Presidente da Câmara Municipal de Gondomar

Proc.:R-1124/95
Rec.nº 75/A/95
Data:1995-07-19
Área: A 2

Assunto:ADMINISTRAÇÃO LOCAL – MERCADO – ADJUDICAÇÃO – DIREITO DE OCUPAÇÃO EFECTIVA DE LOJA – CONCURSO PÚBLICO – VIOLAÇÃO – REGULAMENTO DOS MERCADOS MUNICIPAIS – PRINCÍPIO DA JUSTICA, CONCORRÊNCIA E IMPARCIALIDADE

Sequência: Não acatada

EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS

A) Dos factos

Por deliberação camarária publicada em edital de 3.03.1995, procedeu-se à abertura de concurso público com vista à adjudicação do direito de ocupação efectiva das lojas e bancas existentes naquele mercado entre as quais se encontrava a n° 13.

Segundo o programa de concurso, a recepção de propostas teria lugar durante o prazo de 15 dias a contar de 13 de Março de 1995 (inclusive) estando a abertura das mesmas marcada para o dia 4 de Abril p.p. pelas 14.30h.

Ainda nos termos daquele programa estipulava-se, e entre outras, que:

– o concurso reger-se-ia pelas disposições constantes do Programa e do Regulamento dos Mercados Municipais (cuja consulta era facultada aos interessados).

– cada vendedor poderia apresentar proposta a várias lojas e bancas contudo, e atendendo a que nos termos do disposto no n° 3 e n° 4 do art. 11° do Regulamento dos Mercados Municipais não é permitida a ocupação simultânea de lojas e bancas bem como de mais de uma loja ou banca, cada concorrente teria de optar apenas por um lugar.

Todavia, constata-se que uma das concorrentes,a Senhora …, apresentou cinco propostas todas com vista a ser-lhe adjudicado o direito de ocupação efectiva da loja n° 13.

O que efectivamente veio a acontecer pelo valor do lanço de montante mais elevado, atendendo a que o mesmo ultrapassava o que havia sido proposto pela outra concorrente.

Porém, e muito embora no n° 1 do art. 14° do Regulamento dos Mercados Municipais se estipulasse a obrigatoriedade dos titulares do direito de ocupação de liquidar no acto da praça o preço da arrematação sob pena de, não o fazendo, esta ficar sem efeito, o que sucedeu foi que, e muito embora a proponente não tenha efectuado aquele pagamento (por si ou através de representante) o direito de ocupação efectiva da loja pretendida foi-lhe adjudicado, tendo a Câmara Municipal a que V. Exa. preside, justificado tal comportamento pelo facto de ser “prática corrente” (sic.) a liquidação do valor licitado na
altura da celebração do contrato (após homologação da Câmara Municipal).

Constatam-se assim, várias irregularidades passíveis de comprometer a validade do concurso.

B) Dos fundamentos Impõe a Constituição

Impõe a Constituição da República Portuguesa no seu art. 266° que a Administração prossiga o interesse público respeitando os direitos e interesses legalmente protegidos daqueles que com ela se relacionam, o que implica a proibição de tratamentos preferenciais e a adopção dos mesmos critérios de forma a possibilitar o tratamento igual de situações iguais (tal como J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira in Constituição República Portuguesa anotada, 3ª ed., Coimbra, necessário será entender que o princípio ora em referência se aplica a todas as formas de Administração Pública, incluindo, portanto, a
Administração Local)

E nesta esteira, impõem o art. 4° e art. 6° do Código do Procedimento Administrativo, que a Administração (na qual, e nos termos do disposto na al. c) do n° 2 do seu art. 2° se incluem os órgãos das autarquias locais e suas associações e federações) paute a sua conduta pelos princípios da prossecução do interesse público, protecção dos direitos e interesses dos cidadãos, justiça e imparcialidade.

Citando Freitas do Amaral (in Direito Administrativo, 1985, Vol. III, p. 438), o concurso público aparece forma que melhor garante a igualdade dos concorrentes, a escolha da melhor proposta, a transparência do processo e a sua moralidade”.

No entanto a exigência de concurso público consubstancia-.se, também, numa limitação à discricionariedade da Administração na celebração dos contratos no que respeita à escolha do co-contratante.

Tal limitação, porque visa possibilitar a escolha do melhor parceiro contratual, terá como corolário a salvaguarda dos princípios da concorrência e da imparcialidade com vista a garantir a igualdade de tratamento dos operadores que com ela pretendem contratar.

É que, e como diria Sérvulo Correia, uma vez que em abstracto poderão ser múltiplos os interessados em contratar “assume acuidade especial a aplicação do princípio da imparcialidade sob a vertente da igualdade de tratamento” (in Legalidade e Autonomia Contratual nos Contratos Administrativos, Coimbra, 1987, p. 691).

Por seu turno, estando a actuação da Administração enformada pelos princípios da prossecução do interesse público da justiça e da imparcialidade, impõe-se que a mesma adopte regras claras e devidamente publicitadas de modo a que não se possam levantar dúvidas quanto à transparência das operações inerentes à formação dos contratos (maxime quanto à escolha do contratante).

Ora, são todas estas regras intrínsecas à natureza da figura do concurso público que parece terem sido inobservadas quando:

1. Foi autorizada a admissão a concurso da concorrente … embora se constatasse que esta apresentava cinco propostas relativamente ao mesmo espaço sendo certo que o art. 9° do Programa de Concurso estipulava que “cada vendedor pode apresentar proposta a várias lojas e bancas (…)”.

É que, o facto de a palavra “proposta” estar no singular, limitava a possibilidade de apresentação de propostas por concorrente a uma única, por espaço pretendido.

2. E ao arrepio do disposto no n° 1 do art. 14° do Regulamento dos Mercados Municipais, não se sancionou com a ineficácia da arrematação, o facto de a concorrente não ter liquidado o seu valor no acto da praça autorizando-lhe que tal fosse efectuado aquando da celebração do contrato.

Tal, criou uma situação de profunda desigualdade entre os concorrentes já que a dilação do prazo de pagamento é, como se sabe, matéria crucial na formação da vontade e da disponibilidade em contratar.

CONCLUSÕES

São estas as motivações, Senhor Presidente, que me aconselham dever RECOMENDAR a essa Câmara Municipal (ao abrigo do disposto no art. 20°, n° 1 al. b) da Lei n° 9/91 de 9 de Abril), através de V. Exa., que proceda à anulação do concurso.

O PROVEDOR DE JUSTIÇA

José Menéres Pimentel