Sua Excelência
o Secretário de Estado Adjunto do
Ministro da Saúde
Av. João Crisóstomo, 9
1049-062 LISBOA


 


Vossa Ref.ª
 Vossa Comunicação
  Nossa Ref.ª
Proc. R-501/11 (A6)


Assunto: Cobrança de taxas sanitárias.



Recomendação n.º 11/A/2011
(art.º 20.º, n.º 1, a), da Lei n.º 9/91, de 9 de Abril)



O Provedor de Justiça recebeu um conjunto de queixas relativas à prática seguida por algumas autoridades de saúde locais que terão cobrado duas vezes o mesmo acto/serviço de saúde pública, exigindo em cada uma das ocasiões diferentes valores.


A situação descrita tem origem na entrada em vigor dos novos valores devidos pelo pagamento de actos das autoridades de saúde, aprovados em anexo ao Decreto-Lei n.º 8/2011, de 11 de Janeiro, e relaciona-se, em parte, com a aplicação no tempo do referido instrumento normativo.


Num dos casos, o interessado havia sido submetido a uma junta médica para avaliação de incapacidade em 25 de Maio de 2009, tendo recorrido da decisão dentro dos prazos legais para o efeito. O despacho da autoridade de saúde nacional, a determinar a reavaliação do doente por nova junta médica, foi emitido cerca de 18 meses depois, ou seja, em Novembro de 2010, sendo a realização da diligência prevista para o dia 2 de Fevereiro de 2011, nesta última altura sendo já devida pelo acto a quantia de 100 euros.


Os outros casos consistem em pedidos de realização de junta médica datados de 2010, relativamente aos quais foi cobrado no acto de entrega do requerimento o montante de € 0,90 como estava fixado 2010, tendo todavia sido exigido, no momento da realização da junta médica já em 2011, um novo pagamento, desta feita, no valor de 50 euros. É de notar que, apenas num destes casos, foi assegurada a compensação entre o valor inicialmente pago e o último valor cobrado.


Sobre o assunto foi mantido contacto com a Direcção-Geral da Saúde sem que, todavia, tivesse sido logrado obter o definitivo esclarecimento de todas as questões concretas suscitadas. Junto envio para conhecimento de Vossa Excelência as duas últimas comunicações endereçadas a esta entidade e correspondentes respostas.


Importa, nesta fase, realçar os seguintes aspectos, na expectativa de clarificar a posição deste órgão do Estado e obter o entendimento perfilhado por Vossa Excelência sobre a matéria.


Antes de mais, é de referir que está em apreço um conjunto limitado de situações confinadas a determinado período de tempo. Refiro-me ao período correspondente aos meses que antecederam a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 8/2011, de 11 de Janeiro e durante os quais foram requeridas juntas médicas que apenas se realizaram após a entrada em vigor do mesmo diploma. Incluem-se, naturalmente, situações mais antigas relacionadas com atrasos da administração.


Por outro lado, é de sublinhar que, aceitando-se a posição fundamentada pela Direcção-Geral da Saúde de que os novos valores possam ser aplicados aos processos em curso, não é todavia aceitável o procedimento de cobrança realizado nos serviços públicos envolvidos (que se conheçam, a Unidade Local de Saúde de Matosinhos e a Equipa de Projecto de Braga – Administração Regional de Saúde do Norte I.P.), com consequente insegurança e suspeita gerada junto dos administrados, os quais legitimamente acreditavam ter saldado o preço do serviço requerido no momento da entrega do requerimento, como o comprovam os recibos recebidos, sendo depois surpreendidos por um novo valor que compreensivelmente não aceitam.


Em rigor, parece que os critérios defendidos e agora expostos pela Direcção-Geral da Saúde quanto à cobrança das taxas, não estariam a ser uniformemente praticados por todas as autoridades de saúde conforme, aliás, foi reconhecido por aquela entidade.


Em circunstância alguma deverão os utentes ser penalizados ou admitidas dúvidas sobre o respeito pelo princípio da legalidade em matéria do foro tributário.


Finalmente, no que concerne às situações em que o pagamento dos novos valores se ficou a dever exclusivamente a demora excessiva da administração na tramitação dos processos, importa, antes de mais, clarificar que se considera naturalmente como muito positivo o esforço relatado na recuperação de atrasos.


Todavia, tal não pode significar que o objectivo incumprimento pela administração, ainda que obviamente não intencional na sua origem, dos prazos a que estava vinculada aporte um prejuízo tão evidente para os utentes como aquele que resultou para o Senhor A…, ou, de outra perspectiva, um benefício para o infractor.


Trata-se, nesta situação, de uma evidente exemplificação de uma das manifestações típicas da violação do princípio da boa-fé, comummente chamada de tu quoque, vedando-se conduta que só é autorizada por conduta (omissiva) ilícita anterior da Administração.


Assim, nos termos dos artigos 8.º, n.º 1, e 20.º, n.º 1, a), do Estatuto do Provedor de Justiça, recomendo a Vossa Excelência que se digne providenciar:


a) pela uniformização dos critérios aplicáveis ao momento da cobrança de taxas sanitárias, nos diferentes serviços locais de saúde pública;
b) pela emissão de orientações tutelares no sentido de
i) – não serem exigidos pagamentos adicionais aos utentes a quem tenha sido solicitado o pagamento da taxa devida no acto da entrega do requerimento, ou, assim não sendo, determinando-se, pelo menos, que seja apenas cobrado o valor excedente;
 ii) – garantir que nas situações em que a aplicação da nova tabela de taxas seja resultado de um atraso no procedimento, imputável à Administração, sejam unicamente cobrados os valores anteriormente praticados, sob pena de violação do princípio da boa fé.


Na expectativa da posição perfilhada a este propósito, em cumprimento do disposto no art.º 38.º da Lei n.º 9/91, apresento a Vossa Excelência os meus melhores cumprimentos,



O Provedor de Justiça,


Alfredo José de Sousa