, de 30 de Dezembro.


I


Foi organizado na Provedoria de Justiça o presente processo a propósito da situação funcional de A e de B, ambos funcionários da Câmara Municipal de Guimarães, em cujo quadro ingressaram com a categoria de técnicos-adjuntos de biblioteca e documentação de 2.ª classe, após aprovação em concurso.


Na respectiva instrução, apuraram-se os seguintes factos relevantes:



1. Na sequência da aprovação no concurso aberto por aviso publicado em 3 de Julho de 1997, foram os interessados, entre outros, nomeados técnicos-adjuntos de biblioteca e documentação de 2.ª classe, por urgente conveniência de serviço, com efeitos a 2 de Fevereiro de 1998;


2. Em Janeiro de 1999, por força da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 412-A/98, de 30 de Dezembro, que veio tornar aplicável à administração local o Decreto-Lei n.º 404-A/98, de 18 de Dezembro, foram posicionados na categoria de técnico profissional de biblioteca e documentação de 1.ª classe, escalão 1, índice 215, de acordo com o disposto nos nºs. 2, alínea d), e 6 do artigo 20.º deste último diploma;


3. Todavia, em Junho de 1999, foi determinado o respectivo reposicionamento na categoria de técnico profissional de biblioteca e documentação de 2.ª classe, escalão 1, índice 190, por ter essa Autarquia concluído entretanto que as regras de transição daquele Decreto-Lei só deviam ser aplicadas às situações já constituídas na data a que se reporta a eficácia do mesmo, isto é, a 1 de Janeiro de 1998.



II


A questão que se coloca no presente processo consiste unicamente em saber se aos interessados, bem como a todos aqueles que se encontram em igual situação, deve ser reconhecido o direito à transição para a categoria de técnico profissional de biblioteca e documentação de 1.ª classe, nos termos do disposto no n.º 2, alínea d), e n.º 6, do artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 404-A/98, de 18 de Dezembro, aplicado à Administração Local pelo Decreto-Lei n.º 412-A/98, de 30 de Dezembro (1).


Sustenta V. Exa. que estes funcionários não são abrangidos pelas regras de transição estabelecidas no citado preceito legal, uma vez que o ingresso dos mesmos em carreira técnico-profissional de nível 4, reestruturada pelo Decreto-Lei n.º 404-A/98, de 18 de Dezembro, ocorreu em momento posterior ao da data da produção de efeitos deste diploma, que foi fixada em 1 de Janeiro de 1998. E considera por isso que o respectivo posicionamento na nova carreira criada em substituição daquela há-de ser efectuado de acordo com as regras do artigo 6.º desse mesmo Decreto-Lei.


No entanto, como tentarei demonstrar de seguida, este não se afigura um argumento válido para afastar, no caso, a aplicação das regras do artigo 20.º do mencionado Decreto-Lei n.º 404-A/98, nem tão pouco se afigura solução defensável o recurso às do artigo 6.º do mesmo diploma para determinar o posicionamento dos funcionários na actual estrutura da carreira técnico-profissional.


O Decreto-Lei n.º 412-A/98, de 30 de Dezembro, tornou aplicável à Administração Local, com as adaptações nele constantes, o Decreto-Lei n.º 404-A/98, de 18 de Dezembro, o qual, por sua vez, veio estabelecer as regras sobre o ingresso, acesso e progressão nas carreiras e categorias do regime geral da Administração Pública, bem como as correspondentes escalas salariais, consagrando ainda, em sede de disposições transitórias, normas de direito transitório material para adaptar as situações preexistentes.


Para a análise da questão em apreço, começa-se por invocar os artigos 26.º e 27.º daquele diploma, que dispõem, respectivamente, acerca da sua eficácia e vigência. Assim, e na parte que importa agora considerar, estatui-se, naquele primeiro artigo, que os efeitos do diploma se produzem a 1 de Janeiro de 1998 e, no segundo, que a sua entrada em vigor ocorre no dia seguinte ao da publicação, ou seja, a 31 de Dezembro de 1998.


Como se sabe, vigência e eficácia da lei são conceitos distintos e, no que a este diploma concerne, o início da sua vigência não coincide com o da produção dos seus efeitos.


Deste modo, muito embora o diploma tenha, na verdade, eficácia retroactiva, só a partir do momento da sua entrada em vigor é que ele se integrou na ordem jurídica com carácter obrigatório.


Ora, é inequívoco que em tal momento, isto é, em 31 de Dezembro de 1998, os interessados eram já funcionários públicos, providos definitivamente em categoria de carreira de técnico-adjunto do grupo de pessoal técnico-profissional, carreira esta que surge reestruturada, por fusão com a carreira de técnico auxiliar. As suas situações jurídicas encontravam-se, pois, nessa data, perfeitamente definidas de acordo com as regras estatutárias então vigentes.


Não pode por isso haver dúvidas acerca da necessidade da adaptação dessas situações à reestruturação introduzida, a qual deve, como é óbvio, efectuar-se pelo recurso às regras de direito transitório material que ele próprio consagra para esse efeito, ou seja, no caso, as regras da alínea d) do n.º 2 e do n.º 6 do artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 404-A/98, de 18 de Dezembro.


E, ao contrário do que V. Exa. entende, a tal não obsta a retroactividade da eficácia do diploma, que deve, naturalmente, ser ajustada em função do momento em que essas situações se constituíram, em termos idênticos aos, aliás, expressamente previstos para aqueles casos em que ocorreram mudanças de categoria ou escalão a partir de 1 de Janeiro de 1998.


Com efeito, o legislador, em sede de disposições transitórias, não considerou apenas as situações existentes em 1 de Janeiro de 1998, de forma estanque, mas abrangeu também a dinâmica das relações funcionais verificada entre essa data e a data em que o diploma efectivamente passou a integrar a ordem jurídica.


Assim, por exemplo, o artigo 22.º determina que a transição se efectua de acordo com a categoria e escalão detidos em 1 de Janeiro de 1998, sem prejuízo do reposicionamento decorrente das alterações posteriores, de acordo com as regras aplicáveis, sendo evidente que os efeitos desse reposicionamento se produzirão tão somente a partir do momento em que tais alterações se verificaram (v., também neste sentido, o n.º 5 da parte II da Circular Conjunta n.º 1/DGAP/DGO/98).


De resto, mal se compreenderia que estes e todos os outros funcionários em idênticas circunstâncias permanecessem com a sua situação funcional inalterada, continuando a reger-se por um quadro jurídico que entretanto havia sofrido profundas modificações, hipótese esta que, aliás, V. Exa. também não admite.


Mas se se concorda que essa situação funcional deve ser adaptada ao novo quadro, deve igualmente concordar-se que, para tanto, têm de aplicar-se as regras de transição nele estabelecidas, à luz das quais se determinará a categoria e a escala competente, bem como o posicionamento concreto que há-de caber a cada um, sendo certo, porém, e como decorre do que acima referi, que não se poderá nunca fazer reportar os efeitos da situação assim definida a um momento anterior ao da constituição daquela que lhe deu origem.


O que não pode é fazer-se uso, como se fez, das regras do artigo 6.º mencionado. Estas são regras dinâmicas, que regem prospectivamente o ingresso e acesso na nova carreira, criada em substituição das anteriores carreiras técnico-profissionais, de nível 3 e 4, e não contêm em si qualquer critério susceptível de conformar as situações já existentes. Além do mais, aplicá-las seria ignorar a pertença efectiva a uma carreira que desta se distingue.


Devo ainda sublinhar que não nos deve impressionar o facto de, por força da regra de transição aplicável, os funcionários em causa, que ingressaram, naturalmente, em carreira de nível 4 pela sua categoria de base, virem a aceder à categoria de técnico profissional de 1.ª classe, que constituiu já uma categoria de acesso da nova carreira técnico-profissional. É que, como se sabe, esta é, de facto, uma nova carreira e resultou da agregação da carreira de técnico-adjunto do grupo de pessoal técnico-profissional com a de técnico auxiliar do mesmo grupo, mas de nível inferior. E para a respectiva categoria de base transitaram apenas os que pertenciam a esta última e eram então técnicos auxiliares de 2.ª classe, tendo todos os que eram técnicos-adjuntos de 2.ª classe, para os quais se impunha solução diversa, transitado para a categoria de técnico profissional de 1.ª classe.


Assim sendo, porque, na data da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 412-A/98, de 30 de Dezembro, estes funcionários se encontravam já nomeados na categoria de técnico-adjunto de biblioteca e documentação de 2.ª classe da carreira de técnico-adjunto de biblioteca e documentação, os mesmos devem transitar para a categoria de técnico profissional de biblioteca e documentação de 1.ª classe da carreira técnico-profissional de biblioteca e documentação que a substitui, tal como transitaram todos os que eram titulares daquela categoria desde 1 de Janeiro de 1998 e nela se mantiveram até 31 de Dezembro deste ano. Todavia, porque só foram providos em 2 de Fevereiro de 1998, só a esta mesma data se poderão fazer reportar os efeitos dessa transição.



III


Pelo exposto, entendo exercer o poder que me é conferido pela alínea a) do n.º 1 do artigo 20.º da Lei n.º 9/91, de 9 de Abril, e RECOMENDAR a V. Exa: 








Que a situação jurídica dos funcionários nomeados na sequência da aprovação no concurso aberto pelo aviso publicado em 3 de Julho de 1997 seja corrigida por aplicação das regras de transição estabelecidas no n.º 2, alínea d), e n.º 6 do artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 404-A/98, de 18 de Dezembro, e que, em consequência, lhes sejam pagos os retroactivos respeitantes à transição para a categoria de técnico profissional de biblioteca e documentação de 1.ª classe, escalão 1, calculados desde 2 de Fevereiro de 1998, por ser a data em que foram nomeados na categoria de técnico-adjunto de biblioteca e documentação de 2.ª classe. 


Permito-me lembrar a V. Exa. que, nos termos do disposto nos nºs. 2 e 3 do artigo 38.º da Lei n.º 9/91, de 9 de Abril, deve ser comunicada a este órgão do Estado a posição que venha a ser assumida quanto à presente Recomendação, no prazo de 60 dias a contar da sua recepção, devendo um eventual não acatamento ser sempre fundamentado.


O Provedor de Justiça,
H. Nascimento Rodrigues


 





Nota de rodapé:


(1) Na verdade, as dúvidas que também se colocaram quanto à aplicação do Decreto-Lei n.º 404-A/98, de 18 de Dezembro, às carreiras específicas da área de biblioteca e documentação e de arquivo encontram-se ultrapassadas, de acordo com o entendimento veiculado através do ofício circular n.º 14/GSEAPMA/99, como foi referido no ofício de V. Exa. de 5 de Maio de 2003.
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