Secretário de Estado da Segurança Social e das Relações Laborais
Número: 54/A/99
Processo: 2945/92
Data: 18.06.1999
Área: A3

Assunto: DIREITOS LIBERDADES E GARANTIAS – DIREITO A ALIMENTOS – DIVÓRCIO – PRESTAÇÕES POR MORTE – ACTO ADMINISTRATIVO ILEGAL – ALTERAÇÃO DOS ACTOS DE ATRIBUIÇÃO DAS PRESTAÇÕES

Sequência: Sem resposta

1. A Senhora A dirigiu-me uma reclamação com fundamento no facto de as prestações que auferia por morte do Senhor B terem sido reduzidas por força da atribuição de prestações de igual natureza à Senhora C, sendo que, de acordo com a reclamante, esta pensionista não preenchia os requisitos legalmente exigidos para a atribuição do subsídio por morte e da pensão de sobrevivência.

2. No âmbito da instrução do processo aberto com base na aludida reclamação, concluiu-se que assistia razão à reclamante, essencialmente, porque:

a) o direito a alimentos apenas fora judicialmente reconhecido à Senhora C na vigência do casamento, não se tratando, portanto, da obrigação de alimentos a que se refere o art. 11º do Decreto-Lei n.º 322/90, de 18 de Outubro, que apenas poderá existir entre ex-cônjuges ou separados judicialmente;

b) de acordo com aquela mesma disposição legal, se tornava necessário proceder à prova de que à data da morte do beneficiário, aquela se encontrava efectivamente a receber pensão de alimentos, prova essa que não havia sido exigida pelo Centro Nacional de Pensões.

3. Termos em que foi solicitada ao Senhor Presidente do Conselho Directivo do Centro Nacional de Pensões, através do ofício n.º…, de … 1995, informação quanto à disponibilidade para promover a revisão do processo.

4. Aquele Centro Nacional de Pensões veio, no entanto, a manifestar-se negativamente quanto àquela possibilidade, através do ofício n.º … , de …. de 1996, por entender que, após o divórcio, se manteve a obrigação de alimentos atribuída à Senhora C na constância do casamento e a sentença judicial que os havia fixado constituía prova bastante desse direito.

5. O parecer que sustentou aquela decisão era, no entanto, manifestamente improcedente e revelava uma evidente contradição não só com o essencial dos regimes das obrigações alimentícias, como, também, com posições anteriormente assumidas pelo Centro Nacional de Pensões.

Acresce que, nada se referiu quanto à prova de que o cônjuge divorciado, à data da morte, estava a receber de facto pensão de alimentos.

6. Atentas essas circunstâncias, dirigi, em 9 de Junho de 1997, ao Senhor Presidente do Conselho Directivo do Centro Nacional de Pensões a Recomendação n.º 44/A/97, cuja cópia se junta (doc. n.º 1).

7. O Centro Nacional de Pensões, através do ofício n.º …, de … de 1997, comunicou a decisão de não acatar aquela recomendação, sendo que, porém, não foram aduzidos quaisquer argumentos novos quanto à questão de fundo; com efeito, apenas se acrescentou, quanto à prova do recebimento da pensão de alimentos por parte do cônjuge divorciado, que o facto de o Sr. B não ter declarado, em sede de IRS nos anos de 1989 a 1991, o pagamento de qualquer pensão de alimentos nada prova relativamente à percepção ou não percepção de tal pensão por parte da sua ex-mulher Senhora C.

8. Atento o teor desta resposta, não pude deixar de reiterar a recomendação anteriormente formulada, o que fiz através do ofício n.º …, de … de 1997, cuja cópia se junta (doc. n.º 2).

9. O Centro Nacional de Pensões manteve a decisão de não acatar a recomendação, sendo que, conforme resulta do ofício n.º …, de … de 1998 que comunicou aquela decisão, não se pronunciou, mais uma vez, quanto às questões de fundo que suscitei a propósito da situação sub judice.

10. Na verdade, sendo certo que está em causa o preenchimento dos dois requisitos previstos no art.º 11º do Decreto-Lei n.º 322/90, de 18 de Outubro, aquele Centro limitou-se a referir : ” …julgamos que a ex-cônjuge fez prova que lhe estava judicialmente fixada uma pensão de alimentos definitivos cujo obrigado era o Senhor B.

Ora a existência de tal sentença faz presumir o recebimento de pensão, salvo prova em contrário.

Acresce que a senhora C declarou expressamente que a referida pensão de alimentos sempre lhe foi paga até à morte do Senhor B, não tendo, a nosso ver, a viúva feito prova em contrário”.

11. Verifica-se, pois, que, à semelhança do que aconteceu anteriormente, o Centro Nacional de Pensões desconheceu objectivamente as razões que aduzi para demonstrar a diferente natureza da obrigação alimentícia existente na constância do matrimónio e a que pode subsistir entre ex-cônjuges.

12. Por esse motivo, salienta-se, antes de mais, que se mantêm os argumentos que me levaram a considerar não estar preenchido o requisito da existência da obrigação da prestação de alimentos à Sra. C.

13. É, pois, sem prejuízo desse entendimento que passo a abordar a questão relativa aos elementos que, de acordo com aquele Centro, demonstram o recebimento efectivo de uma pensão de alimentos por parte daquela beneficiária à data da morte.

14. A propósito desta matéria, aquele Centro informou que esse processo incluiu uma presunção fundada na fixação judicial de uma pensão de alimentos “definitivos” e numa declaração expressa da interessada, acrescentando-se que, para além disso, a viúva não fizera prova em contrário.

15. Presentes esses elementos, verifica-se, no entanto, que, se outra razão não houvesse, bastaria a manifesta insuficiência da prova produzida para fundamentar a alteração por mim recomendada.

16. Com efeito, desde logo, não foi tido em conta que a prova do recebimento efectivo da pensão de alimentos competia à interessada Senhora C conforme decorre do art.º 342º, n.º 1, do Código Civil; não fazendo, pois, qualquer sentido invocar que, no âmbito do processo de atribuição das prestações em causa a viúva, Senhora A, não havia feito prova do contrário!

17. Por outro lado, nesta matéria, não existe qualquer presunção legal que legitime a ilação tirada pelo Centro Nacional de Pensões.

O legislador, ao autonomizar, no art.º 11º do Decreto-Lei n.º 322/90, de 18 de Setembro, os dois requisitos cumulativos, partiu, aliás, do pressuposto exactamente contrário, isto é, de que a verificação do primeiro – existência de uma decisão judicial – não significava, necessariamente, a verificação do segundo – recebimento efectivo da pensão nela fixada à data da morte.

A presunção invocada do Centro Nacional de Pensões, para além de, por natureza, não constituir, em si própria, um meio de prova, atentas as razões atrás referidas, não podia, nem devia, portanto, ter sido estabelecida.

18. Chegados a este ponto, verifica-se que o único meio de prova que sustentou a decisão do Centro Nacional de Pensões foi a declaração da interessada.

Ora, essa declaração é manifestamente insuficiente em ordem a demonstrar a realidade cuja verificação se tornava necessário comprovar.

19. Assim sendo, é imperativo concluir que a atribuição das prestações por morte à Sra. C teve lugar sem que se verificasse nenhum dos requisitos previstos no art.º 11º do Decreto-Lei n.º 322/90, de 18 de Setembro, razão porque, a decisão que a determinou foi afectada por vício de violação de Lei.

Atento o exposto,

RECOMENDO

no sentido de Vossa Excelência transmitir ao Centro Nacional de Pensões orientações no sentido de os actos de atribuição à Senhora A das prestações por morte do Senhor B serem alterados de modo a que os respectivos valores coincidam com os inicialmente fixados, sem prejuízo da competente actualização.

O PROVEDOR DE JUSTIÇA

JOSÉ MENÉRES PIMENTEL