Ministro-Adjunto

Rec. nº 139/A/94
Proc.: R-2453/91
Data: 1994-09-14
Área: A6

ASSUNTO: DIREITOS LIBERDADES E GARANTIAS – RTP – REESTRUTURAÇÃO ORGÂNICA – JORNALISTA – REFORMULAÇÃO DA CARREIRA – REITERAÇÃO DE RECOMENDAÇÃO

Sequência: Não Acatada

I – Trago junto de Vossa Excelência uma questão que tive já oportunidade de colocar ao Conselho de Administração da R.T.P., S.A. sem que, lamentavelmente, se tenha mostrado possível um entendimento comum e a consequente resolução de uma situação a que, diga-se desde logo, se poderia ter obviado se, em devido tempo, aquele Conselho de Administração houvesse respeitado os direitos e as legítimas expectativas do jornalista identificado em epígrafe (no original da presente recomendação).

A fim de tornar a exposição do assunto tão clara e sintética quanto possível, evitarei expender-me em considerações idênticas às que teci junto do Conselho de Administração da R.T.P., permitindo-me, em vez disso, apresentar a Vossa Excelência os documentos integrados no processo aberto nesta Provedoria na sequência de queixa do interessado, que melhor descrevem os factos e sintetizam a evolução da posição da R.T.P. sobre o assunto, assim como a minha própria perspectiva que, desde logo por imposição do Estatuo do Provedor de Justiça, não pode deixar de ser uma perspectiva de conciliação entre o mais rigoroso cumprimento da lei e a constante procura da solução mais justa.

II – Face a uma reestruturação da Direcção de Informação da R.T.P., ocorrida em 21/01/86, o jornalista, ora Reclamante, foi alvo de enquadramento profissional na R.T.P., deixando de auferir pelo Nível 1 de remuneração e passando a auferir pelo Nível 3, sendo que este representava um escalão inferir em relação àquele.

A partir daquela data, as promoções, enquadramentos e reenquadramentos profissionais de que o jornalista foi objecto, tiveram como ponto de partida o Nível 3, pelo que o facto de ter auferido durante vários anos pelo Nível 1, não produziu quaisquer efeitos na sua carreira.

Foi por discordar deste entendimento que, após analisada a situação laboral do Reclamante até 21/01/86, entendi formular a Recomendação n° 50/94, de 24/02/94, que remeto em anexo (doc. nº 1 no proc. da presente recomendação), a fim de melhor expôr a Vossa Excelência os motivos desta minha tomada de posição.

Os fundamentos da decisão de não acatamento daquela Recomendação, constam do ofício nº …, do Conselho de Administração da R.T.P., datado de 08/04/94, de que, igualmente, anexo cópia (doc. nº 2 no proc. da presente recomendação).

Conforme Vossa Excelência terá oportunidade de constatar, os argumentos avançados nesta comunicação do Conselho de Administração da R.T.P., para além de não traduzirem motivos verdadeiramente impeditivos do acatamento da Recomendação em causa, denotam, ainda, uma sintomática contradição com a versão inicialmente apresentada pela Empresa para justificar a sua actuação.

A este respeito, não posso deixar de transcrever parte do ofício nº …, de 27/08/91, do então Conselho de Gerência da R.T.P., E.P., enviado à Provedoria de Justiça já no âmbito do presente processo:

«… Em 21/07/83 o Sr. …, então Chefe de Redacção auferindo o Nível 3 de remuneração, é, dentro do direito de “ius variandi” (poder excepcional que assiste à entidade patronal de atribuir aos seus trabalhadores, transitoriamente, funções específicas que não estão compreendidas no objecto do contrato de trabalho), nomeado Director de Informação Não Diária…»

e de comparar este trecho com a alínea b), ponto 2. do ofício nº …, da R.T.P., de 08/04/94 (doc. nº 2 no proc. da presente recomenfação) onde expressamente se afirma que:

«… o exercício do cargo em questão [o de Director de Informação Não Diária] não consubstanciou, bem vistas as coisas, o exercício do “ius variandi” pela Empresa, mas, antes, a aceitação pelo trabalhador do estatuto de transitoriedade ou de precaridade definido para os cargos de estrutura…».

Esta contraditória interpretação dos factos – que cito apenas a título de exemplo – é, tão só, consequência da posição de força assumida pela Empresa face à pretensão do Reclamante, consistente em negar-lhe o direito ao nível remuneratório pretendido, justificando a sua decisão de enquadramento profissional no Nível 3 com base em argumentos nem sempre coerentes.

Por este motivo, e por continuar convicto da importância do respeito pelos direitos e legítimas expectativas do Reclamante que, continuo a afirmar, não tiveram a protecção devida, entendi formular a Recomendação nº 100/94, de 24/05/94, à qual o Conselho de Administração da R.T.P., S.A. viria a responder através do ofício nº …, de 28 de Junho de 1994 (documentos nos 3 e 4, respectivamente, que anexo no proc. da presente recomendação).

O objectivo desta nova Recomendação que entendi dirigir a Vossa Excelência na qualidade de Ministro da Tutela, mais não é do que, apresentando objectivamente ambas as versões dos factos, comprovar o quanto a posição assumida pelo Conselho de Administração da R.T.P. pode representar em termos de precedente, nesta e noutras empresas que, através de interpretações oscilantes dos seus próprios regulamentos internos, poderão hoje decidir num sentido e amanhã no sentido oposto, fazendo tábua rasa de todas as garantias em tempo atribuídas aos seus trabalhadores.

Porque pouco haverá a acrescentar a qualquer das duas posições em confronto, permito-me dar por reproduzidos todos os argumentos invocados nas minhas anteriores Recomendações, na certeza de que não deixará Vossa Excelência de aderir aos mesmos e de obviar a que a situação de despromoção que, em bom rigor, se operou, perdure e sirva de base a futuros atropelos às garantias dos trabalhadores.

Uma última palavra acerca da única conclusão inovadora retirada, pelo Conselho de Administração da R.T.P., da minha Recomendação nº 100/94: afirma-se no ponto 1. do ofício nº …, de 28 de Junho p.p. daquele Conselho de Administração (doc. nº 4 no proc. da presente recomendação) ter a Provedoria de Justiça abandonado “uma boa parte da fundamentação em que se apoiava a anterior Recomendação nº 50/94”, uma vez que “analisada em profundidade a nova Recomendação [a nº 100/94] verifica-se que a sua base de sustentação se resume agora ao insistentemente invocado Despacho nº 31/83, de 7 de Novembro do então Conselho de Gerência”.

Porque creio não estar perante uma interpretação propositadamente distorcida dos termos da minha Recomendação nº 100/94, vejo naquela conclusão do Conselho de Administração da R.T.P. um lapso manifesto: de facto, no segundo parágrafo daquela Recomendação tive o cuidado de esclarecer que o seu objectivo era, tão só, “acrescentar algumas observações ao que, sobre o assunto, tive já oportunidade de dizer na minha 1ª Recomendação”, afirmando-se expressamente, no final do mesmo texto, o reiterar do teor da Recomendação n° 50/94.

Não vejo, pois, como poderá concluir-se que os argumentos expendidos na Recomendação nº 100/94 impliquem um abandonar dos que oportunamente haviam sido deduzidos sobre o mesmo assunto.

Evidentemente que se espera, num processo desta natureza, que ambas as partes tenham presente a todo o momento o que até aí ficou dito sobre o assunto, evitando-se constantes repetições de argumentos que, expressamente, se declarou manter.

Como Vossa Excelência certamente constatará, o ofício nº …, de 28 de Junho último, do Conselho de Administração da R.T.P. nada acrescenta ao que até então fora sobejamente afirmado pela Empresa e, por isso mesmo, não convence.

O que agora se apresenta óbvio para a R.T.P., nunca o foi para o Reclamante, não o é para mim e não o foi, durante cerca de um ano, para a própria Empresa, razão pela qual o jornalista em causa foi despromovido apenas um ano após a data em que, segundo a R.T.P., deixou de ter direito ao Nível 1 de remuneração.

Pelo exposto no presente texto e, em especial, nas minhas duas anteriores Recomendações, que mantenho na íntegra,

RECOMENDO

a Vossa Excelência que, como Ministro da Tutela da R.T.P., S.A., intervenha junto desta Empresa, sensibilizando os seus órgãos dirigentes para a importância de que se reveste o acatamento das Recomendações supra mencionadas, única forma de dar à legítima pretensão do Reclamante a resposta de que é merecedora.

Das diligências ordenadas por Vossa Excelência na sequência desta minha Recomendação, dever-me-á ser dado conhecimento no prazo previsto no nº 2, do artigo 38º, da Lei nº 9/91, de 9 de Abril.

O Provedor de Justiça

José Menéres Pimentel