Secretário de Estado da Juventude
Número :71/A/98
Processo: R-2801/96
Data:20.11.1998
Área: A4

Assunto:FUNÇÃO PÚBLICA – CARGO DIRIGENTE – CONTAGEM DE TEMPO DE SERVIÇO – PROGRESSÃO E PROMOÇÃO – CESSAÇÃO DA COMISSÃO DE SERVIÇO – DIREITO À CARREIRA – DL 323/89, DE 26.09 E DL 34/93, DE 13.02 – PRINCÍPIO DA CONFIANCA.

Sequência:Acatada

1. O licenciado… foi nomeado Chefe da Divisão de Tempos Livres do Instituto da Juventude, lugar de que tomou posse em 1 de Novembro de 1989 (cfr. o respectivo termo de posse).

2. Nessa data, o referido funcionário era Técnico Superior de 1ª classe, desde 27 de Janeiro de 1986 (cfr. extracto publicado no Diário da República, II série, n.º 172, de 29 de Julho de 1986, página 6921, respeitante à Junta Nacional dos Produtos Pecuários).

3. Por despacho de 1 de Agosto de 1990, foi nomeado, precedendo concurso, Técnico Superior Principal, com efeitos desde 28 de Agosto do mesmo ano, data da aceitação da nomeação.

4. Por despacho de 1 de Outubro de 1992, foi-lhe renovada a comissão de serviço no referido cargo de Chefe de Divisão.

5. Com a entrada em vigor (em 4 de Outubro de 1993) do Decreto-Lei n.º 333/93, de 29 de Setembro, que aprovou a lei orgânica do Instituto Português da Juventude, verificou-se a cessação da comissão de serviço do pessoal dirigente do extinto Instituto da Juventude, de acordo com o disposto no artigo 25º desse diploma.

6. O funcionário manteve-se no exercício de funções de gestão corrente até 6 de Dezembro de 1993, por determinação de Sua Excelência a Secretária de Estado da Juventude.

7. Em 28 de Dezembro do mesmo ano, o funcionário requereu a criação do lugar a que teria direito, por força do disposto no artigo 18º, n.º2, alínea a), do Decreto-Lei n.º 323/89, de 26 de Setembro, bem como o pagamento da indemnização a que se refere o n.º 7 do mesmo artigo e diploma.

8. Na sequência de dois pareceres jurídicos, um emitido pelo Gabinete de Apoio Jurídico do Instituto Português da Juventude (doravante designado por IPJ) e outro elaborado no Gabinete de Sua Excelência a Secretária de Estado da Juventude, o licenciado … foi provido num lugar de assessor, escalão 1, com efeitos reportados a 4 de Outubro de 1993 (cfr. extracto publicado no Diário da República, II série, n.º 271, de 23 de Novembro de 1994, página 11750).

9. Em resposta a um pedido do aqui reclamante, a Direcção-Geral da Administração Pública emitiu um parecer, que comunicou ao interessado através do ofício n.º…, onde se conclui que a antiguidade na categoria de assessor deve ser considerada desde 27 de Janeiro de 1992, após a contagem de dois módulos de três anos para promoção.

10. Em 22 de Maio de 1995, o reclamante requereu ao Presidente do Conselho de Administração do IPJ a reavaliação da contagem do tempo de serviço para efeitos de aplicação do disposto no artigo 18º, n.º 2, alínea a), do Decreto-Lei n.º 323/89, de 26 de Setembro, tendo aquele dirigente declarado não ter competência para o efeito.

11. Em 15 de Outubro de 1995, dirigiu a Sua Excelência o Secretário de Estado da Juventude uma petição, solicitando a reapreciação do processo, à luz do parecer da Direcção-Geral da Administração Pública.

12. Já na sequência da intervenção da Provedoria de Justiça, o Centro Jurídico (CEJUR) da Presidência do Conselho de Ministros emitiu, a solicitação daquele membro do Governo, parecer em que se concluía que “apenas deverá ser computado, para efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 3º do Decreto-Lei n.º 34/93, o tempo de serviço prestado após o provimento na categoria de técnico superior principal”, que veio a merecer despacho de concordância daquele membro do Governo.

13. Vejamos, então, como é que a Administração procedeu à aplicação da lei, nos dois momentos em que foi chamada a pronunciar-se.

14. No Parecer n.º 67/GAJ/93, elaborado no IPJ, depois de se transcreverem as disposições do n.º 1 do artigo 3º do Decreto-Lei n.º 34/93, de 13 de Fevereiro e do artigo 18º, n.º 2, alínea a), do Decreto-Lei n.º 323/89, de 26 de Setembro, na sua primitiva redacção, de se definirem os módulos de tempo previstos nos Decretos-Lei n.ºs 265/88, de 28 de Julho e 353-A/89, de 16 de Outubro, para promoção e progressão na carreira técnica superior e de se elencarem os factos relativos ao percurso profissional do aqui reclamante, escreve-se o seguinte:
“Ora, uma vez que a categoria detida pelo funcionário à data da sua nomeação para o cargo dirigente (Técnico Superior de 1ª Classe) se alterou no decurso do tempo de exercício destas funções, tendo o funcionário entretanto beneficiado de uma promoção a técnico superior principal, não faz qualquer sentido, no caso em apreço, falar-se em categoria de origem, nem sequer contabilizar-se o número de anos de serviço na categoria de origem, de forma a poder agregá-los ao número de anos de exercício continuado nas funções de dirigente, de acordo com o que estipula a alínea a) do n.º 2 do artigo 18º do D. L. 323/89, de 26 de Setembro, na sua redacção primitiva. É que, a categoria de origem do funcionário perdeu toda e qualquer relevância prática e de direito desde o momento em que aquele aceitou, em 24.08.90, o lugar de Técnico Superior Principal.”

15. Nesta conformidade, concluía-se que “para efeitos de provimento do funcionário em categoria superior, contabilizar-se-ão apenas o número de anos de exercício efectivo do cargo de Chefe de Divisão, ou seja, (…), quatro anos, um mês e seis dias”, especificando-se, mais à frente, que “o funcionário… tem direito a ser provido na categoria de assessor (…), com efeitos a 7 de Dezembro de 1993 (data da cessação da comissão de serviço)”.

16. No parecer elaborado no Gabinete de Sua Excelência a Secretária de Estado da Juventude, concordando-se, embora, “que o funcionário tem direito ao provimento na categoria de assessor”, diverge-se do parecer do IPJ quanto à forma de calcular “a antiguidade que relevou para efeitos de provimento na aludida categoria e determinação do escalão”.

17. Esta divergência funda-se na circunstância de o funcionário ter sido promovido a técnico superior principal, no decurso da comissão de serviço que vinha exercendo no cargo de chefe de divisão, entendendo-se que se aplica àquela situação o disposto na parte final do n.º 5 do artigo 18º do Decreto-Lei n.º 323/89, de 26 de Setembro, na redacção que lhe foi dada pelo artigo 1º do Decreto-Lei n.º 34/93, de 13 de Fevereiro .

18. “Daqui decorre” – escreve-se no referido parecer – “que no caso vertente não há lugar à aplicação da 1ª parte do disposto no n.º 1 do artigo 3º do Decreto-Lei n.º 34/93, de 13 de Fevereiro, em virtude de existir desde 24 de Agosto de 1990 uma sobreposição do tempo relativo à categoria de origem com o tempo da comissão de serviço do cargo dirigente, os quais não poderão naturalmente ser agregados nos termos da alínea a) do n.º 2 do artigo 18º do Decreto-Lei n.º 323/89, na primitiva redacção, não sendo assim, no caso em apreço, exequível o disposto neste preceito”.

19. E conclui-se, afirmando que o funcionário tem “direito ao provimento em categoria superior, em virtude de o número de anos de exercício continuado de funções dirigentes, que decorre entre 24.08.90 e 7.12.93, (…), ser superior a 3 anos”, considerando-se o tempo remanescente (3 meses e 11 dias) “para efeitos de antiguidade e de determinação do escalão”.

20. Recorde-se que o acto administrativo proferido para dar execução ao disposto no artigo 18º, n.º 2, alínea a), no que respeita à contagem do tempo de serviço, tem por fundamento este parecer.

21. O parecer do CEJUR, emitido na sequência do pedido de reapreciação da contagem do tempo de serviço relevante para efeitos de provimento em categoria superior, no âmbito do direito à carreira garantido ao pessoal dirigente da Administração Pública, formula o problema do seguinte modo:
” Em tese, a questão colocada admite três respostas diferentes: poderá considerar-se que a promoção não tem qualquer relevância na aplicação do regime legal, contando-se todo o tempo prestado no lugar de origem (…); poderá, por outro lado, entender-se que deve ser levado em consideração, independentemente da promoção, todo o tempo de duração das comissões de serviço (…); ou, por último, poderá afirmar-se que apenas deve ser considerado o tempo de duração das comissões de serviço posterior ao provimento na categoria de técnico superior principal (…)”.

22. Mais à frente, escreve-se que “o estatuído no Decreto-Lei n.º 34/93 era já aplicável ao tempo da cessação da comissão de serviço, quer no que respeita ao regime transitório estabelecido no seu artigo 3º, quer no que toca à redacção dada ao n.º 5 no parecer, nunca se esclarece que a norma vigente, constante do n.º 5 do artigo 18º do Estatuto do Pessoal Dirigente, corresponde à norma do n.º 6 do mesmo artigo, antes de este ter sido alterado do artigo 18º do Decreto-Lei n.º 323/89”, sublinhando-se “que esta última alteração não é ressalvada pelas disposições transitórias constantes do diploma de 1993.

23. Acrescenta-se, em seguida, que “do n.º5 do artigo 18º (do Decreto-Lei n.º 323/89), na versão de 1989, decorria necessariamente que a categoria a que se ascendesse na pendência da comissão de serviço valeria, para este efeito, como lugar de origem”.

24. Segundo o parecer, a noção de “lugar de origem” tem de ser entendida com uma latitude que permita abarcar, para além da posição jurídica permanente ocupada pelo funcionário ao tempo da nomeação para o cargo dirigente, aquela a que venha a aceder no exercício de uma faculdade que lhe é expressamente reconhecida”.

25. Continua o parecer, afirmando que “o benefício atribuído pelo Decreto-Lei n.º 323/89 veio a ser retirado em 1993, através da nova redacção que foi dada à alínea a) do n.º 2 do seu artigo 18º; a este propósito, esclarece-se no preâmbulo do diploma que se procurou definir com maior clareza o conceito de direito à carreira, previsto no artigo 18º, evidenciando que o mesmo é reconhecido com o objectivo de evitar possíveis prejuízos no desenvolvimento da carreira de origem, bem como, por consequência, a sua relevância para efeitos de progressão”.

26. Prossegue o parecer, asseverando que “o artigo 3º do Decreto-Lei n.º 34/93, ao determinar a incidência do novo regime nas situações já constituídas, expressamente ressalvou a aplicabilidade a essas situações da formulação original da alínea a) do n.º 2 do artigo 18º do Decreto-Lei n.º 323/89, nada dizendo quanto ao n.º 5 do mesmo artigo”.

27. Daqui se parte para o esforço hermenêutico final:
” A formulação do artigo 3º do Decreto-Lei n.º 34/93 convida a ensaiar uma interpretação enunciativa, fazendo apelo ao argumento a contrario , com o que de imediato se chega à conclusão de que o n.º 5 do artigo 18º do Decreto-Lei n.º 323/89, na sua nova redacção, é aplicável às situações então constituídas. Conhecidas as debilidades deste tipo de interpretação é, todavia, aconselhável confrontar esta conclusão com outro tipo de ponderação, por forma a ter em conta as coordenadas substanciais do sistema.
Simplesmente, se atentarmos no acima referido n.º 1 do artigo 17º do Decreto-Lei n.º 353-A/89, , parece que devemos chegar à mesma conclusão. E, por outro lado, se atentarmos na circunstância de que o acesso à categoria superior na pendência da comissão de serviço é feito com base no módulo de tempo cumprido na categoria de origem (…), o raciocínio é, mais uma vez, confirmado”.

28. E conclui-se, crendo que “apenas deverá ser computado, para efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 3º do Decreto-Lei n.º 34/93, o tempo de serviço prestado após o provimento na categoria de técnico superior principal”.

29. Como se pode verificar, a abordagem interpretativa adoptada nos três pareceres é idêntica, no que respeita à ponderação das disposições transitórias. Este percurso hermenêutico teve como resultado três diferentes interpretações sobre a mesma situação jurídica, o que – convenhamos – não abona em favor da metodologia utilizada, que, claramente, se revela improfícua.

30. Sublinhe-se que, especialmente, os dois últimos pareceres desvalorizam as normas constantes dos artigos 18º, n.º 2, alínea a), do Decreto-Lei n.º 323/89, de 26 de Setembro, e 3º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 34/93, de 13 de Fevereiro, erigindo o disposto no artigo 18º, n.º 6, do primeiro diploma, na redacção que lhe foi dada pelo artigo 1º do decreto de 1993, como factor hermenêutico determinante.
É chegada a altura de confrontar os axiomas vertidos nos pareceres com os dispositivos legais que regulam a matéria em causa.

31. À data da nomeação do reclamante no cargo de Chefe de Divisão, vigorava já o Estatuto do Pessoal Dirigente, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 323/89, de 26 de Setembro.

32. Dispõe o artigo 17º, alínea a), deste diploma que ao pessoal dirigente (em que se inclui o cargo de chefe de divisão, de acordo com o disposto no n.º 2 do artigo 2º do Estatuto em referência) é assegurado o direito à carreira, “nos termos dos artigos seguintes”.

33. Por serem decisivas para a apreciação da concreta situação do reclamante, importa ter presentes as normas do artigo 18º do Estatuto, que a seguir se transcrevem:
” 1- O tempo de serviço prestado em cargos dirigentes conta para todos os efeitos legais, designadamente para acesso nas carreiras em que cada funcionário se encontrar integrado.
2- Os funcionários nomeados para cargos dirigentes têm direito, finda a comissão de serviço:
a) Ao provimento em categoria superior à que possuíam à data da nomeação para dirigente, a atribuir em função do número de anos de exercício continuado nestas funções, agregado ao número de anos de serviço na categoria de origem, agrupados de harmonia com os módulos de promoção na carreira;
b) (…)
6- O disposto no n.º 2 não prejudica o direito de os funcionários que exerçam funções dirigentes se candidatarem aos concursos de acesso que ocorrerem na pendência da respectiva comissão de serviço.”

34. Este artigo 18º do Decreto-Lei n.º 323/89, de 26 de Setembro, veio a ser alterado pelo Decreto-Lei n.º 34/93, de 13 de Fevereiro, pouco antes de se ter verificado a cessação da comissão de serviço do aqui reclamante.

35. O artigo 3º, n.º 1, deste último diploma estabelece que “se mantém transitoriamente em vigor a disposição constante da redacção primitiva do n.º 2 do artigo 18º do Decreto-Lei n.º 323/89, de 26 de Setembro, relativamente aos funcionários que tenham sido nomeados para cargos dirigentes até à data da publicação do presente diploma, relevando para efeitos de antiguidade e de determinação de escalão o tempo remanescente ao necessário para a fixação da categoria a que tenham direito”.

36. Importa, ainda, referir que as normas acima transcritas passaram a ter a seguinte redacção, assinalando-se o fragmento excisado, bem como os segmentos que foram acrescentados ou modificados:
“1- O tempo de serviço prestado em cargos dirigentes conta, para todos os efeitos legais, designadamente para promoção e progressão na carreira e categoria em que cada funcionário se encontrar integrado.
2- Os funcionários nomeados para cargos dirigentes têm direito, finda a comissão de serviço:
a) Ao provimento em categoria superior à que possuíam à data da nomeação para dirigente, a atribuir em função do número de anos de exercício continuado nestas funções, agrupados de harmonia com os módulos de promoção na carreira e em escalão a determinar nos termos do artigo 19º do Decreto-Lei n.º 353-A/89, de 16 de Outubro;
b) (…).
5- O disposto no n.º 2 não prejudica o direito de os funcionários que exerçam funções dirigentes se candidatarem aos concursos de acesso que ocorrerem na pendência da respectiva comissão de serviço, caso em que o provimento respectivo é determinante para efeitos da alínea a) do n.º 2″.

37. É insofismável que o reclamante, licenciado… , foi nomeado para um cargo dirigente antes da publicação do Decreto-Lei n.º 34/93, de 13 de Fevereiro. Nesta conformidade, o direito à carreira é regulado pela “disposição constante da redacção primitiva do n.º 2 do artigo 18º do Decreto-Lei n.º 323/89, de 26 de Setembro”, por força do preceituado no artigo 3º, n.º 1, do diploma de 1993.

38. Em todos os pareceres. procede-se a uma interpretação revogatória da norma do artigo 3º, n.1, do Decreto-Lei n.º 34/93, com fundamento no estatuído no n.º 6 do artigo 18º, na sua nova redacção, sem que se invoque fundamento suficiente para tão drástico resultado.

39. Não se terá dado a devida relevância jurídica ao facto de aos dirigentes que tenham cessado a sua comissão de serviço entre 1 de Outubro de 1989 (data da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 323/89) e 12 de Fevereiro de 1993 (o dia imediatamente anterior ao da publicação do Decreto-Lei n.º 34/93), ser aplicável o disposto no n.º 5 do artigo 18º, na sua redacção primitiva.

40. Significa isto que essa norma integra o regime consubstanciador do direito à carreira definido pelo Decreto-Lei n.º 323/89, que vigorava antes da alteração operada pelo Decreto-Lei n.º 34/93.

41. Neste diploma, distinguem-se claramente três campos de regulação normativa:
a) “a) No artigo 1º, estabelece-se o novo sistema de configuração do direito à carreira, garantido ao pessoal dirigente da Administração Pública;
b) No artigo 2º, confere-se natureza interpretativa aos n.ºs 3 e 12 do artigo 18º;
c) No artigo 3º, congregam-se as disposições transitórias.

42. A norma do actual n.º 5 do artigo 18º faz parte do novo sistema que regula o direito à carreira, não se confundindo com a norma paralela constante do n.º 6 do mesmo artigo, na sua primitiva redacção.

43. A essa regra, a lei não conferiu natureza de norma interpretativa, como o fez com as disposições dos n.ºs 3 e 12 do artigo em referência. Ora, como se sabe e dispõe o artigo 13º, n.º 1, do Código Civil, “a lei interpretativa integra-se na lei interpretada”, atribuindo àquela eficácia retroactiva, embora com os limites que o mesmo artigo impõe.

44. Se a norma em apreço não faz parte das disposições interpretativas incluídas no Decreto-Lei n.º 34/93, terá de concluir-se que, na economia do diploma, esse preceito só pode constituir um preceito inovador.

45. Nas disposições transitórias, não se ressalva a norma do n.º 6 do artigo 18º, como se realça nos pareceres do Gabinete de Sua Excelência a Secretária de Estado e do CEJUR, mas idêntica solução foi adoptada relativamente à norma do n.º 3 do mesmo artigo, ambas na sua primitiva redacção.

46. Neste último preceito, dispõe-se que “o disposto no número anterior é aplicável aos funcionários que se encontrem nomeados em cargos dirigentes à data da entrada em vigor do presente diploma”. Tendo presente que não há norma de sentido equivalente, na redacção que foi dada ao artigo 18º pelo Decreto-Lei n.º 34/93, deverá entender-se que se procedeu à sua revogação, tendo sido retirado esse direito aos funcionários que se encontrem nessa situação, a partir do início da vigência deste diploma ?

47. Importa, agora, não perder de vista o disposto no artigo 12º do Código Civil, onde se estatui que “a lei só dispõe para o futuro”, a que se acrescenta: “ainda que lhe seja atribuída eficácia retroactiva, presume-se que ficam ressalvados os efeitos já produzidos pelos factos que a lei se destina a regular”.

48. Seguramente, o Decreto-Lei n.º 34/93 não atribui eficácia retroactiva ao regime por si instituído, relativamente “aos funcionários que tenham sido nomeados para cargos dirigentes até à data da (sua) publicação”.
49. No que respeita à norma do n.º 6 do artigo 18º, na sua primitiva redacção, esta já produziu os seus efeitos na vigência do regime anterior.

50. O princípio da confiança, ínsito no princípio do Estado de direito democrático, bem como o princípio da igualdade, consagrados, respectivamente, nos artigos 2º e 13º da Constituição, não consente uma interpretação que conduza a uma aplicação da lei? arbitrária, discriminatória e intolerável.

51. As dúvidas de interpretação reveladas nos pareceres a que nos vimos referindo, aconselhariam a que se tivesse optado por uma alternativa hermenêutica conducente a um juízo de compatibilidade das normas interpretandas com a Constituição, de forma a evitar a violação de preceitos e princípios constitucionais (cfr. Gomes Canotilho, “Direito Constitucional e Teoria da Constituição”, Almedina, pág. 1171 e segs).

52. Como se escreve no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 303/90, publicado no Diário da República, 1ª série, de 26 de Dezembro de 1990), “o cidadão deve poder prever as intervenções que o Estado poderá levar a cabo sobre ele ou perante ele e preparar-se para se adequar a elas”, ou ainda no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 17/84, publicado no Diário da República, 2ª série, de 14 de Maio de 1984, “deve poder confiar em que a sua actuação seja reconhecida pela ordem jurídica e assim permaneça em todas as suas consequências juridicamente relevantes. Esta confiança é violada sempre que o legislador ligue a situações de facto, constituídas e desenvolvidas no passado, consequências jurídicas mais desfavoráveis do que aquelas com que o atingido podia e devia contar”.

53. Uma interpretação conforme a Constituição teria iluminado os elementos lógicos da hermenêutica jurídica, designadamente os de ordem sistemática e racional (cfr. Karl Engisch, “Introdução ao Pensamento Jurídico”, Fundação Calouste Gulbenkian, 6º edição, pág. 147, e Jorge Miranda, Manual de Direito Constitucional”, Tomo II, 3º edição, Coimbra Editora, 1991, pág. 263). Este percurso teria permitido evidenciar a incompatibilidade de articulação das disposições da alínea a) do n.º 2 do artigo 18º, na sua primitiva redacção, e do n.º 5 do mesmo artigo, na redacção resultante da alteração introduzida pelo diploma de 1993, norma esta que só ganha sentido na conjugação com a norma actual da alínea a) do n.º 2 do artigo em referência.

54. A busca de um sentido para a expressão “categoria de origem” só pode encontrar justificação na necessidade de compatibilizar as normas acima mencionadas, sendo puramente artificial a conclusão a que os três pareceres chegam, não tendo “na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso”, como se exige no artigo 9º, n.º 2, do Código Civil.

55. E, no entanto, na primitiva redacção da alínea a) do n.º 2 do artigo 18º do Decreto-Lei n.º 323/89, aquela expressão não geraria a menor controvérsia. A “categoria de origem” não pode ser outra que não “a categoria que (os funcionários) possuíam à data da nomeação para dirigente”. E, esta interpretação coaduna-se, na perfeição, com o disposto no n.º 6 do mesmo artigo e diploma, na sua redacção original.

56. A interpretação enunciativa ensaiada no último parecer não passa de uma proposição assertiva, destituída de qualquer fundamentação. Com efeito, não se está perante uma norma excepcional, nem o intérprete dela extraiu qualquer princípio-regra de sentido oposto para os casos não abrangidos por aquele jus singulare (cfr. J. Baptista Machado, “Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador”, Almedina, 1985, págs. 187 e 188).

57. Como já se explanou, está-se, apenas, perante a sucessão no tempo de dois regimes diferentes que incidem sobre o mesmo tipo de situações jurídicas. A lei nova esclarece (cfr. artigo 3º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 34/93) que o novo regime se aplica às situações constituídas após a sua publicação, mantendo-se submetidas ao regime anterior as situações anteriormente constituídas.

58. Ainda no que se refere àquele último parecer, cumpre apreciar a invocação que ali se faz do artigo 17º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 353-A/89, de 16 de Outubro. Esta disposição aplica-se às situações de promoção dos funcionários, em conformidade com as normas que regulam o acesso na carreira, normalmente, por via de concurso, como resulta do estatuído no artigo 16º do mesmo diploma .

59. Ora, o direito à carreira assegurado pelo Estatuto do Pessoal Dirigente, em qualquer dos dois regimes, processa-se segundo regras especiais, que já tivemos oportunidade de enunciar, das quais resulta a inaplicabilidade da disposição invocada no parecer do CEJUR, em matéria de concretização daquele direito.

60. Nesta conformidade:
a) Considerando o disposto no artigo 18º, n.º 2, alínea a), do Decreto-Lei n.º 323/89, de 26 de Setembro, na sua primitiva redacção, aplicável por força do preceituado no n.º 1 do artigo 3º do Decreto-Lei n.º 34/93, de 13 de Fevereiro;
b) Atendendo aos módulos de tempo (de três anos) definidos nos artigos 3º, n.º 1, alíneas b) e c), do Decreto-Lei n.º 265/88, de 28 de Julho, e 19º, n.º 2, alínea b), do Decreto-Lei n.º 353-A/89, de 16 de Outubro, para efeitos de promoção e progressão na carreira técnica superior;
c) Tendo presente que o aqui reclamante era técnico superior de 1ª classe (categoria de origem), desde 27 de Janeiro de 1986 e que a sua comissão de serviço no cargo de chefe de divisão cessou em 4 de Outubro de 1993;
O licenciado…adquiriu o direito a ser provido na categoria de assessor, com efeitos reportados a 27 de Janeiro de 1992, data a partir da qual deverão ser contados os módulos de tempo para efeitos de progressão.
Por todo o exposto, no exercício dos poderes que me são conferidos pelo artigo 20º, n.º 1, alínea a), da Lei n.º 9/91, de 9 de Abril,

RECOMENDO
a) Que ao licenciado… seja contado, na categoria de assessor, todo o tempo de serviço prestado desde 27 de Janeiro de 1992;
b) Que, em função dessa antiguidade, seja corrigida a integração nos escalões imediatos;
c) Que, em conformidade com essa correcção, lhe sejam abonadas a diferença entre as remunerações efectivamente auferidas e as que, por direito, deveriam ter sido processadas.

O PROVEDOR DE JUSTIÇA

José Menéres Pimentel