Presidente da Câmara Municipal de Grândola
Processo:R-2304/96
Número: 73/A/96
Data:2.10.1996
Área: A1

Sequência:Acatada parcialmente

Assunto:URBANISMO E OBRAS – LOTEAMENTO – ALTERAÇÃO DO ALVARÁ – EXECUÇÃO DE PLANOS – ERRO DE DIREITO – LICENÇA DE CONSTRUÇÃO – DESVIO DE PODER

I-Exposição dos Motivos

(§1.º)-Descrição dos Factos

A-Do pedido de intervenção do Provedor de Justiça

1. Ao Provedor de Justiça foi apresentada queixa, em 20 de Junho p.p., por um grupo de cidadãos identificados, relativa ao procedimento em curso de alteração ao alvará de loteamento n.º …, emitido em 8-6-1990 pela Câmara Municipal de Grândola, na sequência de requerimento da … – Sociedade Imobiliária … .

2. Verificada a competência do Provedor de Justiça para intervir, uma vez que se imputa à Câmara Municipal de Grândola uma conduta administrativa tida por ilegal, importa delimitar o objecto da queixa e sumariar as razões que a determinam.

3. Fundamentalmente, a queixa reporta-se às alterações que o município pretende introduzir à disciplina urbanística e de ordenamento do território que se encontra consagrada no referido alvará, bem como também à aprovação de licenças de construção desconformes com a operação de loteamento autorizada.

4. Assim, é reclamada a operação de fusão dos lotes identificados no alvará n.º … com os n.ºs 1, 2, 276, 277, 278, 279, 280, 281, 282 2 283, por forma a permitir a edificação neste conjunto de dois blocos de apartamentos em banda, agravada pelo facto de os trabalhos de construção no local terem sido já iniciados. Outro tanto se reclama por conta da operação de fusão dos lotes n.ºs 183 e 184.

5. Do mesmo passo, é contestada a emissão de alvarás de licença de construção em outros lotes em infracção aos condicionalismos fixados no alvará de loteamento, designadamente a construção realizada no lote n.º 68.

6. Entendem os queixosos que as alterações devem ser precedidas da anuência da maioria de dois terços dos proprietários de imóveis ou suas fracções compreendidas na área abrangida pelo alvará.

7. Por aditamento de 19 de Julho p.p., vieram os reclamantes informar terem sido os proprietários notificados do teor da proposta de alteração promovida pela Câmara Municipal de Grândola, para o efeito de se pronunciarem sobre o conteúdo da mesma.

8. Não obstante, pretendem ver mantida a intervenção do Provedor de Justiça porque a participação pedida aos proprietários é meramente consultiva, já que o procedimento seguido é o previsto no art.º 37.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 448/91, de 28 de Novembro, respeitante a alterações por iniciativa municipal.

9. Dizem-se lesados nos seus direitos e legítimos interesses, uma vez que a posição desfavorável à alteração poderá não ser consequente, com o resultado de verem defraudados os critérios de ocupação, de volumetria e de impacto que o alvará de loteamento n.º … faz valer, dado que no respectivo quadro e planta de síntese são individualizados os lotes n.ºs 1, 2, 183, 184 e 276 a 283, conforme se pode observar de reprodução deste documento.

B-Das Informações Pedidas ao Órgão Visado

10. Para poder formular conclusões sobre a procedência da queixa, e de modo a dar cumprimento ao dever de audição prévia do órgão reclamado, tal como se dispõe no art.º 34.º do Estatuto do Provedor de Justiça, foram pedidas informações instrutórias à Câmara Municipal de Grândola, através do ofício n.º …. dirigido ao seu Exm.º Presidente.

11. Ali se inquiriu o município sobre os procedimentos seguidos para as alterações mencionadas, solicitando descrição dos seguintes aspectos:

a) data e conteúdo das deliberações camarárias que hajam aprovado requerimento da SOLTRÓIA, S.A.;
b) teor dos pareceres emitidos;
c) fundamentos legais invocados para as alterações a promover;
d) licenciamento de construções requeridas para os lotes cuja fusão se reclama;
e) conformidade dos projectos de construção aprovados com as condicionantes do alvará de loteamento n.º … .

12. Mais se pediu à Câmara Municipal que facultasse a esta Provedoria cópia dos requerimentos, pareceres, deliberações e alvarás pertinentes.

C-Da Resposta Do Órgão Visado

13. Veio a resposta ao solicitado a ser obtida em 7 de Agosto p.p., em sentido desfavorável à procedência das objecções manifestadas pelos reclamantes.

14. Começa a Câmara Municipal por explicar que o alvará n.º … corresponde, ele próprio, ao resultado de alterações introduzidas aos alvarás de loteamento n.ºs … .

15. Responde que as alterações reclamadas já haviam sido aprovadas pela Câmara Municipal sem que, no entanto, se encontrassem consagradas no respectivo alvará.

16. De resto, a alteração tendente a fundir num só lote os lotes n.ºs 1, 2 e 276 a 283 teria recebido, em 16-4-1990, parecer favorável da Comissão de Coordenação da Região do Alentejo (CCRA), ao que se seguiu deliberação camarária de aprovação em 4-5-1990.

17. Por seu turno, a fusão dos lotes n.ºs 183 e 184 terá merecido parecer favorável da CCRA e aprovação camarária de 4-10-1990.

18. Todavia, dá-se conta de um procedimento de alterações em curso ao alvará n.º …, iniciado pela CM de Grândola, invocadamente, por sugestão da Inspecção-Geral da Administração do Território.

19. Por esta via, pretende a CM de Grândola “alterar o alvará de loteamento n.º …., de forma a que fiquem devidamente registadas em alvará todas as alterações atrás citadas e que foram, em seu tempo, devidamente aprovadas.” E prossegue, afirmando que “ao abrigo do disposto no art.º 37.º do D.L. 448/91, de 29 de Novembro, a Câmara Municipal de Grândola iniciou o processo de alteração do alvará … .”

20. Quanto ao licenciamento reclamado de construções infractoras do citado alvará, responde a CM de Grândola que para o lote n.º 68 não se verifica o desrespeito pelas condicionantes impostas pelo alvará, sustentando-se na descrição das cérceas e utilização permitidas.

21. Já por reporte às edificações dos restantes lotes nomeados, afirma-se ter ocorrido, em 8-1-1993, aprovação municipal de um Estudo Prévio para Ocupação do Lote 1, após ser obtido parecer favorável da CCRA de 5-2-1992.

22. A Direcção-Geral de Turismo (DGT), em 26-11-1994, aprovou o projecto, ao que se seguiu a emissão do título de licenciamento municipal da construção em 11-1-1995.

23. Em anexo, foram facultadas cópias dos seguintes documentos:
a) Requerimento, de 16-2-1990, da SOLTRÓIA, SA, solicitando a junção da memória descritiva e justificativa adicional e da planta de síntese ao processo de alterações ao alvará em vigor do núcleo C- 1 de Tróia;
b) Parecer favorável dos serviços técnicos camarários de 20-2-1990;
c) Parecer da CCRA, de 16-4-1990, favorável, entre outras alterações, à fusão dos lotes 1, 2, 276 a 283 em dois lotes para edifícios de apartamentos em bandas;
d) Deliberação camarária de 4-5-1990 que aprova alterações às operações de loteamento do núcleo C- 1 de Tróia;
e) Requerimento, de 9-12-1991, da SOLTRÓIA, SA, pedindo a aprovação do Estudo Prévio de Ocupação do Lote 1;
f) Parecer favorável dos serviços técnicos camarários, de 30-1-1992;
g) Pedido de parecer à CCRA, de 14-2-1992;
h) Parecer favorável da CCRA, de 4-5-1992;
i) Deliberação camarária, de 29-5-1992, pela qual se aprova o citado estudo prévio;
j) Ofício da DGT, de 28-10-1992, à CMG, relativo à localização e projecto de apartamentos turísticos a instalar em Tróia;
l) Deliberação camarária, de 8-1-1993, que aprova parecer sobre o projecto;
m) Ofício da CMG à DGT, de 5-2-1993, comunicando a aprovação do projecto;
n) Ofício da DGT à CMG, de 6-12-1994, comunicando aprovação do projecto de alterações e de segurança de apartamentos turísticos no lote 1 da Urbanização Soltróia;
o) Alvará de licença de obras particulares n.º 27/95, de 11-1-1995, para construção de um conjunto de apartamentos e restaurante no lote 1, impondo como condicionamentos os previstos no alvará de loteamento;
p) Requerimento da SOLTRÓIA, SA, de 6-8-1990, pedindo à CMG a fusão de três pares de lotes, a saber: 107/108, 183/184 e 233/372;
q) Comunicação à CMG do parecer favorável, de 9-8-1990, da CCRA ao deferimento do pedido;
r) Deliberação camarária, de 4-10-1990, aprovando o pedido de fusão de 6-8-1990;
s) Alvará de loteamento no 6/90, emitido pelo Senhor Presidente da CM de Grândola em 8-6-1990, onde se titula “a constituição dos lotes que, devidamente numerados e com a indicação das respectivas áreas e destinações, constam da planta regulamento e quadro de áreas que vão apensas ao presente Alvará e dele fazem parte integrante”.
t) Regulamento do alvará de loteamento n.º 6/90, de cujo articulado sobressai, para o caso presente, o disposto no art.º 26.º: “Admite-se a utilização, para fins turísticos, das áreas previstas para habitação, desde que sejam respeitadas todas as condicionantes constantes do presente regulamento, com as necessárias adaptações”.

D-Da Proposta Municipal de Alterações

24. Através de nova comunicação dos queixosos, de 13 de Agosto p.p., foi facultada a esta Provedoria cópia da proposta de alteração ao alvará de loteamento n.º …, tal como notificada, em 16 de Julho p.p., aos proprietários de lotes, para o efeito de se pronunciarem, no prazo de trinta dias, de acordo com o disposto no art.º 37.º, n.º 3 do Decreto-Lei n.º 448/91, de 29 de Novembro.

25. Do seu teor resulta, entre muitos outros aspectos, a proposta de agrupamento dos lotes 1, 2 e 276 a 283 num só lote com 12 049 m2, envolvendo áreas máximas de construção e ocupação de, respectivamente, 6 000 e 2 500 m2, para um máximo de três pisos destinados a apartamentos turísticos, concedendo que, muito embora tivessem sido obtidos os necessários pareceres da Administração Central em 1990, não. havia “sido registada esta operação no quadro síntese e planta síntese anexas ao 6/90”, como afirma, “por manifesto lapso”.

26. O município justifica a alteração que pretende realizar com exigências de execução do Plano Regional de Ordenamento do Território do Litoral Alentejano (PROTALI), aprovado pelo Decreto Regulamentar n.º 26/93, de 27 de Agosto, e do Plano Director Municipal (PDM) de Grândola, ratificado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 20/96, de 8-2-1996, publicado no DR, 1 Série-B, n.º 54, de 4-3-1996.

27. Sustenta a Câmara Municipal que as alterações consubstanciadas no agrupamento de lotes permitem a construção de apartamentos, o que vai ao encontro dos objectivos de incremento da actividade turística (“relegando para segundo plano a construção de segunda habitação”) delineados no art.º 5.º, n.º 2, alínea a) do PROTALI, na área de desenvolvimento turístico do PDM e num futuro Plano de Pormenor “neste momento em fase de execução promovida pela Câmara”.

28. Acrescenta a CM de Grândola que a junção dos referidos lotes alcança, ainda, outros dois propósitos:
primeiro, obsta à edificação de moradias com dois pisos, “ao passo que presentemente se prevê a construção de um conjunto de apartamentos turísticos com um piso acima do arrendamento de acesso”;
em segundo lugar, por poderem os estabelecimentos hoteleiros ultrapassar, de acordo com os citados instrumentos de planeamento territorial, o limite de 6,5 metros de altura, “permitindo-se a altura de 8 metros desde que fique assegurada a sua integração na paisagem”.

29. Globalmente, e por fim, entende a CM de Grândola que as alterações propostas, ainda que sujeitas a parecer da CCRA, contribuem para uma melhoria das condições ambientais, já que reduzem os índices volumétricos, do mesmo passo que mantêm as áreas de construção.

30. Por ofício de 17 de Julho p.p. a CCRA transmitiu à CM de Grândola o teor do parecer que emitiu. Assim, profere parecer desfavorável, na falta do Plano de Pormenor da Área de Desenvolvimento Turístico de Tróia e da completa definição da extensão da Reserva Ecológica Nacional.

(§2.º)-Apreciação das Alterações Propostas

A-Do Regime das Alterações ao Alvará de Loteamento

31. O alvará de loteamento n.º …, emitido em 8-6-1990, não contemplou a agregação dos lotes 1, 2 e 276 a 283, nem dos restantes lotes ora enunciados na proposta camarária de alterações.

32. Em sede de prescrições fixadas no mesmo alvará, releva a primeira que autoriza “a constituição dos lotes que, devidamente numerados e com a indicação das respectivas áreas e destinações, constam da planta regulamento e quadro de áreas que vão apensos ao presente Alvará e dele fazem parte integrante”.

33. A consulta do quadro e planta citados não deixa qualquer dúvida quanto à perfeita individualização dos lotes 1, 2, 276 a 283, definidas a sua localização e áreas e estabelecidos os critérios de ocupação de cada um dos lotes.

34. As alterações requeridas pela SOLTRÓIA, SA, em 16-2-1990, de onde não resulta a agregação dos lotes 1, 2 e 276 a 283 num único lote, apesar de terem recebido parecer favorável da CCRA, são inexistentes no plano jurídico, porquanto nunca vieram a integrar o alvará de loteamento, conforme se observou.

35. A CM de Grândola perfilha este entendimento. De outro modo, não se compreenderia a iniciativa, ao abrigo do disposto no art.º 37.º do Decreto-Lei n.º 448/91, de 29 de Novembro, de levar a cabo a alteração, por substituição, do alvará n.º 6/90, solicitando, para esse efeito, novo parecer à CCRA, pois o parecer emitido por este órgão em 164-1990 já caducara, quer por aplicação do disposto no Decreto-Lei n.º 81/89, de 23 de Março, quer por força do disposto no art.º 43.º, n.º 3 do já citado Decreto-Lei n.º 448/91. Com efeito, se é certo que a operação de loteamento fora licenciada pela Câmara Municipal, certo é também que essa mesma licença não contemplou o pedido de alterações requerido.

36. Não haja dúvidas sobre a aplicação do regime constante do Decreto-Lei n.º 448/91, de 29 de Novembro, às alterações em curso, não obstante ter o alvará n.º … sido emitido em data anterior à do início da vigência deste diploma, dado que no seu art.º 72.º se estipula que as alterações a alvarás de loteamento anteriores obedecem à disciplina contida na lei nova.

37. Importa, então, analisar o regime das alterações a operações de loteamento licenciadas, o qual se reparte entre os art.ºs 360 e 370, sendo respectivamente, aplicáveis as suas regras às modificações requeridas por particulares e às modificações promovidas pelas câmaras municipais.

38. A Câmara Municipal de Grândola seguiu, naturalmente, o regime prescrito no art.º 37.º, pelo que terá de merecer atenção o que nele se prevê, essencialmente, em matéria de pressupostos de facto e de direito que habilitam os municípios a proceder ofíciosamente a alterações sobre alvarás vigentes.

39. Em primeiro lugar, determina o legislador que haja decorrido o prazo de dois anos sobre a emissão do alvará. Este pressuposto mostra-se verificado.

40. 0 mesmo já não se pode reconhecer ao segundo pressuposto definido no art.º 37.º, n.º 1, qual seja o de as modificações a introduzir resultarem da necessidade de executar regularmente plano regional ou municipal de ordenamento do território, área de desenvolvimento urbano prioritário, área de construção prioritária ou área crítica de recuperação e reconstrução urbanística.

41. Desde logo, a posição da Câmara Municipal quanto às alterações pretendidas definiu-se, se não expressamente na deliberação de 4 de Maio de 1990, pelo menos através da deliberação que aprovou o designado estudo prévio de ocupação do lote 1, datada de 8 de Janeiro de 1993.

42. Constata-se facilmente que nas datas referidas não vigorava qualquer plano cuja execução pudesse ser afectada pelas prescrições do alvará 6/90. Isto porque a publicação do Plano Regional de Ordenamento do Território do Litoral Alentejano (PROTALI) ocorreu em 27 de Agosto de 1993 (cfr. Diário da República n.º 201 – 1 Série-B, pp. 4538 e ss.), enquanto o Plano Director Municipal de Grândola, ratificado nos termos da Resolução do Conselho de Ministros n.º 20/96, foi publicado em 4 de Março pp.

43. Podemos, contudo, considerar que as deliberações mencionadas se reportam a procedimento diverso do agora questionado, isto é, foi abandonado o procedimento de alterações por iniciativa particular, manifestada em requerimento, tendo a Câmara optado, recentemente, por alterar, por sua iniciativa, as prescrições do alvará emitido.

44. Tanto assim é, que a CM de Grândola não deixou de solicitar novo parecer à CCRA, nem de cumprir o dever de notificação aos proprietários dos lotes, por força do disposto no art.º 37.º, n.º 3.

45. Em definitivo, é arredada a hipótese de nos encontrarmos perante uma simples rectificação devida a lapso material, o qual sempre seria indesculpável.

B-Da necessidade das alterações para execução de instrumento de planeamento

I-Do Plano Regional de Ordenamento do Território do Litoral Alentejano

46. De acordo com o PROTALI, a área compreendida na proposta de alteração encontra-se na faixa litoral, obedecendo, como tal, às disposições contidas no art.º 9.º e, supletivamente, às regras dos capítulos II, III e IV.

47. Sobressai a aplicação do disposto em matéria de cérceas das edificações no art.º 9.º, n.º 11, alínea a), onde se interditam construções com mais de 6,5 metros de altura.

48. Ora, no alvará n.º …, para os lotes em questão prevê-se a construção de edifícios com apenas dois pisos. De modo algum se pode admitir que esta prescrição contenda com o citado preceito regulamentar do PROTALI, mesmo sendo certo que a cada piso corresponde um pé direito mínimo de 2,70 metros (art.º 65.º do Regulamento Geral das Edificações Urbanas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 38 382, de 7 de Agosto de 1951).

49. Ao invés, a proposta de alterações aponta para um máximo de três pisos. Embora excepcionalmente admita o PROTALI uma altura máxima de 8 metros para estabelecimentos hoteleiros, não pode concordar-se com a justificação da CM de Grândola, segundo a qual se estará a contribuir para uma redução da volumetria. Dentro dos parâmetros volumétricos que o PROTALI admite, este último será sempre excepcional, não podendo reconhecer-se, de modo algum, que a excepção derrogatória promova melhor a qualidade ambiental que o cumprimento da regra geral.

50. A fragilidade desta motivação torna-se tão mais evidente, quanto se afirma na proposta de alteração que aos lotes 1, 2 e 276 a 283, fundidos num só, só seja permitida a altura de “um piso acima da cota do arrendamento de acesso”, para no quadro síntese com as alterações sugeridas se indicar um máximo de três pisos.

51. Também quando confrontadas as justificações apresentadas pela CM de Grândola com o conteúdo do art.º 5.º, n.º 2, alínea a) do PROTALI que se invoca, não pode deixar-se de dar por não verificado um requisito que o legislador fixou como critério legitimador das alterações unilateralmente introduzidas. Com efeito, ali se determina que estas modificações sejam necessárias à regular execução de um plano.

52. Necessárias não significa úteis ou simplesmente desejáveis. Como explica ALVES CORREIA (O Contencioso dos Planos Municipais de Ordenamento do Território, in Revista Jurídica do Urbanismo e do Ambiente, N.º 1, Junho – 1994, Coimbra, p. 28), ao concretizar a aplicação do princípio da proibição do excesso ao planeamento urbanístico, a necessidade de uma medida afere-se pela sua indispensabilidade.

53. Quer isto dizer que uma alteração promovida ao abrigo da faculdade contida no art.º 37.º do Decreto-Lei n.º 448/91, só pode ter-se por legítima quando, a não ser adoptada, frustre a regular execução de um instrumento de planeamento territorial.

54. Teria a CM de Grândola que demonstrar ser a alteração promovida indispensável para poder “reforçar o posicionamento estratégico do litoral alentejano, potenciando as actividades económicas existentes e desenvolvendo o turismo, compatibilizando estas duas componentes com o desenvolvimento das infra-estruturas portuárias e rodoviárias e com a salvaguarda do ambiente e recursos naturais” (art.º 5.º, n.º 2. alínea a) do PROTALI), demonstrando também que seja a actual disciplina fixada no alvará n.º 6/90 incompatível com o objectivo enunciado.

55. A Câmara Municipal invoca uma disposição de natureza programática, a qual merece concretização por plano hierarquicamente subordinado. Para prosseguir os seus objectivos, nomeadamente, o desenvolvimento do turismo, dispõe o município de um vasto e indeterminado número de opções e medidas que não passam forçosamente pela edificação de empreendimentos turísticos na área correspondente ao conjunto dos lotes que se pretendem unificar, com sacrifício, além do mais, das posições jurídicas consolidadas nos adquirentes dos lotes vizinhos. Antes deste meio, tem inequivocamente o município ao seu dispor o controlo urbanístico sobre futuras operações de loteamento.

56. Deve dizer-se que nem se poderá excluir que o actual quadro de síntese e ocupação deixem de contribuir, de algum modo, para o incremento turístico, pois, na verdade, é preciso não esquecer que no art.º 26.º do regulamento da operação de loteamento se prevê que possa conferir-se utilização turística aos lotes em questão: “Admite-se a utilização, para fins turísticos, das áreas previstas para habitação, desde que sejam respeitadas -todas as condicionantes constantes do presente regulamento, com as necessárias adaptações”.

57. Por último, no que respeita ao PROTALI, como alegado motor das alterações, e se dúvidas restassem quanto à perfeita compatibilidade do alvará n.º … com o PROTALI, importa não deixar passar em claro que o mesmo alvará “foi objecto de certificado de compatibilidade emitido nos termos e ao abrigo do D.L. 351/93, de 7.10.” (Ofício n.º 7663, de 7-8-1996, enviado por V.ª Ex.ª à Inspecção Geral da Administração do Território). De outro modo, ou seja, se o conteúdo do alvará n.º 6/90 não se mostrasse compatível com as exigências do PROTALI, teria o mesmo alvará sido revogado por força do citado Decreto-Lei n.º 351/93, de 7 de Outubro.

II-Do Plano Director Municipal do Concelho de Grândola

58. Como se verá, seguidamente, também o PDM não pode constituir fundamento válido para justificar a legitimidade das alterações em curso.

59. É certo, porém, que o PDM de Grândola considera, nos termos do art.º 9.º, como espaços turísticos, “as áreas que se destinam predominantemente à instalação de empreendimentos e projectos de natureza turística”. É certo também que estabelece para o local uma área de desenvolvimento turístico (ADT), cuja disciplina urbanística, e sem prejuízo de quanto se dispõe em matéria de protecção da orla costeira (art.º 16.º), fica remetida para plano de pormenor (art.º 10.º, n.º 3) – neste caso, e de acordo com as cartas de ordenamento, o Plano de Pormenor da Área de Desenvolvimento Turístico de Tróia (PPT).

60. A tal ponto resulta importante a disciplina a prever em plano de pormenor que se fixa um estatuto de solo não urbanizável até que este instrumento de planeamento territorial venha a tornar-se eficaz (art.º 10.º, n.º 3).

61. A CM de Grândola deveria, então, questionar-se acerca da necessidade de alteração do alvará de loteamento n.º… para permitir a regular execução de quanto se dispõe no art.º 10.º (Espaços turísticos da faixa litoral), pois, de outro modo, como se viu, será ilegítima a alteração em curso.

62. Compaginada a disciplina do alvará n.º … com o conteúdo desta última disposição citada, conclui-se que a dimensão dos lotes e as características referentes à sua ocupação, tal como se encontram estabelecidas em nada colidem com a regular execução do plano, mostrando-se perfeitamente compatíveis com o enunciado do referido art.º 10.º do PDM, a cuja disciplina, por sua vez, há-de vir a obedecer o Plano de Pormenor n.º 7.

63. Ver-se-á porquê. Na verdade, são compreendidos na ADT estabelecimentos hoteleiros dos grupos 1 a 6 e 8, aldeamentos turísticos e loteamentos. Estes últimos não são, por certo, destinados exclusivamente ao aproveitamento turístico, já que todos os empreendimentos turísticos, de acordo com o Decreto-Lei n.º 328/86, de 30 de Setembro, se encontram consumidos nas categorias anteriores, ao que acresce, elucidativamente, a referência a “Togos”, quando se disciplina a matéria de estacionamento (ao invés para os aldeamentos turísticos e para os restantes empreendimentos, usou o município de Grândola a expressão “camas”).

64. Retira-se, ao fim e ao cabo, da disposição contida no art.º 10.º do PDM de Grândola que os critérios de ocupação do solo para a zona em questão apontam para três componentes: empreendimentos turísticos, em geral, aldeamentos turísticos e loteamentos urbanos. Isto não quer dizer duas coisas. Primeiro, não quer dizer que o alvará n.º 6/90 comprometa estes objectivos para toda a zona. Segundo, não significa que a ocupação planeada fique frustrada pela actual configuração, de tal sorte que se exija a junção dos lotes 1, 2 e 276 a 283 (entre outros) como meio necessário para executar -regularmente o disposto no art.º 10.º do PDM.

65. Acresce que os critérios fixados não são de molde a excluir o destino de segunda habitação, porquanto deve entender-se como turística a utilização para fins de vilegiatura, por exemplo. O critério usado pelo legislador no Decreto-Lei n.º 328/86, de 30 de Setembro, para qualificar empreendimentos turísticos não serve, forçosamente, para qualificar ocupação turística.

66. Em suma, se é certo que, no futuro, a CM de Grândola pode legitimamente conferir predominância na zona ADT à ocupação por empreendimentos turísticos -desde que salvaguarde a presença de outras construções exigida pelo disposto na alínea c) do n.º 5 do art.º 10.º – por forma a executar a citada disposição do PDM, não é menos certo afirmar que a disciplina urbanística contida no alvará n.º 6/90 contribui para esse desiderato, em nada colidindo com a regular execução do instrumento de planeamento.

67. Para que a alteração prevista fosse susceptível de integrar os requisitos do art.º 37.º do Decreto-Lei n.º 448/91, de 29 de Novembro, teria de demonstrar com meridiana clareza -que sem a junção de lotes se tornaria impraticável assegurar as finalidades ocupacionais do solo enunciadas no art.º 10.º do PDM. Não basta reconhecer que essas mesmas finalidades melhor seriam prosseguidas através deste meio (o que, de resto, não se concede).

68. Outro sentido não deve retirar-se da norma do art.º 37.º do Regime dos Loteamentos Urbanos; norma essa que é excepcional e implica redobradas cautelas na sua aplicação, já que comporta a produção retroactiva dos efeitos de um instrumento de planeamento territorial, com tudo o que isso representa no plano da confiança depositada por terceiros que tomam parte numa relação jurídica administrativa poligonal de vizinhança.

III-Do Plano Pormenor n.º 7 Previsto no PDM

69. As alterações em promoção pelo município não encontram apoio no plano de pormenor previsto para a Área de Desenvolvimento Turístico, dado não ter o mesmo sido aprovado, pelo que não serve como justificação para o exercício, pela CM de Grândola, do poder contido no art.º 37.º do Decreto-Lei n.º 448/91, de 29 de Novembro.

70. Por isso, considerou a Comissão de Coordenação da Região do Alentejo emitir parecer desfavorável às modificações, notificado a V.ª Ex.ª em 17-7-1996, indicando aquele órgão “aguardar um melhor e adequado enquadramento jurídico na legislação em vigor, em parecer fundamentado dessa Câmara Municipal, e após delimitação definitiva da REN”.

71. Sem que se conceda que possa um plano de pormenor comportar validamente os critérios de ocupação visados na proposta de alterações ao alvará n.º 6/90 (por previsível infracção ao disposto no art.º 16.º, n.ºs 1 e 2, alínea c) do PDM, porquanto não se vislumbra qualquer anterior compromisso válido assumido pela Administração), o certo é que a CM de Grândola afirma não ter podido suster o procedimento:
“Encontrando-se em fase de elaboração tal Plano, não é ainda previsível qual a data em que o mesmo virá a ser concluído, pelo que, a ser absolutamente necessário, a alteração do Alvará ficaria adiada, com todas as consequências negativas que dai decorrem, já que não será possível levar ao Alvará todas as alterações que entretanto se verificaram”.

C-Do Motivo Determinante das Alterações

72. O poder confiado às câmaras municipais no art.º 37.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 448/91, de 29 de Novembro, é, por certo, um poder discricionário, posto que implica uma escolha por parte do órgão competente, em atenção ao fim visado, entre promover ou não promover as alterações aos alvarás emitidos. E de ponderar nesta decisão, designadamente, as lesões produzidas na esfera jurídica dos interessados, as quais terão de ser ressarcidas, nos termos do disposto no art.º 37.º, n.º 4.

73. Como poder discricionário que é, do seu exercício há-de resultar a concordância entre o motivo principalmente determinante da sua prática e o fim visado pela lei na concessão do poder discricionário (art.º 19.º, § único, da Lei Orgânica do Supremo Tribunal Administrativo), sem o que o acto será anulável (art.º 135.º do Código do Procedimento Administrativo).

74. O fim pretendido pelo legislador quando concede às câmaras municipais a citada faculdade é identificado expressamente no articulado legal: a regular execução de instrumento de planeamento territorial válido e eficaz.

75. Ora, a Câmara Municipal demonstra ter norteado a sua actuação, não por este fim, não com o objectivo legal de evitar a frustração da regular execução de instrumento planificatório, mas, ao invés, o de tornear uma aludida impraticabilidade, por parte da SOLTRÓIA, SA, em lograr as alterações pretendidas por recurso ao mecanismo do art.º 36.º do Decreto-Lei n.º 448/91, de 29 de Novembro (alterações por iniciativa particular).

76. A ser concretizada a alteração promovida pelo município, haverá lugar a um desvio do procedimento descrito no art.º 36.º por recurso ao procedimento do art.º 37.º, operando-se a oclusão do motivo de interesse público subjacente às alterações por iniciativa pública pela determinação de motivos de natureza privada, quando a vinculação dos fins é inexorável.

77. No caso de ser levada avante a alteração proposta, não apenas a finalidade do acto modificativo do alvará n.º … seria desviada (desvio de poder “stricto sensu”), como também o próprio procedimento seria desviado (desvio de um procedimento com participação constitutiva dos interessados na decisão para um procedimento com participação meramente consultiva dos mesmos interessados).

78. Com efeito, se as alterações a alvarás de loteamento emitidos podem ser promovidas por particulares e por municípios, distintos são os fins prosseguidos e diversos os regimes procedimentais seguidos. Em obediência à distinção destes fins – um público, o outro de ordem privada – o legislador consagrou substanciais diferenças nos respectivos regimes procedimentais, como já se referiu.

79. É a CM de Grândola que expõe que:
“(…) tem diligenciado no sentido de alterar efectivamente tal Alvará. Acontece, contudo, que, nos termos da art.º 360 do D.L. 448/91, de 29.11. tais alterações só podem ser licenciadas mediante autorização escrita de dois terços dos proprietários dos lotes abrangidos pelo Alvará, dos edifícios neles construídos ou suas fracções autónomas.
Após contactos realizados, designadamente, com a APROSOL – Associação de Proprietários de Soltróia, conclui-se que muito dificilmente se poderia obter tal aprovação, dada que vários proprietários se têm mostrado relutantes em autorizar tais alterações. Optou-se então pelo mecanismo previsto no art.º 37.º do supra-referido diploma legal.”.

80. E prossegue V.ª Ex.ª, no ofício n.º …, que dirigiu ao Exm.º Inspector Geral da Administração do Território, e cujo teor vem sendo citado:
“Esta disposição legal permite assim que a Câmara Municipal possa deliberar alteração de alvarás de loteamento quando a execução de instrumentos de ordenamento do território, maxime o PROTALI ou o PDM assim o exijam”, quando acaba de reconhecer que o uso do poder previsto no art.º 37.º se deve, tão só, a constrangimentos na garantia do bom sucesso da iniciativa particular, resultantes da adivinhada oposição da maioria dos proprietários.

81. Devo referir, ainda, que na documentação consultada é, por repetidas vezes, afirmado que só por mero lapso não constam do alvará n.º … as alterações visadas na recente proposta, apesar de no processo judicial que correu os seus termos no Tribunal Judicial da Comarca de Grândola, por petição de ratificação de embargo de obra nova a opor à construtora nos lotes em causa, se encontrar referido um requerimento da SOLTRÓIA, SA, dirigido ao Senhor Presidente da CM de Grândola, em 26-11 – 1990, onde se diz não ter ficado contemplada a agregação dos lotes “por razões ligadas a uma grande urgência na emissão do alvará”. Isto parece, de resto, ter justificado as várias iniciativas compreendidas no período 1990/1996 destinadas a modificar as regras urbanísticas definidas para a operação de loteamento.

82. O mesmo Tribunal decidiu, ainda, dar como provado que a SOLTRÓIA, SA, alienou à PENÍNSULA DE TRÓIA – Fomento Imobiliário, Cooperativa de Construção e Habitação, CRL, os dez lotes que a CM de Grândola pretende, agora, unificar, sob compromisso de proceder à sua anexação num só, conforme documento aditado à escritura pública de compra e venda dos lotes n.ºs 1, 2 e 276 a 283, realizada em 15-6-1992.

83. Faço notar que o Tribunal da Relação de Évora, no acórdão de 14-3-1996 que, embora haja concedido provimento ao agravo (recurso n.º 814/95) interposto contra a decisão do citado Tribunal de primeira instância que ratificara o embargo extrajudicial de obra nova, aceitou os factos já referidos e revogou a decisão da primeira instância apenas por fundamentos que nada têm a ver com o cerne da nossa questão (não se tratar de direitos reais e incompetência absoluta dos tribunais comuns).

84. A deliberação de 4 de Maio de 1990 e a deliberação que aprovou o designado estudo prévio de ocupação do lote 1, de 8 de Janeiro de 1993, tinham o mesmo desiderato das alterações que a CM de Grândola promove actualmente.

85. Improcede sustentar que nessas datas fosse visada a regular execução de um Plano Regional e de um Plano Director Municipal que não existiam (cfr. infra, n.º 42)

86. Não se mostra provado que a CM de Grândola tenha proveito na satisfação do interesse da SOLTRÓIA, SA, em honrar o compromisso assumido com a PENÍNSULA DE TRÓIA, CRL, facto que não poderia deixar de ser tido em conta no plano jurídico-penal. Todavia, ao associar-se a CM de Grândola à prossecução de um interesse não compreendido na finalidade para a qual lhe foi outorgado um poder discricionário, por mais legítimo que possa ser aquele interesse, e tomando-o como motivação determinante do acto praticado no exercício deste poder, envereda pelo caminho da ilegalidade administrativa. O acto que venha a praticar será inválido por desvio de poder.

(§3.º)-Da licença de construção

87. Para os lotes 1, 2 e 276 a 283, que a CM convenciona designar como lote n.º 1, deliberou a CM de Grândola, em 30-11 – 1994, conceder à PENÍNSULA DE TRÓIA, CRL, licença para edificar um conjunto de apartamentos e um restaurante, numa área de construção de 5588 m2. Veio a ser emitido o respectivo alvará, com o n.º…, em 11-1-1995.

88. Cada um destes lotes, de acordo com o alvará de loteamento n.º …, apenas admite uma construção unifamiliar isolada, cuja implantação se encontra definida no quadro síntese para cada um dos lotes. Assim, a título de exemplo, veja-se que para o lote n.º 1, com 1520 m2, encontra-se fixada uma área de construção de 400 m2 e uma área de implantação de 300 m2, com o número máximo de dois pisos. Aplica-se o disposto no art.º 16.º, n.º 2 do regulamento do loteamento, o qual prevê os seguintes afastamentos às extremas do lote frente/6 metros, laterais/3 metros e tardoz/ 10 metros.

89. A licença de construção referida contende com o disposto no alvará de loteamento, sendo, por isso, inválido o acto que a concedeu.

90. Esta invalidade é cominada com a nulidade (art.º 52.º, n.º 2, alínea b) do Decreto-Lei n.º 445/91, de 20 de Novembro), pelo que o acto em causa é insusceptível de produzir qualquer efeito jurídico, podendo ser declarado nulo a todo o tempo, mais não podendo ser ratificado, sanado, convertido ou revogado (art.º 134.º, n.ºs 1 e 2 do Código do Procedimento Administrativo), sem prejuízo de eventual responsabilidade civil extra-contratual da Autarquia por lesão causada ao titular da licença (art.º 52.º, n.º 5 do citado Decreto-Lei n.º 445/91).

91. As obras realizadas ao abrigo de licença de construção cuja nulidade venha a ser declarada sujeitam-se ao regime das obras realizadas sem licença, pelo que, a não poderem ser legalizadas, nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 167.º do Regulamento Geral das Edificações Urbanas, e sem que se prognostiquem medidas menos gravosas que permitam repor a legalidade infringida, para efeitos de aplicação do disposto no art.º 58.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 445/91, de 20 de Novembro, terão de ser demolidas, havendo lugar, eventualmente, à reposição do terreno.

92. É caso para advertir que quanto mais dilatado venha a ser o tempo que a CM de Grândola leve a declarar a nulidade deste acto de licenciamento, mais avultados serão, porventura, os quantitativos indemnizatórios.

II-Conclusões

De quanto vem exposto, precedentemente, analisados todos os factos à luz das pertinentes disposições legais e regulamentares, e dos princípios gerais aplicáveis, resulta, em síntese:

1. que a deliberação camarária que venha a determinar as alterações ao alvará de loteamento n.º 6/90, em especial no que toca à agregação de lotes, será inválida pelas razões seguintes:
a) por erro de direito na interpretação do disposto no art.º 37.º do Decreto-Lei n.º 448/91, de 29 de Novembro, uma vez não demonstrada a necessidade das modificações como meio de assegurar a regular execução, nem do Plano Regional de Ordenamento do Território do Litoral Alentejano, aprovado pelo Decreto-Regulamentar n.º 26/93, de 27 de Agosto, nem do Plano Director Municipal de Grândola, ratificado pelo Conselho de Ministros, através da resolução n.º 2O/96, de 8 de Fevereiro, e publicado no Diário da República, 1ª Série-B, de 4 de Março p.p.;
b) por desvio do poder confiado às câmaras municipais “para alterarem alvarás de loteamento, por sua iniciativa, dado que o motivo determinante da intervenção se afasta do fim para o qual foi conferido o poder discricionário ao órgão autárquico;
c) por desvio do procedimento previsto no art.º 37.º do Decreto-Lei n.º 448/91, de 29 de Novembro, para os desideratos próprios do procedimento regulado no art.º 36.º do mesmo diploma;

2. É nulo o acto administrativo que licenciou a construção de empreendimentos turísticos (apartamentos turísticos e restaurante) nos lotes n.ºs 1, 2 e 276 a 283 por desrespeito aos condicionamentos fixados no alvará de loteamento n.º … (art.º 52.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 445/91, de 20 de Novembro).

III

Assim no exercício do poder que me é conferido pelo disposto no art.º 20.º, n.º 1, alínea a) da Lei n.º 9/91, de 9 de Abril, RECOMENDO:

A) que o procedimento de alterações em curso, promovido pela Câmara Municipal de Grândola, ao alvará n.º 6/90, seja sustido;
B) que a deliberação que a Câmara Municipal de Grândola aprovou em 30-11-1994, deferindo requerimento de licença de construção, para o que erroneamente se convencionou designar lote n.º 1 (lotes n.ºs 1, 2 e 276 a 283, na verdade), seja declarada nula, nos termos do disposto no art.º 134.º, n.º 2 do Código do Procedimento Administrativo, e cassado, consequentemente, o alvará de licença de obras n.º 27/95.

O PROVEDOR DE JUSTIÇA

José Menéres Pimentel