Director Regional de Educação do Norte

Processo:R-1910/94
REC. N° 83/A/95
Data:1995-09-13
Área: A4

Assunto:FUNÇÃO PÚBLICA – FALTAS – JUSTIFICAÇÃO – EXERCÍCIO DO DIREITO DE GREVE.

Sequência: Acatada

I-
1.Tendo sido aberto na Provedoria de Justiça um processo em que é objecto de queixa a injustificação de uma falta dada no dia 24 de Março de 1994, por dois funcionários da Escola Preparatória de Arcozelo e afirmando-se, na reclamação, que não obstante os funcionários se encontrarem abrangidos por um pré-aviso de greve emitido pela Federação Nacional dos Sindicatos da Função Pública, o Conselho Directivo da Escola lhes considerou injustificada a falta, foram pedidos esclarecimentos à Exma. Sra. Presidente do Conselho Directivo.

2.Foi enviada resposta que afirmava ter sido pedida à Direcção-Geral da Administração Pública informação sobre o assunto, bem como ao Exmo. Sr. Coordenador do Centro da Área Educativa do Porto.
Junto com essa resposta, foi enviada cópia da que, sobre o assunto, havia sido dada pela Direcção Regional de Educação do Norte, não tendo sido porém enviada a este Orgão do Estado a resposta remetida pela Direcção-Geral da Administração Pública.

3.Assim, foi solicitado ao Exmo. Sr. Director-Geral da Administração Pública o envio de cópia da resposta prestada à
Escola.

4.Através do ofício n° …, de 2 de Agosto de 1994, respondeu o Exmo. Sr. Director-Geral, informando ter a resposta da DGAP sido prestada ao estabelecimento de ensino com o ofício n° …, de 9/5/94 (tendo ainda enviado cópia do referido ofício).

II-
Analisada toda a documentação junta no processo, retirei as seguintes conclusões:

1.Foi incorrectamente considerada como injustificada a falta dada pelos funcionários da Escola, pois:

1.1. A Lei n° 65/77, de 26 de Agosto, é aplicável a esses funcionários, visto nunca ter sido publicado o regime especial a que se refere o artigo 12° do diploma;

1.2. Tendo o pré-aviso de greve sido emanado de acordo com os preceitos legais reguladores da matéria, inclusos na Lei n°
65/77, de 26 de Agosto, isto é, tendo a greve sido declarada por uma associação sindical competente, a Federação Nacional
dos Sindicatos da Função Pública, nos termos do artigo 2°, n° 1, do citado diploma e com a antecipação legalmente exigida,
produziram-se “ope legis” os efeitos do artigo 7°, ficando os trabalhadores aderentes desvinculados do dever de subordinação e de assiduidade.

1.3. Não podem, assim, ser tais trabalhadores prejudicados na sua antiguidade e nos efeitos decorrentes da situação de
suspensão, realçando o n° 3 do artigo 7°, que a contagem de tempo de serviço não pode ser afectada por tal motivo. Ora,
ao considerar-se injustificada a falta dada pelos funcionários, são exactamente essas as consequências legais.

1.4. Mais se conclui que os trabalhadores, ao serem detentores de uma total liberdade no que diz respeito à sua adesão a uma greve, não estão vinculados nem a informar sobre a sua adesão, nem sobre a sua não-adesão, salvaguardando portanto a lei todos os que a ela aderirem, exigindo-se apenas aos não-aderentes, que violem o dever de assiduidade, a justificação da falta pelos meios idóneos para tanto. E isto porque, por vontade própria, o trabalhador tem o direito de se “afastar” da greve a que não pretende aderir.

1.5. Por outro lado, não se argumente com a possibilidade que o n° 2 do artigo 19° do Decreto-Lei n° 497/88, de 30 de Dezembro dá ao dirigente do funcionário, de lhe poder exigir a apresentação de meios adequados à prova da ocorrência dos motivos justificáveis das faltas, pois nesta situação (adesão a uma greve) não cabe, sequer, esta exigência porquanto a declaração do funcionário é por si só suficiente para que se produzam os efeitos da suspensão, já referidos, realçando-se, como é evidente, a suspensão do direito ao vencimento.
Além do mais, já que tal prova poderia revelar-se impossível de ser feita e seria claramente violadora dos princípios enformadores do direito à greve sempre se concluíria ser impossível a invocação de tal disposição.
Em caso de dúvida do dirigente do funcionário, cabe ao serviço apurar a legalidade da greve, não podendo a prova ser exigida ao funcionário.

1.6. Esta é, sem margem para dúvidas, a interpretação a dar às normas relativas ao exercício do direito à greve, pelo que a injustificação da falta dos funcionários se mostra ilegal, porquanto se revela directamente violadora do disposto no artigo 10°, da Lei n° 65/77, de 26 de Agosto e, ainda, da globalidade do espírito enformador da Lei da Greve, que verte, no seu sentido mais amplo, o direito constitucionalmente garantido no Artigo 57°, n° 1, da Constituição da República Portuguesa.

1.7. Não posso deixar ainda de sublinhar o meu desacordo com a posição assumida pelo Exm° Sr. Director de Serviços da
Direcção Regional de Educação do Norte, quanto ao assunto, pelo que informo V. Exa ter também, no âmbito deste processo,
feito idêntica Recomendação àquela Direcção Regional.

Pelo exposto, RECOMENDO a V.Exa, Senhor Director Regional de Educação do Norte, que considere justificadas as faltas dadas com fundamento em exercício do direito de greve, em todos os casos em que se esteja perante o exercício

O PROVEDOR DE JUSTIÇA

José Menéres Pimentel