Director Regional da Juventude, Emprego e Formação Profissional
Número: 20/A/99
Processo: 4055/98
Data: 13.04.1999
Área: Açores

Assunto: DIREITOS LIBERDADES E GARANTIAS – DIREITO A FÉRIAS – DIREITO AO REPOUSO – PROGRAMA SOCIAL DE OCUPAÇÃO DE ADULTOS

Sequência: Acatada

I- Introdução

Em 30/09/98, foi aberto processo na Extensão da Provedoria de Justiça da Região Autónoma dos Açores em virtude de reclamação relativa à situação jurídico-laboral da senhora D. G. C., Auxiliar de Acção Educativa na EB/JI de Nossa Senhora da Conceição ao abrigo do Programa de Ocupação de Adultos (P.R.O.S.A.). Nos termos da queixa, a interessada terá trabalhado ininterruptamente durante dois anos e seis meses (ao abrigo, primeiro, de um programa MEFE e, agora, de um programa PROSA) sem gozar quaisquer dias de férias.

O acordo de actividade ocupacional da interessada, após prorrogação, terá terminado em 30/09/98.

No âmbito da instrução do processo aberto na Extensão da Região Autónoma dos Açores deste Órgão do Estado foram obtidas informações sobre o reconhecimento do direito a férias dos trabalhadores a exercer funções ao abrigo de programas de ocupação de adultos ou de medidas de fomento ao emprego.

A coberto do ofício supra referido, V.Exa. prestou os seguintes esclarecimentos:

“O programa Medidas Especiais de Fomento do Emprego – MEFE, foi criado pela Resolução nº 125/93, de 11 de Novembro, alterada pelas Resoluções nº 102/94, de 18 de Agosto e nº 229/95, de 28 de Dezembro, e é regulamentado pelo Despacho Normativo nº 68/94, de 17 de Fevereiro, alterado pelo Despacho Normativo nº 54/96, de 15 de Fevereiro.

O Programa Social de Ocupação de Adultos – PROSA, foi criado pela Resolução nº 29/97, de 13 de Março e é regulamentado pelo Despacho Normativo nº 74/97, de 13 de Março, alterado pelos Despacho Normativos nº 80/97, de 3 de Abril e nº 119/97, de 30 de Maio.

Em ambos os casos,trata-se de programas ocupacionais que proporcionam a ocupação de desempregados em actividades ocupacionais de interesse colectivo,realizadas no âmbito de projectos apresentados pelas entidades promotoras.

Nestes termos, e ainda de acordo com a regulamentação acima referida, a actividade ocupacional não pode consistir no preenchimento de postos de trabalho existentes, além de que a mesma não gera nem titula relações de trabalho subordinado, caducando com o termos do projecto apresentado.

Face ao exposto, os desempregados inseridos nos programas MEFE e PROSA, não beneficiaram nem beneficiam dos direitos dos trabalhadores, pelo que não lhes é reconhecido o direito a férias”.

II – Exposição de Motivos

Importa, desde já, delimitar os parâmetros normativos da presente análise.

As medidas especiais de fomento do emprego, abreviadamente designadas por MEFE, constituem um programa de formação e de ocupação de desempregados, promovido pelo Governo Regional, tendo sido criadas pela Resolução nº 125/93, de 11 de Novembro (alterada pelas Resoluções nºs 102/94, de 18 de Agosto, e 229/95, de 28 de Dezembro) e regulamentadas pelo Despacho Normativo nº 68/94, de 17 de Fevereiro, (alterado pelos Despachos Normativos nºs 10/95, de 12 de Janeiro, e 54/96, de 15 de Dezembro).

O programa integra duas medidas: a medida 1, de ocupação de desempregados, e a medida 2, de formação profissional pré-qualificante. A primeira visa “proporcionar aos desempregados de longa duração, aos desempregados sazonais e aos jovens candidatos ao primeiro emprego uma actividade ocupacional, que permita a satisfação de necessidades de interesse colectivo ou incentive a criação de futuros empregos” (nº 2 da Resolução nº 125/93, de 11 de Novembro). A segunda “visa conferir formação profissional pré-qualificante aos jovens candidatos ao primeiro emprego, com o objectivo de promover uma mais fácil inserção no mundo do trabalho e uma melhor perspectivação do seu futuro profissional” (nº 3).

Nos termos do disposto no nº 4 da Resolução nº 125/93, de 11 de Novembro, na redacção conferida pela Resolução nº 229/95, de 28 de Dezembro, “podem apresentar projectos para apoio, no âmbito do programa, entidades públicas ou privadas, de acordo com a seguinte ordem de preferência:

a) Instituições Particulares de Solidariedade Social;
b) Associações;
c) Autarquias Locais;
d) Serviços e organismos da Administração pública;
e) Cooperativas;
f) Empresas Públicas”.

O regulamento do programa MEFE foi aprovado pelo Despacho Normativo nº 68/94, de 17 de Fevereiro. Nos termos do disposto no artigo 5º, alínea c), constitui dever do promotor “facultar aos formandos o acesso aos benefícios e equipamentos sociais que sejam compatíveis coma acção frequentada e com a sua duração”. Por outro lado, os participantes são beneficiários de contrato de seguro de acidente de trabalho ou de acidentes pessoais (artigo 7º).

No que concerne à medida 1 do MEFE, os projectos devem incluir a descrição do projecto [alínea a) do artigo 12º], o número de desempregados a ocupar [alínea b)], a localização [alínea c)] e o prazo de duração [alínea d)]. A participação nesta medida especial de fomento do emprego é titulada por um contrato de ocupação temporária de desempregado (artigo 13º, nº 1) que contém, como conteúdo obrigatório, o “horário e termo inicial da ocupação” [alínea d) do artigo 13º]. Nos termos do nº 3, “o contrato de ocupação temporária de desempregado não gera nem titula relações de trabalho subordinado e caduca com o termo do projecto no âmbito do qual foi celebrado”.

Note-se o disposto no artigo 10º do Despacho Normativo nº 68/94, de 17 de Fevereiro, na redacção dada pelo Despacho Normativo nº 54/96, de 15 de Fevereiro, que dispõe assim:

Artigo 10º
Destinatários

1.A Medida 1 – Ocupação de desempregados, tem como destinatários os desempregados que preencham os seguintes requisitos:
a) Estejam inscritos nos centros de emprego da Região há mais de 60 dias;
b) Não tenham estado ocupados um ano completo no MEFE;
c) Não sejam beneficiários do subsídio de desemprego ou do subsídio social de desemprego.

2.O requisito constante da alínea b) não é exigido no caso de deficientes, e pode ser dispensado no caso de outras situações consideradas especiais,designadamente as de natureza sócio-económica, mediante autorização do Secretário Regional da Juventude, Emprego, Comércio, Indústria e Energia.

No âmbito da medida 2, os projectos devem preencher os requisitos exigidos para as acções cofinanciadas pelo Fundo Social Europeu (artigo 19º, nº 2). É celebrado um contrato de formação, (artigo 20º, nº 1), que contém, igualmente como conteúdo obrigatório, a “duração e local de realização do curso de formação” [alínea c) do artigo 20º]. Nos termos do nº 3, “o contrato de formação não gera nem titula relações de trabalho subordinado e caduca com a conclusão, desistência ou exclusão do curso de formação para que foi celebrado”.

O Programa Social de Ocupação de Adultos (ou PROSA), foi criado pela Resolução nº 29/97, de 13 de Março, e é regulamentado pelo Despacho Normativo nº 74/97, de 13 de Março, alterado pelos Despachos Normativos nº 80/97, de 3 de Abril, nº 81/97, de 10 de Abril, e nº 119/97, de 30 de Maio.

A criação deste programa social de ocupação de adultos teve em consideração “(…) a necessidade de introduzir um certo número de regalias sociais no âmbito dos programas ocupacionais, tendo em vista uma maior justiça social” (cf. preâmbulo da Resolução nº 29/97, de 13 de Março) e visou, entre outros, os seguintes objectivos:

a) O desenvolvimento de actividades que facilitassem aos desempregados o ingresso num emprego estável [nº 2, alínea a)];
b) Uma mais fácil integração na vida activa através de uma formação básica [alínea b)];
c) A satisfação de necessidades colectivas [alínea c)].

Os desempregados inseridos em projectos ocupacionais ficam obrigatoriamente abrangidos pelo regime geral da segurança social dos trabalhadores por conta de outrem e por um seguro de acidentes de trabalho (nº 5).

Competia ao Secretário Regional da Educação e Assuntos Sociais regulamentar, através de despacho, a execução do PROSA (nº 6). Este desígnio foi cumprido através do Despacho Normativo nº 74/97, de 13 de Março. Nos termos do artigo 2º, nº 1, define-se actividade ocupacional como “a ocupação temporária de desempregados em tarefas que satisfaçam necessidades colectivas”;e o nº 2 dispõe que “a actividade ocasional não pode consistir no preenchimento de postos de trabalho existentes”.

Nos termos do artigo 3º, as actividades ocupacionais são realizadas no âmbito de projectos a promover por entidades públicas ou privadas sem fins lucrativos, nomeadamente:

a) Entidades de solidariedade social;
b) Autarquias;
c) Serviços públicos.

São destinatários do PROSA os desempregados inscritos nos centros de emprego há mais de doze meses, que não tenham direito às prestações de desemprego, ou que já tenham terminado os respectivos períodos de concessão (artigo 4º, nº 1). Por outro lado, é considerada prioritária a ocupação de desempregados deficientes e de desempregados com idade igual ou superior a 45 anos (nº 2) .

Sobre o procedimento de apresentação dos processos rege o artigo 6º que dispõe que “(…) são instruídos com descrição do projecto, número de desempregados a ocupar, localização, prazo de duração do projecto e termo de responsabilidade do promotor” (nº 2).

As relações entre os desempregados ocupados e as entidades promotoras são tituladas por um acordo de actividade ocupacional (artigo 7º, nº 1), do qual constará a duração da actividade [alínea c)]. O nº 4 do deste artigo 7º dispõe expressamente que “o acordo de actividade ocupacional não gera nem titula relações de trabalho subordinado, caducando com o termo do projecto no âmbito do qual foi celebrado”.

Note-se o teor do nº 2 do artigo 8º:

2. A violação de qualquer obrigação por parte do desempregado ocupado ou pelo promotor que, nos termos das relações de trabalho subordinado pudesse fundamentar a rescisão do contrato, confere ao lesado a faculdade de obter a cessação do acordo mediante parecer favorável da Direcção Regional do Emprego.

Pela relevância que assume para o presente estudo recorde-se que a duração dos projectos de actividades ocupacionais não pode exceder doze meses (artigo 9º, nº 1), e que apenas se permite a prorrogação, nos termos do nº 2, “(…) até ao limite máximo de seis meses, mediante solicitação fundamentada das entidades promotoras, com uma antecedência de 30 dias em relação ao termo de execução do projecto”.
Acresce que findo o acordo inicial (ou a renovação, quando for o caso) a entidade promotora não pode celebrar contrato da mesma natureza e com o mesmo objecto com o respectivo desempregado, antes de decorrido o prazo de seis meses (nº 4).

Os desempregados inseridos nos projectos ocupacionais ficam obrigatoriamente abrangidos pelo regime geral de segurança social dos trabalhadores por conta de outrem (artigo 11º, nº 1) e são abrangidos por um seguro de acidentes de trabalho a contratar pelas entidades promotoras e cujos encargos são por elas suportados (artigo 12º).

O nº 2 do artigo 13º dispõe que “o trabalhador ocupado dispõe de dois dias por mês para efectuar diligências de procura de emprego, devendo comprovar a efectivarão das mesmas, sem prejuízo do direito de descanso semanal legalmente estabelecido”.

Do que fica exposto podem extrair-se as seguintes conclusões relativamente aos programas em análise:

1ª As medidas especiais de fomento do emprego (MEFE) e o Programa Social de Ocupação de Adultos (PROSA) são programas ocupacionais de desempregados;
2ª São celebrados contratos de ocupação temporária e contratos de formação (MEFE) ou acordos de actividade ocupacional (PROSA).
3ª Não podem ser preenchidos postos de trabalho já existentes.
4ª Os acordos celebrados não consubstanciam contratos de trabalho subordinado;
5ª Os acordos vigoram pelo tempo do respectivo projecto;
6ª Está predefinida a duração máxima dos programas;
7ª Os beneficiários dos programas ocupacionais estão abrangidos pelo regime geral de segurança social dos trabalhadores por conta de outrem;
8ª Os desempregados estão, igualmente, abrangidos por um seguro de acidentes de trabalho ou de acidentes pessoais.

A interessada no presente processo apresentou uma reclamação ao Provedor de Justiça em virtude da circunstância de ter trabalhado ininterruptamente durante dois anos e seis meses, ao abrigo de programas ocupacionais, sem ter gozado quaisquer dias de férias, uma vez que, como ficou atrás exposto, aos desempregados inseridos nos programas MEFE e PROSA não tem sido reconhecido o direito a férias.

A questão submetida à minha apreciação é pois tão somente a de averiguar se a assinatura de contratos de ocupação temporária, contratos de formação ou acordos de actividade ocupacional confere aos beneficiários o direito a férias.

Se o objecto da presente análise fosse o exercício do direito de férias remuneradas pela senhora D. G. C., então dever-se-ia concluir, em face do quadro normativo exposto, pela improcedência da queixa. Com efeito, como resulta da descrição do respectivo regime jurídico, o legislador, ao disciplinar os programas ocupacionais MEFE e PROSA, afastou, intencional e expressamente, a aplicabilidade das regras próprias dos contratos de trabalho subordinados.

Reforça este entendimento a referência aos benefícios relativos ao regime geral de segurança social dos trabalhadores por conta de outrem e aos seguros de acidentes de trabalho ou de acidentes pessoais. Estes mecanismos de protecção dos trabalhadores – e apenas estes – são extensivos aos beneficiários dos programas ocupacionais, e somente na medida em que o legislador previu expressamente a sua consagração. A contrario, não posso deixar de concluir que o legislador quis afastar a aplicabilidade do regime geral das férias aos desempregados ocupados nas actividades ocupacionais uma vez que, como é pacífico na jurisprudência e na doutrina, “(…) na determinação do sentido prevalecente da Lei, deverá o intérprete presumir que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados e que consagrou as soluções mais acertadas (artigo 9º, nº 3, do Código Civil)”.

Não é difícil constatar que a inaplicabilidade do regime geral das férias, e a não consagração de um regime específico de férias, resultam da própria natureza dos acordos que o MEFE e o PROSA geram: contratos de ocupação pelo tempo necessário à execução dos projectos aprovados. Não faz sentido, pois, que o desempregado venha a beneficiar de um período de férias remuneradas durante a execução do projecto previamente aprovado.

Não obstante, o exemplo trazido à colação pela interessada no presente processo revela a existência de situações em que a sucessão de vínculos criados no âmbito de programas ocupacionais diferentes, ou de diferentes projectos no âmbito do mesmo programa, se traduzem em períodos de ocupação contínua superiores aos humanamente toleráveis . É por esta razão que, na presente situação, o argumento de que a interessada não tem direito a um período de paragem de laboração ao fim de um ano de trabalho porquanto é desempregada integrada em actividades ocupacionais não pode colher: na prática, a senhora D. G. C. foi uma Auxiliar de Acção Educativa na EB/JI de Nossa Senhora da Conceição, e não uma desempregada esporadicamente ocupada.

Não obstante entender-se – como propendo a entender – que a interessada não tinha direito a férias, parece abusivo concluir que aos beneficiários dos programas ocupacionais MEFE e PROSA não é reconhecido o direito ao repouso consagrado no artigo 59º, nº 1, alínea d), da Constituição da República. Este direito, como referem GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, enquadra-se nos “direitos análogos aos direitos, liberdades e garantias” e é um dos “direitos fundamentais derivados” beneficiando, por este facto, do regime específico dos direitos, liberdades e garantias (artigo 17º, da Constituição).

Acresce que neste particular domínio resulta do artigo 59º, nº 2, alínea b), da Constituição, que incumbe ao Estado assegurar as condições de trabalho,retribuição e repouso a que os trabalhadores tem direito, nomeadamente a fixação a nível nacional dos limites da duração do trabalho. Ora, no caso em apreço, é bem menos relevante a qualificação jurídica do vínculo no âmbito do qual a interessada presta serviço do que os efectivos termos em que a laboração ocorre. Se a senhora D. G. C. desempenhou as mesmas tarefas, esteve sujeita a igual horário de trabalho e se encontrou-se submetida a idênticos poderes de direcção que as restantes auxiliares de acção educativa da EB/JI de Nossa Senhora da Conceição, deveria ter beneficiado dos direitos cuja aplicabilidade não é naturalmente afastada pelo facto de ter sido admitida ao abrigo de um programa de ocupação de desempregados.

O direito ao repouso visa proporcionar a recuperação dos trabalhadores do desgaste provocado pelo esforço físico e psicológico inerente ao desempenho profissional. Neste contexto, é absolutamente injustificada qualquer discriminação fundada na desigualdade dos vínculos jurídicos que ligam as diferentes auxiliares de acção educativa à EB/JI de Nossa Senhora da Conceição. Aliás, este raciocínio é extensível ao direito à organização do trabalho em condições socialmente dignificantes [artigo 59º, nº 1, alínea b), da Constituição], e ao direito à prestação do trabalho em condições de higiene, segurança e saúde [artigo 59º, nº 1, alínea c)]. Neste domínios, qualquer discriminação fundada nas diferenças de vínculo jurídico que titulam as relações laborais é ilegítima, por ausência de elementos que objectivamente a justifiquem.

Diferentemente, o direito à retribuição do trabalho não pode significar, quanto aos desempregados contratados ao abrigo de programas ocupacionais, uma equivalência relativamente aos demais trabalhadores da Administração. Nesta situação, é justificada a desigualdade de tratamento, a qual é fundada nos objectivos principais da ocupação dos desempregados: a satisfação de necessidades de interesse colectivo, a (futura) criação de empregos, a formação básica propiciadora de integração na vida activa, o (futuro) ingresso num emprego estável.

Neste contexto, importa mencionar, como factores de discriminação legítimos , o carácter temporário dos programas ocupacionais – no caso do PROSA a duração dos projectos não pode exceder doze meses, permitindo-se apenas a prorrogação até ao limite máximo de seis meses -, e a sua natureza de actividade ocupacional ou pré-qualificante – no caso da medida 1 os destinatários não podem ter estado anteriormente ocupados um ano completo no MEFE. Ora, não permitir, por um lado, que os programas ocupacionais excedam determinada duração e tolerar, paralelamente, que no mesmo posto de trabalho uma pessoa esteja ocupada durante um período ilimitado de tempo em virtude da celebração de diferentes contratos de ocupação temporária é, para além de um contra-senso, uma clara situação de fraude à Lei.

Dito isto, compreende-se que a interessada, terminado um dos projectos de ocupação temporária, não tenha optado por exercer o reclamado direito ao repouso antes de retomar o lugar. É que tal circunstância teria implicado, com toda a probabilidade, a colocação de um outro desempregado no lugar, possivelmente ao abrigo dos mesmos programas ocupacionais.

É a desproporção evidente entre a possibilidade do exercício do direito ao repouso, por um lado, e a susceptibilidade da perda do posto de trabalho, por outro, que leva à intervenção do Provedor de Justiça na presente situação.

Parece-me que a paragem de laboração da senhora D. G. C. constituía um direito que deveria ter sido reconhecido pela Administração, sem que tal implicasse a exclusão da desempregada do programa no qual estava integrada.

III – Conclusões

Em face do regime jurídico dos programas ocupacionais MEFE e PROSA,e em especial da circunstância de ter sido expressamente afastada a aplicabilidade das regras próprias dos contratos de trabalho subordinados, não assistia à senhora D. G. C. o direito a férias remuneradas.

Porém, está documentada a existência de situações de ocupação contínua prolongada, em virtude da celebração de mais do que um contrato no âmbito de diferentes programas ocupacionais, ou de diferentes projectos no âmbito do mesmo programa.

A interessada foi, na prática laboral diária, uma Auxiliar de Acção Educativa na EB/JI de Nossa Senhora da Conceição, e não uma desempregada ocupada num projecto de duração limitada.

À senhora D. G. C., bem como aos beneficiários dos programas ocupacionais MEFE e PROSA que se encontrem em condições análogas, deveria ter sido reconhecido o direito ao repouso, consagrado no artigo 59º, nº 1, alínea d), da Constituição da República, indispensável à recuperação do desgaste provocado pelo esforço físico e psicológico do respectivo desempenho profissional.

Em face das especificidades próprias dos programas MEFE e PROSA, e das suas características de actividades ocupacionais ou pré-qualificantes, o recomendado reconhecimento do direito ao repouso não confere o direito à retribuição em tempo de férias.

Como forma de tornar efectivo o mencionado direito ao repouso deve ser assegurada a continuação da vigência dos contratos de ocupação temporária ou dos acordos de actividade ocupacional após o gozo dos respectivos períodos de descanso.

O acordo de actividade ocupacional da interessada, após prorrogação, terá terminado em 30/09/98. No mesmo dia este processo foi aberto na Extensão da Provedoria de Justiça da Região Autónoma dos Açores, uma vez que só nessa data foi recebida a mencionada reclamação. A probabilidade da instrução do processo em nada aproveitar à interessada não desmotivou a formulação da presente recomendação uma vez que outros beneficiários do MEFE e PROSA podem encontrar-se em situação idêntica.

Pelas razões que deixei expostas e no exercício do poder que me é conferido pelo disposto no artigo 20º, nº 1, alínea a), da Lei nº 9/91, de 9 de Abril,

RECOMENDO

A. Que aos beneficiários dos programas MEFE e PROSA que, em virtude de sucessivos vínculos criados no âmbito de programas ocupacionais diferentes, ou de diferentes projectos no âmbito do mesmo programa, estejam continuamente ocupados, seja reconhecido o direito ao repouso,consagrado no artigo 59º, nº 1, alínea d), da Constituição da República, indispensável à recuperação do desgaste provocado pelo esforço físico e psicológico do respectivo desempenho profissional.

B. Que, como forma de tornar efectivo o mencionado direito ao repouso, seja assegurada a continuação da vigência dos contratos de ocupação temporária ou dos acordos de actividade ocupacional após o gozo dos respectivos períodos de descanso.

O PROVEDOR DE JUSTIÇA

JOSÉ MENERES PIMENTEL