Exm.° Senhor
Presidente da Assembleia de Pedroso

Rec. n.º 60A/98
Proc.: R-1737/98
Data: 30-09-1998
Área: A 6

Assunto: AUTARQUIAS LOCAIS – HERÁLDICA DAS FREGUESIAS – USO DE SÍMBOLOS HERÁLDICOS.

Sequência: Sem resposta

Recebi queixa relacionada com a utilização feita por esse órgão autárquico de determinados símbolos heráldicos, alegadamente em situação ilegal, bem como do uso da expressão “Vila de Pedroso” como denominação dessa freguesia.

Analisada a reclamação em causa, entendi ser a mesma procedente, em ambas vertentes.

Não é pacífica a resposta à questão de saber-se se as freguesias tinham ou não, antes de 1991, direito ao uso de símbolos heráldicos. O despacho de 14 de Abril de 1930 bem como a Lei das Autarquias Locais (Decreto-lei 100/84), até 1991, eram omissos a esse respeito. A opinião das várias Comissões de Coordenação Regionais que foram chamadas a pronunciar-se foi unanimemente negativa em relação à capacidade heráldica das freguesias (cfr. CABRAL, Manuel de Novais, “Do direito ao uso de brasão de armas, selo e bandeira pelas freguesias”, Armas e Troféus, VI série, tomo I, 1987/88. pg. 205 e segs., em especial, pgs. 213 e 206, nota 1). Ainda que assim não fosse, tendo em conta o papel que a Constituição dá às freguesias enquanto autarquia local, nunca se poderia defender um procedimento menos rigoroso do que o existente à data para os municípios, sendo forçosa a sua aplicação por analogia. Esse procedimento, à data dos factos, repita-se, apenas consagrado para os municípios, impunham, ex vi art.º 39. °, n.º 2, r), da Lei das Autarquias Locais, na redacção dada pela Lei 25/85, de 12 de Agosto, não só a deliberação do órgão competente, a assembleia municipal, mas também a audição da Comissão de Heráldica da Associação dos Arqueólogos Portugueses.

Essa audição era um requisito obrigatório da deliberação do órgão autárquico competente. Não se tendo verificado, segundo informação, colhida junto daquela Comissão, a deliberação em causa é sem dúvida ilegal, ainda que o não fosse por incidir sobre matéria de todo estranha às suas atribuições e competências.

De notar que o regime em causa foi alterado pela Lei 53/91, de 7 de Agosto, sendo certo que agora foram expressamente reconhecidos os direitos heráldicos da freguesia desenvolvendo-se o regime de aprovação, mas continuando a declarar-se expressamente a obrigatoriedade e vinculatividade do parecer da Comissão de Heráldica da Associação dos Arqueólogos Portugueses (art.ºs 4.º, n.º 1, a) e 19.º, n.º 2, da mesma lei).

Seja pela ausência de capacidade heráldica, seja pela preterição desse requisito legal não posso deixar de concluir pela ilegalidade dos actuais símbolos heráldicos usados por esse órgão.

Do mesmo passo, não posso concordar com a designação que para essa freguesia tem vindo a ser utilizada de “Vila de Pedroso”, nomeadamente na identificação desse órgão autárquico.

As categorias de vila ou de cidade são atribuídas pela Assembleia da República (art. 2.º da Lei 11/82, de 2 de Junho) a povoações e não a autarquias. Não há confusão possível entre freguesias, municípios e regiões administrativas, por um lado, e aglomerados populacionais que servem ou não de substrato territorial àquelas pessoas colectivas (veja-se, a título de exemplo, a vila de Caxias, lugar da freguesia de Paço d’ Arcos, concelho de Oeiras). A Lei 64/89, de 24 de Agosto, elevou a povoação de Pedroso a vila não a freguesia que aí tem sede, sendo certo que o seu n.º 2 é perfeitamente inútil pois nenhum conflito podia haver com a elevação a vila de outra povoação, esta não sede de autarquia e correspondendo a território pertencente à freguesia de Pedroso. Assim a elevação da povoação de Pedroso a vila não tem influência na nomenclatura da freguesia local que aí tem a sua sede, o mesmo é dizer, na nomenclatura dessa povoação-sede.

Nos termos da norma legal já citada, é à Assembleia da República que cabe alterar essa denominação se assim o entender, caso que não se verificou e não se verifica simples elevação da povoação-sede à categoria de vila ou cidade.

Deste modo, sempre se deverá referir a freguesia em causa pelo seu nome oficial de Pedroso, independentemente de a povoação do mesmo nome ser hoje vila e, quem sabe, amanhã cidade. De notar que são comparativamente raros os casos das vilas que integraram essa qualificação no seu nome, na totalidade, aliás, em período historicamente bastante recuado, sendo algumas delas hoje cidades (Vila Real ou Vila Nova de Gaia, por exemplo).

Assim, nos termos do art.º 20. °, n.º 1, a), da Lei 9/91, de 9 de Abril, RECOMENDO a esse órgão autárquico, na pessoa de V. Ex.ª, que:

1) Cesse de imediato o uso dos símbolos heráldicos que até aqui vinha sucedendo, pela sua manifesta ilegalidade;
2) Querendo, inicie o procedimento previsto no art.° 15. °, n.º 1. v), da Lei das Autarquias Locais, de molde a possibilitar a assunção de simbologia heráldica própria de acordo com os procedimentos e termos legais.
3) Utilize sempre, quando se deva referir à freguesia e não a localidade, a designação oficial de “Pedroso”, nomeadamente na denominação desse órgão autárquico.

O PROVEDOR DE JUSTIÇA

JOSÉ MENÉRES PIMENTEL