Presidente da Câmara Municipal de Lisboa
Rec.n.º 52/A/97
Proc. P-20/95
Data:07.07.1997
Área: A1
Assunto: URBANISMO E OBRAS – PRÉDIOS DEGRADADOS – RECRIA – RUÍNAS.
Sequência: Acatada
RELATÓRIO DA ASSESSORIA
I – Descrição do Problema
A-Introdução
Determinou o Provedor de Justiça, por despacho de 19 de Fevereiro de 1995, a criação de um grupo de trabalho, ao qual foi cometida a tarefa de proceder ao estudo das causas de degradação do património residencial do município de Lisboa, a partir da observação do exercício dos poderes atribuídos às entidades públicas competentes, e da análise do quadro jurídico aplicável. A constituição daquele grupo de trabalho foi motivada pelo elevado número de queixas dirigidas a este Órgão do Estado, relativas às deficientes condições de conservação de edifícios habitacionais sitos na cidade de Lisboa, alguns dos quais ameaçando ruína ou tendo sofrido derrocada, ainda que parcial. Em termos gerais, as queixas fundadas nas más condições de habitabilidade dos imóveis têm sido apresentadas por arrendatários desses edifícios ou das suas fracções. A intervenção solicitada à Provedoria de Justiça tem em vista a realização das necessárias obras de conservação pelos proprietários, em cumprimentos de determinação camarária a tanto destinada, ou em alternativa, a execução coactiva pela câmara municipal da ordem proferida. A instrução dos processos revela que não são efectuadas pelos proprietários as obras necessárias a assegurar a manutenção das condições existentes à data da celebração do contrato de arrendamento. Intimados os proprietários pela câmara municipal a realizar as obras de conservação e reparação em falta, verifica-se, regra geral, que as ordens camarárias não são cumpridas. Mais se observa que são escassas as situações em que o município desencadeia procedimento sancionatório, verificado o incumprimento da ordem. Ao invés, a câmara municipal informa o proprietário da possibilidade de requerer apoio financeiro para a realização das obras no âmbito do programa RECRIA. Na maioria dos casos a intervenção camarária esgota-se nas sucessivas notificações dirigidas aos proprietários para a feitura das obras, precedidas da realização de vistorias com o objectivo de avaliar a situação do prédio e de ponderar a necessidade de aplicação de medidas cautelares para prevenir a onsumação de danos em pessoas e bens, encontrando-se ameaçada a segurança e solidez do edifício. As vistorias destinam-se, também, a facultar à câmara municipal os elementos necessários para a elaboração do orçamento das obras. Mais se verifica que a câmara municipal se substitui nalguns casos aos proprietários na realização das obras em falta. Contudo, é manifesta a desproporção entre o número de intimações camarárias não cumpridas e o número de execuções coercivas municipais. Ainda que seja determinada a execução coerciva das obras e que a câmara municipal haja tomado posse administrativa do prédio, em muitos casos as obras não são efectuadas. A intervenção camarária cinge-se, em boa parte das situações, à aplicação de medidas cautelares, em especial, à interdição da utilização dos espaços públicos confinantes com os edifícios em perigo e de partes ou da totalidade dos imóveis, quando se justifiquem. Ao Provedor de Justiça cumpre, antes de mais, conhecer das acções e omissões que os cidadãos imputem aos poderes públicos, motivo que leva a presente análise a incidir fundamentalmente na actividade de polícia administrativa das edificações e na política legislativa de solos urbanos. Claro está que não poderia deixar de ser ponderado um conjunto de questões concernentes ao arrendamento urbano. Com efeito, o incumprimento dos deveres locatícios em matéria de conservação habitacional condiciona decisivamente o exercício das competências de polícia administrativa das edificações. É nessa perspectiva que o estudo que se apresenta contém um capítulo dedicado ao contrato de arrendamento urbano (cap. IV), sem prejuízo das conclusões que venham a ser obtidas na instrução de um outro processo pendente na Provedoria de Justiça, circunscrito às relações de arrendamento urbano e às injustiças que frequentemente são apontadas por inquilinos e senhorios à legislação em vigor. De resto, o problema é verificado, mesmo para além da relação jurídica de arrendamento, porquanto se observam, do mesmo modo, múltiplos casos em que o proprietário não promove a adequada conservação do prédio destinado a habitação, ainda que nele resida ou que o mesmo se encontre devoluto. Todavia, em anexo ao presente estudo, são apresentadas duas notas em matéria de arrendamento urbano. O propósito desta inclusão em nada contraria a opção metodológica exposta supra, pois reportam-se a dois casos em que os poderes públicos operam directamente no âmbito das relações de locação de prédios urbanos e suas fracções: a posição de arrendatário urbano do Estado e de outras pessoas colectivas públicas e, por outro lado, o regime favorável às Instituições Particulares de Solidariedade Social, na medida em que faz recair os seus custos apenas nos senhorios, tendo este último sido objecto da Recomendação n.º 11/B/95, de 2 de Março de 1995. Certo é que o estado de degradação acentuada de numerosos prédios da cidade é agravado de dia para dia, pelo que se procura propor soluções que a muito curto trecho permitam inverter uma sequência que parece irreversível, sem, porém, deixar à margem medidas de carácter administrativo e financeiro que vêm sendo adoptadas e cujos efeitos já se podem notar. No âmbito deste estudo, e como última advertência, importará ter presentes, perante a extensão e a complexidade do problema, a diversidade das situações verificadas, seja no tocante ao estado de degradação dos imóveis habitacionais, seja quanto ao uso que lhes é conferido.
B – Alguns Contributos
A Provedoria de Justiça questionou diversas entidades acerca da questão em análise, por forma a recolher as informações e os pontos de vista das entidades públicas com competências na matéria e das entidades privadas interessadas.
1. Secretaria de Estado da Habitação
A Sua Excelência a Secretária de Estado da Habitação foi solicitada informação sobre a existência de projectos de medidas legislativas para criação de um novo regime de apoio, na forma de subsídios a fundo perdido, e crédito bonificado para recuperação de fogos degradados. Fundamentou-se esta questão nos objectivos enunciados para a política habitacional no Programa do XIII Governo Constitucional e na Lei das Grandes Opções do Plano para 1996 (Lei n.º 10-A/96, de 23 de Março). Aí se enunciava que a actuação do Governo, neste domínio, tem em vista assegurar condições e promover instrumentos para que os portugueses disponham de uma habitação condigna, que permita uma diversificada integração social e a preservação de padrões aceitáveis de qualidade ambiental, sendo para este efeito orientada a política governamental no sentido da correcção das debilidades estruturais do sector. Para prossecução deste objectivo são consideradas preferenciais as medidas relativas à política de solos, à fiscalidade, ao estímulo ao arrendamento e à melhoria do respectivo sistema, à reabilitação e conservação do parque habitacional, à redução da burocracia, à promoção da qualidade e, em particular, à erradicação das barracas e outros tipos de situações atentatórias da dignidade. Em termos institucionais as finalidades enunciadas pressupõem uma estreita colaboração entre o Governo e as Autarquias Locais, uma maior interligação com as diferentes instituições sociais e uma participação empenhada dos agentes económicos e financeiros que intervêm no sector. Entre as vertentes essenciais da política de habitação conta-se a diversificação e intensificação dos apoios à recuperação de edifícios e a reabilitação de zonas urbanas degradadas. Neste domínio os objectivos elencados são a desburocratização e diversificação dos processos de apoio e recuperação de edifícios habitacionais, a instituição de formas de crédito bonificado a conceder aos proprietários com rendimentos insuficientes e a criação de subsídios de renda para viabilizar o aumento da renda, quando os proprietários realizem as obras necessárias para garantir condições de salubridade. Adequadas à recuperação do parque habitacional existente, entre as outras vertentes essenciais da política de habitação, são enunciadas no Programa do Governo, medidas de simplificação do sistema de impostos e taxas e melhoria dos incentivos ao investimento em habitação própria e de rendimento, a análise das melhorias aos incentivos fiscais para sociedades, fundos mobiliários e de pensões e outros investidores interessados no mercado de arrendamento habitacional, a criação de estímulos para incremento da poupança-habitação e medidas no sentido de criar um subsídio familiar à habitação aplicável na aquisição e ou no arrendamento habitacional. Especificamente vocacionada para recuperação do parque habitacional existente é perspectivado no Programa do Governo, o aperfeiçoamento e eventual ampliação do RECRIA, apoio à reabilitação de zonas históricas e degradadas através da utilização de fundos comunitários. Nas informações prestadas pelo Gabinete de Sua Excelência a Secretária de Estado da Habitação, considera-se não ser alheia à situação de progressiva degradação do património habitacional a insuficiência de algumas medidas tomadas no âmbito do regime do arrendamento urbano e no âmbito do programa RECRIA. Embora aptas a fazer face ao agravamento progressivo da situação, as medidas em questão vieram a revelar-se significativamente limitadas nos seus efeitos devido à rigidez dos mecanismos instituídos e à falta de previsão de soluções complementares de financiamento relativamente ao montante das obras de conservação e beneficiação não comparticipado a fundo perdido ao abrigo do RECRIA. Assim, sem prejuízo de outras medidas, ainda em fase de estudo, o Governo criou um conjunto de mecanismos que reputa aptos a imprimir uma maior eficácia ao processo de renovação e reabilitação urbana. Constam estes mecanismos dos Decretos-Lei n.ºs 104, 105, 106, publicados a 31 de Julho de 1996. Procede o primeiro dos diplomas citados à ampliação das modalidades de apoio previstas pelo programa RECRIA, instituído pelo Decreto-Lei n.º 4/88, de 14 de Janeiro, e posteriormente modificado, atentas as alterações sobrevindas ao regime do arrendamento urbano com a publicação Decreto-Lei n.º 321-B/90, de 15 de Outubro, pelo Decreto-Lei n.º 197/92, de 22 de Setembro. Assim, para além da comparticipação financeira para recuperação de fogos e imóveis arrendados actualmente existente, passa a prever-se um regime de financiamento bonificado complementar para os Municípios sempre que estes procedam, nos termos legais, à execução de obras de conservação e beneficiação nos prédios urbanos em substituição dos seus proprietários. Institui-se, também, um ónus de inalienabilidade dos imóveis a favor das câmaras municipais, nas situações referidas. A alienação do prédio ou das suas fracções autónomas que hajam sofrido obras de conservação ou beneficiação realizadas pelas câmaras em substituição dos respectivos senhorios ou proprietários encontra-se sujeita ao integral reembolso das quantias despendidas pelo órgão municipal. O Decreto-Lei n.º 105/96, de 31 de Julho, institui o Regime de Apoio à Recuperação Habitacional em Áreas Urbanas Antigas (REHABITA). Trata-se de um normativo legal que estabelece um regime específico de apoio exclusivamente aplicável em núcleos urbanos históricos declarados áreas críticas de recuperação e reconversão urbanística, nos termos do art. 41.º do Decreto-Lei n.º 794/76, de 5 de Novembro. Pretende-se com este mecanismo, facilitar a execução de obras de conservação, de beneficiação ou de reconstrução de edifícios habitacionais e as acções de realojamento provisório ou definitivo, no caso de edifícios cuja recuperação seja inviável, no âmbito de uma operação municipal de reabilitação urbana. Por último, o Decreto-Lei n.º 106/96, vem suprir uma lacuna existente nos mecanismos legais em matéria de reabilitação urbana pelo facto de os proprietários de fracções autónomas em prédios urbanos em regime de propriedade horizontal se encontrarem impossibilitados de recorrer ao programa RECRIA. Através deste diploma institui-se o Regime Especial de Comparticipação e Financiamento na Recuperação de Prédios Urbanos em Regime de Propriedade Horizontal (RECRIPH), ao qual têm acesso os condóminos de edifícios habitacionais construídos até à data da entrada em vigor do Regulamento Geral das Edificações Urbanas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 32 382, de 7 de Agosto de 1951, ou após essa data, cuja licença de utilização tenha sido emitida até 1 de janeiro de 1970. O regime em apreço prevê a possibilidade de comparticipações a fundo perdido e de financiamentos a uma taxa de juro bonificada aos condóminos para a realização de obras de conservação e beneficiação nas partes comuns dos prédios e, subsidiariamente, em condições determinadas, a financiamentos bonificados para a realização de obras nas próprias fracções autónomas. Considera esta Secretaria de Estado serem os meios de comparticipação e financiamento descritos o primeiro conjunto de medidas aptas a promover a incremento da reabilitação urbana habitacional, designadamente, da melhoria das condições de habitabilidade e segurança dos prédios urbanos.
2. Instituto de Gestão e Alienação do Património Habitacional do Estado
Atentas as atribuições de gestão e conservação do parque habitacional cometidas ao Instituto de Gestão e Alienação do Património Habitacional do Estado (IGAPHE) foi solicitado a esta entidade que se pronunciasse sobre as causas de facto e as razões imputáveis ao regime jurídico aplicável que têm contribuído para o estado de degradação de muitos edifícios particulares destinados à habitação, em especial, no domínio de relações jurídicas de arrendamento. Entre as causas de carácter fáctico aponta o IGAPHE a antiguidade de muitos dos edifícios da cidade de Lisboa, bem como a sua falta de manutenção pelos respectivos proprietários. Do ponto de vista legal, a não realização de obras de conservação pelos proprietários-senhorios deriva da exiguidade das rendas pagas, o que conduz à impossibilidade de realização das obras por insuficiência económica, nuns casos, e noutros, à evidente falta de interesse na sua execução, atenta a nula rentabilidade do investimento. Por seu turno, os inquilinos, tendo interesse directo na realização das obras, também não dispõem de capacidade económica que lhes permita substituírem os proprietários ou suportarem grandes aumentos de renda por forma a suportar os encargos da recuperação dos edifícios. No que se reporta ao funcionamento do programa RECRIA, informou o IGAPHE que cerca de 90% dos processos referem-se a prédios sitos no Município de Lisboa, atingindo o número total de 1781, os processos analisados até Julho de 1996, relativos a todo o país. São 551, os processos em que as obras se encontram em execução e 23 os processos em análise. O prazo para aprovação pelo Instituto dos pedidos de comparticipação, nos termos do protocolo celebrado com a câmara municipal de Lisboa, é de quinze dias úteis a contar da data de entrada dos processos no IGAPHE. A dotação orçamental do ano findo para financiamentos no âmbito do programa RECRIA foi de Esc. 5.000.000.000$00 (cinco mil milhões de escudos).
3. Câmara Municipal de Lisboa
3.1. Vereação do Pelouro da Conservação de Edifícios
Apontou a Câmara Municipal de Lisboa, ouvida através do Gabinete do Exmo. Vereador Bento Feliz, o congelamento das rendas como causa fundamental da não realização de obras de conservação pelos proprietários do parque habitacional da cidade de Lisboa. Sobre as questões formuladas pela Provedoria de Justiça, pronunciou-se aquele gabinete, facultando os seguintes dados e indicações numéricas, reportados ao período compreendido entre 1991 e 1996: Dirigiram os serviços camarários 9.910 intimações a proprietários, ao abrigo dos arts. 9.º, 10.º, 12.º e 115.º do Regulamento Geral das Edificações Urbanas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 38.382, de 7 de Agosto de 1951 (RGEU). Foram efectuadas cerca de 50 intimações para demolição por ameaça à segurança das edificações nos termos previstos no art. 10.º, 1.º parágrafo, do RGEU. As intimações acatadas pelos proprietários perfazem o número de 687, de acordo com os dados facultados pela Divisão de Fiscalização do Departamento de Conservação de Edifícios e Obras Diversas. Foi verificado terem sido realizadas obras, mediante recurso ao apoio financeiro concedido no âmbito do programa RECRIA, em cumprimento de determinação municipal, por 565 proprietários. A Câmara Municipal de Lisboa adjudicou, ao todo, e com referência ao período designado, 126 empreitadas de obras coercivas. A Divisão de Recuperação de Edifícios Particulares lavrou 215 autos de posse administrativa, aos quais acrescem 53 autos da iniciativa da Divisão de Conservação. A dotação orçamental da Divisão de Recuperação de Edifícios Particulares para realização de obras coercivas perfez Esc.1 258 268 000$00. Foram detectadas pela Divisão de Fiscalização 597 situações de risco iminente para a segurança de pessoas e bens, em vistorias realizadas. No que se reporta às medidas adoptadas a fim de prevenir a consumação de danos, procede a câmara municipal ao escoramento de edifícios, ao emparedamento total ou parcial de edificações, ainda que restrito a casos de perigo de incêndio e de prédios devolutos, à interdição de espaços e vias públicas confinantes com edifícios em perigo, bem como à interdição da utilização de partes ou da totalidade das edificações e ao despejo sumário de pessoas e bens. Não lograram os serviços camarários quantificar as medidas cautelares aplicadas nos últimos cinco anos. Sobre os procedimentos de actuação coerciva, esclareceu a câmara municipal dirigir-se a intervenção municipal, prioritariamente, aos prédios classificados na escala A, em função do risco de acidente, de acordo com os critérios de definição do Despacho n.º 4/P/85. Nos termos do citado despacho, perante o elevado número de processos em curso, e tendo em vista a actuação coerciva municipal, ao abrigo do art. 166.º do RGEU, e a impossibilidade de intervenção a curto prazo por parte da câmara municipal, cumpria "estabelecer tão rapidamente quanto possível uma escala de prioridades de intervenção graduada em função do risco da ocorrência de acidentes graves (…)". Foi determinada a classificação, no que se reporta aos procedimentos de obras coercivas, dos riscos de acidente segundo uma escala A, B e C. A escala A abarca as situações de "risco iminente de acidente por instabilidade da construção ou partes desta", a escala B reporta-se a "situações graves de insalubridade que não afectam contudo, de forma imediata, a estabilidade da construção", por fim, compreende a escala C as "situações de insalubridade ou instabilidade com tendência a agravar-se mas que não constituem risco imediato". Em conformidade, hão-de os autos de vistoria para organização de processo de obras coercivas, conter descrição da situação do prédio, referência à classificação dos riscos de acidentes e escala correspondente, bem como descrição do estado global do edifício. Devem os técnicos pronunciar-se, em especial, sobre a recuperabilidade do edifício, os elementos estruturais de maior risco e as causas de insalubridade. Além do mais, devem ser discriminadas, com indicação de prioridade, as obras de intervenção a executar. É, do mesmo modo, determinada a ordenação, por grau de prioridade, dos autos de vistoria elaborados em data anterior à da publicação do despacho. Na prática a intervenção camarária dirige-se, preferencialmente, às situações em que "se constata manifesta insalubridade e/ou insegurança de pessoas e bens, nomeadamente quando existe risco de instabilidade do imóvel e ainda nos prédios cuja taxa de ocupação é maior". Em reunião realizada nas instalações da Provedoria de Justiça em 25.03.1996, declarou a directora do Departamento de Conservação de Edifícios e Obras Diversas que entre prédios cujo estado de degradação seja similar, é concedida preferência ao imóvel com taxa de ocupação mais elevada. A respeito de uma das queixas apresentadas na Provedoria de Justiça, foi afirmado não prever a câmara municipal a execução coerciva das obras reclamadas, por se verificar uma acentuada desproporção entre o respectivo custo e a taxa da ocupação do imóvel. Mais foi declarado que, salvo casos pontuais, nomeadamente intervenções ditadas por razões conjunturais, a câmara municipal delibera realizar obras coercivas, no tocante a prédios de risco A. Quanto a esta categoria de imóveis, a câmara municipal distingue diferentes estádios de degradação e perigo de ruína. A percentagem de obras coactivas de reparação de canalizações é insignificante, porquanto tais obras apenas têm lugar em casos extremos. Foi, também, respondido que, por falta de verba, apenas no início do ano de 1996, foi iniciada a execução de obras coercivas relativas a empreitadas adjudicadas nos anos de 1993 e de 1994. Ao intimar os proprietários para a realização de obras de beneficiação e reparação, a câmara municipal fixa prazos de 15 ou 30 dias. A DMPGU condiciona a aprovação de projectos de demolição de edificações arrendadas e ocupadas, a prévia desocupação. Os serviços municipais não possuem indicação quantitativa das edificações que ruíram nos últimos cinco anos. Questionada sobre as posturas e regulamentos municipais que dispõem acerca da matéria objecto do presente processo, indicou a câmara municipal ser a sua actuação pautada pelas normas aplicáveis do Regime do Arrendamento Urbano, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 321-B/90, de 15 de Outubro (RAU), e do Regulamento Geral das Edificações Urbanas, bem como ainda pelas orientações fixadas no Despacho n.º 2/DSO/DFCCEP/86 e no Despacho n.º 4/P/85. O Despacho n.º 2/DSO-DFCCEP/86 define os procedimentos a adoptar quando sejam detectadas obras ilegais, distinguindo, para esse efeito, consoante a natureza da obra e a gravidade da lesão do interesse público. Pedidas informações relativas a programas de intervenção directa de obras em áreas urbanas definidas, foi esclarecido que a Divisão de Recuperação de Edifícios Particulares definiu como áreas de intervenção prioritária, as zonas correspondentes à Baixa Pombalina, à Praça dos Restauradores, à Praça do Chile, à Praça José Fontana e à Av. Almirante Reis. Mais foi adiantado terem sido celebrados protocolos com as várias juntas de freguesia nos termos dos quais são as mesmas competentes para realizar pequenas obras de conservação e reparação, nomeadamente nas canalizações e coberturas dos prédios. No tocante a programas de financiamento a obras particulares para recuperação de edifícios, refere a câmara municipal constituir o RECRIA o único programa utilizado, quer pela câmara, quer pelos proprietários.
3.2. Vereação do Pelouro da Habitação, Segurança, Pessoas e Bens
Tendo sido pedidos esclarecimentos sobre um anunciado projecto da Câmara Municipal de Lisboa com vista à definição de um regime legal de gestão administrativa de terrenos e edifícios, o qual mereceu referência nos meios de comunicação social, o Exmo. Senhor Vereador …, em resposta, veio dar a conhecer o teor do ofício n.º …, remetido a Sua Excelência o Ministro do Equipamento Social. É exposta ao Governo a questão dos prédios urbanos devolutos e sem utilização por período prolongado, reclamando a necessidade de adopção de medidas legislativas adequadas que permitam uma intervenção eficaz dos municípios. Propõe-se ao Governo que pondere, em sede de revisão legislativa dos regimes aplicáveis, o seguinte: A. A tributação das fracções edificadas utilizáveis, mantidas devolutas, pelo valor presumível do rendimento que poderiam gerar; B. Quanto aos prédios constituídos por lotes vagos ou edifícios irrecuperáveis e totalmente devolutos, a instauração do procedimento que se descreve: «1. As Câmaras Municipais deveriam poder notificar os proprietários estabelecendo um prazo para início de obras de construção ou reconstrução de acordo com os normativos urbanísticos aplicáveis. 2. Decorrido tal prazo sem que tivesse iniciado as obras, o proprietário seria notificado da posse administrativa com intenção de expropriação. 3. O prédio seria, de seguida, colocado em hasta pública com a condição do adquirente assegurar, através de garantia bancária, o início das obras no prazo estabelecido . 4. O produto da hasta pública (deduzido dos encargos administrativos) seria colocado à disposição do proprietário inicial, como pagamento da expropriação». 4. Associação Lisbonense de Proprietários Inquirida sobre as razões, tanto de facto e de direito aplicável que não permitem impedir eficazmente a degradação dos edifícios habitacionais em Lisboa, a Associação Lisbonense de Proprietários vem reconduzir o problema da ruína e elevada deterioração do parque imobiliário residencial de Lisboa às regras e modo de funcionamento do arrendamento em Portugal, afirmando que "de facto, arrendamento e derrocada formam um todo indissociável". Considerando as queixas dos proprietários relativas aos valores irrisórios das rendas (o que se deve ao binómio congelamento de rendas/inflação) e as queixas dos inquilinos, que referem a impossibilidade de pagamento de rendas mais altas, a Associação aponta a falta de informação como um factor que tem obstado a um estudo aprofundado sobre o assunto, não deixando, porém, de concluir que "as rendas ruinosas só podem gerar cidades em ruínas", o que considera provado remetendo para um estudo elaborado por Artur Soares Alves, O Congelamento das Rendas Urbanas, Edição CNAPI, Lisboa, 1995). Os proprietários lisbonenses pretendem que lhes seja dado um tratamento equivalente ao de outros agentes económicos, com a possibilidade de tornar rentáveis os investimentos em património locativo e sem o encargo de uma função assistencialista a favor dos arrendatários (traduzida nos baixos valores da generalidade das rendas praticadas). Mais chamam a atenção para o facto de as imposições de obras de reabilitação e renovação não deverem envolver despesas excessivas e exigências gravosas, atento os valores das rendas. Como ponto de partida, submetem à consideração do grupo de trabalho as seguintes questões: 1. Quantos são os prédios em risco de ruir, nos próximos três anos? 2. Qual o prejuízo líquido que um prédio representa para o seu proprietário, ao longo das últimas décadas, dado o congelamento das rendas e a inflação? 3. Qual a percentagem dos rendimentos dos agregados familiares afecta à renda, com base em dados exactos, que actualmente se desconhecem? 4. Quais as situações de pobreza real dos senhorios? 5. Qual o custo estimado e a quem beneficia a execução de obras de restauro pelo Estado em edifícios sitos nas zonas nobres da cidade, substituindo-se aos proprietários? Conclui a Associação Lisbonense de Proprietários que a situação actual dos imóveis arrendados se revela muito injusta. 5. Associação dos Inquilinos Lisbonenses A posição da Associação dos Inquilinos Lisbonenses quanto às razões determinantes da degradação do parque habitacional de Lisboa e os frequentes desmoronamentos de edifícios nele compreendidos assenta nos motivos que, em síntese, se descrevem. Considera esta Associação que a não realização de obras periódicas ao nível de telhados, canalizações e esgotos, de que decorrem danos nas paredes, soalhos, tectos e instalação eléctrica, entre outros, é a principal causa da degradação do parque imobiliário. A falta de actuação atempada do proprietário ou da câmara municipal, em substituição daquele, contribui para o agravamento da situação do edifício, que pode culminar na sua derrocada. São apontadas, ainda, actuações e omissões ilícitas por parte dos proprietários, como o facto de contarem, à partida, com a falta de intervenção municipal, e a criação de condições para a degradação do edifício, como a retirada de telhados ou a manutenção de fogos devolutos com as janelas abertas para acelerar a deterioração das estruturas. Quanto à legislação vigente (RAU e RGEU), refere a Associação de Inquilinos que a mesma se caracteriza pela falta de simplicidade e clareza. Como exemplo, chama-se a atenção para o facto de ter vantagem o senhorio na imposição camarária de realização de obras, porquanto a mesma prevê a actualização das rendas (arts. 13.º e 38.º, do RAU). Ainda no âmbito de aplicação do Regime de Arrendamento Urbano, é referida a inexistência de um sistema de resolução de conflitos e de controle da natureza e valor das obras realizadas pelo proprietário, surgindo dúvidas quanto à entidade a recorrer – o Tribunal ou a Comissão Especial prevista no art. 36.º, do Decreto-Lei n.º 321-B/96, de 29 de Agosto. No tocante ao RGEU, considera a Associação que o mesmo contempla uma actuação ineficaz e tardia do município. Ineficaz, dado o incumprimento generalizado das intimações camarárias para a realização de obras. Tardia, porque só se verifica a actuação camarária após solicitação; não ocorre uma actuação preventiva. Conclui esta Associação pela necessidade de reformulação da legislação e, consequentemente, da actuação das entidades envolvidas. Assim, é proposto que a legislação seja revista por forma a permitir uma maior celeridade nos processos de obras coercivas, e prever um maior controlo sobre a execução das obras e as referidas actuações intencionais com vista à degradação do imóvel. Espera-se, ainda, uma actuação mais eficaz por parte do município, em sede preventiva (fiscalizações periódicas e quando solicitadas; registo municipal no livro de obras de todas as intervenções em cada edifício, sobretudo ao nível das obras no telhado, canalizações e esgotos) e em sede repressiva (aplicação de coimas; ocupação do imóvel; responsabilização do proprietário por danos causados).
6. Associação dos Promotores Imobiliários
Foi a Associação dos Promotores Imobiliários (API) questionada sobre as razões de facto e de direito que determinam a degradação e os frequentes desmoronamentos de edifícios do parque habitacional de Lisboa. Em resposta, manifestou a Associação auscultada o entendimento de que as raízes do problema assentam em dois núcleos, o quadro legal, em particular, do arrendamento, sector que regista elevada taxa de ocupação habitacional, e a falta de um sistema adequado de financiamento de habitação. No tocante ao enquadramento jurídico do contrato de arrendamento, identifica a API a prorrogação forçada do contrato e o congelamento e controle administrativo das rendas como as principais causas do fraco investimento no sector imobiliário. E acrescenta que Portugal constitui, entre os países da Comunidade Europeia, aquele que regista despesas menos significativas no campo da habitação. Acresce que, na generalidade dos países europeus, domina a promoção pública de habitação em regime de arrendamento, ao invés do que sucede em Portugal em que o parque locativo é gerido, fundamentalmente, por particulares, predominando, claramente, a iniciativa privada. Os factores de actualização extraordinária das rendas, introduzidos pela Lei n.º 46/85, de 20 de Novembro, não contribuíram, de forma significativa, para o restabelecimento da debilitada confiança no mercado de arrendamento nem para o reajustamento entre e a oferta e a procura. A reforma legislativa operada em 1990, com o Regime do Arrendamento Urbano, tem-se revelado, também ela, insuficiente perante os efeitos do prolongado congelamento das rendas em termos económicos e sociais. Apesar dos passos dados com a consagração dos contratos de arrendamento de duração limitada por períodos mínimos de cinco anos e da faculdade de estipular livremente o valor das novas rendas, verifica-se que a larga maioria dos arrendamentos são, ainda, de duração ilimitada, com preços desajustados do valor a preços de mercado. Os coeficientes de actualização ordinária ficam muito aquém da inflação. Tais circunstâncias acarretam o aumento da procura da habitação em regime de arrendamento, em detrimento da aquisição de habitação, e a diminuição da oferta do arrendamento. Os proprietários não auferem rendimentos prediais que cubram as despesas de reparação dos imóveis, pelo que se abstêm de realizar obras de conservação. Com a degradação dos prédios, diminui o número de locados que ofereçam condições de habitabilidade e, por conseguinte, também a oferta; os inquilinos procuram nova habitação, pelo que se acentua o desajustamento entre a oferta e a procura. Considera a API que o congelamento de rendas estimulou as demolições para construção de imóveis destinados a serviços ou a habitações isentas de condicionamentos no primeiro arrendamento. São, também, apontadas como consequências do controlo das rendas a fixidez residencial, a «transferência forçada de rendimentos de senhorios para inquilinos, transferência, essa, que, naturalmente abstrai dos rendimentos dos vários actores envolvidos, com as inerentes distorções económicas e injustiças sociais gritantes». O diminuto preço do locado propicia a retenção de casas não habitadas pelos inquilinos. Verifica-se, por outro lado, que muitos senhorios mantêm fogos devolutos por não confiarem no mercado de arrendamento. Por virtude dos baixos níveis das rendas, o Estado perde, no domínio da tributação dos rendimentos prediais, milhões de contos, que, de outro modo, poderia canalizar para o mercado fundiário. Também o regime da transmissão do arrendamento manifesta a iniquidade do sistema. Como solução aponta-se «a liberalização ou, pelo menos, a correcção substancial das rendas antigas, por forma a potenciar o encontro entre a oferta e a procura, uma maior mobilidade residencial e a criação de adequadas condições de preservação e conservação do património», em articulação com a atribuição de «subsídios sociais de apoio às camadas sociais de mais baixos rendimentos, à semelhança do que foi efectuado, aliás, noutros países.» Recorde-se, a esse respeito, que uma grande parte dos arrendatários antigos é composta de idosos e reformados, camadas sociais de notória debilidade económica. São apontadas outras insuficiências do quadro legal no que toca à preservação do parque habitacional, tais como, a não consagração da plena repercutibilidade pelo senhorio, na renda, do custo das obras de conservação e reparação; a impossibilidade legal de proceder ao aumento de renda por motivo de obras, sem acordo do inquilino; a inexistência de subsídios de renda para fazer face a situações de aumentos compensatórios de renda por realização de obras. São, do mesmo modo, referidas as dificuldades legais e processuais despejo nas situações em que o senhorio pretenda alterar ou ampliar o locado (Lei n.º 2088, de 3 de Julho de 1957). Considera a API constituir o programa RECRIA o único incentivo legal à conservação dos prédios, ainda que de eficácia limitada por não ponderar o legislador, ao traçar o respectivo regime, a repercussão dos valores despendidos nos valores das rendas. E, denotando as insuficiências do actual sistema de realização de obras adianta, «em qualquer caso, e no quadro de uma reforma séria do sistema, os senhorios, em nome de elementares princípios de justiça, só poderão ser obrigados a efectuar obras cujos custos não excedam o normal rendimento dos prédios, isto de acordo com o princípio da adequada proporção entre o direito do proprietário à rentabilidade do seu investimento e uma adequada estabilidade na permanência e no custo da renda.» No entender da API concorrem para a degradação dos prédios urbanos motivações de ordem cultural, económica e jurídico-política. «A salvaguarda do património é, em primeiro lugar, uma questão cultural. Entre nós, só em anos recentes, surgiram sinais de uma tomada de consciência sobre a importância vital da preservação e reabilitação do património. As iniciativas provêm, regra geral, das camadas mais jovens da população e visam a defesa do património histórico, arquitectónico e paisagístico. Mas este movimento ainda não chegou decisivamente ao património habitacional. (…) As estatísticas dizem-nos que os gastos com a conservação e a reabilitação do património habitacional não ultrapassam, anualmente, 5% do investimento total do sector. Em França e Itália essa percentagem alcança, actualmente, entre 35% e 40%. Uma recomendação do Conselho da Europa, de 1975 (Carta de Amsterdão), estabelece que os fundos públicos dotados à reabilitação nos Centros Urbanos deverão ser pelo menos equivalentes aos destinados a nova habitação». A respeito do segundo núcleo do problema, o sistema de financiamento da habitação, considera a API como vocacionados para o investimento em prédios de rendimento os «investidores institucionais», tais como os fundos de pensões, as companhias de seguros, os bancos, os grandes proprietários imobiliários, os grandes grupos comerciais e industriais. Ao investimento fundiário podem, também, existindo as necessárias condições de segurança e rentabilidade, ser afectas reservas das autarquias locais, com reflexos na dinamização da preservação do património. Não só no campo do mercado do arrendamento, mas, do mesmo modo, no mercado de compra de casa se verificam elevados níveis de carência imobiliária. Salienta a API a insuficiência manifesta do actual sistema de financiamento à habitação, que não comporta incentivos adequados ao arrendamento ou à aquisição de casa, nem à execução de um empreendimento imobiliário. E, a este propósito, aduz existirem, tão só, medidas esparsas, na «ausência de um verdadeiro sistema de poupança habitação, ou seja um sistema financeiro-fiscal vocacionado para a canalização e mobilização de poupanças para a habitação (…). O sistema fiscal não atende aos sacrifícios necessários à compra ou ao arrendamento de habitação e, ao mesmo tempo, não estimula os proprietários a arrendarem os seus prédios. Independentemente da insipiência desta realidade nos Impostos sobre o Rendimento, que de tão óbvia não merece sequer comentários, repare-se como a propriedade se revela um bem precioso nos cálculos de qualquer Ministro das Finanças – Sisa, Contribuição Autárquica, Imposto sobre Sucessões e Doações. A urgência da criação de um tal sistema integrado e coerente de apoio à procura e à oferta privada é sobrelevada pelo facto de, de acordo com dados do INE (Instituto Nacional de Estatística), e no universo dos últimos trinta anos, a Oferta de Habitação se ter distribuído da seguinte forma – Sector Cooperativo – 2,2%, Sector Público – 8,9% e Sector Privado – 88,9%.» Após observar que os esforços no domínio de parque habitacional se concentram, fundamentalmente, na construção de novas habitações, em detrimento da reabilitação e da conservação, propõe a API a criação de incentivos à promoção imobiliária, de subsídios e bolsas destinados à formação de técnicos na área de reabilitação por forma a colmatar a actual escassez de conhecimentos em matéria de recuperação do património habitacional, a adopção de uma política fiscal que tenda a beneficiar a recuperação em confronto com a construção «ex novo». No âmbito do procedimento de demolição para aumento do número de fogos ou para ampliação, aponta a necessidade de simplificar a aprovação de projectos de demolição e de imprimir maior celeridade ao processo, em particular em situação de ruína iminente, nas quais importa encontrar soluções que promovam o realojamento, em tempo adequado, das famílias que ocupam edifícios à beira da derrocada. Impõe-se melhorar a eficácia da gestão do património público habitacional, através da sua profissionalização e por forma a acentuar a intervenção das entidades públicas nas franjas mais deterioradas do parque habitacional. Apela a API ao estabelecimento de mecanismos de adequada cooperação entre o Estado e a câmara municipal.
7. Associação dos Empresários da Construção e Obras Públicas
A contribuição da Associação dos Empresários da Construção e Obras Públicas (AECOPS) para o objecto do estudo em análise traduziu-se no envio, para consulta, de um projecto elaborado pela Associação para o Relançamento da Habitação pelo Arrendamento, já submetido à apreciação da Secretaria de Estado da Habitação. Reportando-se aos resultados do «Censos 91» sobre habitação (efectuado pelo Instituto Nacional de Estatística no ano indicado), a Associação refere os problemas inerentes ao défice de fogos para habitação (mais de meio milhão), à situação do património habitacional, envelhecido e degradado, e ao facto de cerca de 80% dos proprietários ocuparem a sua própria casa. Quanto a este último aspecto, ilustrado também com a redução verificada nos últimos anos de casas arrendadas, considera a mesma Associação que a rigidez do regime legal do arrendamento que vigorou até 1990, conjugada com o congelamento das rendas, «ditou a morte do arrendamento urbano em Portuga»". Especificamente sobre o objecto do presente estudo, é dito que «um dos problemas pior quantificados, sobre o qual pouco se sabe e que está relacionado com a evolução que acabámos de descrever, diz respeito ao estado de conservação do parque habitacional existente. Da análise do Censos 91 é possível reter algumas informações relevantes: – dos cerca de 4,1 milhões de alojamentos clássicos existentes, quase 450 mil encontravam-se vagos em 1991, dos quais 41 mil aguardavam demolição, 84,6 mil para venda, 50,5 mil para arrendar, e sobre os restantes 264 mil não se conhecia o destino provável; – dos cerca de 3 milhões de alojamentos clássicos ocupados como residência habitual, mais de 746 mil tinham sido construídos antes de 1945 (dos quais 378,7 mil tinham sido construídos antes de 1919). Como os censos não fornecem nenhuma informação sobre o estado de conservação do parque habitacional existente, a observação empírica e a conjugação destas duas informações permitem supor que ascendem a umas largas centenas de milhar os fogos que carecem de reabilitação (só na cidade de Lisboa as chuvas do último inverno provocaram a derrocada de umas dezenas de edifícios). Por outro lado e como não estão disponíveis elementos que permitam quantificar e qualificar os problemas existentes de reabilitação, assumimos no presente estudo que o valor médio de reabilitação desses fogos se aproxima do custo de construção de fogos novos». Entre as propostas da Associação com vista a alcançar o objectivo de relançamento da habitação pelo arrendamento através do aumento anual da produção de fogos (quer novos, quer resultantes da reabilitação de parte dos já existentes), contam-se a adopção de medidas concretas no plano jurídico (a flexibilização do regime do arrendamento e a actualização das rendas), no plano fiscal e financeiro (desde a redução de impostos à criação de incentivos fiscais para as actividades ligadas à construção e ao arrendamento de edifícios e fracções) e no plano empresarial (nomeadamente através de acções de formação de pessoal e de modernização empresarial). Em conclusão, o contributo das diversas entidades públicas e privadas auscultadas traduz-se nos aspectos seguintes: a) Pela Secretaria de Estado da Habitação foi dada ênfase ao conjunto de medidas de apoio na forma de subsídios a fundo perdido e crédito bonificado para recuperação de fogos degradados, decorrentes quer da ampliação do programa RECRIA, quer da criação de um regime específico de apoio para núcleo urbanos históricos declarados áreas críticas de recuperação e reconversão urbanística (REHABITA) e para edifícios antigos em propriedade horizontal (RECRIPH). b) Pelo Instituto de Gestão e Alienação do Património Habitacional do Estado foi apontada como a principal causa de degradação do património habitacional a não realização de obras de conservação dos edifícios, o que se fica a dever fundamentalmente à exiguidade das rendas, o que justifica a impossibilidade de realização das obras, por insuficiência económica, nuns casos, e noutros pela evidente falta de interesse na sua execução, atenta a nula rentabilidade do investimento. Também os inquilinos não dispõem de capacidade económica que lhes permitam suportar os custos das obras, quer substituindo-se aos proprietários, quer mediante repercussão no valor das rendas. c) A Câmara Municipal de Lisboa, através da Vereação do Pelouro da Conservação de Edifícios, aponta, também, o congelamento das rendas como causa da falta de preservação dos imóveis. Sobre os procedimentos de execução coerciva, foi informado que a intervenção municipal se dirige, prioritariamente, aos prédios considerados em situação de risco iminente de acidente por instabilidade da construção ou partes desta. Como critério acessório da actuação municipal, releva, também, a taxa de ocupação do imóvel. Não obstante constituírem estes prédios uma ameaça à segurança pública, não se verifica em todas as situações uma intervenção apta a remover o perigo, seja através da realização de obras, seja por aplicação de medidas cautelares, designadamente, a interdição da utilização de partes ou da totalidade das edificações, bem como dos espaços e vias públicas confinantes ou o despejo sumário dos ocupantes. As insuficiências de índole orçamental foram apontadas como justificação quer para o não exercício do poder de substituição dos proprietários na conservação dos prédios, quer para a excessiva demora dos procedimentos de execução coerciva. A título exemplificativo, refira-se que apenas no início do ano de 1996 foi iniciada a execução de obras relativas a empreitadas adjudicadas nos anos de 1993 e 1994. Não foram disponibilizados quaisquer dados relativos ao número de imóveis carecidos de imediata intervenção, não possuindo, inclusive, a câmara municipal indicação quantitativa relativa às edificações que ruíram nos últimos cinco anos. A insuficiência dos elementos de facto fornecidos não permite uma apreciação rigorosa do exercício dos poderes camarários. d) O vereador do Pelouro da Habitação, Segurança, Pessoas e Bens, fez referência a um projecto de medidas legislativas, apresentado ao Governo, com vista à definição de um regime de gestão administrativa de terrenos e edifícios. Consiste esta proposta na atribuição às câmaras municipais do poder de expropriar os prédios, irrecuperáveis e devolutos, cujos proprietários não tivessem cumprido as intimações camarárias para realização de obras. Uma vez expropriado, o prédio seria, em seguida, colocado em hasta pública com a condição de o adquirente assegurar, através de garantia bancária, o início das obras no prazo estabelecido. O produto da alienação, deduzido dos encargos administrativos, seria colocado à disposição do proprietário inicial, como forma de pagamento da indemnização. e) A Associação Lisbonense de Proprietários reconduz o problema da degradação e ruína do património residencial ao regime do arrendamento urbano, dado o carácter vinculístico do contrato e, sobretudo, o valor irrisório das rendas, em virtude das políticas de congelamento e limitação das rendas. A Associação considera ainda injusto o cometimento de uma função assistencialista dos senhorios para com os arrendatários, traduzida no baixo valor das rendas, e desproporcionadas as imposições de realização de obras de beneficiação, quando impliquem despesas excessivas e exigências gravosas. A falta de informação sobre os problemas é apontada também como uma das causas da insuficiência de soluções encontradas. f) A Associação dos Inquilinos Lisbonenses considera que o estado de degradação das casas em Lisboa se fica a dever ao não cumprimento, por parte dos proprietários, do dever de realização de obras periódicas de conservação, a que acresce a imputação aos proprietários de actuações e omissões ilícitas potenciadoras da degradação dos imóveis. Por outro lado, a actuação camarária é tardia e ineficaz. São apontadas causas de ordem legal, como a falta de clareza do RAU e o RGEU, em especial no que concerne aos conflitos relativos à natureza das obras e ao valor das rendas, pelo que se sugere a alteração daqueles diplomas. g) Para a Associação dos Promotores Imobiliários, as raízes do problema assentam em dois núcleos: o quadro legal, em particular, a prorrogação forçada do contrato de arrendamento e o congelamento das rendas, e a falta de um adequado sistema de financiamento à habitação. Neste âmbito, salienta-se a insuficiência dos montantes gastos com a conservação e reabilitação do património habitacional, que não ultrapassam, anualmente, em Portugal, 5% do investimento total do sector, ascendendo, em França e Itália, a 35% e 40%, respectivamente. Os efeitos decorrentes dos aspectos negativos enunciados não foram, no entender da Associação, devidamente corrigidos com a publicação do RAU, já que sendo a larga maioria dos arrendamentos ainda de duração ilimitada, os coeficientes de actualização anual das rendas ficam muito aquém da inflação. Quanto à existência de fogos devolutos, considera a API que o diminuto preço do locado propicia a retenção de casas não habitadas pelos inquilinos e a falta de confiança no mercado de arrendamento explica o estado de abandono a que são votadas pelos respectivos proprietários. Como insuficiências de ordem legal são também apontadas a não consagração da plena repercutibilidade pelo senhorio, na renda dos custos das obras de reparação e a inexistência de subsídios de renda para fazer face a situações de aumentos compensatórios de renda por motivo de obras. Propõe a API a criação de incentivos à promoção imobiliária, de subsídios e bolsas destinados à formação de técnicos na área da reabilitação e a adopção de uma política fiscal que privilegie a recuperação em confronto com a construção de novas edificações. h) A Associação dos Empresários da Construção e Obras Públicas enviou um projecto elaborado e apresentado ao Governo com vista ao Relançamento da Habitação pelo Arrendamento. As propostas foram efectuadas com base em dados contidos no «Censos 91» sobre habitação, realizado pelo Instituto Nacional de Estatística, pese embo