Presidente da Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia
Processo:R-374/95
Número: 81/A/96
Data:18.10.1996
Área: A1

Assunto:URBANISMO E OBRAS – OBRAS PARTICULARES – GARAGEM – ALVARÁ DE LOTEAMENTO – DESCONFORMIDADE – DEMOLIÇÃO – DESPEJO ADMINISTRATIVO.

Sequência: Não acatada

I-Exposição de Motivos

1. Foi apresentada na Provedoria de Justiça uma queixa na qual se alegava que um edifício em construção na Rua Padre António Soares, em Vila Nova de Gaia, apresentava um corpo construído não previsto no alvará de loteamento, mais concretamente um aproveitamento em cave além da mancha de implantação prevista.

2. Solicitados esclarecimentos à Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia, foram pela mesma confirmados, através do ofício n.º …, os factos objecto da queixa, e acrescentado que fora deliberado aguardar que o infractor obtivesse autorização escrita de dois terços dos proprietários dos lotes, por forma a viabilizar uma alteração do alvará de loteamento que permitisse a legalização das obras.

3. Insistindo a Provedoria de Justiça junto da Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia, designadamente quanto ao facto de não ter sido fixado prazo ao infractor para a obtenção do consentimento dos proprietários dos restantes lotes, a autarquia respondeu através do ofício n.º …, informando que a declaração de autorização não fora ainda apresentada, pelo que ia ser de novo pedida, fixando-se para o efeito um prazo de 30 dias.

4. De novo questionada pela Provedoria de Justiça, veio a Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia informar, pelo ofício n.º …., que a declaração de autorização não fora apresentada, e que, encontrando-se a obra concluída e habitada, fora elaborada participação por ocupação ilegal.

5. Nos termos do art.º 1.º, n.º 1, al. a), do Decreto-Lei n.º 445/91, de 20 de Novembro, as obras em causa só podiam realizar-se após licenciamento, o qual teria de respeitar o alvará de loteamento em vigor (art.º 63.º, n.º 1, al. a), do Decreto-Lei n.º 445/91), sob pena de nulidade do acto (art.º 52.º, n.º 1, al. b] , do mesmo diploma).

6. Assim, o aproveitamento em cave para além da mancha de implantação prevista no loteamento, embora sujeito a licenciamento, não foi licenciado, nem o poderia ter sido validamente, por contrariar alvará de loteamento em vigor.

7. Ao presidente da câmara municipal compete ordenar a demolição de obra não licenciada e, quando seja o caso, determinar que se reponha o terreno nas condições em que se encontrava antes da infracção (art.º 58.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 445/91, e art.º 53.º, n.º 2, al. l], do Decreto-Lei n.º 100/84, de 29 de Março), seguindo o procedimento disciplinado no Decreto-Lei n.º 92/95, de 9 de Maio.

8. Este poder tem de ser articulado com o poder contido no art.º 167.º do Regulamento Geral das Edificações Urbanas, que permite à câmara municipal a aprovação de obras que se encontrem executadas, embora sem licença, ou ao arrepio da licença outorgada.

9. Este poder constitui um corolário do princípio da proporcionalidade, pois pretende evitar-se o excesso de virem a ser demolidas obras que preencham os requisitos urbanísticos substantivos, ou seja, obras que se mostrem conformes com os critérios de estética, salubridade, segurança e ordenamento.

10. Assim, o presidente da câmara municipal há-de ordenar a demolição desde que a obra não possa por outro meio satisfazer aos requisitos legais e regulamentares de urbanização, estética, segurança e salubridade das edificações, como há-de ordená-la também quando o interessado nada promova com vista à legalização da obra.

11. É, hoje, este o entendimento sufragado pelo Supremo Tribunal Administrativo em acórdão de 06.11.1990 (proc.º 28440, AJ, n.ºs 13-14, p. 35):
“caso os particulares ou pessoas colectivas procedam a construções sem licença ou com inobservância das condições desta, dos regulamentos, posturas municipais ou planos directores, de urbanização ou de pormenor em vigor, devem as câmaras municipais, no exercício de um poder vinculado, ordenar a demolição dessas construções”.

12. Em conclusão sobre os factos, não resta alternativa à demolição das obras reclamadas, pois as mesmas não preenchem os parâmetros enunciados no art.º 167.º do Regulamento Geral das Edificações Urbanas, no que respeita aos requisitos de urbanização, uma vez que contrariam alvará de loteamento em vigor. De outro modo, permaneceria afrontado o princípio da legalidade com o que isso, acrescidamente, importa no plano da autoridade dos órgãos municipais e da segurança jurídica dos munícipes.

13. A verificar-se que a demolição possa ameaçar a solidez da estrutura da edificação, deverá a Câmara Municipal, pelo menos, despejar administrativamente a parte ilegal, usando a faculdade consagrada no art.º 165.º do Regulamento Geral das Edificações Urbanas e fundando-se na falta de licença de utilização.

II-Conclusões

Em face do exposto, e com vista à reparação da ilegalidade cometida, entendo exercer o poder que me é conferido pelo art.º 20.º, n.º 1, alínea a), da Lei n.º 9/91, de 9 de Abril, e como tal

RECOMENDO:
Que V.ª Ex.ª ordene a demolição da obra reclamada, nos termos do art.º 58.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 445/91, de 20 de Novembro, alterado pelo Decreto-Lei no 250/94, de 15 de Outubro, e art.º 53.º, n.º 2, alínea l), do Decreto-Lei n.º 100/84, de 29 de Março, cumprindo o procedimento descrito no Decreto-Lei n.º 92/95, de 9 de Maio.

O PROVEDOR DE JUSTIÇA

José Menéres Pimentel