Director Regional de Agricultura da Beira Litoral

Proc.:R.3322/94
Rec. nº 65/A/95
Data:1995-06-29
Área: A 1

Assunto:AMBIENTE – EXPLORAÇÃO DE AVIÁRIO NÃO AUTORIZADO – LESÃO DO AMBIENTE E QUALIDADE DE VIDA – PODER VINCULADO – ENCERRAMENTO.

Sequência: Acatada

EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS

1.Queixaram-se ao Provedor de Justiça quarenta e três moradores do lugar de Salgueiral de Cima, freguesia de São João de Ovar, a respeito de lesões ao seu ambiente e qualidade de vida causadas por uma exploração avícola integrada por cinco aviários.

2.No decurso da instrução do processo foi a Direcção Regional de Agricultura da Beira Litoral inquirida sobre a instalação e funcionamento daquela exploração, através do ofício nº …, de 24. 02.1995, para efeitos das norma legais e regulamentares aplicáveis, a saber, o regime contido no Decreto-Lei nº 182/79, de 15 de Junho, desenvolvido pela Portaria nº 392/79, de 3 de Agosto.

3.Em resposta de 29.03.1995, confirma a DRABL a autorização de funcionamento de dois pavilhões da exploração reclamada.

4.Já sobre as restantes edificações existentes se refere faltar a autorização exigida no art. 2º do Decreto-Lei nº 182/79, de 15 de Junho, o qual determina que o exercício da actividade por unidades avícolas de reprodução e produção, bem como por unidades de caria e recria de aves de aptidão ovopoiética, não possa ser levado a cabo sem prévia autorização administrativa das autoridades agrárias e higio-sanitárias.

5.Ficou demonstrado na instrução que a vistoria efectuada ao local em 23.02.1994 permitiu constatar à DRABL a exploração de três aviários com cerca de 34 000 frangos, apontando para um total anual de aves que ronda as 68 000 ( a fls 43 do nosso processo, reproduzindo relato da vistoria conjunta elaborado na Direcção Regional do Ambiente e Recursos Naturais do Centro).

6.Certo é pois, encontrar-se em ilegal funcionamento um dos três aviários em exploração, embora se admita estar em curso procedimento administrativo onde é requerida autorização à Direcção Regional de Agricultura da Beira Litoral.

7. Ao dar-se conta dos factos, em 23.02.1994, a Direcção Regional de Agricultura da Beira Litoral praticou um acto de verificação e, como tal, reconheceu a sua existência da qual retira a lei determinadas consequências.

8.Como afirma SÉRVULO CORREIA, “uma vez concluído o juízo de existência da situação, nasce para o seu autor a vinculação de emitir um comando com um certo conteúdo” (Noções de Direito Administrativo, pp 457 e ss.), ou seja, a vinculação de retirar da verificação as consequências individuais e concretas que a lei generica e abstractamente determina uma vez preenchida certa previsão legal.

9. Ora, da previsão da implantação de explorações em contravenção ao disposto no Decreto-Lei nº 182/79, de 15 de Junho, resultam dois efeitos: um de natureza repressiva sobre o infractor (o pagamento de multa, de acordo com o art. 8º, nos 1 e 6); outro cuja finalidade determinante é a de repor a legalidade violada (o encerramento das instalações ilegalmente implantadas, nos termos do art. 8º, nº 6).

10. Acresce ainda uma terceira consequência, qual seja a de vedar às explorações contraventoras “quaisquer auxílios técnicos, financeiros ou outros” por parte do Ministério da Agricultura (art. 8º, nº 5).

11. Todavia, apesar do acto de verificação, a unidade não autorizada da exploração avícola reclamada permanece em normal funcionamento.

12.O poder de encerramento e a aplicação de multa por contravenção ao disposto no art. 2º do Decreto-Lei nº 182/79, de 15 de Junho, constituem um poder vinculado da Administração PúbIica, o que quer dizer que não é conferida qualquer margem de livre conformação à Direcção Regional de Agricultura da Beira Litoral.

13.Na vistoria sempre mencionada concluíram as autoridades sanitárias inexistir grave perigo para a saúde pública decorrente do funcionamento da exploração avícola, mas admitem-se, contudo, incómodos pontuais.

14. Significa esta constatação que, pese embora não se tenha apurado dano na salubridade pública, não se afastam, antes se admitem, danos para o ambiente e qualidade de vida dos moradores próximos, e por isso, foi ao proprietário sugerida “a execução de algumas melhorias, nomeadamente a plantação de uma cortina arbórea com árvores de folhas perenes na orientação dos ventos dominantes, arranjo de algumas janelas e melhoria das descargas dos estrumes”.

15. Sem que a exploração se encontre devidamente autorizada sempre haverá lugar ao ressarcimento dos lesados nos termos da resp nsabilidade civil, relativamente aos prejuízos e lucros cessantes cujo nexo de causalidade venha a dar-se como provado.

16.A essa responsabilidade haverá que aduzir, caso os lesados exerçam o seu direito e fique demonstrada a mencionada causalidade, uma obrigação de indemnizar por parte dos órgãos e serviços da Administração Pública que, possuindo competência sobre o funcionamento e munidos de poderes com que a lei os investe para pôr cobro a situações de ilegalidade, não tenham agido com a diligência que lhes era devida ou tenham omitido certo acto que a lei lhes impusesse praticar.

17. E nada permite abonar em favor da permanência da actividade a sua importãncia para a economia local ou regional, pois essa motivação não legitima que se afrontem direitos fundamentais como o direito a um ambiente sadio e ecologicamente equilibrado, quando afinal de contas, é possível por via da autorização administrativa e da imposição de medidas correctoras obter uma harmonização entre os direitos e interesses em presença.

18. Isto, antes de mais, porque “as competências jurídicas derivadas do direito de polícia devem ser exercidas no interesse da colectividade, sendo, por isso,irrenunciáveis” (GOMES CANOTILHO, Actos autorizativos jurídico-públicos, in BFDC, Vol. LXIX (1993), p.47).

19. Isto significa também que, mesmo que não viessem a dar-se como provados todos os prejuízos ambientais invocados pelos moradores do lugar de Salgueiral de Cima (contaminação dos solos e afectação dos recursos aquíferos), nem assim poderia ficar afastado o cumprimento das disposições do Decreto-lei nº 182/79, de 15 de Junho, nomeadamente o encerramento das instalações não autorizadas.

20. Com efeito, a não ser deste modo, estaria a Administração Pública a perverter um interesse público primário, cuja definição cabe ao legislador promover.

CONCLUSÕES

Usando da faculdade que me é conferida no art. 20º, nº 1, alíneas a) e e) da Lei nº 9/91, de 9 de Abril, fundando-me na apreciação dos factos demonstrados e do direito aplicável que a instrução do processo em curso permitiu concluir, e após ter ouvido a Delegação Regional de Agricultura da Beira Litoral, cumprindo o princípio da prévia audição, entendo RECOMENDAR:

O encerramento do pavilhão não autorizado da exploração avícola reclamada, sita nas proximidades do lugar de Salgueiral de Cima, na freguesia de S.João de Ovar, porquanto foi verificado em vistoria realizada em 23.02.1994 que o mesmo funcionava em contravenção ao disposto no art. 2º do Decreto-lei n4 182/79, de 15 de Junho, assim como o cumprimento das demais estatuições que tais factos desencadeiam, sem prejuízo de autorização, no futuro, caso venham a dar-se como preenchidas as
condicionantes sugeridas e os demais pressupostos que a Portaria nº 392/79, de 3 de Agosto, exige, como seja a localização em terreno de fraca aptidão agrícola (nº 2/1, al. b]).

O PROVEDOR DE JUSTIÇA

José Menéres Pimentel