Ministro das Finanças
Número:5/A/96
Processo:R.-2037/93
Data:12.01.1996
Área: A4

Assunto:FUNÇÃO PÚBLICA – FALTAS INJUSTIFICADAS – AUSÊNCIA AO SERVIÇO – PRÉ-APOSENTAÇÃO – REPOSIÇÃO DE VENCIMENTO – RELEVAÇÃO.

Sequência:Acatada

I

1. A Exm.ª Sr.ª …, funcionária do Hospital de Santa Maria, aposentada com a categoria de 1.º Oficial Administrativo, dirigiu-me uma exposição em que pedia a intervenção do Provedor de Justiça no caso que se encontrava em decisão naquele Hospital, relacionada com a reposição da quantia de 171.027$00, que lhe teria sido indevidamente paga entre 1 de Outubro de 1990 e 5 de Dezembro de 1990, com fundamento em faltas injustificadas.

2. A Reclamante apresentou os seguintes factos:
a) Em finais do mês de Setembro de 1990, aquando da entrega dos documentos e impressos para requerimento de aposentação, foi informada pelo Chefe de Secção do Serviço de Pessoal, Sr. …, que devia aguardar no domicílio a comunicação da situação de aposentada;
b) Estranhando a informação, dirigiu-se a outra funcionária do serviço de pessoal com o intuito de obter melhor esclarecimento, tendo sido aconselhada a seguir a ordem do Chefe de Secção, o já referido Sr…;
c) Assim, deixou de comparecer ao serviço em 3 de Outubro de 1990, aguardando a aposentação em casa, tendo sido aposentada em 6 de Dezembro de 1990, conforme publicado em Diário da República.
d) Através do ofício n.º …, subscrito pela Directora de Serviços de pessoal desse Hospital, foi a reclamante informada da necessidade de proceder à reposição da quantia de 171.027$00, que lhe teria sido paga indevidamente.
e) Apurou, então, que tal reposição era exigida por terem sido consideradas injustificadas as faltas ao serviço desde 1.10 até 5.12.1990.
f) Requereu a justificação das referidas faltas, o que foi indeferido por Despacho de 27 de Março de 1993 e lhe foi comunicado pelo ofício n.º 15954, de 2 de Abril de 1993.

3. Levantada a questão junto do Exm.º Senhor Administrador Delegado do Hospital de Santa Maria, através do ofício n.º …, foi obtida resposta através do ofício n.º …, (doc. 1), que esclarecia os seguintes aspectos:
a) O referido funcionário, Sr…., foi alvo de um processo disciplinar no âmbito do qual foram apuradas diversas infracções, entre as quais algumas relacionadas com reposições, tendo sido demitido da função pública;
b) O mesmo Sr… foi criminalmente condenado, para além da pena disciplinar, encontrando-se a cumprir pena de prisão.
c) Foi então afirmado, no parágrafo 5. desse ofício, que a situação da funcionária reclamante consubstanciava uma das formas de actuação ilícita do referido Chefe de Secção.
d) Defendeu porém o Exm.º Senhor Administrador Delegado que a Reclamante, sendo primeiro-oficial administrativa, não podia ignorar uma matéria do Estatuto da Aposentação como a cessação de funções no âmbito do processo de aposentação e terminava afirmando que a mesma iria ser informada da possibilidade de requerer a relevação da reposição.

4. Através do ofício n.º …, procurou a Provedoria de Justiça alertar para uma solução oficiosa do caso, já que a reclamante era uma “vítima” da ilícita conduta do Chefe de Secção.
a) Em ofício datado de 9 de Novembro de 1994, com o n.º 53861, informou o Exm.º Senhor Administrador Delegado que havia sido emitida a guia de reposição e o assunto exposto junto do Ministério das Finanças.
b) Foi enviado ao Exm.º Senhor Chefe do Gabinete de Sua Excelência o Ministro das Finanças um ofício em que, sendo exposto o caso, era pedida a atenção para os princípios da boa-fé e da confiança na Administração, que haviam pautado a actuação da reclamante.
c) Foi comunicado pelo Exm.º Senhor Chefe do Gabinete de Sua Excelência o Secretário de Estado do Orçamento que havia sido feito um pedido de esclarecimento ao Presidente do Conselho de Administração da Caixa-Geral de Aposentações e em ofício posterior, datado de 10 de Março de 1995, com o n.º …, foi comunicado ter o assunto sido objecto de despacho, autorizando a reposição em 20 prestações mensais.
d) Mostrando-se necessário esclarecer melhor o assunto, foi pedida cópia da Informação n.º …, de 7 de Fevereiro de 1995, da 12ª Delegação da Contabilidade Pública, que servira de base de decisão de Sua Excelência o Secretário de Estado do Orçamento, de 15 de Fevereiro.
e) Dessa informação não constam os factos apresentados pela reclamante ao longo de todo o processo e confirmados pelo Hospital de Santa Maria, resumindo-se a exposição do assunto a um caso de “faltas injustificadas originadas por informação errada dos Serviços” e a uma escassa fundamentação legal, não sendo sequer avaliada a justificação e a excepcionalidade de toda a situação.

II

1. Perante tais factos, cumpre analisar as disposições legais relevantes para o caso.

2. Assim, as faltas dadas pela Exm.ª Sr.ª … foram consideradas injustificadas nos termos do artigo 71.º, n.º1, do Decreto-Lei n.º 497/88, de 30 de Dezembro.

3. No entanto, essas faltas encontram fundamento no acatamento de um esclarecimento dado por um funcionário detentor de conhecimentos especializados na matéria e de uma categoria superior à da funcionária.

4. À reclamante não era exigível outro comportamento, sendo certo que foi através da situação narrada em I que foi possível ao Hospital de Santa Maria desencadear todo o processo que levou ao apuramento da verdade.

5. Assim, dir-se-á que parece ser aplicável ao caso “sub judice” a norma constante do artigo 4.º, n.º1 do Decreto-Lei n.º 324/80, de 25 de Agosto, já que o caso é excepcional e se encontra plenamente esclarecida a ausência da funcionária pelo referido período de tempo, isto é, estão reunidos os pressupostos legais imprescindíveis à aplicação desta norma, que confere a possibilidade de determinação da relevação da reposição.

III

Pelo exposto:
a) Por estarmos perante um caso em que ficará fortemente abalado o princípio da confiança na Administração e da boa-fé se não for determinada a inexigibilidade da quantia à funcionária;
b) Por se ter provado que foi por dolosa actuação de outrem que a situação ocorreu;
c) Por se considerar justa e legal a pretensão da reclamante, pelos fundamentos expostos;
d) Por se revelar lacunoso e infundamentado o parecer da 12ª Delegação da Contabilidade Pública que fundamentou o despacho de Sua Excelência o Secretário de Estado do Orçamento,

RECOMENDO:
a Vossa Excelência, Senhor Ministro das Finanças que, revendo o assunto, revogue o despacho de 15 de Fevereiro de 1995, em que foi autorizada a reposição em 20 prestações mensais e releve, a título excepcional e justificado, a reposição de qualquer quantia ou, caso a mesma já tenha ocorrido, mande devolver integralmente à reclamante toda e qualquer soma por ela paga a título de reposição.

O PROVEDOR DE JUSTIÇA

José Menéres Pimentel