Presidente da Câmara Municipal de Ribeira de Pena
Número: 22/A/99
Processo: 4358/96
Data: 15.04.1999
Área: 1

Assunto: SAÚDE PÚBLICA – ESTABELECIMENTO CAPRIL – INSALUBRIDADE – DESPEJO

Sequência: Acatada

I – Exposição de Motivos

1.Em queixa que me foi apresentada em Outubro de 1996, contestava-se a posição de tolerância dessa Câmara Municipal relativamente à situação de insalubridade e perigo para a saúde pública ocasionada pela construção e funcionamento de um capril confinando com a habitação do Sr…, no lugar de Vilarinho, freguesia de Salvador, nesse concelho.

2.Volvidos quase três anos e a despeito das inúmeras diligências promovidas, a situação mantém-se inalterada. Os animais permanecem na construção contígua à habitação do queixoso, sem que se mostrem reunidas as mínimas condições de higiene e salubridade, tendo sido proferido, inclusive, parecer da Autoridade de Saúde Concelhia segundo o qual, os casos de brucelose detectados na família, provavelmente, estarão relacionados com a proximidade do capril (ofício nº 25/98, de 12/05/1998).

3.V. Exa. ordenou o despejo sumário das edificações em 12 de Maio de 1995; em 9 de Janeiro de 1997, foi efectuada nova intimação a tanto destinada; em 30 de Abril do mesmo ano, o proprietário comprometeu-se a retirar os animais no prazo de 30 dias; em 22 de Junho do ano findo, foi proferida nova ordem de retirada dos animais que veio a ser confirmada por deliberação camarária de 25/11/1998, a qual ordenou, a instauração de processo de contra-ordenação ao infractor.

4. Foram, deste modo, sendo concedidas sucessivas prorrogações do prazo fixado para que o proprietário desse cumprimento à ordem de despejo das edificações, sem que nada justifique a não adopção das medidas tendentes a conferir exequibilidade ao acto administrativo em questão, verificada a atitude de reiterado incumprimento, numa posição de tolerância por parte dessa Câmara Municipal que se pode fazer equivaler à renúncia tácita das respectivas competências em matéria de saúde pública – o que, como V. Exa., por certo reconhecerá, a Lei não permite (art. 29º, nº 1, do Código do Procedimento Administrativo).

5. Dir-se-á, no caso em apreço, que V. Exa. não renunciou às respectivas competências, apenas tem vindo a diferir no tempo, transitoriamente, o respectivo exercício. Não me parece colher tal entendimento em face de quanto impõe o princípio da prossecução do interesse público, o qual não se compadece com motivações não contempladas pela lei como condicionantes do exercício da competência respectiva. A lei atributiva da competência não admite que o respectivo titular abdique ou desista, ainda que transitoriamente, de exercer os poderes respectivos.

6. As edificações reclamadas não possuem licença de utilização que habilite o uso que lhes é conferido e as instalações não reúnem condições para que o funcionamento do curral seja legitimado pela emissão de alvará de licença sanitária (Instruções aprovadas pela Portaria nº 6065, de 30.III.1929), e a respectiva construção não observa os requisitos fixados nos arts. 115º a 119º do Regulamento Geral das Edificações Urbanas, aprovado pelo Decreto-Lei nº 38.382, de 7 de Agosto de 1951, quanto às edificações destinadas a alojamento de animais.

7. Por seu turno, a Autoridade de Saúde Concelhia em vistorias realizadas ao local, considerou inviável a exploração do capril sem risco para a saúde e comodidade dos moradores locais (art. 115º, § único, do Regulamento Geral das Edificações Urbanas), pelo que não se oferece outra possibilidade para a resolução do problema que a execução coactiva da ordem de despejo. Com efeito, nos termos do § único do citado art. 115º do Regulamento Geral das Edificações Urbanas, cabe às câmaras municipais interditar a utilização de edificações para alojamento de animais quando não seja possível a sua exploração sem risco para a saúde e comodidade dos habitantes locais.

8. Assim, urge exercer os poderes que a Lei faculta para conferir exequibilidade aos actos administrativos sempre que o respectivo destinatário se furte ao seu cumprimento, dando por isso início ao procedimento de execução coactiva (arts 149º e segs. do Código do Procedimento Administrativo).

9. Com efeito, a reposição dos níveis ambientais e de salubridade exigíveis apenas será possível através do despejo das edificações e encerramento do estabelecimento pecuário, pelo que a resolução da questão se encontra pendente da plena operatividade do acto administrativo que tais consequências determinou.

10. A observação das fotografias e de filme efectuado no local deixam-me sem compreender as motivações de V. Exa. ao permitir que a situação se mantenha indefinidamente. Por certo, só por desconhecimento das reais condições em que habita a família do Sr…, V. Exa. não terá promovido a adopção dos meios ao alcance dessa Câmara Municipal para fazer cessar uma situação, não só de clara ilegalidade, como da mais flagrante injustiça para com um agregado familiar carenciado e sem possibilidade de expedito recurso aos meios judiciais.

11. Dificilmente serão aceitáveis, em face das ameaças, se não dos danos consumados na saúde de quem ali habita, que se tolere a manutenção da situação por motivos de índole económica, ou outros, atinentes ao proprietário dos animais. É este um caso em que não se pode falar de conflito de valores, pois simplesmente, não pode haver conflito em situação de ilegalidade e de flagrante postergação das atribuições municipais em matéria de ambiente e salubridade pública.

12. Não se argumente, pois, que o carácter rural do meio justifica a tolerância municipal relativamente a estas situações, porquanto não será pela preocupação de salvaguardar a viabilidade das actividades tradicionais que se podem legitimar tais atentados à saúde pública.

13. Cumpre-me, pois, exortar V. Exa. a que proceda, com a urgência que a gravidade da situação descrita impõe, à execução coactiva da ordem de despejo sumário das edificações, pois não se vislumbram quais as razões que possam obstar a que se faça cessar, de imediato, a situação de risco para a saúde do aglomerado populacional local, o atentado ilícito ao ambiente e a lesão contínua e reiterada, dos direitos dos vizinhos à saúde e à qualidade de vida.

II – Conclusões

De acordo com o exposto, entendo, no uso dos poderes que me são conferidos pelo art. 20º, nº 1, al. a), do Estatuto do Provedor de Justiça, aprovado pela Lei nº 9/91, de 9 de Abril,

RECOMENDO

1º) Que promova a Câmara Municipal de Ribeira de Pena a execução coactiva da decisão camarária que ordenou o despejo sumário das edificações reclamadas, com fundamento no disposto nos arts. 149º, nº 2, e 157º, nºs 1 e 2 do Código do Procedimento Administrativo.

2º) Que para tal fim, seja notificado o proprietário das instalações, nos termos e para efeitos do disposto no art. 152º do Código do Procedimento Administrativo, da decisão de se proceder à execução da ordem de despejo, com indicação das condições em que as medidas de execução irão ser realizadas (art. 157º, nº 2, do CPA).

O PROVEDOR DE JUSTIÇA

JOSÉ MENÉRES PIMENTEL