Ministro das Finanças

Rec. n.º 65 A/92
Proc.: R-783/89
Data: 23-07-92
Área: A 2

Assunto: FISCALIDADE – IRS – PENSÃO DE SOBREVIVÊNCIA – TRIBUTAÇÃO – ILEGALIDADE.

Sequência: Acatada

1. Em Julho de 1979 o Provedor de justiça formulou recomendação ao então Ministro das Finanças no sentido de não ser tributada em I.R.S. a pensão de sobrevivência de M, com base nos argumentos constantes do parecer do Adjunto do Provedor de Justiça que aqui se dão por reproduzidos.

2. Na resposta comunicada ao Provedor de Justiça, o então Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais concordou com o parecer a propósito emitido pelo Centro de Estudos Fiscais da D.G.C.I. (Parecer 40/91) no qual se concluiu pela impossibilidade de acatamento daquela recomendação, atendendo, em suma, a que os residentes em Timor devem ser considerados, para efeitos fiscais, como não residentes em Portugal.

3. Reconheço estarem juridicamente correctas duas afirmações que o Fisco avança em contradição ao primeiro tipo de razões que a Provedoria invocara:

a) Timor não pode, na verdade, face à Constituição e mesmo, embora somente para efeitos fiscais, nos termos do DL 579/70, de 24/11, ser considerado território português. A queixosa é, pois, em termos de I.R.S., “não residente” em Portugal.

b) Só a partir do Decreto-Lei n.° 95/90 se tornou legalmente possível aplicar a pensões de não residentes o regime do art.° 51.° do I.R.S.

E o princípio do mínimo de subsistência consagrado no art.° 71.° só vale, expressamente, para os rendimentos do trabalho.

4. Isto posto, continuo, porém, a entender que existem razões jurídicas a sustentar a recomendação que o Fisco não aceitou.
Vejamos:

5. Antes de mais, há uma parte da quantia retida compreendida entre a Circular de 15 de Setembro de 1989 e Janeiro de 1990.

É que o BNU aplicou, com rigor, o novo regime estabelecido no Decreto-Lei n.° 95/90 a partir de 1/1/90 .

Mas o que sucedeu foi que o Fisco, decerto ciente da injustiça do regime inicial fixado no Código de I.R.S., e com base na Lei que autorizava o Governo a revê-lo (Lei n.° 29/89), mandou desde logo aplicar esse novo sistema pela citada Circular, emitida em 15 de Setembro de 1989.

Só que esta Circular foi enviada à Caixa Geral de Aposentações e ao Centro Nacional de Pensões, as duas principais entidades pagadoras de pensões.

A D.G.C.I. não terá tido em conta, que os Bancos (entre os quais o BNU, aqui em causa) também pagam pensões, por o seu pessoal não estar integrado em qualquer regime de segurança social.

Assim, gerou-se aqui uma situação de desigualdade, desfavorável à queixosa: porque o BNU aplicou a lei (Decreto-Lei n.º 95/90) com rigor, ela sofreu retenção ainda a partir de 12/9/89 e até 1/1/90, período durante o qual a mesma já não foi – ilegalmente, mas com espírito de justiça – aplicada à generalidade dos não residentes titulares de pensões pagas por entidades destinatárias da aludida circular que fez efectivar o Decreto-Lei n.° 95/90 antes ainda da sua exacta entrada em vigor.

Com base no princípio da igualdade, pelo menos estas quantias devem ser devolvidas à interessada.

6. Mas, a meu ver, não só estas, e isso por dois motivos fundamentais:

a) 0 Centro Nacional de Pensões esclareceu que nunca aplicou a retenção em causa aos não residentes que tivessem em Portugal procurador.

Ora era essa, precisamente, a situação da queixosa. Mais: o pagamento, a esta, nem era, em rigor, feito em Timor.

O pagamento da pensão em causa era feito em Lisboa, em conta aberta no BNU para esse efeito – conta essa em nome da queixosa mas com a morada do seu procurador.

Depois é que era feita a transferência bancária dessas quantias para o banco indonésio com filial em Timor.
Mas, se o pagamento das pensões em causa era feito em Lisboa, em conta da queixosa e com menção da morada do seu procurador, deveria, em minha opinião, ter-se procedido em termos paralelos aos utilizados pelo Centro Nacional de Pensões.
Não efectuando o Centro Nacional de Pensões retenção na fonte em situações destas, entendo que, de novo por força do princípio da igualdade, de modo similar deveria o BNU ter agido em relação à pensão de sobrevivência da queixosa.

b) Acresce – e sobretudo – que o Ministério das Finanças, depois de mais bem estudado o problema geral das pensões pagas a não residentes, veio a concluir que não deveriam ter sido objecto de retenção as relativas a pessoas residentes em países que houvessem celebrado com Portugal convenções destinadas a evitar a dupla tributação.

Mas, se assim é, idêntico critério se deveria ter aplicado em relação a Timor.
É que – porventura com razão – o Fisco entende continuar em vigor, em relação a Timor, o Decreto-Lei n.° 579/70, destinado a evitar duplas tributações entre os vários espaços fiscais existentes no âmbito de Portugal, incluídas as então chamadas “províncias ultramarinas”.

E o art.° 8.° desse diploma dispõe que: “A tributação do rendimento global de pessoa singular … que resida em Portugal só pode efectuar-se no território do seu domicílio”.

É certo que o art.° 23.° n.° 1 do mesmo Decreto-Lei prescrevia que “são tributáveis por imposto parcelar apenas no território do domicílio da entidade que paga as remunerações”, estendendo o subsequente n.° 2 o mesmo regime às pensões.

Mas este último regime é o aplicável a impostos parcelares. E o I.R.S. é, declaradamente, um imposto global sobre o rendimento.
Sendo assim, é-lhe aplicável o supracitado art.° 8.º do Decreto-Lei n.º 579/70.
Esta aplicação opera-se directamente, na medida em que se entenda que o Decreto-Lei n.° 579/70 ainda hoje vigora para Timor.

E, em qualquer caso, sempre se aplicaria por analogia (ou, até, maioria de razão), face à solução tida por legal em relação aos países com os quais Portugal celebrou convenção destinada a evitar dupla tributação em sede de imposto global sobre o rendimento.

7. Nestes termos, e ao abrigo do disposto na alínea a) do n.° 1 do art.º 20.° da Lei 9/91 de 9 de Abril, reitero perante Vossa Excelência a RECOMENDAÇÃO

para que seja revisto o caso da contribuinte a fim de não ser tributada em I.R.S. a respectiva pensão de sobrevivência.

0 PROVEDOR DE JUSTIÇA

JOSÉ MENÉRES PIMENTEL