Ministra da Educação

R-3173/93
Rec. nº 16/B/95
Data:19.05.95
Área: A4

Assunto:FUNÇÃO PÚBLICA – DOCENTES – LICENÇA SEM VENCIMENTO DE LONGA DURAÇÃO – REGRESSO – QUADRO DE ORIGEM – VAGAS – NÃO ABERTURA DE CONCURSO.

Sequência:

A-OS FACTOS

1.A licenciada …, professora do quadro de nomeação definitiva da Escola Secundária da Trofa, apresentou queixa na Provedoria de Justiça contra o Despacho da Exma. Directora do Departamento de Gestão dos Recursos Educativos, de 3/11/92, através do qual lhe foi autorizado o regresso ao serviço no termo de licença sem vencimento de longa duração, ao abrigo do artigo 82º do Decreto-Lei nº 497/88, de 30 de Dezembro, uma vez que o mesmo apenas lhe foi viabilizado através de candidatura a concurso.

Com efeito, a reclamante gozou a referida licença, a partir de 1/9/90, tendo requerido na Escola Secundária da Trofa, em 12 de Maio de 1992, o seu regresso ao serviço.

2.Ouvidos os respectivos serviços centrais do Ministério da Educação e o Conselho Directivo da Escola Secundária de Trofa, apurou-se o seguinte:

a)A referida Escola enviou o requerimento da interessada à Direcção Regional de Educação do Norte, em 12/5/92, tendo solicitado, anteriormente, com vista à colocação para o ano escolar 1992/93, uma vaga no grupo de docência da requerente 11º Grupo B;

b)No ano escolar de 1992/93, foi colocada a concurso uma vaga para o 11º grupo do quadro da Escola Secundária da Trofa, conforme aviso de abertura publicado no Diário da República, nº25, de 30/1/92, não tendo a reclamante podido candidatar-se, visto o concurso ter decorrido, em data anterior à do seu requerimento;

c) A ex-Direcção Geral de Administração Escolar, através do ofício nº 19643, de 23/12/92, comunicou, posteriormente, à Escola o deferimento do pedido de regresso ao serviço, tendo, todavia, informado a mesma de que a docente só poderia ocupar o lugar do quadro mediante oposição a concurso, nos termos do disposto no nº1 do artigo 28º do Decreto-Lei nº 18/88, de 21 de Janeiro;

d) Em Fevereiro de 1993, a reclamante foi opositora à ia fase do concurso para colocação de professores dos ensinos básico e secundário referente ao ano lectivo de 1993/94, tendo concorrido a 60 estabelecimentos de ensino, entre os quais a escola de origem, que colocou em primeira prioridade, e na qual surgiram, entretanto, 2 vagas adicionais, resultantes da movimentação decorrente do concurso;

e) Porém, não logrou obter colocação em qualquer das escolas a que concorreu nesta fase do concurso, tendo, em relação à escola de origem, acabado por ser preterida em favor de outros 3 candidatos, por ter ficado em 651º lugar na respectiva lista de graduação;

f)Tendo recorrido hierarquicamente do despacho que homologou a lista de colocações, foi negado provimento ao respectivo recurso;

g) Concorreu, posteriormente, à 2ª fase do concurso relativo ao mesmo ano lectivo de 1993/94, tendo obtido colocação na escola de origem, embora a escola desconheça o tipo de vínculo que a docente mantém em relação ao respectivo quadro.

B-O DIREITO

3.A reclamante considera-se injustamente tratada, discordando do entendimento sustentado pelos serviços na dependência de Vossa Excelência, segundo o qual os docentes que pretendam o regresso à actividade após a situação de licença de vencimento de longa duração têm de ser opositores ao concurso para colocação de professores, por força do disposto no nº 1 do artigo 28º do Decreto-Lei nº 18/88, de 21 de Janeiro, conjugado com o disposto no artigo 123º do Estatuto da Carreira docente, aprovado pelo Decreto-Lei nº 139-A/90, de 28 de Abril.

4.Tal interpretação é porém ofensiva, em minha opinião, do disposto no nº3 do artigo 107º do referido Decreto-Lei nº 139-A/ 90 e no artigo 82º do Decreto-Lei nº 497/88, de 30 de Dezembro, ex vi do artigo 86º daquele diploma.

4.1.Com efeito, o disposto no nº 1 do artigo 28º, ao exigir que os professores do quadro em situação de licença ilimitada, que pretendam reocupar lugar do quadro, só o possam fazer através do concurso regulamentado por aquele diploma, deverá considerar-se actualmente derrogado, devido à entrada em vigor do referido Estatuto da Carreira Docente, o qual, a este respeito, adoptou no seu artigo 107º um mecanismo coincidente com o do regime geral, aprovado para os restantes funcionários e agentes da Administração pelo artigo 82º do Decreto-Lei nº 497/88, de 30 de Dezembro.

4.2.Tal derrogação não resultará, apenas, da circunstância de, entretanto, ter sido definido um novo regime geral e dada uma nova designação à figura da licença sem vencimento de longa duração, chamada licença ilimitada, ao tempo da entrada em vigor do Decreto-Lei nº 18/88.

4.3.O afastamento do regime definido no nº 1 do artigo 28º deste diploma resulta, sobretudo, do facto de o legislador do Estatuto da Carreira Docente ter operado no seu artigo 86º uma remissão genérica, em matéria de férias, faltas e licenças do pessoal docente, para o regime geral em vigor na Função Pública (actualmente constante dos artigos 78º a 83º do Decreto-Lei nº 497/88, de 30 de Dezembro), apenas com reserva das adaptações constantes das secções seguintes.

4.4.Deste modo, em tudo o que não se encontrar especialmente regulado no referido estatuto deverá aplicar-se o regime previsto no Decreto-Lei nº 497/88, sem que haja lugar a qualquer outra adaptação ou regime especial.

4.5.Ora, no que toca à licença sem vencimento de longa duração, o artigo 107º do estatuto aprovado pelo Decreto-Lei nº 139-A/90, de 28 de Abril, apenas contém uma adaptação de relevo, em relação ao referido regime geral, ao dispor, no seu nº 2, que “o início e o termo da licença sem vencimento de longa duração é obrigatoriamente coincidente com as datas de inicio e de termo do ano escolar”. Tal regra bem se compreende, sobretudo se atentarmos na perturbação que aqueles factos gerariam no seio das escolas, a meio do ano escolar, ao mesmo tempo que a apresentação de requerimento, previamente à abertura de concurso, permite dar satisfação aos interesses dos requerentes, sem ofensa dos interesses legítimos dos eventuais opositores ao mesmo concurso (cfr. nº2 do artigo 82º do Decreto-Lei nº 497/88).

4.6.A seguir à introdução desta especialidade, o nº 3 do citado artigo 107º estabelece que “o docente em gozo de licença sem vencimento de longa duração pode requerer, nos termos do número anterior, o regresso ao quadro de origem numa das vagas existentes no respectivo grupo de docência ou na primeira que venha a ocorrer no quadro a que pertence”.

4.7.Quer isto dizer que, existindo vaga no respectivo grupo de docência, no quadro de origem, no fim de um dado ano escolar, (altura em que o docente deve solicitar o termo da licença, segundo o disposto no nº 2) , tal vaga “cabe” (segundo a expressão utilizada no regime geral constante do nº 1 do artigo 82º do Decreto-Lei nº 497/88) ao docente que tiver requerido o regresso à actividade e, inexistindo aquela, caber-lhe-á a primeira que venha a ocorrer no mesmo quadro.

4.8.Não há aqui qualquer remissão para o regime de colocação através de concurso, o qual, aliás, se pode vir a revelar antagónico com o direito ao preenchimento do lugar vago conferido ao docente, uma vez que tal colocação depende das contingências inerentes ao processo de concurso, como acabou por se verificar no caso vertente.

4.9.É que, da forma com agiram os serviços, o conteúdo daquele direito seria completamente esvaziado, uma vez que a qualquer titular de habilitação profissional para a docência sempre será permitido candidatar-se ao preenchimento de lugares vagos através de concurso (cfr. artigo 17º e segs. do Decreto-Lei nº 139-A/90), pelo que também essa via estaria, em principio, aberta ao docente em situação de licença, independentemente de requerimento prévio para o efeito.

4.10.Nem se afigura colher o argumento extraído do disposto no artigo 123º do mesmo Estatuto, que mantém em vigor, até à definição do novo regime dos concursos previsto no artigo 24º, o regime de colocação resultante do Decreto-Lei nº 18/88.

Com efeito, o regime de colocação de docentes e o de férias, faltas e licenças são perfeitamente autonomizáveis, muito embora o termo de uma licença sem vencimento de longa duração pressuponha naturalmente também uma colocação após a reassunção da plenitude do vínculo, temporariamente suspenso (cfr. nº 1 do artigo 82º do Decreto-Lei nº 497/88).
Todavia, o que está em causa é saber se esta colocação, no termo da licença sem vencimento de longa duração é, ou não, independente de concurso, impelindo no sentido da interpretação preconizada quer a ausência de norma transitória que haja suspendido a aplicação da inovação operada no regime da licença sem vencimento de longa duração, e decorrente, como se viu, do artigo l07º do Estatuto, quer a circunstância de a ressalva constante do artigo 123º abranger apenas a regulamentação anterior dos concursos, em si mesma considerada (como resulta, aliás, da epígrafe deste preceito), expurgada, assim, da norma do nº 1 do artigo 28º, tão frontalmente contrariada.

C-CONCLUSÕES

5.Em face do exposto, e desde que o docente que requer o regresso da situação de licença sem vencimento de longa duração o faça, atempadamente, antes do termo do ano escolar, caber-lhe-á a vaga existente no seu quadro de origem, a qual, por tal motivo, já não poderá ser posta a concurso.

Caso a vaga não exista no quadro de origem, à data da abertura do concurso, apenas aí surgindo, posteriormente, e ainda que durante a realização deste, aquela caber-lhe-á do mesmo modo.

6.No caso vertente, tendo a reclamante apresentado o seu requerimento, antes do termo ano escolar -Maio 1992- tendo já decorrido o processo de concurso para colocação de professores para o ano seguinte -1992/93-, a mesma não poderia legitimamente aspirar ao preenchimento da vaga existente na escola e colocada a concurso nesse ano.

7.Todavia, caber-lhe-ia a vaga surgida posteriormente no quadro da sua escola, a qual terá sido, assim, indevidamente posta a concurso, em Fevereiro de 1993, não tendo a reclamante sequer obtido colocação em qualquer das duas vagas adicionais abertas durante a realização do concurso para 1993/94.

8.Uma vez que a reclamante acabou por ficar, porém, colocada na sua escola, na 2ª fase do mesmo concurso, deverá ser considerada, para todos os efeitos, como docente de nomeação definitiva e ao serviço da escola, desde a data em que o teria sido se lhe tivesse sido atribuída a referida vaga, posta indevidamente a concurso.

9.Posto o que,RECOMENDO:

a)Que a reclamante seja, para todos os efeitos legais, considerada, desde a data em que se efectivou o preenchimento da vaga existente no respectivo grupo de docência na Escola Secundária da Trofa e indevidamente posta a concurso para o ano escolar de 1993/94, como professora nomeada de nomeação definitiva, titular de lugar do quadro da mesma escola, tanto mais que esses efeitos se reportam à mesma data (início do ano escolar de 1993/94), em que obteve colocação, embora na 2ª fase do concurso a que desnecessariamente se submeteu;

b)Que, sejam igualmente corrigidas todas as situações em que se mostre ter existido violação do direito consagrado no artigo 107º do Estatuto da Carreira Docente, aprovado pelo Decreto-Lei nº 139-A/90, de 28 de Abril, e adoptado, futuramente, pelos serviços um procedimento consentâneo com o seu efectivo reconhecimento.

O PROVEDOR DE JUSTIÇA

José Menéres Pimentel