Presidente da Câmara Municipal do Porto

R-1195/92
Rec. nº 20/B/95
Data:26.05.95
Área: A2

Assunto:FUNÇÃO PÚBLICA – BOMBEIROS – REGULAMENTO DISCIPLINAR – PENAS APLICÁVEIS – ALTERAÇÃO.

Sequência:

1.Foi solicitada a minha intervenção no âmbito de um processo disciplinar contra um elemento do Batalhão de Sapadores Bombeiros do Porto, que evidenciou a injustiça de alguns dos dispositivos que integram o respectivo Regulamento Disciplinar.

2.Na verdade, a leitura do disposto nos arts. 18º a 26º do referido regulamento, bem como do disposto no seu art. 53º, nºs 1 e 2, evidencia que não se faz uma pré-determinação de quais os tipos de infracção disciplinar a que cabem as penas previstas, excepção feita ao caso das penas disciplinares de reforma compulsiva e demissão, e mesmo assim em termos vagos.

3.Significa isto que, independentemente do tipo de falta cometida, fica exclusivamente dependente do superior hierárquico o tipo de pena a aplicar.

4.Ora, entendo que nada justifica a existência de tipos de penas em aberto, que podem ser aplicadas de forma arbitrária ou mesmo discriminatória, sem uma relação directa e proporcional à gravidade da infracção cometida.

5.Na verdade, e a título de exemplo, pode acontecer que uma falta de moderação de linguagem (art. 4º, nº 18) venha a ser punida com pena igual à aplicada num caso de encobrimento de criminosos (idem, nº 52), obviamente bem mais grave, só porque eram diferentes as pessoas que as cometeram, ou diferentes as pessoas chamadas a decidir da pena aplicável, ou, ainda, diferente o seu estado de espírito ou outras circunstâncias especificas de cada caso.

6.Por outro lado, dada a conhecida afinidade entre o direito penal e o disciplinar, que têm de comum o facto de serem direitos que punem as condutas ilícitas dos cidadãos, importa ter presente que, para o direito penal como também para o direito disciplinar em geral, é princípio básico com assento legal a prévia definição de quais os factos a que são aplicáveis as diversas penas consentidas por lei, com o que se impede o arbítrio de quem detém o poder de punir e se salvaguarda a equidade e justiça no tratamento a dar ao infractor, assegurando-se, assim, independentemente das pessoas envolvidas, que aos mesmos factos, devidamente caracterizados em todas as suas circunstâncias, se venha a aplicar tendencialmente a mesma pena.

7.Não se ignora o elemento subjectivo que sempre existe na aplicação de quaisquer sanções jurídicas, como também é evidente que a lei, por ser geral e abstracta, não pode tomar em conta e ponderar ela mesma todos os elementos relevantes de qualquer caso concreto. No entanto, há que convir que é muito diferente a aplicação, ainda que subjectiva, de critérios legais, e a pura e simples ausência de tais critérios. No primeiro caso, sempre é possível, pelo menos, apreciar – mesmo jurisdicionalmente – a existência de erros e excessos evidentes na aplicação da lei; no segundo caso, por definição, não existem erros ou excessos.

8.Não parece possível, para refutar o exposto, invocar o art. 53º, nº 1, do Regulamento, uma vez que este normativo, pela sua vaguidade, deixa os limites da discricionaridade do poder de punir para além do inevitável – e, portanto, para além do aceitável.

9.Finalmente, reconhece-se que a especificidade dos corpos de bombeiros pode justificar especialidades ao nível disciplinar – daí a existência de um Regulamento Disciplinar próprio, no caso. Mas essas especificidades, se podem dar origem, por exemplo, a uma maior severidade das penas, ou a uma diferente hierarquização dos valores disciplinares, não justificam, de forma alguma, a existência de tipos de penas completamente em aberto, com todos os riscos de arbitrariedade e discriminação já referidos.

10.Face ao exposto, e nos termos do art. 20º, nº 1, alínea b), da Lei nº 9/91, de 9 de Abril,

RECOMENDO:

a V.Exª que se introduzam as alterações convenientes no articulado do Regulamento Disciplinar do Batalhão de Sapadores Bombeiros da Câmara Municipal do Porto, de forma a que fiquem definidos com a maior concretização possível quais os tipos de infracção a que são aplicáveis as diferentes penas disciplinares.

O PROVEDOR DE JUSTIÇA

José Menéres Pimentel