Ministro da Solidariedade e da Segurança Social
Número: 2/B/97
Processo: 2863/96
Data: 14.01.1997
Àrea: A3

Assunto: SEGURANÇA SOCIAL – PENSÃO DE ALIMENTOS – EX-CONJUGE – PRESTAÇÃO POR MORTE – HERDEIROS HÁBEIS

Sequência: Não Acatada

1. Foi-me solicitada a intervenção relativamente ao indeferimento, por parte do Centro Nacional de Pensões, de um pedido de concessão de pensão de sobrevivência.

2.A situação de facto relevante resume-se, essencialmente, ao seguinte:

2.1. A interessada foi casada com um contribuinte do regime geral da segurança social do qual se separou por sentença transitada em julgado em … de 1969, separação esta convertida em divórcio por sentença de … de 1975.

2.2. Nesta decisão judicial foi o referido subscritor julgado único culpado pelo divórcio, nada se dispondo quanto ao dever de prestação de alimentos entre os ex-cônjuges.

2.3. Posteriormente ao divórcio e não obstante tal matéria não ter sido contemplada na respectiva sentença, a interessada recebeu do seu ex-cônjuge uma quantia atribuída mensalmente, a título de pensão de alimentos.

2.4. A referida interessada nunca requereu – quer na acção de divórcio litigioso quer posteriormente – a fixação judicial da pensão de alimentos por parte do seu ex-cônjuge.

2.5. Por decisão do Centro Nacional de Pensões de … .1996, foi-lhe negada a pensão de sobrevivência por óbito do seu ex-cônjuge, com o fundamento de não ter sido feita prova da fixação judicial do direito a alimentos, nos termos do disposto no art. 11º do Decreto-Lei n.º 322/90, de 18 de Outubro.

3. A análise da situação à luz do regime legal aplicável conduz, forçosamente, à conclusão da conformidade legal da decisão da Centro Nacional de Pensões. E diversa não teria sido a solução caso o ex-cônjuge da interessada revestisse a qualidade de subscritor da Caixa Geral de Aposentações, atenta a identidade de regimes contidos no Decreto-Lei n.º 322/90 e no art.º 41º do Estatuto das Pensões de Sobrevivência aprovado pelo Decreto-Lei n.º 142/73, de 31 de Março.

4. Não deixa, porém, de ser nítida a injustiça da aplicação ao caso concreto do mencionado dispositivo legal.

5.A provarem-se os factos alegados pela interessada, há que reconhecer que lhe assistia – porque não considerada cônjuge culpada pelo divórcio – o direito a exigir alimentos do seu ex-cônjuge, nos termos do art. 2016 n.º 1 a) do Código Civil, e que, até à morte daquele, o poderia ter feito com recurso à via judicial.

6.Não é, contudo, difícil compreender que tal não tenha sucedido, se o seu ex-cônjuge, após o divórcio, lhe entregou, com carácter de regularidade, uma quantia mensal que não tivesse outra razão que a de prover ao seu sustento.

7. Afigura-se, assim, manifestamente injusta a negação do direito à pensão de sobrevivência por não ter sido reconhecido judicialmente um direito que, no plano de facto, foi sempre satisfeito. Não se vislumbram razões para considerar exigível à interessada a propositura de uma acção judicial destinada a reconhecer um direito – e o correspondente dever – que estavam, respectivamente, a ser exercido e cumprido.

8. Ainda que se aceite que a interessada poderá, no momento presente, propor uma acção declarativa de simples apreciação, mediante a qual requeira a declaração judicial de que lhe assistia o direito a alimentos do seu ex-cônjuge, em vida deste e que, por essa razão, deve ser considerada herdeira hábil para efeitos de atribuição de pensão de sobrevivência, considero que o actual quadro legislativo requer a introdução de alguns ajustamentos.

9. Na verdade, parece de evidente justiça permitir às pessoas nas condições da interessada a prova extra-judicial de que:

a) se encontram numa das situações em que a lei estabelece o direito a alimentos, em caso de divórcio ou separação judicial de pessoas e bens;

b) tal direito, embora não reconhecido judicialmente, foi satisfeito pelo respectivo obrigado, até à data da sua morte.

10. Não me parece, por outro lado, que razões de segurança desaconselhem tal solução: as condições de que a lei faz depender o direito a alimentos são, de um modo geral, comprovadas pela sentença que decreta o divórcio ou a separação judicial de pessoas e bens; a prova do cumprimento da obrigação de alimentos não tem cariz subjectivo, podendo resultar com clareza de documentos ou de prova testemunhal.

11. Em face do actual quadro normativo, o reconhecimento da prova extra-judicial mencionada exige a alteração da redacção do artigo 11º do Decreto-Lei n.º 322/90, de 18 de Outubro.

12. Já em 17 de Janeiro de 1995 dirigi uma recomendação nesse sentido ao Senhor Ministro do Emprego e da Segurança Social.

13. Em resposta à Recomendação 1-B/95, foram aduzidas razões que se prendem com a dificuldade em provar o pagamento regular da prestação de alimentos e com o tratamento legal dado a situações qualificadas como análogas (a união de facto), concluindo pela improcedência da recomendação.

14. No entanto, o primeiro aspecto constituiria obstáculo a resolver pelos interessados sobre quem recairia o ónus de tal prova.

15. Por outro lado, a situação em análise não é comparável com a união de facto, já que nesta é necessário provar vivência em condições análogas às dos cônjuges e o estabelecimento de um prazo ou outro requisito de verificação da regularidade do pagamento, invocado pelo M.E.S.S., é um aspecto atinente à mera regulamentação do regime que, só por si, não obstaria ao acatamento da Recomendação.

16. Em face do exposto,

RECOMENDO

A Vossa Excelência no sentido de ser alterada a norma constante do art. 11º do Decreto-Lei n.º 322/90, de 18 de Outubro, de modo a serem considerados herdeiros hábeis para efeitos de pensão de sobrevivência os divorciados ou separados judicialmente de pessoas e bens que demonstrem extra-judicialmente a verificação das circunstâncias supra referidas em 9.

Cumpre-me, ainda,referir que,sendo idênticos os regimes de concessão de pensões de sobrevivência a divorciados e separados judicialmente de pessoas e bens nos sistemas de segurança social do sector privado e da função pública formulei, nesta data, recomendação de teor idêntico a Sua Excelência o Ministro das Finanças, para alteração, no sentido aqui propugnado, do art. 41º do Estatuto das Pensões de Sobrevivência aprovado pelo Decreto-Lei n.º 142/73, de 31 de Março.

O PROVEDOR DE JUSTIÇA

JOSÉ MENÉRES PIMENTEL