Primeiro Ministro
Processo:R-1938/91
Número: 20/B/96
Data:25.07.1996
Área: A4

Assunto:FUNÇÃO PÚBLICA – TESOUREIRO – ABONO PARA FALHAS – REGULAMENTAÇÃO – ALTERAÇÃO LEGISLATIVA – EFEITOS RETROACTIVOS

Sequência: Acatada

Factos

1. Desde 1990, foram apresentadas múltiplas queixas respeitantes à falta de cumprimento do Dec.Lei n.º 4/89, de 6 de Janeiro, nuns casos por não terem sido ainda publicados os despachos conjuntos necessários à sua execução, em outros, posteriormente, por os pagamentos do abono para falhas não serem uniformes, processando-se, por vezes, desde a publicação daquele diploma, ou após a data de publicação do regulamento que definiu as categorias abrangidas ou do despacho com indicação nominativa dos funcionários das referidas categorias e ainda por naqueles despachos terem sido fixados contingentes nas categorias, limitativos do número de trabalhadores aos quais o direito ao abono fora atribuído.

2. Dada a disparidade de critérios, ouviu-se, no ofício de que junto cópia, o Senhor Secretário de Estado do Orçamento, realçando a necessidade de uniformização de procedimentos.

3. Na resposta enviada, transmite-se o despacho concordante do então Secretário de Estado do Orçamento com um parecer que acompanha o oficio, no qual se defende que os funcionários ou agentes passam a ter direito ao abono após emissão do despacho conjunto previsto no n.º 2 do art.º 2.º do Dec.Lei n.º 4/89.
Argumenta-se ser condição necessária para a titularidade do direito ao abono para falhas a prolação do despacho conjunto pois enquanto o despacho não for proferido, o direito, embora previsto abstractamente na lei, não existe em concreto nas respectivas esferas jurídicas e ainda que o despacho autorizador do pagamento é um mero acto de natureza burocrática para regularização do processamento dos abonos.

4. A situação real é que, passados 7 anos sobre a publicação do diploma que fixou o abono para falhas para os funcionários e agentes que praticam funções próprias dos tesoureiros embora não possuam tal categoria, há trabalhadores que, embora exerçam tais funções, ainda nada receberam porque o Ministério a que pertencem não emitiu o despacho necessário à execução do diploma (ex: Ministério da Educação), outros começaram a receber em datas diferentes embora exercessem funções na mesma data (diferentes Ministérios) e outros queixam-se de não terem sido abrangidos, por estabelecimento de contingentes limitativos que a lei não previa ( Segurança Social ).

A Lei

5. O Dec.Lei n.º 4/89, de 6 de Janeiro, estabelece, no art.º 2.º, “Têm direito a abono para falhas:
a) …
b) Os funcionários ou agentes que, não se encontrando integrados na carreira de tesoureiro, manuseiem ou tenham à sua guarda, nas áreas de tesouraria ou cobrança, valores, numerário, títulos ou documentos, sendo por eles responsáveis.”

6. Diz o n.º 2 do mesmo artigo que:
” No caso da alínea b) do número anterior, as categorias que em cada departamento ministerial têm direito ao abono para falhas são determinadas por despacho conjunto do respectivo Ministro e do Ministro das Finanças.”

7. O art.º 7.º determina ” O disposto no presente diploma produz efeitos a partir do primeiro dia do mês seguinte ao da sua publicação.”

8. Das disposições referidas conclui-se, com clareza, a necessidade da publicação do despacho conjunto para que o direito possa ser efectivado, mas há controvérsia sobre a data do início dos efeitos dele resultantes.

A Justiça

9. Afigura-se que, como outros têm entendido, só a atribuição retroactiva à data de publicação do Dec.Lei n.º 4/ 89 satisfaz as razões de Justiça.

10. Não parece admissível que os funcionários com as condições legalmente definidas à data da entrada em vigor da lei sejam prejudicados no seu direito ao abono para falhas por demora na publicação do despacho conjunto, ficando dependentes da maior ou menor diligência de cada departamento ministerial ou pela fixação de contingentes nas suas categorias.

O Direito

11. O art.º 7.º diz ” O disposto no presente diploma produz efeitos a partir do primeiro dia do mês seguinte ao da sua publicação”. Como o disposto no diploma é precisamente o reconhecimento ao direito ao abono para falhas aos tesoureiros e demais funcionários e agentes nas condições nele previstas, daqui decorre que tal direito foi integrado na esfera jurídica destes trabalhadores desde o dia 1 de Fevereiro de 1989, ficando o seu exercício condicionado à definição das respectivas categorias, a fazer por despacho conjunto do Ministro das Finanças e do membro do Governo respectivo.

12. Tal despacho apenas tem a função de declarar quais as categorias que em cada departamento preenchem os requisitos definidos, não havendo qualquer argumento doutrinal que afaste em absoluto a eficácia à data do diploma de que visa permitir a execução.

13. Efectivamente, os despachos conjuntos previstos não vêm criar direitos, apenas lhes cabe, em execução da lei, indicar as categorias de trabalhadores que desempenham as actividades em função das quais o direito foi atribuído.

14. Como não houve um entendimento uniforme quanto à aplicação do Dec.Lei n.º 4/89, daí resultando tratamento desigual para muitos trabalhadores que exercem as mesmas funções, importa restabelecer a igualdade e não frustrar as expectativas dos que aguardam há anos o cumprimento do direito que a lei lhes concedeu.

Nestes termos, ao abrigo do disposto na al. b) do n.º 1 do art.º 20 da Lei n.º 9/91, de 9 de Abril, RECOMENDO :

seja alterado o Decreto-Lei n.º 4/89, de 6 de Janeiro, atribuindo efeitos retroactivos, no seu n.º 2 do artigo 2.º, de modo a dele resultar, explicitamente, a atribuição do direito ao abono para falhas desde a data prevista no art.º 7.º – 1 de Fevereiro de 1989- para os funcionários e agentes que já exerciam as funções nele previstas e, genericamente, desde o inicio do exercício de tais actividades para os que as venham ou tenham vindo a exercer.

O PROVEDOR DE JUSTIÇA

José Menéres Pimentel