Reparo / Censura


Entidade visada: Instituto da Conservação da Natureza
Assunto: Ordenamento do território – domínio público marítimo – delimitação – direitos procedimentais 


 


(§1º )
– Enunciado-



I. Desde 16.09.2004 que este órgão do Estado se vem ocupando de reclamação contra o Instituto da Conservação da Natureza, apresentada no interesse de ………., pelo seu mandatário.



II. Já desde 9.02.1988, a referida interessada requerera à Direcção-Geral dos Portos a delimitação entre um terreno de sua propriedade e o domínio público marítimo, em Ofir, Fão, concelho de Esposende, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 10.º do Decreto-Lei n.º468/71, de 5 de Novembro. Ao tempo, com efeito, não fora ainda publicado o Decreto-Lei n.º379/89, de 27 de Outubro, delimitando as áreas de jurisdição portuária, nem tão-pouco o Decreto-Lei n.º201/92, de 29 de Setembro, que fez transitar para as autoridades ambientais boa parte da jurisdição costeira.



III. Sabendo que, entretanto, o expediente transitara para o então Serviço Nacional de Parques, Reservas e Conservação da Natureza, sucedido, em 1993, pelo Instituto de Conservação da Natureza, a interessada requereu informações sobre o andamento do assunto, em Maio e, de novo, em Julho, de 2004, mais pedindo, ao abrigo do direito que lhe assiste (artigo 63.º do Código do Procedimento Administrativo) a passagem de uma declaração autenticada contendo cópia dos elementos que integrariam o expediente.



IV. Nada obtendo, salvo uma informação lacónica, onde se aludia à ausência de qualquer processo (of.º 6.123, de 1.09.2004) queixou-se ao Provedor de Justiça, cujos serviços interpelaram o ICN. Na resposta, de 28.01.2005, relatava-se que os elementos existentes «eram insuficientes para a instrução do processo», motivo por que fora, então, sugerido à reclamante que enviasse os documentos necessários (of.º665, de 28.01.2005).



V. Como, porém, ficassem por esclarecer as questões suscitadas pelo mandatário da reclamante, de novo interpelámos o ICN, podendo saber que, em 29.03.2005, fora dada resposta aos pedidos de certidão (of.º2.803, de 28.04.2005).



VI. Embora com alguns incidentes, a certidão – cujo prazo para ser passada é de dez dias – só ao cabo de dez meses viria a ser lavrada.



VII. Mas, o mais relevante é que o ICN transmitiria ulteriormente ao mandatário da queixosa que «o processo não estava, de todo, completo, faltando, em especial, o requerimento que a requerente apresentou em 1988 e os documentos que o acompanhavam».



VIII. Ora, o mandatário tivera transmitido ao ICN, por comunicação escrita de 30.03.2005, encontrar-se na posse da totalidade das cópias entregues para a instrução do procedimento, dispondo-se a facultar esses mesmos elementos. Pretendia o mandatário colaborar na reforma do processo, receando que a obtenção oficiosa de alguns documentos, por parte do ICN, viesse a mostrar-se morosa e redundante.



IX. Todavia, o ICN ignorou a disponibilidade do mandatário, motivo que nos levou a questionar o motivo por que não poderia a reforma do processo ser levada a cabo com as cópias em poder da requerente e do seu advogado.



X. A resposta do ICN revela-se, por uma vez mais, inconclusiva, remetendo simplesmente para as notas explicativas enunciadas pelo Instituto da Água (INAG), embora admitindo que bastariam as cópias para reconstituir o processo (of.º16, de 3.01.2006). Destas, porém, já só duas plantas (uma à escala 1:2000 e outra à escala 1:000) seriam válidas, já que, no mais, os elementos instrutórios para a delimitação do domínio público marítimo seriam hoje mais exigentes do que no passado.



XI. O óbito da requerente viria a determinar a inutilidade superveniente da reclamação, uma vez que os seus herdeiros não manifestaram a pretensão de prosseguir.


(§2.º)
– Apreciação –



XII. A situação descrita não pode, contudo, deixar de justificar uma nota da minha parte, chamando a atenção de V.Ex.a., a pensar em casos semelhantes que possam estar pendentes e em casos que possam futuramente ocorrer. Nem a delimitação do domínio público marítimo foi alcançada, nem as garantias procedimentais foram respeitadas.



XIII. O ICN não providenciou pelo andamento do procedimento, nem com celeridade (artigo 57.º do Código do Procedimento Administrativo) nem com observância do princípio de colaboração da Administração Pública com os particulares (artigo 7.º) nem em cumprimento do dever de decisão (artigo 9.º).



XIV. E, sobretudo, nunca prestou à interessada, em tempo razoável, as informações que razoavelmente esta pedia, considerando, em especial, o facto de o extravio do processo e dos documentos que o instruíam ser imputável ao ICN.



XV. É meu dever funcional contribuir para o aperfeiçoamento da actividade administrativa (artigo 21.º, n.º1, alínea c), da Lei n.º9/91, de 9 de Abril) e, por sua vez, há-de ser motivo para V.Ex.a. ponderar as providências que tiver por oportunas à situação exposta, com vista a fomentar o bom desempenho das atribuições cometidas ao Instituto que superiormente dirige e respeitar os direitos e interesses legalmente protegidos dos administrados. Os cidadãos são a razão de ser da Administração Pública, pressuposto que estou certo partilhará comigo. Como tal, ainda que a delimitação entre um terreno privado e o domínio público possa não interessar directamente à conservação da natureza nem à preservação dos recursos naturais, tal acto não deve nem pode ser visto como adversidade contra o interesse público, pois a certeza, o rigor e a segurança sobre os precisos limites dos bens dominiais só podem contribuir para uma maior eficácia na sua salvaguarda.



XVI. Encontrando-se o ICN sob superintendência e tutela do Governo e do Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, assim como o Instituto da Água – também com atribuições neste sector – entendi dever enviar cópia da presente comunicação àquele membro do Governo.