Presidente do Conselho Directivo do Centro Nacional de Pensões
Número:42/A/97
Processo:R-1125/95
Data:12.06.1997
Área: A3

Assunto:SEGURANÇA SOCIAL – PENSÃO DE VELHICE.

Sequência:

1. A Sra… , beneficiária da segurança social n.º…, dirigiu-me uma exposição onde invoca, essencialmente, o seguinte:

Em 27 de Outubro de 1988, ao perfazer 62 anos de idade, requereu a atribuição de pensão de velhice. Em 3 de Julho de 1989 o Centro Nacional de Pensões comunicou-lhe o indeferimento da sua pretensão por não ter direito à atribuição da pensão e o consequente arquivamento do seu processo. A reclamante ao perfazer 65 anos de idade requereu, de novo, em 26 de Março de 1992, a atribuição da pensão de velhice, a qual lhe foi concedida com efeitos reportados a essa mesma data. Os pressupostos de facto e de direito para a atribuição da pensão eram, todavia, os mesmos em 27 de Outubro de 1988 e em 26 de Março de 1992. Razão pela qual reclamou em primeiro lugar pessoalmente e depois através de carta de 2 de Abril de 1993, junto desses serviços, solicitando que a atribuição da pensão tivesse os seus efeitos reportados à data do seu primeiro requerimento, 27 de Outubro de 1988. Essa solicitação foi indeferida pelo Centro Nacional de Pensões dado a reclamação da beneficiária ter sido apresentada fora do prazo previsto no art.º. 141º do Código do Procedimento Administrativo.

2. O indeferimento que teve lugar em 1988 resultou do facto de apenas terem sido considerados os períodos contributivos compreendidos entre Fevereiro de 1970 e Abril de 1970 e Fevereiro de 1980 e Outubro de 1980. No entanto, para além desses períodos, deviam ter sido considerados os períodos compreendidos entre Maio de 1970 e Junho de 1973 e Julho de 1973 e Fevereiro de 1977. Tal como, aliás, aconteceu em 1992, dado que foi o conjunto desses períodos que fundamentou a atribuição, nessa data, da pensão de velhice. Na verdade, a reclamante reunia já em 1988 os requisitos para a atribuição de velhice previstos no art.º. 88º, n.º. 2 do Decreto n.º. 45266, de 23 de Setembro de 1963, quanto à idade e no n.º. 1 do mesmo artigo (na redacção introduzida pelo Decreto-Regulamentar n.º. 25/77, de 4 de Maio) e art.º. 5º do Decreto Regulamentar n.º. 60/82, de 15 de Setembro, quanto ao prazo de garantia. O lapso na contagem dos períodos contributivos na instrução do processo em 1988 conforme informação do Centro Nacional de Pensões, resultou do facto de o ex-Centro Regional de Segurança Social de Viana do Castelo ter informado que a beneficiária apenas apresentava registos de remunerações de Fevereiro a Abril de 1970 e de Fevereiro a Outubro de 1980, e no Banco Nacional de Dados de Beneficiários e Utentes não constar, ainda, o período contributivo compreendido entre Maio de 1970 e Fevereiro de 1977, lapso esse, imputável à Administração Pública e não à beneficiária. Note-se, porém, que a esse lapso acresceu outro, igualmente imputável à Administração, no que respeita à notificação do acto de indeferimento da concessão da pensão. Na verdade, a fundamentação constante dessa notificação foi manifestamente insuficiente no que respeita aos factos e ao direito aplicável, impedindo a beneficiária de conhecer as razões do indeferimento e, nessa medida, prejudicando, seriamente, o seu direito de defesa.

3. Essas circunstâncias impõem que se reconheça como sendo de inteira justiça a reparação dos prejuízos causados à reclamante. No entanto, esse Centro Nacional de Pensões tem vindo a manifestar a sua indisponibilidade para promover a revisão do processo, dado entender que não é viável a revogação do acto administrativo de indeferimento ocorrido em 1988, atento o disposto no art.º. 141º do Código de Procedimento Administrativo. Importa, todavia, fazer notar que a revogação desse acto teve já lugar ao deferir-se em 1992 a concessão da pensão de velhice, com base nos mesmos e exactos pressupostos de facto e de direito existentes em 1988. Conforme refere Robin de Andrade a págs. 38 de “A revogação dos actos administrativos”, edição de 1969, “a incompatibilidade implícita que determina a revogação resulta da contradição entre os efeitos jurídicos de determinado acto e os efeitos jurídicos do acto anterior. … Desde que os efeitos jurídicos do segundo e do primeiro acto se choquem impõe-se a figura da revogação, dado que os dois actos não podem vigorar simultaneamente no mundo jurídico”. Sendo, aliás, certo que a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo sempre se tem mostrado defensora da existência dos actos de revogação implícita. A esse acto de revogação implícita deveria, todavia, ter sido conferido eficácia retroactiva, nos termos do art.º. 144º, n.º. 3, do C.P.A., mediante a concessão da pensão de velhice com efeitos a 27 de Outubro de 1988.

Na verdade, não há qualquer razão de mérito que desaconselhe a reapreciação do processo, demonstrado que foi que a decisão de indeferimento inicial estava viciada de erro sobre os pressupostos de facto. E o interesse público não é uma noção que se oponha necessariamente ao interesse particular, antes deverá representar o melhor equilíbrio entre os interesses em presença. Ora, não prosseguir o interesse da reclamante em receber a pensão de velhice com efeitos desde 1988, sem que a tal se oponha qualquer interesse público digno de relevo ou de prevalência sobre aquele, é solução manifestamente atentatória dos princípios da proporcionalidade e da prossecução do interesse público, no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos (art.ºs. 266º,n.ºs. 1 e 2 da CRP e 4º e 5º do CPA).

4. Em face do exposto,R ECOMENDO:

a V.ª Ex.ª que seja alterado o acto de concessão de pensão de 26 de Março de 1992, à Sra…, sendo-lhe conferida eficácia retroactiva a 27 de Outubro de 1988.

O PROVEDOR DE JUSTIÇA

José Menéres Pimentel