Primeiro-Ministro

R-307/95
Rec. nº 7/B/95
Data:10.02.95
Área: A2

Assunto:CONSUMIDORES – PARQUE AQUÁTICO – CONDIÇÕES TÉCNICAS E DE SEGURANÇA – LEGISLAÇÃO.

Sequência:

Pelos pais de X – uma das crianças vítimas dos trágicos acontecimentos ocorridos no parque aquático de Lisboa designado por “Aquaparque” em Julho de 1993, oportunamente divulgados pela comunicação social -, e com o louvável objectivo de obviar à repetição de incidentes semelhantes, foi apresentada queixa na Provedoria de Justiça e solicitada a minha intervenção acerca da actual lacuna existente no sistema jurídico nacional que, ao contrário do que já acontece a nível internacional, é omisso quanto à regulamentação específica das condições de segurança a que deve obedecer a actividade desenvolvida nos parques aquáticos.

Concluída a fase de recolha de elementos e elaboração de estudos que ordenei para efeitos de instrução do processo aberto com base nesta queixa, ficou clara a existência de uma situação que não posso deixar de considerar extremamente grave, enquanto atentatória da integridade física e mesmo, como a prática infelizmente já demonstrou, da vida de pessoas, em particular de crianças e jovens.

O Regulamento das Condições Técnicas e de Segurança dos Recintos de Espectáculos e de Divertimentos Públicos, actualmente em vigor, constante do Decreto nº 42662, de 20 de Novembro de 1959, não pode, por manifesta desactualização, continuar a considerar-se suficiente para a regulamentação de uma actividade tão recente e específica quanto a desenvolvida pelos parques aquáticos.

O referido Regulamento integrava um conjunto de cinco diplomas – além do supra mencionado, os Decretos-Lei nºs 42660 e 42663, e ainda os Decretos nºs 42661 e 42664 -, cuja publicação, naquela data, teve por objectivo reformular todo o regime jurídico de exploração, realização e fiscalização dos espectáculos e divertimentos públicos.

Mais de 35 anos volvidos sobre a data da elaboração de tais diplomas, imperioso se torna reconhecer a evolução dos conceitos de espectáculo e divertimento público, não só pela evidente alteração de hábitos e comportamentos sociais como, essencialmente, pelo aparecimento, neste período, de muitas formas de espectáculo e divertimento estreitamente conexas com a evolução da ciência e da tecnologia, desconhecidas à data da elaboração dos diplomas em causa.

A dimensão de tal evolução ultrapassou, há já muito tempo, a fase em que uma interpretação actualista dos diplomas em causa permitia uma razoável aplicação dos mesmos às situações aí não expressamente previstas, nomeadamente através do recurso às disposições aplicáveis aos “recintos análogos” – cfr. artigo 3º do Decreto nº 42662.

Urge, pois, regulamentar de novo, consagrando regras próprias para o exercício de actividades como as desenvolvidas nos parques aquáticos, que, não obstante o carácter lúdico ou de recreio que lhes é reconhecido, comportam riscos específicos cuja exaustiva identificação e consequente prevenção se impõem como condição prévia ao licenciamento e à entrada em funcionamento de qualquer recinto desta natureza.

Que tal regulamentação se impõe foi conclusão já há muito alcançada, e questão desde cedo qualificada de prioritária. Desde pelo menos 1991, têm sido constantes as manifestações de interesse de várias entidades no assunto, nomeadamente a Secretaria de Estado do Ambiente e Defesa do Consumidor, o Instituto Nacional para a Defesa do Consumidor, a Secretaria de Estado da Cultura, através da Direcção-Geral dos Espectáculos e das Artes, a Secretaria de Estado do Turismo, a Direcção-Geral da Saúde, o Instituto do Desporto, e a Associação Portuguesa de Parques Aquáticos e de Lazer, entre outras, cuja disponibilidade manifestada para a resolução da questão, sendo necessária e louvável, não é suficiente.

Desde a campanha de sensibilização para os perigos da utilização destes parques, levada a efeito pelo Instituto Nacional de Defesa do Consumidor em 1991, até à presente data, decorreram já quatro épocas balneares, uma das quais – a de 1993 – marcada pelos trágicos acontecimentos que, num parque aquático de Lisboa, levaram à morte de duas crianças, facto que, se à data pareceu constituir um – lamentável – incentivo à celeridade do processo legislativo que então se dizia em curso, poucas ou nenhumas repercussões viria a ter nessa matéria.

A proximidade de mais uma época balnear, e a consequente reabertura ao público dos referidos recintos sem que a regulamentação em causa se encontre publicada, constitui, não só para mim como certamente para Vossa Excelência e para todos os proprietários e utentes de parques aquáticos, motivo de forte preocupação.

Com o objectivo de evitar que, de novo, as promessas de urgente resolução do assunto se prolonguem por mais uma época balnear, desacompanhadas de qualquer medida concreta que garanta aos frequentadores destes recintos as condições mínimas de segurança actualmente inexistentes,

RECOMENDO :

1.Que sejam criadas normas destinadas a regular os requisitos de entrada em funcionamento, as condições técnicas e de segurança e a fiscalização da actividade desenvolvida pelos parques aquáticos, processo ao qual deverá ser concedida prioridade absoluta, de modo a que tais normas possam vir a aplicar-se a partir do início da próxima época balnear.

2.Que as referidas normas contemplem, nomeadamente, os seguintes aspectos:

a) Isolamento de canalizações, condutas – aí incluídos os ralos de aspiração e circulação de água – e instalações eléctricas;

b) Revestimentos anti-derrapantes nas zonas – em particular nas escadas – de acesso às piscinas e restantes aparelhos aquáticos;

c) Obrigatoriedade da existência de protecções laterais adequadas, barras, pegas e corrimãos, em todos os locais inclinados – v.g. escorregas e rampas – e nas respectivas escadas de acesso;

d) Inspecções periódicas ao estado de conservação dos equipamentos;

e) Fixação de valores máximos e mínimos dos fluxos e quantidade de água;

f) Renovação, depuração e tratamento da água;

g) Número mínimo de pontos de água potável;

h) Vigilância adequada e com formação específica: número mínimo de vigilantes por área e por aparelho aquático e sua permanência constante nos locais;

i) Demarcação expressa de áreas para crianças, com vigilância reforçada;

j) Afixação junto a cada aparelho – escorregas, piscinas, pistas, rampas, etc. – da forma mais segura de utilização, assim como dos escalões etários autorizados a frequentar o mesmo, e limitações a utentes que sofram de determinadas doenças ou deficiências;

l) Fixação de lotação máxima do parque e seu controle permanente;

m) Número mínimo de saídas de emergência;

n) Posto de primeiros socorros equipado com meios humanos e materiais adequados à dimensão do parque;

o) Conservação e higiene de todas as zonas do parque, em particular dos balneários, chuveiros e instalações sanitárias;

p) Regras especiais em caso de abertura nocturna dos recintos;

q) Disponibilização de informação ao público, à entrada e dentro do parque, acerca da estrutura do mesmo – localização dos diferentes aparelhos, das saídas de emergência e do posto de primeiros socorros -, bem como dos cuidados genéricos a observar durante a permanência no local, nomeadamente pelos acompanhantes de crianças.

r) Fiscalização rigorosa do cumprimento das normas assim estabelecidas e fixação de sanções aplicáveis em caso de violação das mesmas.

3.Que o licenciamento de novos parques e a reabertura dos já licenciados para o exercício desta actividade sejam suspensos até à entrada em vigor e verificação do cumprimento das normas em questão.

O PROVEDOR DE JUSTIÇA

José Menéres Pimentel