APresidente da Câmara Municipal de Mirandela

Proc. R-2260/96
Rec. n.º 13/A/98
1998.03.16
Área:A1
Sequência: Acatada

I Exposição de motivos

1. Requerida a intervenção deste Órgão do Estado a propósito de um procedimento de licenciamento de reconstrução de umas escadas em que a Câmara Municipal exigiu ao reclamante a apresentação de uma informação da Junta de Freguesia para que o procedimento de licenciamento pudesse prosseguir os seus termos, desencadeou a Provedoria de Justiça a instrução do processo pedindo esclarecimentos à Câmara Municipal de Mirandela.

2. Terminada a instrução do processo concluiu-se que:
a) Em 20 de Abril de 1995, A… requereu à Câmara Municipal de Mirandela autorização para a reconstrução de umas escadas de uma casa sua sita na Freguesia de Abreiro.
b) Em 11 de Maio de 1995, o Presidente da Câmara respondeu ao requerente informando-o de que deveria “instruir o processo com uma informação da Junta de Freguesia de Abreiro e planta topográfica do local da obra para posterior apreciação”.
c) Face à dificuldade em obter a referida informação da Junta de Freguesia, A… dirigiu-se à Provedoria de Justiça.
d) Tendo este Órgão do Estado questionado o Presidente da Câmara Municipal de Mirandela sobre o fundamento legal da exigência da referida informação da Junta de Freguesia, foi a Provedoria de Justiça informada de que se tratava de uma “folha tipo a preencher pela respectiva Junta, aprovada pela Associação de Municípios da Terra Quente, em uso pelos Municípios correspondentes”.
Mais afirmava o Presidente da Câmara que tal informação era útil “pelo facto da Junta de Freguesia tomar à partida conhecimento das obras a existirem na Freguesia, prestando informações prévias de interesse para a sua apreciação”.

3. A referida informação da Junta de Freguesia, tal como exigida pela Câmara Municipal de Mirandela, constitui um ónus a cargo do requerente que condiciona, ainda que formalmente, a apreciação prévia do pedido de licenciamento.
Caso as Juntas de Freguesia se recusem ou se abstenham de fornecer a informação solicitada fica o requerente do licenciamento sem possibilidades de ver o seu pedido de licenciamento apreciado pela Câmara Municipal e de, assim, obter uma decisão do orgão competente.

4. No actual quadro legislativo de licenciamento de obras particulares, só os Municípios possuem competências em matéria de licenciamento de obras particulares de edificios para habitação, não possuindo as Freguesias qualquer competência nesta matéria.
Com efeito, apesar de a recente publicação da Lei n.º 23/97, de 2 de Julho ter vindo ampliar as atribuições das Freguesias e as competências dos seus órgãos, nomeadamente, em matéria de “ordenamento rural e urbano” (art.2º, alínea i), os seus poderes nesta matéria restringem-se à “aprovação dos projectos de loteamento urbano respeitantes a terrenos integrados no seu domínio patrimonial” (art.4º, n.º2, alínea c), à participação e colaboração com os municípios no procedimento de elaboração dos planos municipais de ordenamento do território, (art.4º, alíneas d) e e), bem como a “pronunciar-se sobre projectos de construção e de ocupação da via pública, sempre que tal lhe for requerido pelos órgãos do município” (art.4º, n.º2, alínea g).

5. Nos termos do disposto no art. 3º, do Decreto-Lei n.º 129/91, de 2 de Abril, “não podem ser exigidos formulários, formalidades ou pagamentos que não sejam expressamente mencionados em lei ou regulamento”. Nada permite excluir a aplicação desta regra ao regime do licenciamento municipal de obras particulares.

6. Ora, a exigência da informação da Junta de Freguesia para instrução dos procedimentos de licenciamento de obras particulares não se encontra prevista em qualquer lei ou regulamento pelo que se apresenta como absolutamente ilegal.

7. Nada impede que as Câmaras Municipais, se entenderem conveniente para uma correcta apreciação dos pedidos de licenciamento, solicitem directamente às Juntas de Freguesia as informações de que necessitem, mas a lei proíbe que as Câmaras Municipais condicionem a apreciação dos pedidos de licenciamento à apresentação de qualquer informação das Juntas de Freguesia por parte dos requerentes do licenciamento.

II Conclusões

De acordo com o exposto, no uso dos poderes que me são conferidos pelo art. 20º, n.º 1, al. a), do Estatuto do provedor de justiça, aprovado pela Lei n.º 9/91, de 9 de Abril, RECOMENDO,
a) Que a Câmara Municipal de Mirandela, e V.Exa., se abstenham de exigir aos requerentes nos procedimentos de licenciamento de obras particulares a instrução do processo com uma informação da Junta de Freguesia.

b) Que a Câmara Municipal prossiga a apreciação dos pedidos de licenciamento onde a exigência de informação da Junta de Freguesia já tenha sido formulada, informando-se os requerentes de que a referida exigência se considera sem efeito.
Recordo, por fim, a V. Exa. o dever contido no art. 38º, n.º 2, do referido Estatuto do provedor de justiça, para o qual me permito pedir a melhor atenção.

O PROVEDOR DE JUSTIÇA
Menéres Pimentel