Directora Regional do Ambiente
Número:55/A/98
Processo: R-2184/98
Data:1998.09.01
Área: Açores

Assunto:AMBIENTE – RUÍDO – SOCIEDADE FILARMÓNICA – VIOLAÇÃO DO REGULAMENTO GERAL SOBRE O RUÍDO – LICENCIAMENTO DE ACTIVIDADES RUIDOSAS – CONTRA-ORDENAÇÃO – IRRENUNCIABILIDADE DA COMPETÊNCIA DA CÂMARA MUNICIPAL.

Sequência:Acatada

I-Exposição de Motivos

1. Em 14/05/98, foi aberto processo na Extensão da Provedoria de Justiça da Região Autónoma dos Açores em virtude de reclamação dirigida ao provedor de justiça relativa à incomodidade sonora provocada pelo funcionamento da Sociedade Filarmónica…, sita na Rua …. Horta.

2. Através de diversos documentos que acompanhavam o texto da queixa a Provedoria de Justiça tomou conhecimento de que, em 26/11/95, a Direcção Regional do Ambiente promoveu a realização de exames de medição dos níveis sonoros para avaliar do cumprimento da disciplina contida no Decreto-Lei n.º 251/87, de 24 de Junho. Os referidos testes comprovaram a existência de uma situação de violação ao Regulamento Geral sobre o Ruído, uma vez que o nível sonoro verificado [13,9 dB (A)]era superior ao limite máximo legalmente admitido.

3. Em ordem ao cabal apuramento dos factos relevantes para a instrução do processo, foram – em 20/05/98 e a coberto do ofício n.º … – solicitadas à Câmara Municipal da Horta esclarecimentos sobre:
– A utilização licenciada para o edifício onde está instalada a Sociedade Filarmónica…;
– A actividade ali desenvolvida;
-A salvaguarda, no respectivo processo de licenciamento, do aspecto da incomodidade sonora provocada para o exterior do edifício (designadamente imposição da realização de obras de insonorização).

4. Na mesma data (cfr. ofício n.º…), foram solicitadas informações à Direcção Regional do Ambiente sobre:
– A instauração do competente procedimento contraordenacional em virtude da medição realizada em 26/11/95;
– A data da decisão final, e o seu conteúdo.

5. Através do ofício n.º …, V.Exa. prestou os seguintes esclarecimentos:
“(…) as reclamações apresentadas devido ao ruído produzido pela Sociedade Filarmónica …, incidiam sobre o ruído produzido pela realização de Bailes nas instalações da Sociedade.

Nesse sentido e, após contactos com o reclamante, foi realizada uma determinação de níveis sonoros, para avaliar da existência de situação de incomodidade resultante da realização dessas actividades.
Na determinação dos níveis sonoros efectuada a 26 de Novembro de 1995, verificou-se que era excedido o diferencial de 10dB(A) estipulado no n.º 1, do artigo 20º, do Regulamento Geral Sobre o Ruído.

Considerando que as referidas actividades não se encontravam licenciadas, foi decidido informar as entidades responsáveis pelo licenciamento que as mesmas eram susceptíveis de causar incomodidade e que não deveriam ser concedidas licenças para a sua realização.
Foram igualmente informadas as autoridades policiais para este facto.
Não foi instaurado qualquer procedimento contra-ordenacional”.

O Regulamento Geral sobre o Ruído

6. O Regulamento Geral sobre o Ruído (abreviadamente R.G.R.) – aprovado pelo Decreto-Lei n.º 251/87, de 24 de Junho e posteriormente alterado pelo Decreto-Lei n.º 292/89, de 2 de Setembro – elenca as categorias de actividades a que se aplica o seu regime jurídico. Assim, nos termos do disposto no art. 2º, a construção de edifícios; a laboração de indústrias, comércio e serviços; o tráfego – rodoviário, ferroviário e aéreo e a sinalização sonora, são as actividades compreendidas no âmbito de aplicação do Decreto-Lei n.º 251/87, de 24 de Junho [cfr. alíneas a) a f), do art. 2º, do R.G.R.].

7. Não obstante esta enumeração, o disposto na alínea g) do mesmo artigo vem submeter à disciplina do R.G.R. todas as “actividades geradoras de ruído (…) que possam causar incomodidade”.

8. O art. 20º, integrado no capítulo relativo às actividades ruidosas, definia os requisitos a que deveria obedecer o licenciamento dos locais destinados a espectáculos, diversões e outras actividades ruidosas.

9. O limite sonoro máximo permitido era de 10 dB (A), uma vez que, nos termos da alínea a) deste art. 20º, a diferença entre o valor do nível sonoro contínuo equivalente, corrigido do ruído proveniente dos locais em questão, e o valor do nível sonoro do ruído de fundo, que é excedido, num período de referência, em 95% da duração deste (L95), deve ser inferior ou igual aquele valor.

10. O Decreto-Lei n.º 292/89, de 2 de Setembro, veio alterar a redacção, entre outros, dos art.s 20º e 21º, deixando inalterado o limite de 10 dB (A).

11. Não obstante, a nova redacção do n.º 2 do art. 20º introduziu uma presunção juris tantum, nos termos da qual a licença ou a imposição de condicionalismos para a realização de espectáculos, diversões ou quaisquer actividades ruidosas presume-se concedida sob condição de respeito por aquele limite.

12. O art. 21º, dispondo, como na anterior redacção, sobre espectáculos e actividades que não carecem de prévio licenciamento, alargou, no entanto, a natureza dos seus condicionamentos. Nestes termos, só deve ser autorizada a realização de espectáculos e actividades nas proximidades de edifícios de habitação, escolares, hospitalares ou similares e de estabelecimentos hoteleiros e meios complementares de alojamento, quando:
a) Seja respeitado o limite sonoro máximo de 10 dB (A);
b) Ocorra a sua suspensão
– entre as 22,00 e as 8,00 horas do dia seguinte, de Domingo a quinta-feira;
– entre as 24,00 e as 8,00 horas do dia seguinte, à sexta-feira, ao sábado e nas vésperas de dias feriados.

13. O n.º 3 do art. 20º – a que correspondia o anterior n.º 2 – determina que incumbe às entidades competentes para o licenciamento ou autorização, ouvidas as entidades fiscalizadoras, a imposição, expressamente e a título excepcional, dos condicionamentos tendentes ao cumprimento das imposições do Regulamento Geral sobre o Ruído.

14. O art. 33º do Decreto-Lei n.º 251/87, de 24 de Junho, dispõe sobre a competência para fiscalizar o cumprimento das disposições do R.G.R.. Primeiramente, a atribuição foi feita às autoridades policiais e às entidades com superintendência técnica em cada sector; após a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 292/89, para além destas entidades, a competência foi estendida ao director regional do ambiente da comissão de coordenação regional respectiva (na Região Autónoma dos Açores a competência é da Direcção Regional do Ambiente).

15. Os poderes de fiscalização incluem, nos termos do disposto no n.º 2 do art. 33º, a realização de vistorias e ensaios julgados pertinentes.

16. O n.º 3 do art. 21º – totalmente inovador em relação à redacção inicial do Decreto-Lei n.º 251/87 – impõe a suspensão imediata, pela intervenção da autoridade policial, oficiosamente ou a pedido de qualquer interessado, dos espectáculos ou das actividades que produzam ruído a níveis superiores a 10 dB (A), ou dos que se realizem entre as 22,00 e as 8,00 horas, nos Domingos, terças-feiras, quartas-feiras e quintas-feiras, ou entre as 24,00 e as 8,00 horas, às sextas-feiras, sábados e vésperas dos dias feriados.

17. Por outro lado, constituem contra-ordenações, nos termos do disposto no art. 36º, as infracções ao preceituado, entre outros, no n.º 4 do art. 20º (violação das condições de licenciamento) e n.ºs 1 e 2 do art. 21º [realização de espectáculos ou actividades produzindo ruído a níveis superiores a 10 dB (A), depois das 22,00 horas, nos domingos, terças-feiras, quartas-feiras e quintas-feiras, ou depois das 24,00 horas, às sextas-feiras, sábados e vésperas dos dias feriados].

18. O processamento das contra-ordenações e a aplicação das coimas competem às entidades com superintendência técnica em cada sector (determinada em razão da matéria), ao director regional do ambiente e às autoridades sanitárias concelhias ou distritais (cfr. art. 37º).

A Instauração de Procedimento Contraordenacional

19. Como já referi, nos termos do disposto no art. 33º, do Decreto-Lei n.º 251/87, de 24 de Junho (na redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 292/89, de 2 de Setembro), a fiscalização do cumprimento das disposições do R.G.R. incumbe, também, à Direcção Regional do Ambiente. Por outro lado, dispõe o art. 37º, do R.G.R., que o processamento das contra-ordenações e a aplicação das coimas competem, igualmente, à Direcção Regional do Ambiente.

20. Em 26/11/95, a Direcção Regional do Ambiente promoveu a realização de exames de medição dos níveis sonoros que comprovaram a existência de uma situação de violação ao Regulamento Geral sobre o Ruído, uma vez que o nível sonoro verificado era de 13,9 dB (A). Face a esta verificação, dever-se-ia ter instaurado processo de contra-ordenação.

21. Ao não ter determinado a instauração de procedimento contra-ordenacional, a Direcção Regional do Ambiente recusa o exercício da sua competência própria de fiscalização do Regulamento Geral sobre o Ruído.

22. Nos termos do disposto no art. 29º, do Código do Procedimento Administrativo, a competência é irrenunciável e inalienável, sendo nulo todo o acto que tenha por objecto a renúncia ao exercício da competência legalmente conferida.

II-Conclusões

23. Termos em que, pelas razões que deixei expostas e no exercício do poder que me é conferido pelo disposto no art. 20º, n.º 1, alínea a), da Lei n.º 9/91, de 9 de Abril,

RECOMENDO,que a Direcção Regional do Ambiente:
A. Promova, com carácter de urgência, a realização de exames de medição dos níveis sonoros para avaliar do cumprimento, pela Sociedade Filarmónica …, sita … Horta, da disciplina contida no Decreto-Lei n.º 251/87, de 24 de Junho;
B. Que, caso verifique uma situação de violação ao Regulamento Geral sobre o Ruído (designadamente em virtude do nível sonoro apurado ser superior ao limite máximo legalmente admitido), instaure procedimento contraordenacional e exerça as demais competências previstas na lei.

O PROVEDOR DE JUSTIÇA

José Menéres Pimentel