Ministro da Justiça
Processo:R-2531/93
Número: 12/B/96
Data:28.03.1996
Área: A5

Assunto:ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA – PROCESSO JUDICIAL – PERITO – REMUNERAÇÃO DESACTUALIZADA – MEDIDA LEGISLATIVA.

Sequência:Parcialmente Acatada

Têm-me sido dirigidas múltiplas exposições, apresentadas por intervenientes acidentais em processos judiciais, nomeadamente peritos – Engenheiros Civis e Revisores Oficiais de Contas – nas quais se alega que:
– foram nomeados peritos pelos Tribunais, no âmbito de processos judiciais em que se exige a sua intervenção;
– as intervenções em apreço, para além das peritagens e inspecções propriamente ditas, e não obstante variarem as características de acordo com o caso concreto, quase sempre implicam tempo dispendido com a deslocação ao local respectivo, reuniões de trabalho e a redacção do relatório final;
– as diligências de que são incumbidos prolongam-se, a maior parte das vezes, por muitos dias, com perturbação das suas vidas profissionais.

Mais realçam que não estão em causa a natureza das nomeações e a sua reconhecida necessidade, mas sim os valores das remunerações que lhes são atribuídas e arbitradas de acordo com os critérios estipulados no Código das Custas Judiciais, manifestamente desajustadas da realidade e carecendo de actualização, conforme demonstram alguns exemplos apresentados:
a) um, expresso em sentença proferida em 23 de Março de 1993, no âmbito de processo que correu termos no Tribunal Judicial de Vale de Cambra, relativamente a um Engenheiro Civil, cujas funções prestadas em 15 dias (que, de acordo com a respectiva nota de honorários, equivaleriam a 36.000$00) foram remuneradas com a quantia de 12.000$00 (Doc. 1. em anexo);
b) outro, quanto a um Revisor Oficial de Contas, que, tendo sido nomeado em Julho de 1992 pelo Tribunal de Leiria para efectuar uma peritagem com o fim de dirimir um conflito entre duas empresas, e tendo entregue o correspondente relatório em 20 de Outubro de 1992 e a nota de honorários no valor de 150.000$00, veio a auferir 18.000$00 (Doc. 2. em anexo).
Na sequência das exposições referidas, e após estudo da matéria em apreço, verificou-se que os valores previstos no artigo 69.º do Código das Custas Judiciais, de acordo com os quais são atribuídas as remunerações em causa, não sofreram qualquer alteração desde a redacção que foi dada a este preceito pelo Decreto-Lei n.º 118/85, de 19 de Abril, não obstante terem ocorrido posteriormente alterações ao Código das Custas Judiciais, através do Decreto-Lei n.º 387-D/87, de 29 de Dezembro, que no entanto não aumentou os valores em questão.

Na verdade, os emolumentos a que têm direito os peritos ou louvados em processo cível ou em processo obrigatório, os peritos ou louvados com conhecimentos especiais e os técnicos, e ainda os peritos ou técnicos diplomados com curso superior quando a lei exija essa habilitação, são, respectivamente, de 400$00, 300$00, 800$00 e 1.200$00 por dia, conforme as alíneas a), b) e c), do n.º 1 do artigo 69.º em causa.

A diversidade dos emolumentos – expressão que, não obstante ser de natureza equívoca, significa, nesta sede, a remuneração devida a outrem pelo serviço prestado – constante das alíneas citadas assenta na preparação técnica, científica ou literária das pessoas nomeadas para colaborar com os operadores judiciários, exigida pela natureza do serviço que são chamadas a realizar.

Tem sido salientada a desactualização e inadequação dos valores em causa. “A base remuneratória fixa prevista no mesmo artigo revelava-se inadequada à realidade (por maioria de razão quanto à actual) provocando distorções indesejáveis, que nem sempre a intervenção judicial prevista no art.º 70.º é susceptível de corrigir” (nota 3. ao art.º 69.º, S. COSTA, Código das Custas Judiciais, 1989, 2ª ed., pp. 91). “Nesse sentido, e também em 1989, é de referir que as mesmas verbas do art.º 69.º foram consideradas desactualizadas” (nota 3, ao art.º 70.º, JOSÉ G. J. ROQUE/HUMBERTO J. MELO, Código das Custas Judiciais, 2ª ed., pp. 74).
Mais recentemente, o artigo 35.º do Anteprojecto do Código das Custas Judiciais, publicado em Agosto de 1995, e no que à mesma matéria diz respeito, vem propor:

– no n.º 2, que “Os peritos e louvados em cada avaliação que não requeira conhecimentos especiais, percebem a décima parte de uma Unidade de Conta (UC), com o limite de uma UC para várias avaliações efectuadas no mesmo dia”; e,
– no n.º 3, que “Os demais peritos e louvados, os tradutores e os intérpretes recebem por dia a remuneração fixada pelo tribunal em conformidade com a actividade desenvolvida e o disposto nas alíneas seguintes:
a) Os peritos e louvados com conhecimentos especiais, entre um décimo e metade de uma UC;
b) Os peritos diplomados com curso superior, quando a lei exija essa habilitação, entre um quinto e uma UC”.

Compulsando os elementos disponíveis, conclui-se que os valores em apreço, ainda que ligeiramente revistos naquele Anteprojecto, continuam manifestamente desadequados da realidade e são desmotivadores do bom exercício das funções em causa, por serem irrisórios relativamente aos valores pagos por serviços idênticos no contexto profissional normal de cada especialidade.

Do Programa do actual Governo, e no âmbito da Política Judiciária, consta a revisão do regime de custas judiciais, referindo-se expressamente, todavia, apenas à sua simplificação e à limitação da tributação dos incidentes processuais.

Considerando que os operadores judiciários são, cada vez mais, forçados a recorrer, no exercício das suas funções, à colaboração de técnicos com conhecimentos especiais que pressupõem uma base científica, tecnológica ou literária específica, e que as remunerações previstas para estes técnicos se mostram inadequadas, entendo, ao abrigo da competência que me é conferida pelo artigo 20.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 9/91, de 9 de Abril,

RECOMENDO:
que, no âmbito do actual processo de revisão do Código das Custas Judiciais, se proceda à alteração dos valores das remunerações atribuídas aos intervenientes acidentais nos processos judiciais, no sentido de se aproximarem, na medida do possível, dos valores correspondentes aos mesmos serviços prestados no contexto profissional normal de cada especialidade.

O PROVEDOR DE JUSTIÇA

José Menéres Pimentel