Presidente da Assembleia de Freguesia da Vila de Argoncilhe
Número: 17/A/97
Processo: 1975/95
Data: 14.03.1997
Área: A1

Assunto: AUTARQUIAS LOCAIS – ALTERAÇÃO DA TOPONÍMIA – DIREITOS DE PARTICIPAÇÃO – LEI 49/90 – DECRETO-LEI 100/84

Sequência: Não Acatada

I – Exposição de Motivos

1. Na sequência de uma reclamação dirigida ao Provedor de Justiça, relativa a alterações toponímicas ocorridas na freguesia de Argoncilhe, concelho de Santa Maria da Feira, foi aberto processo neste Órgão do Estado.

2. Em especial, os queixosos referiam que a decisão de alteração da denominação de duas ruas da freguesia de Argoncilhe – Castanheira por Carvalheira e de S. José por das Gândaras – não mereceu a concordância dos respectivos moradores.

3. Inquirida sobre estes factos, a Câmara Municipal de Santa Maria da Feira respondeu que, em casos semelhantes, sempre fora realizada a audição das populações envolvidas, assegurada mediante a consulta aos seus representantes – Junta e Assembleia de Freguesia.

4. A Autarquia remeteu, então, a este Órgão do Estado, ofício do Presidente da Junta de Freguesia de Argoncilhe sobre a matéria em causa. Nele são prestados esclarecimentos, de entre os quais se reproduzem os seguintes julgados mais relevantes:

a) Os nomes Castanheira e S. José nunca fizeram parte da toponímia de Argoncilhe;

b) Não ocorreu, por conseguinte, a alegada alteração de denominação de ruas;

c) As denominações Rua da Carvalheira e Rua das Gândaras foram atribuídas há cerca de quinze (15) anos;

d) Em 1994, a Câmara Municipal de Santa Maria da Feira aprovou, sob proposta da Junta de Freguesia de Argoncilhe, o Plano de Toponímia de Argoncilhe, o qual mantinha as designações referidas;

e) Nesta altura, havia já constituídos dois grupos de cidadãos com entendimentos diferentes sobre a toponímia em causa;

f) Em 1995, parece ter-se reanimado a constestação aos nomes, tendo surgido, em contraponto, pessoas a defendê-los.

5. A questão suscitada pelos reclamantes tem, já se vê, contornos marcadamente locais, não assumindo a relevância social nem política de tantos outros problemas locais, nem pela matéria em causa, nem, tão pouco, pelo número de pessoas envolvidas. Trata-se de questão que, a ser decidida, sempre se fundará em critérios opinativos e de preferência pessoal, pelo que se mostra idóneo devolver a tomada de posição aos eleitores, através de meio próprio da democracia directa.

6. A Lei Constitucional n.º 1/82 aditou ao art. 241.º da Constituição da República Portuguesa o n.º 3 onde se dispõe que “os órgãos das autarquias locais podem efectuar consultas directas aos cidadãos eleitores recenseados na respectiva área, por voto secreto, sobre matérias incluídas na sua competência exclusiva, nos casos, nos termos e com a eficácia que a lei estabelecer”.

7. O diploma em causa é a Lei n.º 49/90, de 24 de Agosto, que veio permitir a realização dos vulgarmente designados referendos locais e disciplinar os termos em que podem ser efectuados.

8. Nos termos do art. 2.º, as consultas directas aos cidadãos eleitores a nível local incidem sobre matéria da exclusiva competência dos órgãos autárquicos, não podendo versar questões financeiras nem quaisquer outras que devam ser resolvidas vinculadamente por aqueles órgãos ou que já tenham sido objecto de decisão irrevogável.

9. Como resulta do disposto na alínea f), do n.º 4, do art. 51.º, do Decreto-Lei n.º 100/84, de 29 de Março, na redacção conferida pela Lei n.º 18/91, de 12 de Junho, compete às câmaras municipais estabelecer a denominação das ruas e praças das povoações. Por outro lado, a deliberação sobre a toponímia das vias municipais não é relativa a matéria financeira, pode ser livremente tomada pelas câmaras municipais e é susceptível de ser alterada, a todo o tempo, nos termos legais.

10. A Câmara Municipal de Santa Maria da Feira aprovou, em 21/02/94 e sob proposta da Junta de Freguesia de Argoncilhe, o Plano de Toponímia de Argoncilhe.

11. A consulta directa aos cidadãos, a nível local, pode realizar-se no âmbito de uma freguesia ou abranger todo um município. Uma vez que a designação controvertida respeitava a duas vias da freguesia de Argoncilhe, justificar-se-ia a realização de um referendo nesse âmbito territorial, ficando então salvaguardada a discussão pública das propostas e a democraticidade da decisão.

12. Poderia, então, a Assembleia ou a Junta de Freguesia de Argoncilhe ter proposto, à Assembleia Municipal de Santa Maria da Feira, a realização de uma consulta local sobre o plano toponímico.

13. Subsistindo a querela relativamente às designações de ruas, não se descortina meio mais adequado para assegurar uma justa decisão do que a consulta directa á população, a realizar nos termos da Lei n.º 49/90, de 24 de Agosto.

14. Justifica-se, pois, recomendar que a Assembleia de Freguesia de Argoncilhe proponha à Assembleia Municipal de Santa Maria da Feira, nos termos dos art.s 8.º e 6.º daquele diploma, que os cidadãos eleitores de Argoncilhe sejam chamados a escolher a designação das ruas da sua freguesia.

15. Uma vez que, como decorre do disposto no n.º 1, do art. 7.º, as perguntas a submeter a votação devem permitir resposta inequívoca – mediante a impressão das palavras “Sim” e “Não”, em linhas sucessivas, seguidas a cada pergunta, figurando na linha correspondente a cada uma daquelas duas palavras um quadrado em branco destinado a ser assinalado com a escolha (cfr. art. 28.º) – julgo aconselhável a simples enumeração das designações submetidas a sufrágio, para que os cidadãos eleitores possam manifestar a sua opção.

16. A eficácia deliberativa que, nos termos do art. 5.º, reveste a decisão dos cidadãos eleitores implicará a escolha das denominações que forem aprovadas pela maioria dos votantes.

17. Por fim, permito-me lembrar a V.Exas. que, nos termos do disposto no n.º 1, do art. 9.º, as propostas a apresentar devem conter as perguntas a submeter aos cidadãos eleitores, num máximo de três.

Pelas razões que deixei expostas,

RECOMENDO

A) Que a Assembleia de Freguesia de Argoncilhe delibere sobre a apresentação de proposta de realização de consulta local aos cidadãos recenseados na Freguesia de Argoncilhe relativa às denominações de ruas da freguesia.

B) Que, caso venha a ser esse o sentido da deliberação, a Assembleia de Freguesia da Vila de Argoncilhe apresente à Assembleia Municipal de Santa Maria da Feira, nos termos do disposto na alínea a), do art. 8.º, da Lei n.º 49/90, de 24 de Agosto, proposta de realização de consulta local sobre as alterações toponímicas da Freguesia de Argoncilhe.

O PROVEDOR DE JUSTIÇA

JOSÉ MENÉRES PIMENTEL